





Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Neste ensaio, neires maria soldatelli paviani explora os conceitos e as funções do corpo como linguagem e da linguagem do corpo, examinando suas interconexões com o processo de formação dos indivíduos na educação. O autor aborda a importância do corpo na comunicação humana, sua relação com a linguagem e as implicações dessas ideias para a educação.
Tipologia: Exercícios
1 / 9
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Neires Maria Soldatelli Paviani* Assim cantou Zaratustra. Mas, quando a dança acabou e as jovens foram embora, sentiu-se triste. (NIETZSCHE, Assim falou Zaratustra ) O homem é a articulação de duas ordens: a do corpo e a da linguagem. (RENAUD, 1999, p. 1182) A experiência humana oferece a profunda certeza da unidade vivida com o corpo e no corpo. [...] É mais exato dizer “sou” o meu corpo, sou corpóreo, do que dizer “tenho” um corpo. Este é vivido humanamente desde dentro como “eu mesmo”. (PINHO, 1999, p. 1184) Resumo: Este ensaio examina os conceitos e as funções do corpo como linguagem e da linguagem do corpo, ambos articulados com os processos de formação dos indivíduos na educação. Palavras-chave: Corpo. Linguagem. Educação. Body, language and education Abastract: This essay examines concepts and functions of the body as language and body language, both articulated with processes of formation of individuals in education. Keywords: Body. Language. Education. Cuerpo, lenguaje y educación Resumen: Este ensayo examina los conceptos y las funciones del cuerpo como lenguaje y del lenguaje del cuerpo, ambos articulados con los procesos de formación de los individuos en la educación. Palabras clave: Cuerpo. Lenguaje. Educación.
Introdução A linguagem, as palavras, os gestos, os signos nascem do corpo de cada ser humano que se expressa e comunica com os outros, com o mundo. Corpo e linguagem, num certo aspecto, são a mesma coisa. Pode-se falar no corpo da linguagem e na linguagem do corpo. E tanto o corpo como a linguagem são elementos de desenvolvimento e de formação. O sujeito é constituído a partir da educação do corpo e, simultaneamente, da educação linguística. Todavia, para poder entender essas afirmações, é necessário, antes de tudo, voltar o pensamento para o enigma do corpo, para o corpo como expressão, para o corpo como elemento que inaugura o conhecimento humano e é o meio de explosão da consciência de si no mundo. São múltiplos os acessos ao corpo, desde a Biologia até a Psicologia; no entanto, é na arte que talvez se manifeste uma das compreensões mais profundas das relações entre o corpo e a linguagem. O corpo e a poesia Drummond, no livro de poemas Corpo , chama a atenção, numa leve linguagem poética erótica, sobre as contradições do corpo. Já no início do poema, ele mostra a dificuldade que cada um de nós tem de entender o próprio corpo, ao afirmar que “meu corpo é ilusão de outro ser”, pois, ele, o corpo, “sabe a arte de esconder-me”. Numa sucessão de imagens, afirma que corpo é “meu envelope selado” ou “meu carcereiro” ou, ainda, “meu revólver de assustar”. A razão disso é que o meu corpo “me sabe mais que me sei”. (1984, p. 7). Também menciona, nas estrofes seguintes, a dor, a doença, o prazer, etc., que são sentidos antes de tudo pelo corpo e não “por mim”. Diz: “Meu prazer mais refinado não sou eu quem vai senti-lo. É ele, por mim...” (1984, p. 9). Enfim, parece que o eu se estabelece em uma luta entre meu corpo e eu. Nem sempre é possível entendê-lo na sua opacidade, no seu enigma. Além de ser naturalmente ambíguo, de ser finito e contraditório, existe a nudez do corpo. E Drummond, dela, diz o seguinte: “Nudez, último véu da alma que ainda assim prossegue absconsa.” (1984, p. 13). Nem a “linguagem fértil do corpo” detecta e decifra a nudez. Ela 2 DO CORPO: Ciências e Artes, Caxias do Sul, v. 1, n. 1, jul./dez. 2011
corpo e ela se padroniza pela educação. O cochicho e o falar alto, por exemplo, tendem a exagerar ou não o que se comunica. Portanto, sempre há uma relação entre a fala, a voz, o gesto, a expressão do rosto na conversação em geral. Daí, a necessidade de a educação interferir nos modos de fala, nos gestos e na escolha das palavras adequadas para cada ocasião. O corpo e a linguagem Larrosa, em Linguagem e educação depois de Babel , afirma que “se a negação do corpo mutila o humano, essa mutilação é também da linguagem. Porque assim como o homem, quando é inteiro, é corpo, também a linguagem quando é inteira é corpo”. (2004, p. 168). Assim, quem não possui corpo também não possui linguagem, ou quem, de um modo ou outro, tem problemas com seu corpo poderá ter problemas de linguagem. O corpo e a linguagem não duas dimensões originais e radicais do ser humano. Sob o ponto de vista da educação, as relações íntimas entre corpo e linguagem podem sofrer interferências positivas e negativas. Nesse sentido, Larrosa afirma que “o culto do corpo do mundo contemporâneo é tão doentio como o horror ao corpo de outros tempos”. (2004, p. 169). Podemos desvirtuar, mediante a exibição e outras estratégias, mediante a doença, o marketing , etc., o equilíbrio entre o sujeito e corpo. Do mesmo modo, também podemos proceder em relação à linguagem. O corpo e a linguagem podem ser calados e, igualmente, podem falar sem dizer nada, isto é, tornarem-se lugar do vazio. Cabe à educação, especialmente hoje, devolver ao corpo e à linguagem a exata medida da expressão, da comunicação. O excesso de informação, de propaganda, de retórica, de dispositivos, que falseiam as funções do corpo e da linguagem, dificulta a vida humana, as relações sociais e perturba, a curto e médio prazo, a economia da aprendizagem humana. Assim, a linguagem do corpo e o corpo da linguagem são, ao mesmo tempo, sujeitos e objetos de educação. Embora, em circunstâncias especiais, possam ser considerados meios, o corpo e a linguagem, em sua origem e natureza, não o são. São fins da 4 DO CORPO: Ciências e Artes, Caxias do Sul, v. 1, n. 1, jul./dez. 2011
educação. Essa é a tese que os educadores deveriam assumir e desenvolver em suas práticas. O corpo e a educação A educação não tem assumido o corpo como um modo de dizer, cuja linguagem requer habilidades de leitura. O corpo como um modo de dizer pode expressar-se de forma silenciosa, contida, sentida, sofrida, resignada, como pode manifestar-se de forma efusiva, escancarada, expansiva, alegre ou triste, exaltada. Esta, por ser mais visível, é também mais facilmente percebida, lida e/ou interpretada. Aquela nem sempre é percebida, compreendida, porque requer sensibilidade do Outro, em perceber que esse dizer contido se volta para dentro, para os sentimentos e as emoções sentidas; porém, não manifestadas a quem não tem olhos para ver, ou que enxerga até onde a vista alcança. Esse aspecto, ou essa capacidade de perceber, nem sempre o professor o tem para fazer leituras da linguagem interior que se diz ou que se manifesta, através do corpo, transpirando, lacrimejando, enrubescendo, tremendo, empalidecendo, emudecendo, doendo, adoecendo, entre outras formas. Há outras formas de educar as manifestações do corpo. A princípio, elas parecem não ter relação com educação formal e informal, porque as instituições (escola, entidades sociais e governamentais, familiar) estão imersas nos processos culturais (princípios, normas, crenças, costumes, rituais, etc.) de interação social que também seguem padrões pré-estabelecidos. Historicamente, os cuidados com o corpo têm ficado mais a cargo da educação informal. A família, quando assume essa função, é quem dá conta dessa educação. A escola, outrora, dava orientações de como, por exemplo, em lições de civilidade, portar-se à mesa; de como fazer o asseio/higiene do corpo; de como sentar- se, etc. Ou seja, a questão da postura física já foi mais contemplada na educação em geral. Por outro lado, a determinação social de como o corpo deve portar-se diante de determinadas situações parece engessar as manifestações do homem, não lhe permite possibilidades de outras manifestações corpóreas. A tentativa, por exemplo, de Bourdieu (1979) de explicar essa questão por meio da Universidade de Caxias do Sul 5
a resposta a imperativos sociais tais como a ‘linha’, a ‘forma’, o ‘orgasmo’, etc.”, diz Vigarello (1982, p. 72 apud LE BRETON, 2006, p. 85). Le Breton comenta que “o dualismo da modernidade não mais opõe a alma ao corpo, mais sutilmente opõe o homem ao corpo como se fosse um desdobramento. Destacado do homem, modulado conforme o gosto do dia, o corpo se equivale ao homem, no sentido em que, se modificando as aparências, o próprio homem é modificado”. (2006, p. 87). No entanto, apesar de hoje haver todo um culto ao corpo, ele ainda permanece oculto. “A ocultação do corpo continua presente e encontra o melhor ponto de análise no destino dado aos velhos, aos moribundos, aos deficientes ou no medo que todos temos de envelhecer.” (LE BRETON, 2006, p. 87). Entendemos que não nos educamos para aceitar o envelhecimento do corpo. Muitas vezes forjamos esse aceite, quando dizemos que o “espírito é jovem”. Esse autor segue dizendo que “um dualismo personalizado de algum modo se amplia, é necessário não confundi-lo com ‘libertação’”. A esse respeito comenta, citando Yonnet (1985, p. 121), que “o homem só será ‘libertado’ quando qualquer preocupação com o corpo tiver desaparecido”. (LE BRETON, 2006, p. 87). Mas isso nos parece ser impossível, enquanto estivermos vivos. O corpo é, ao mesmo tempo, ponte e limite. Fronteira no sentido de unir e não de separar. A questão, portanto, não consiste na preocupação com o corpo, mas na ocupação, isto é, no cuidado a ele devido. A tradição clássica de um modo geral (filósofos, teólogos, cientistas), segundo Renaud (1999), tem colocado os conceitos de corpo e alma numa perspectiva dualista, suscitando, algumas vezes, uma relação do corpo com o fenômeno do conhecimento, principalmente nos diálogos de Platão. Aristóteles desfaz o dualismo platônico. Para ele, o corpo não é “um simples mecanismo, mas um ente dotado de sentido, que tem o seu fim e o seu centro na gravidade em si mesmo e que só se compreende a partir de si próprio e da sua função. O corpo, como matéria informada, é visto como uma totalidade”. (1999, p. 1.178). Ainda na Antiguidade, os textos de Santo Agostinho, Tomás de Aquino, entre outros, tratam das questões do corpo numa perspectiva teológica e/ou metafísica. Universidade de Caxias do Sul 7
Na modernidade, confirmou-se o corpo “não como condição exterior do espírito, mas como lugar próprio da sua formação”. (RENAUD, 1999, p. 1.178). E, na contemporaneidade, numa visão fenomenológica do corpo, esclarecida pela antropologia, que inscreveu o homem numa linha evolutiva dos organismos naturais, e que, segundo Renaud, a questão da especificidade corporal passou a ser fundamental, perguntando-se, por exemplo: “Qual a essência do homem enquanto organismo?” Responder a esta pergunta requer que se façam várias considerações, mas, aqui, destaca-se a ideia de que “o comportamento humano não é, como o dos outros animais, programado por um patrimônio hereditário submetido ao ciclo repetitivo do instinto, mas passa a inscrever-se no jogo dos modelos que lhe é transmitido pela educação”. (RENAUD, 1999, p. 1181). Na sequência, a autora comenta que “a linguagem é a chave a que o lingüista Jacobson chamou de ‘realidade transacional’ simultaneamente natural, corporal e cultural”. (1999, p. 1.181). E, por sua vez, Freud e Lacan, comenta Renaud, reafirmam que o corpo efetivamente é susceptível de encarnar, no sentido forte do termo, a ordem da linguagem. [...] Isto porque a complexidade do corpo psíquico consiste na imbricação destas duas ordens: a da vida e a da linguagem. Imbricação que, segundo a psicanálise, não é tão fácil como pretendiam alguns filósofos, porque o corpo humano é pulsional e não instintivo, e por isso, é tensional e conflituoso. (1999, p. 1.181). As ciências como um todo tentam, por meio de suas investigações, responder às perguntas que se fazem, no caso, acerca do corpo. Elas, porém, historicamente, têm mostrado que os estudos não esgotam a discussão e que, apesar de ser uma questão tão próxima, tão concreta e inerente a cada ser humano, o corpo se nos apresenta como algo complexo, misterioso, justamente porque, ao mesmo tempo que é comum a todos, é singular enquanto existe em cada ser. Considerações finais Em linhas gerais, o que se pode dizer é que tudo passa pelo corpo. Inclusive a vida. O corpo é o livro que guarda em suas 8 DO CORPO: Ciências e Artes, Caxias do Sul, v. 1, n. 1, jul./dez. 2011