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Este texto apresenta a história do movimento de poesia concreta no estado do ceará, brasil. Desde a sua origem na década de 1950, liderada pelo grupo 'noigandres' de são paulo, até as contribuições de poetas cearenses como josé alcides pinto, antônio girão barroso, pedro henrique saraiva leão e horácio dídimo. O texto também discute as influências sociais, políticas e econômicas que contribuíram para a disseminação do movimento no ceará.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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X Seminário de Pesquisa do Departamento de História - UFC Fortaleza, 01 a 03 de outubro de 2012. CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCRETISMO NA LITERATURA CEARENSE Kedma Janaina Freitas Damasceno∗ O movimento nacional de poesia concreta nasceu nos primeiros anos da década de 1950, pelo trabalho do grupo brasileiro “Noigandres”^1 (depois “Invenção”), de São Paulo, composto inicialmente por Augusto de Campos, Décio Pignatari e Haroldo de Campos. A primeira mostra do movimento aconteceu no Brasil, no período de 4 a 18 de dezembro de 1956, no MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo. A poesia concreta surgia no Brasil, segundo seus teóricos, com o intuito de combater o retrocesso formal que a chamada “Geração de 45” representava para a poesia da época, bem como formular um projeto geral de criação poética em que predominasse uma linguagem objetiva, a economia das palavras e a arquitetura do poema, fazendo deste: "produto de uma evolução crítica de formas ". Os concretistas se inspiraram bastante na poesia “Pau-Brasil” de Oswald de Andrade, com suas reduções linguísticas e técnicas de montagem, assim como no rigor construtivo dos poemas de João Cabral, para proporem suas inovações poéticas. No âmbito internacional, nomes como Stéphane Mallarmé, Ezra Pound, e.e cummings e James Joyce foram as principais influências dos poetas concretistas brasileiros. Visando compreender melhor a atuação da vanguarda concretista no Brasil e mais especificamente no Ceará, faz-se necessário apresentar como estava a sociedade brasileira no período do surgimento do Concretismo, quais eram seus problemas, seus anseios, seus projetos. Dessa forma, fica mais fácil entender a dialética entre a sociedade e a nova poesia. O contexto social, político e econômico da década de 50 no Brasil contribuiu bastante para a inserção do movimento de poesia concreta no país. O governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi marcado pelo anseio de modernidade e desenvolvimento, tendo como lema principal o progresso industrial e econômico de 50 anos em 5. Os estados da região Sudeste, considerados o centro cultural e econômico do país, viviam um período de significativas inovações tecnológicas, industriais e crescimento urbano, influenciados, principalmente, pelas mudanças desenvolvimentistas que estavam ocorrendo no governo de JK. A construção de Brasília, iniciada em 1957 e concluída em 1960, representa bem essa busca pela modernidade, tão característica do governo de Juscelino Kubitschek, e fortalece as ideias de ruptura postuladas pelo movimento de poesia concreta. Até o título do manifesto
∗ (^) Mestre em Letras pelo Programa de Pós-Graduação em Literatura Comparada da Universidade Federal do Ceará. E-mail: kedma20@yahoo.com.br
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coletivo de 1958, “plano-piloto para a poesia concreta”, assemelha-se ao “plano-piloto para a construção de Brasília” do arquiteto Lúcio Costa que venceu o concurso da NOVACAP (nova capital), lançado por JK em 1957. O citado manifesto concretista demonstrava o desejo do movimento de erguer-se como porta-voz natural, no campo da poesia, do novo clima modernista que a nova urbe transformava em nacional e hegemônico.
A ruptura que a exposição de poesia concreta supunha com o contexto era homóloga àquela produzida pelo projeto de Brasília. O elemento vanguardista, dessa perspectiva, em relação com um campo determinado, consistia em que ela só podia impor-se a partir do hiato e do estranhamento (a não-conciliação como modo de negociar com o receptor). Tratava-se de uma cidade que fazia um corte abrupto com as tradições, como se sua forma só pudesse constituir-se depois que se houvesse submergido nas águas do esquecimento modernista. A eliminação da rua como célula de organização urbana, no “Plano Piloto” de Lúcio Costa, era homóloga à eliminação do verso na poesia concreta. Cidade sem ruas, poesia sem versos: os elementos de reconhecimento e de orientação básicos são substituídos por uma espacialidade que exige novos preceitos. (AGUILAR, 2005, p.83) A opinião dos concretistas sobre o projeto da nova capital brasileira era a mais positiva possível. Haroldo de Campos, em seu ensaio “Contexto de uma vanguarda” de 1960, afirmou o seguinte:
Em nosso país, que acaba de dar ao mundo o exemplo altamente significativo da construção, em pleno oeste, de uma nova capital que é, ao mesmo tempo, um marco da arquitetura e do urbanismo de vanguarda, mais talvez do que em nenhum outro se apresentam as condições para a produção e o consumo de uma arte verdadeiramente contemporânea, porque, enquanto informação estética, comensurada ao homem de hoje. (CAMPOS, 1987, p.152) Em algumas entrevistas ele chegou a reconhecer explicitamente as vinculações do seu grupo com a criação de Brasília:
O movimento de poesia concreta... nasceu em um contexto preciso... o programa aberto pelo período de liberdades democráticas que caracterizou o governo de Juscelino Kubitschek, um liberal progressista que tinha seu artista predileto no arquiteto comunista Oscar Niemeyer, criador de Brasília, verdadeira “metáfora epistemológica” daquele período. (CAMPOS apud AGUILAR, 2005, p.83) Porém, toda a empolgação do governo brasileiro em relação à modernização do país pressupõe uma tentativa de superação do estado de atraso e subdesenvolvimento pelo qual o país passava. Apesar de todo o espírito de otimismo gerado no governo de JK, não se pode deixar de mencionar as consequências de sua política desenvolvimentista. Para realizar tantos investimentos, o governo realizou pesadas emissões de papel moeda e abriu nossa economia
X Seminário de Pesquisa do Departamento de História - UFC Fortaleza, 01 a 03 de outubro de 2012. A primeira exposição contou com trabalhos de Antônio Girão Barroso (o poema “ó duquesa”, dito “quase concreto”), José Alcides Pinto (6 poemas e 2 desenhos), Pedro Henrique Saraiva Leão (2 poemas, sendo um deles “lucialindaluciabela”), Estrigas (Nilo Firmeza: 2 guaches), Goebel Weyne (2 desenhos), J. Figueiredo (6 desenhos), Zenon Barreto (1 desenho) e Liberal de Castro (3 desenhos). Desses, somente o pintor J. Figueiredo não era cearense. Ele nasceu em São Luís do Maranhão e somente em 1956 transferiu-se para Fortaleza. Já a segunda reuniu alguns participantes da primeira (Antônio Girão Barroso, José Alcides Pinto, Pedro Henrique Saraiva Leão, J. Figueiredo e Goebel Weyne) e mais, do Ceará, Horácio Dídimo e os irmãos Eusélio e Eudes Oliveira. Como contribuições de fora a essa segunda mostra incluíam-se poemas de Haroldo de Campos, Augusto de Campos, Décio Pignatari e Ronaldo de Azeredo, de São Paulo, Alberto Amêndola Heinzl, de Campinas, José Chagas e Deo Silva, do maranhão, e Ivo Barroso, do Rio de Janeiro. Como ficou exposto, as duas mostras contaram com a participação não apenas de poetas, mas também de pintores, desenhistas e artistas plásticos que se identificavam com as idéias e com a forma concretista. Dos cearenses, foi o ficcionista e poeta José Alcides Pinto quem primeiro entrou em contato com as ideias concretistas e foi quem as trouxe para o estado já em 1957, menos de um ano depois da primeira Mostra Nacional de Arte Concreta, ocorrida em São Paulo. Antônio Girão Barroso, Horácio Dídimo, Eusélio Oliveira, Eudes Oliveira e Pedro Henrique Saraiva Leão foram os poetas que, juntamente com José Alcides Pinto, formaram o grupo de poetas concretos do Ceará. Neste ensaio, serão abordados, sucintamente, os trabalhos dos principais poetas do Concretismo cearense: José Alcides Pinto, Antônio Girão Barroso, Pedro Henrique Saraiva Leão e Horácio Dídimo. Ver-se-á que, embora tenham aderido às experimentações concretistas, suas composições diferem das composições dos concretistas de São Paulo, apresentando algumas particularidades que serão discutidas. Alcides Pinto (1923 -2008) nasceu em São Francisco do Estreito, distrito de Santana do Acaraú, no Ceará. Diplomou-se em Jornalismo pela Faculdade Nacional de Filosofia da antiga Universidade do Brasil e em Biblioteconomia pela Biblioteca Nacional. Viveu durante alguns anos, a partir de 1945, no Recife e no Rio de Janeiro, tendo regressado a Fortaleza em
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do movimento de vanguarda, já em 1956 estava lançado o seu livro de poemas visuais Concreto : Estrutura Visual - Gráfica_._ Em uma de suas entrevistas, o poeta relembrou momentos importantes da atuação do movimento concretista no Ceará e afirmou: “Eu vim para o Ceará para fundar a poesia concreta. Aqui, fizemos duas Mostras de Arte Concreta. Delas participaram poetas cearenses e artistas de outros estados.” ( Diário do Nordeste , 03 de dezembro de 2006) Ou seja, é perceptível o empenho que o poeta tinha em trazer para o estado as ideias do movimento concretista. O poeta se correspondia frequentemente com os irmãos Haroldo e Augusto de Campos. Inúmeras cartas foram perdidas, mas, das que restaram, é interessante mostrar como os paulistas apoiavam a atuação dos cearenses e inclusive os elogiavam:
A atividade de vocês aí em Fortaleza continua a nos surpreender. Com o material enviado por você e pelo Girão [Antonio Girão Barroso], preparamos uma reportagem sobre o front concreto no Ceará, que sairá num dos próximos números da revista ad. (PINTO, 2006, p.313) Sua obra se caracteriza pela diversidade, pois o autor transitou por diversos gêneros: foi poeta, ficcionista, teatrólogo, crítico literário, ensaísta, contista, memorialista. É conhecido por muitos como o poeta “maldito”, pois cultiva temas relacionados com a morte, o diabo e a miséria humana. Concreto: Estrutura Visual-Gráfica (1956) foi a principal obra de viés concretista do poeta, tendo sido publicada no mesmo ano do lançamento da poesia concreta no (MAM) Museu de Arte Moderna de São Paulo. Dimas Macedo caracteriza a obra como sendo o segundo salto qualitativo no processo criativo de José Alcides Pinto, uma vez que se constitui como “um inventário de motivação essencialmente concretista através do qual o poeta modifica seu comportamento diante dos próprios Cantos de Lúcifer e de toda sua poemática, com evolução de fundo e de forma.” (MACEDO, 2006, p.426). Um dos poemas que compõe esta obra é o seguinte:
um peixe nada pára para onde para que pára para nada Neste poema, que não possui título como os demais que compõem o livro, percebe-se logo certo apelo visual, uma vez que a disposição das palavras no papel sugerem uma
X Seminário de Pesquisa do Departamento de História - UFC Fortaleza, 01 a 03 de outubro de 2012. Assim, foi possível perceber que o poeta foi um típico poeta modernista, pois, desde as suas primeiras composições, nota-se a liberdade formal em sua poesia. Contudo, também exerceu um papel importante no movimento de poesia concreta cearense. Quanto a Pedro Henrique Saraiva Leão, que era o mais jovem componente do grupo de poetas concretos do Ceará, apesar de suas publicações terem sido mais tardias, sua participação foi importante para o movimento. Como afirma José Alcides Pinto no prefácio de Concretemas (1983):
O concretismo no Ceará foi por natureza um movimento de equipe, sem chefes nem papismos. Mas teve seu consultor, como acontece em todo grupo literário ou artístico. E esse papel era desempenhado pelo mais jovem do grupo – Pedro Henrique saraiva Leão. E foi na condição de acadêmico de medicina e professor de Inglês do IBEU que cerrou fileiras ao nosso lado. Um dos poemas que apresentou nas exposições de arte concreta cearense foi o seguinte:
F F F V F A F A P F A B F A B P F A B R F A B R I F A B R I O F A B R I C F A B R I C V F A B R I C A F Á B R I C A Neste poema, a forma é predominante, pois o poema, gráfica e semanticamente se autofabrica. O poeta, como um operário da linguagem, vai construindo a estética e a semântica do seu poema, de forma que o resultado remeta a um objeto concreto da realidade. No caso deste poema, o autor vai inserindo as letras de cima para baixo sempre acrescentando uma letra no final do sintagma, o que vai passando uma ideia de construção. As duas últimas palavras se diferenciam apenas pelo acento agudo que está na última (FABRICA–FÁBRICA) e que faz toda a diferença, pois é na última palavra que está o núcleo do poema: o advento da industrialização e o aumento do número de fábricas em diversas partes do país. Suas obras poéticas são as seguintes: 12 poemas em inglês (1960), Ilha da canção (1983), Concretemas (1983), Poeróticos (1984), Meus eus (1995) e Trívia : 1 livro fora do
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com/um (1996). Concretemas é a obra mais significativa do poeta para o estudo da poesia concreta no estado. É importante lembrar que esta também é uma obra tardia dessa vanguarda no estado, pois, mesmo contendo alguns dos poemas que foram apresentados pelo poeta nas duas Mostras que ocorreram no Ceará, foi publicada somente em 1983 e reflete sobre o Concretismo como uma vanguarda ainda vigente. Observando os poemas que compõem a obra, pode-se dizer que Concretemas é um livro de poemas concretos, sem que se possa dizer que Pedro Henrique seja um poeta unicamente concretista. Dimas Macedo sintetiza bem o sentido deste livro:
Em Concretemas o efeito espacial do poema, disposto em linhas e palavras que se harmonizam, conduz o leitor ao caminho do experimento e da compreensão da forma-montagem, que antecede a estrutura gráfico-virtual e que com ela se complementa, formando uma unidade orgânica, indissolúvel e sublevando o efeito discursivo da poesia de feição modernista ou tradicional. (MACEDO, 1997, p. 47)
Viu-se que houve nas produções do poeta uma heterogeneidade das formas em seus diversos livros, entre as quais a forma concreta. Neste último livro, ressalta-se uma tendência mais recente a um vanguardismo pouco aceito pela crítica local, contrariamente ao que acontece com Horácio Dídimo, que tendeu a promover uma reconciliação entre vanguarda e tradição em suas obras mais recentes. Mesmo Horácio Dídimo ele tendo participado apenas da segunda Mostra de Arte Concreta do Ceará, pode ser considerado um dos poetas mais significativos do movimento, principalmente no que concerne em averiguar a poesia concreta posteriormente ao apogeu do movimento nacional. Ele começou suas atividades poéticas pelo final dos anos 50 vinculando-se ao experimentalismo da poesia concreta, inclusive participando da segunda Mostra de Arte Concreta ocorrida no Ceará em 1959. Passou quase uma década para publicar seu primeiro livro, Tempo de Chuva (1967), livro este que apresenta pouco de Concretismo, apesar do forte caráter sintético de alguns poemas. Esta sua primeira obra privilegia um conteúdo voltado para a reflexão do que estava se passando na sociedade brasileira naqueles anos difíceis da ditadura militar. E na forma, pode-se dizer que seus poemas aproximam-se mais das técnicas modernistas de utilização de versos livres. Nos anos 80, com a obra A palavra e a PALAVRA , sua poesia ganha um caráter de misticismo ao serem acrescentadas passagens
X Seminário de Pesquisa do Departamento de História - UFC Fortaleza, 01 a 03 de outubro de 2012. Há quanto tempo nada acontecia, há quanto tempo o sol não rebrilhava, há quanto tempo a chuva não chovia! Há quanto tempo o tempo não mudava, há quanto tempo o coração batia, há quanto tempo, sim, há quanto tempo! O poema concreto é visualmente interessante. Intitulado “Encontro”, as letras dessa palavra são desmembradas de forma que ela se mantém inteira no centro e, acima e abaixo dela, ficam as suas letras fragmentadas. O “encontro” então, se dá somente a partir da junção das letras de cima com as de baixo. O soneto segue a forma petrarquiana, uma vez que é composto por dois quartetos e dois tercetos. É repleto de rimas e de repetições. Observe-se que todos os versos são iniciados com o sintagma “Há quanto tempo...”, gerando um paralelismo, tornando o soneto bastante simples e até cansativo. Note-se ainda que, mesmo sendo sintético, o poema concreto expressa conteúdo semelhante ao que é expresso pelo soneto, porém de forma bem mais interessante. Para refletirmos melhor sobre essas composições concretistas posteriores ao anos do apogeu dessa vanguarda, é importante atentarmos para dois importantes conceitos que representam bem o contexto da poesia brasileira dos anos 80: o conceito de “poesia pós- utópica”, de Haroldo de Campos, e a questão da “retradicionalização frívola”, discutida por Iumna Maria Simon em seu ensaio “Condenados à tradição”. O primeiro conceito foi formulado por Haroldo de Campos em seu ensaio “Poesia e modernidade: da morte da arte à constelação. O poema pós-utópico”, de 1984. Diante do enfraquecimento das tendências vanguardistas depois dos anos 60, este conceito ajudou a marcar oficialmente o fim da poesia concreta e o fim das utopias. Haroldo de Campos, em seu ensaio, fala da “poesia da presentidade” para caracterizar os novos desenvolvimentos teóricos da poesia dos anos 80.
Sem perspectiva utópica, o movimento de vanguarda perde seu sentido. Nessa acepção, a poesia viável do presente é uma poesia de pós-vanguarda, não porque seja pós-moderna ou antimoderna, mas porque é pós-utópica. Ao projeto totalizador da vanguarda, que, no limite, só a utopia redentora pode sustentar, sucede a pluralização das poéticas possíveis. Ao princípio-esperança , voltado para o futuro, sucede o princípio-realidade , fundamento ancorado no presente. (CAMPOS, 1997, p.268) Essa poesia da “presentidade”, ou poesia da “agoridade”, foi uma maneira do crítico justificar a “pluralização das poéticas possíveis”, ou seja, a mistura de formas e tendências poéticas, pois, naquele momento, era o que de fato estava acontecendo, as produções
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poéticas deixaram de seguir uma única forma utópica e vanguardista, como a forma concreta, para usufruir de um mosaico de formas disponíveis, inclusive das formas mais tradicionais. Já a questão da “retradicionalização frívola”, surgida após o fim das pretensões vanguardistas, caracteriza ironicamente a retomada de formas tradicionais da poesia de maneira pluralista, visando principalmente à institucionalização e ao esteticismo desse “novo” modo de fazer poético. Assim, os poetas que passaram a incorporar formas tradicionais aleatórias, inclusive vindas do modernismo e das vanguardas dos anos 50, começaram também uma disputa de mercado editorial e publicitário, permitindo que se possa defini-la como “uma poesia profissionalmente poética, integrada ao mercado e com baixo interesse artístico”. Embora inseridas também nesse contexto, as obras mais tardias dos concretistas cearenses não caracterizam tão bem esses conceitos, pois em A PALAVRA e a palavra , por exemplo, não se pode dizer ainda que Horácio Dídimo pratica o chamado “pluralismo de formas”, pois a tradição religiosa entra no livro em seus próprios termos, não estetizada. Em A Nave de Prata (1991), também não se pode afirmar que ocorre uma “pluralização das poéticas possíveis”, pois o poeta coloca num mesmo espaço a poesia concreta e o soneto, sem que haja alterações em suas formas. Conclui-se que, desde o início, a poesia concreta no Ceará tendeu a um menor compromisso com as formas do movimento, pois enquanto os concretistas de São Paulo dedicavam-se prioritariamente à composição de poemas concretos, os do Ceará não assumiram tal obrigatoriedade e compunham seus poemas mais livremente. Contudo, apesar de não se dedicarem tanto ao projeto da poesia concreta quanto se dedicaram os poetas de São Paulo, percebe-se que a manifestação dessa vanguarda no estado, além de legar aos poetas cearenses algumas técnicas de composição, causou alguma estranheza no meio ainda fortemente tradicionalista, cumprindo assim, ao menos em parte, o desígnio de todas as vanguardas.
AGUILAR, Gonzalo. Poesia Concreta Brasileira : as vanguardas na encruzilhada modernista. São Paulo: Edusp, 2005. BARROSO, Antônio Girão. Modernismo e Concretismo no Ceará. Fortaleza: Instituto Lusíadas, 1978.