Baixe Compressão Medular por Ossificação do Ligamento Amarelo na Coluna Torácica: Relato de Caso e outras Notas de estudo em PDF para Patologia, somente na Docsity!
Arq Neuropsiquiatr 1998;56(2):312-
COMPRESS√O MEDULAR TOR¡CICA EM DOIS NÕVEIS POR
CALCIFICA«√O DE LIGAMENTO AMARELO
RELATO DE CASO
JACKSON GONDIM, FRANCISCO RAMOS JR
RESUMO - Calcificação e/ou ossificação do ligamento amarelo é patologia bem conhecida na literatura japonesa.
Causa estenose do canal vertebral torácico e compressão medular. Os autores apresentam o caso de um paciente
de origem não japonesa com mielopatia torácica causada por compressão devida a calcificação do ligamento
amarelo.
PALAVRAS-CHAVES: medula torácica, mielopatia, ligamento amarelo, compressão medular.
Thoracic spinal cord compression at two levels due to ligamentum flavum calcification: case report
ABSTRACT - Calcification and/or ossification of the ligamenta flava is a well reported clinicopathologic entity
causing narrowing of the spinal canal and spinal cord compression. It has been described almost exclusively in
Japanese people. The authors present the case of a non Japanese patient with thoracic myelopathy caused by
ossification of the ligamentum flavum.
KEY WORDS: thoracic spine, myelophaty, ligamentum flavum, spinal cord compression
Ossificação ou calcificação do ligamento amarelo (OCLA), associado ou não a ossificação
do ligamento longitudinal comum posterior, são frequentes na literatura japonesa nos últimos trinta
anos. Foram inicialmente descritos em 1920 por Polgar^1 , baseado em radiografias laterais de coluna
cervical. O primeiro caso clínico de ossificação do ligamento amarelo foi publicado em 1960 por
Yamaguchi e col.^2. Outras descrições feitas em 1931 por Shore 3 e 1942 por Oppenheimer^4 eram
essencialmente rádio-anatômicas. Esta patologia é quase exclusivamente encontrada em publicações
japonesas 5-12. Alguns artigos não japoneses já foram publicados13-17^. Recentemente, o encontro desta
patologia em um paciente, aliado à ausência de publicações nacionais sobre o tema, apesar de uma
importante imigração japonesa no pais, nos levou a registrar este caso.
RELATO DO CASO
Paciente do sexo masculino, branco, de 50 anos, sem ascendência japonesa, com quadro de paraparesia
espástica de evolução progressiva há 6 meses, acompanhado de dores cérvico-torácicas de predominância noturna,
intermitentes e bem localizadas em T2-T3. O exame neurológico mostrava síndrome piramidal bilateral, marcha
difícil sem ajuda, com diminuição das sensações proprioceptivas nos membros inferiores, e com nível sensitivo
em T4. Não apresentava radiculalgias ou alterações esfincterianas. Os exames complementares laboratoriais
foram normais, excluindo causas metabólicas. O estudo radiológico da coluna cérvico-torácica foi inconclusivo,
assim como a mielografia torácica, que não mostrou compressão medular. A ressonância nuclear magnética
(RNM) mostrou dupla compressão posterior em T2 e T3, com sofrimento medular (Figs 1 e 2). O paciente foi
*Serviço de Neurocirurgia do Hospital Geral de Fortaleza. Aceite: 5-janeiro-1998.
Dr. Jackson Gondim - Rua Dr. Pedro Sampaio 50 - 60181-560 Fortaleza CE - Brasil. E-mail: jagondim@secrel.com.br
submetido a laminectomia T2-T3, evidenciando-se uma verdadeira estenose do canal raquidiano dorsal,
essencialmente causada pela calcificação do ligamento amarelo, que estava intimamente aderido às superfícies
articulares e à dura-máter, resultando em lesão desta, que foi fechada com enxerto de aponeurose muscular. No
pós operatório imediato, houve piora do quadro motor com recuperação progressiva posterior. Na segunda semana
pós operatória uma fistula liquórica na cicatriz cirúrgica foi fechada por nova cirurgia. Atualmente, 8 meses após
a ultima cirurgia, o paciente apresenta excelente recuperação do seu quadro sensitivo motor, voltando a deambular
sem ajuda.
DISCUSS√O
Na coluna vertebral torácica, o ligamento amarelo insere-se sobre uma crista óssea situada na
borda inferior da lâmina, logo em baixo de sua superfície lisa endocanalar, estendendo-se até a
reborda superior da lâmina do corpo vertebral subjacente. Lateralmente, cada ligamento amarelo
estende-se à cápsula da articulação entre as facetas e desta forma contribui para o limite posterior do
forame intervertebral. Os dois ligamentos são separados por um intervalo estreito, mediano, através
Fig 1. OCLA na RNM. Imagem sagital mostrando indentação posterior na
medula espinhal em T2 e T3.
condrocalcinose 26 , pelviespondilite reumática 19 , hipoparatireoidismo, hiperostose esquelética
idiopática difusa^27. Estes pacientes apresentam grande prevalência de obesidade, diabetes melito,
hiperinsulinismo, alteração na tolerância da glicose e anormalidades no metabolismo do cálcio 28. A
associação com hiperostose vertebral anquilosante foi evocada, mas parece ser razoável pensar em
duas doenças distintas. Na realidade, a etiologia desta calcificação/ossificação ainda permanece
obscura. Os exames laboratoriais, na maioria das vezes, não mostram alterações metabólicas. O
papel de um traumatismo inicial não foi demostrado, mas pode agravar as alterações neurológicas 29.
Radiografias laterais da coluna vertebral torácica podem ser de ajuda no diagnóstico,
especialmente na região inferior, onde calcificação/ossificação são encontradas fortuitamente em
radiografias de tórax ou de coluna dorsal, sendo assintomáticos. Na transição cérvico-torácica e
torácica alta geralmente é prejudicada pela superposição dos ombros e escápulas. A mielografia
frequentemente tem valor relativo pois, sendo realizada na posição prona, pode não evidenciar defeitos
de enchimento no espaço subaracnóide póstero-lateral 11 , como ocorreu com nosso paciente.
Ressonância nuclear magnética é muito útil em determinar o grau de compressão da medula e
características da ossificação. Ela mostra o ligamento hipointenso em T1 e T2. A indentação é
melhor vista em imagens em T2. A tomografia computadorizada (TC) é um bom exame, mostrando
massa extra dural calcificada/ossificada em baixo da lâmina, indo até o forame intervertebral, com
perda da gordura extradural. Atualmente, a combinação de RNM e TC oferece dados são mais úteis
e precisos no diagnóstico de calcificação do ligamento amarelo 9,^.
O único tratamento para a OCLA é a descompressão cirúrgica posterior através de laminectomia
ou laminoplastia com preservação articular, levando a melhor estabilização da coluna vertebral. O
prognóstico na maioria das vezes é bom. No entanto, um programa de reabilitação fisioterápico
deve ser começado de maneira gradativa, desde que possível no pós operatório imediato.
Em conclusão, a OCLA do ligamento amarelo é patologia rara em não japoneses, podendo
levar a compressão medular por estenose do canal raquidiano. O diagnóstico é dado preferencialmente
pela combinação de RNM e TC. O prognóstico é variável, algumas vezes severo devido à importância
e extensão da estenose. Um melhor conhecimento da doença poderia aumentar o número de casos
diagnosticados em pacientes não japoneses.
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