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Partidos Políticos e Sistemas Eleitorais: A Origem e Evolução, Resumos de Teoria Política

Este documento aborda a concepção de partidos políticos e sistemas eleitorais, explicando suas definições, origens históricas e evolução. O texto enfatiza a importância da organização interna de partidos e a relação entre eles e os sistemas eleitorais, com referências a inglaterra, estados unidos e outros países.

Tipologia: Resumos

2020

Compartilhado em 11/04/2022

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Partidos políticos e sistemas eleitorais
ALBERTO DE LIMA VIEIRA
I — GENERALIDADES
O partido político é instituto recente no Direito Constitu-
cional, e fenômeno que só ultimamente tem solicitado a atenção
dos constitucionalistas, como tema especial e relevante.
Definindo-o, a doutrina já aplainou as divergências iniciais
na sua caracterizão, e podemos dizer, com Friedrich, que um
partido potico é um grupo de sêres humanos que tem uma orga-
nização estável com o objetivo de conseguir ou manter para seus
líderes o controle de um govêrno e com o objetivo ulterior de
dar aos membros do partido, por intermédio de tal controle,
benefícios e vantagens ideais e materiais.1
A definição proposta por Friedricií, tem a grande van-
tagem de englobar quase todos os tipos de partido potico,
dando ênfase tanto ao elementoopinião” quanto ao elemento
organização” .
Ao pesquisar-se, na história constitucional dos novos oci-
dentais, o aparecimento dos partidos na vida política, já não
se encontrará acôrdo entre os principais autores que versaram
a matéria.
Deve-se isso à maior ou menor importância atribuída pelos
mesmos ao elemento organização .
1. Friedrich, Carl J. Teoria y Realiã ad de la Organización Consti-
tucional Demo crática, F.C.E., México, 1946, pg. 297.
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Partidos políticos e sistemas eleitorais

A L B E R T O D E L IM A V IE IR A

I — GENERALIDADES

O partido político é instituto recente no Direito Constitu-

cional, e fenômeno que só ultimamente tem solicitado a atenção

dos constitucionalistas, como tema especial e relevante.

Definindo-o, a doutrina já aplainou as divergências iniciais

na sua caracterização, e podemos dizer, com F r i e d r i c h , que um

partido político é um grupo de sêres humanos que tem uma orga-

nização estável com o objetivo de conseguir ou manter para seus

líderes o controle de um govêrno e com o objetivo ulterior de

dar aos membros do partido, por intermédio de tal controle,

benefícios e vantagens ideais e materiais.

A definição proposta por F r ie d r ic ií , tem a grande van-

tagem de englobar quase todos os tipos de partido político,

dando ênfase tanto ao elemento “opinião” quanto ao elemento

“organização”.

Ao pesquisar-se, na história constitucional dos novos oci-

dentais, o aparecimento dos partidos na vida política, já não

se encontrará acôrdo entre os principais autores que versaram

a matéria.

Deve-se isso à maior ou menor importância atribuída pelos

mesmos ao elemento “ organização”.

1. F rie d rich , C arl J. — Teoria y Realiãad de la Organización Consti- tucional Democrática, F. C. E. , México, 1946, p g. 297.

9 0 R^ e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ d i r e i t o

Claro está que se se atribuir grande importância à organi- zação interna dos partidos políticos, situar-se-á mais tarde o seu aparecimento. Inversamente, não se exigindo grande orga- nização em sua caracterização, pode-se lobrigar seu início em tempos mais afastados. De qualquer forma, é na Inglaterra, indubitavelmente, que aparecem pela primeira vez os partidos políticos e, a despeito das controvérsias, podemos situar por volta de 1680 o marco inicial dos partidos. Com efeito, foi a partir do “Exclusion Bill” , como esclarece M u n r o , que se firmou a doutrina da aceitação da oposição política, isto é, a doutrina básica da democracia, de que os inimigos do govêrno não são inimigos do Estado, e que um oposicionista não é por isso um rebelde. Pode argumentar-se que, à época, “ whigs” e “ tories” não estavam suficientemente .organizados, sendo freqüentes as de- fecções e traições, a formação de facções internas sendo quase sempre a regra. A êsses argumentos responde-se, com vantagem, que as defecções e traições são defeitos humanos, inevitáveis ainda na mais perfeita organização, e que as facções internas são antes um sinal de vitalidade partidária, sendo fenômeno encontradiço em qualquer período do desenvolvimento dos partidos. Os “whigs” representavam o capitalismo urbano, sendo

monarquistas liberais, ao passo que os “ tories” representavam

o feudalismo agrário, defendo veementemente as prerrogativas régias, nota A f o n s o A r in o s d e M e l o F r a n c o , que subestima,

entretanto, a influência religiosa na formação daquêles partidos,

fato que mais avulta quando é sabido, como observa La vau, que a burguesia urbana sempre esteve ligada à nobreza agrária, que não se recusou a absorver os elementos daquela.

Apesar da fraca organização, que assemelha os partidos

daquêle período inicial às facções anteriores, vamos buscar, com

M u n r o , a nota preponderante do aparecimento dos partidos no

princípio democrático de respeito às oposições.

  1. M e l o F r a n c o , A .A. — História e Teoria do Partido Político n Direito Constitucional Brasileiro , Rio, 1948, pg\ 9.

9 2 R^ e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ D^ i r e it o

Ê o círculo vicioso a que se refere D u v e r g e r , o qual não

consegue rompê-lo, como pretendia.

A despeito desta carência de princípios gerais que facilitem

a análise, procuraremos fazer um estudo sintético e generalizado,

já que a observação pormenorizada dos diversos sistemas par-

tidários nacionais extravazaria o âmbito do nosso trabalho.

Se a própria noção de partido é ambígua, como nota L a v a u (certos partidos de minoria negam a função partidária de busca

do poder; a orientação política cabe também aos sindicatos,

grupos de pressão, etc.), mais ambíguas são as noções de “ bi-

partismo” , “ pluripartismo” , etc., tomadas como oposições me-

ramente esquemáticas, recobrindo situações que apresentam

apenas uma semelhança formal.

Advertidos das dificuldades que encerra o tema, passemos

ao estudo dos vários sistemas partidários.

Para D u v e r g e r , o bipartismo apresenta um caráter natural,

dado que as opções políticas se apresentam, de ordinário, sob

a forma dualista. Há sempre um dualismo de tendências, embora

possa não haver um dualismo de partidos, mas aquêle resultaria

neste.

Pode haver um partido do centro, nunca uma tendência do

centro ou uma doutrina do centro, “le centre n’existe pas en

politique” , afirma D u v e r g e r.

O centro seria apenas o lugar geométrico onde se juntam

os moderados de tendências opostas. Todo centro, estando divi-

dido em centro-esquerda e centro-direita, deve esfacelar-se.

O centro é o sonho de realizar a síntese de aspirações diver-

gentes, somente possível no plano das idéias, impossível no plano

da ação, a qual implica sempre uma escolha. Para o bipartismo contribuem ainda o dualismo natural dos temperamentos humanos, divisíveis, “ grosso modo” , em radicais

e conservadores, e a oposição marxista entre burguesia e pro-

letariado. Armagnacs e Bourgignons, Guelfos e Gibelinos, Católicos e Protestantes, Girondinos e Jacobinos, Conservadores e Liberais, Burguêses e Socialistas, Ocidentais e Comunistas, são alguns aspectos da diferenciação dualista da opinião pública, quando colocada face aos grandes problemas básicos.

P a r t id o s P o l ít ic o s e S is t e m a s E l e it o r a i s (^93)

Ê o fenômeno de “polarização” , que inclina naturalmente o corpo político ao dualismo, ao bipartismo. As conclusões de D u v e r g e r devem ser recebidas com cautela, pois parecem brigar com outras a que chega ao estudar o fenô- meno de “superposição”. Com efeito, as oposições dualistas não se produzem unicamente a respeito de dado tema, não existe sempre coincidência entre as várias categorias de oposição, o que leva ao pluripartismo. Donde se conclui que o pluripartismo é tão natural quanto o bipartismo. Segundo D u v e r g e r , três tipos de bipartismo sucederam-se a partir do século X IX : no início o bipartismo burguês caracte- rizado pela oposição entre liberais e conservadores; depois, na segunda metade do século XIX, o desenvolvimento do radica- lismo tendeu a dividir internamente os liberais, com a formação de um dualismo de radicais e conservadores, o que só se con- cretizou nos Países-Baixos e na Dinamarca. Para M a c l v e r a polarização natural é esta.3 Finalmente, surgiu o bipartismo burguês-socialista, como se deu na Inglaterra com a supressão do Partido Liberal.

Ao “bipartismo técnico”, caracterizado pelo respeito mútuo

dos partidos, opõe Duverger o “bipartismo metafísico”, anti-de-

mocrático, pois tende à supressão de um dos partidos, caracte-

rizado pela intolerância própria das doutrinas totalitárias.

Aproximadamente, pode dizer-se que o bipartismo é um fe- nômeno anglo-saxão.

Nos Estados Unidos, a despeito dos pequenos partidos que vicejam no plano estadual, o bipartismo é também incontestável; manifestou-se já na convenção de 1787, repetiu-se em 1796 na luta eleitoral entre A d a ms e J e f f e r s o n , com o Partido Federa- lista defendendo a centralização e o Partido Republicano a des- centralização, continuou com a oposição do Partido Republicano ao Partido Democrata. Os Estados Unidos não sofreram a crise

geral do aparecimento dos partidos socialistas, que abalou os

sistemas europeus.

3. M aciver — O Estado, Martins Editôra, S. P. , 1945, pg. 275.

P a r t id o s p o l í t i c o s e S i s t e m a s e l e i t o r a i s (^95)

Não assiste razão ao ilustrado tratadista das organizações constitucionais, já que as facções indicadas não assumem todos os caracteres próprios dos verdadeiros partidos políticos, pelo

mesmo autor assinalados. Influem no sentido do bipartismo bri-

tânico o regime parlamentar, já referido, o direito de dissolução, o “ self-government” que atenua os seus defeitos e a simplificação crescente das estruturas sociais, minudentemente estudada por

L a v a u.

O aparecimento do “ Labour Party” não engendrou ali um tripartismo, por ter o Partido Liberal esgotado o essencial de seu programa, encontrando-se em uma posição quase conserva- dora, o que facilitou seu ocaso. O bipartismo verifica-se, fora dos países anglo-saxões,

principalmente no Uruguai ( “blancos” e “ colorados” ) e na Tur-

quia ( “Partido da Nação” e “Partido Democrata” ), com caráter

bastante estável, em que pese a brevidade da experiência turca

e o original sistema do país platino.

Na França, a tendência para o bipartismo foi obstada pelas

práticas divisionistas de Luiz XV III e Luiz Felipe.

O Canadá, apesar de seus quatro partidos, apresenta para D u v e g e r um bipartismo básico, dado o caráter local dos dois

partidos menores e o fato de que nas eleições locais defron-

tarem-se sempre apenas dois partidos. Preferimos, entretanto,

denominar o regime de partido dominante o regime canadense,

seguindo L a v a u , pois existe ali o domínio durável e regular de

um só partido,6 a estrutura federal assegura a salvaguarda das

minorias e dos particularismos.

Na Bélgica nota-se presentemente uma tendência para a

volta ao bipartismo tradicional, após o tripartismo devido à lei

eleitoral de 1894.

A tendência ao bipartismo acentúa-se fortemente na Itália,

não sem real perigo para a democracia, em virtude do totalita-

rismo do partido comunista, que tenta sempre eliminar seu

opositor.

6. L a v a u — Partis Politiques et Réalités Sociales, Armand C olin , p aris, 1953, p g. 54.

9 6 R^ e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ d i r e i t o

A história constitucional pátria, tão bem descrita por

A f o n s o A r in o s d e M e l o F r a n c o , apresenta a nosso ver uma

forte tendência ao bipartismo, durante o Império, com o dua-

lismo Partido Conservador-Partido Liberal, depois Partido Con- servador-Partido Progressista.

O bipartismo, assevera P ie t r o V ir g a , apresenta as van-

tagens de produzir a estabilidade do govêrno, a coesão da opo-

sição e a alternância dos partidos no govêrno.

O defeito principal do sistema seria a falta de representação de tôdas as correntes de opinião, a restrição imposta à escolha

do povo.

Mas esta questão, adverte Y v e s S i m o n , resolve-se em outra

mais geral, qual seja a de se saber se a democracia pode tolerar

a ação de princípios não-democráticos e, de alguma forma, bene-

ficiar-se dêles.

A restrição ao princípio democrático pode ser-lhe favorável,

se reprime as fôrças que tendem a prejudicá-lo, conclui S i mo n ,

esposando a doutrina tomista sôbre a excelência das formas

mistas de govêrno.

III — O PLURIPA RTISM O

“ A verdade é una, o êrro é múltiplo. Não é casual que a direita professe o pluralismo” , afirma S i mo n e d e B e a u v o ir ,

profunda analista de nossos dias.

No entanto, o pluripartismo (aqui compreendido também o hipartismo) é admitido pelo pensamento político, em virtude, não da multiplicidade inerente ao êrro, mas da experiência que

nos ensina que no terreno da política a verdade é precária, donde

admitirmos que podemos não estar com a razão, o que conduz ao pluripartismo e ao respeito mútuo entre os partidos.

7. SIMON, Y v e s — Filosofia do Govêrno Dem ocrático, A g ir, Rio, 1955, p g. 108. 8. B e a u v o ir , Simone de — L a Pensée Politique de Droit, A u j o u r d ’h u i, trad. esp., Leviatan, Buenos Aires, s .d ., p g. 7.

9 8 r e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ D^ ir e i t o

Nota-se que tal fenômeno não pode dar-se com os partidos

comunistas, precisamente em virtude do caráter totalitário dos

mesmos, da aspiração ao dominio absoluto que revestem e tam-

bém do dinamismo que lhes é peculiar. Pode-se, com restrições,

falar em tripartismo e quadripartismo, mas depois dêste tôda

classificação é impossível.

O estudo sumário de alguns tipos de pluripartismo será

feito ao tratarmos da influência dos sistemas eleitorais sôbre

os partidos.

L a v a u , considerando que as relações de trabalho são a

fonte das estruturas econômicas e sociais, advoga uma cor-

respondência entre estas e os partidos políticos, atribuindo a

fraqueza e instabilidade do pluralismo francês ao caráter

abstrato dos partidos, à falta daquela correspondência socioló-

gica profunda. Mas se atentarmos para a advertência de M e n -

d ie t a y N u n e z de que a luta entre partidos correspondentes a

grupos econômicos antagônicos é pela eliminação mútua, perce-

beremos que tal correspondência pode apresentar graves pe-

rigos para a democracia.

Excluídos aquêles grupos de base predominantemente eco-

nômica, pode concluir-se, com F r ie d r ic h , que o pluripartismo é

desejável, quando as diferenças sociais e raciais são marcantes

e conhecidas.1 2

É o caso da Suiça, que realiza uma admirável síntese demo-

crática, guardando zelosamente seus particularismos próprios.

O panorama brasileiro atual revela as inconveniências do

pluripartismo, como a instabilidade das maiorias, dependendo o

govêrno das coalisões parlamentares sempre precárias e obtidas

a custo de concessões políticas e favores materiais.

Não pensamos, como V ir g a , que o pluripartismo evite o

monopólio dos partidos de massa; ainda aqui tudo dependerá

das circunstâncias políticas, sempre cambiantes e imprevisíveis.

12. F r i e d r i c h , C arl J. — O bra citada, p g. 285.

p a r t i d o s P o l í t ic o s e S i s t e m a s E l e i t o r a i s (^) 9 9

IV — O PARTIDO ÚNICO

O partido único é a adaptação à ditadura de uma técnica

geral nascida em um quadro democrático, e representa uma ino-

vação política do século XX, assinala Duverger, acrescentando

que entre o partido único e o partido do sistema democrático

não há diferença essencial de estrutura .1 3

Não é exata a assimilação do partido único ao partido tota- litário, existindo partidos totalitários no pluripartismo e par- tidos únicos sem caráter totalitário, continua D u v e r g e r , mas somos obrigados a discordar radicalmente de suas afirmações.

Com efeito, o caso turco, exautisvamente estudado pelo ilustre tratadista francês, parece antes uma exceção à regra, e mais ainda, devemos observar que, se aos nossos olhos não existiu caráter totalitário no partido que serviu à ocidentalização da Turquia, para os turcos daquela época, a ideologia demo- crática era efetivamente nova, revolucionária e totalitária quan- to à sua abrangência. De qualquer forma o partido de Kemal foi sempre fortemente autoritário, reconhece D u v e r g e r. Não po- demos aceitar a possibilidade da coexistência de democracia e partido único, como faz D u v e r g e r.

O caso dos partidos únicos de alguns estados norte-ame- ricanos não confirma as conclusões de D u v e r g e r , pois em quase todos existem pequenos partidos, como nota F r ie d r ic h , sendo antes o caso de “partido dominante” , para L a v a u. Acresce que não sendo soberana a ordem jurídica de um estado-membro, ainda que aí existisse um só partido, o regime político dependeria não apenas de seu sistema partidário, mas do caráter da ordem

jurídica da federação.

Contra o ponto de vista de D u v e r g e r podemos alinhar

B u r d e a u , F r ie d r ic h , M a c iv e r , I z a g a , V e d e l , P i n t o F e r r e ir a ,

T h e mis t o c l e s B r a n d ã o C a v a l c a n t i e muitos outros, que expri-

mem a corrente doutrinária preponderante. “ Em realidade, o

Estado de um partido único é uma contradição “ in terminis” ,

13. D u v e r g e r , M aurice — O b ra citada, p g. 286,

P a r t i d o s P o l í t ic o s e S i s t e m a s E l e i t o r a i s (^) 1 0 1

Estabelecida a correspondência entre partido único e dita-

dura, contra a opinião de P o s a d a , D u v e r g e r e outros, convém

lembar que não existe um regime de partido único, abstrato e

geral, mas vários regimes substancialmente diferentes, cada

partido único apresentando ideologia própria, o que não exclui

algumas notas gerais, tais como a função de formação de elites

dirigentes, de contato entre o povo e os dirigentes, no sentido

ascendente ou no descendente e o emprêgo de expurgos violentos.

Nascidos do fracasso das democracias européias, os partidos únicos fundam-se na unidade nacional ou social, ou na conside- ração de que o pluralismo seria contrário à persecussão do bem- comum, como já afirmava R o s s i mi n ; coincide com a religião do Estado e arvora-se em guardião de um ideal supremo. O Estado de partidos ( “Parteienstaat” ) tende para o Es- tado-partido ( “ Staatspartei” ) , assevera B u r d e a u , por um pro- cesso de endurecimento dos quadros partidários, que coloca a direção nas mãos de uma pequena elite de dirigentes partidários, a qual em seguida arroga para o partido o poder supremo, dado que a fonte do poder político vem a situar-se, em nossos dias, no partido. Êste fenômeno foi a princípio constatado por P a r e t o e M i c h e l s , depois por D u v e r g e r , K o l l r e u t t e r , V ir g a e outros. Segundo S á n c h e s A g e s t a , o partido único, se de recruta- mento restrito cacarcteriza-se como “partido de classe” , se de livre recrutamento como “partido de movimento”. Tal classifi- cação não corresponde, a nosso vêr, à realidade, já que o partido comunista russo sendo por definição um partido de classe, sem- pre esteve aberto, sempre adotou o livre recrutamento, embora dificulte o acesso aos seus quadros dirigentes. S á n c h e s A g e s t a classifica ainda os partidos únicos em “ de subordinação” e de “supraordenação” , segundo estejam submetidos ao controle do Estado ou controlem o Estado. O partido comunista russo, essencialmente de classe, des- tinado a realizar a ditadura do proletariado, definindo-se consti- tucionalmente como a vanguarda dêste, deveria desaparecer

findo o período de transição para a utópica sociedade sem classes.

O livre recrutamento e a eleição dos dirigentes dão ao par-

tido comunista um caráter de dinamismo que não se encontra

10 2 R^ e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ D^ ir e it o

nos partidos facistas. Aqui, o partido não se identifica com o Estado, mas exerce um controle estrito sôbre o governo, exi- gindo fidelidade absoluta dos seus membros e submissão perfeita às diretrizes partidárias. Já na Alemanha e Itália a militarização do partido precede a militarização do Estado, nota K e l s e n. 19 O partido Nacional-Socialista organiza-se em esquadrões, secções, companhias, batalhões e regimentos, tendo suas mi- lícias armadas, que depois chegariam a constituir problema para o Fuehrer. As confusas e nebulosas doutrinas nazistas, o mito da raça, do super-homem, mascaram uma dominação burguêsa, milita- rista e de elite, em um partido fechado, somente acessível à ju- ventude educada nos seus princípios doutrinários. O partido é estático e identifica-se mais estreitamente com o Estado, confundindo-se as vontades de ambos,2 0 mas com pre- ponderância do partido, o qual, de resto, perde seu caráter revo- lucionário ao alcançar o poder, e torna-se o fundamento de sua legitimidade. No fascismo italiano, a rigôr, não deveria haver partido político, pois Sorel, inspirador de Mussolini, advogava a trans- ferência da representação popular para os sindicatos operários revolucionários. Mas o facismo, estreitamente ligado à burguesia, não se aventurou a realizar tal transferência, acabou pois com todos os partidos, menos com o seu próprio. Também aqui o partido fecha-se finda a revolução, torna-se estático na sua peculiar estrutura militar de “ squadri di comba- timenti” , seções, centúrias, cohortes, legiões, pois como no Par-

tido Nacional Socialista alemão os postos de comando não são

eletivos, mas de designação dos supremos dirigentes partidários.

D u v e r g e r , embora não entrando em detalhes, coloca a

União Nacional de Salazar entre os pretensos partidos únicos

19. K e ls e n , H an s **— Obra citada, p g. 467.

  1. P i n t o F e r r e i r a —** Princípios Gerais do Direito Constitucional Moderno, José Konfino, Rio, 1955, p g. 444.

1 0 4 r e v i s t a^ d a^ F^ a c u l d a d e^ d e^ D^ i r e i t o

ração. Pelo que ficou dito, podemos concluir, com G a b r ie l M a r c e l , que “ o partido único é sempre a raiz ou o suporte das ditaduras modernas”. 2 2

V — PARTIDOS POLÍTICOS E SISTEMAS ELEITO RAIS

Não poderemos, é evidente, tratar pormenorizadamente o assunto, examinando todos os casos concretos que se apresentam,

sem estender demasiadamente o presente trabalho, que pretende

antes ser sintético, embora sem ignorar as dificuldades de tal

síntese. Por isso, ficaremos de preferência nos princípios gerais.

O primeiro dêles, e o que mais se aproxima para D u v e r g e r de uma verdadeira lei sociológica, é o seguinte: “le scrutin raa-

joritaire à un seul tour tend au dualisme des partis” .2 3

Para confirmá-lo, invoca o autor os casos dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha, União Sul Africana e Nova Zelândia,

mas sua justificação quanto à exceção belga não chega a con-

yencer, como mostra L a v a u , para o qual não se pode afirmar

nem mesmo que o escrutício majoritário conserve um dualismo

já estabelecido, em virtude da sub-representação que impediria

o nascimento de um terceiro partido, alegada por D u v e r g e r.

Por outro lado, V. O. K e y assinala a influência do dis-

trito uninominal no bipartismo Norte-americano, atribuindo-lhe

grande responsabilidade na manutenção do sistema.2 4

Com efeito, o caso britânico está a desmentir as conclusões

de D u v e r g e r que invoca para justificar a exceção a base sindical

do “Labour” , pois o partido não se constituiu estabelecendo os

sindicatos; foram êstes que se reuniram politicamente no Par-

tido Trabalhista, assevera L a v a u. A conclusão mais avançada

a que se pode chegar, sem fugir do campo científico, é a de que

o sistema adápta-se bem ao bipartismo, como diz F r ie d r ic h.

22. M a r c e l , G abriel — Os Hom ens contra o H om em , **E d. Educação Nacional, Pôrto, s. d ., p g. 47.

  1. D u v e rg e r, M aurice —** L es Partis Politiques, **p g. 247.
  2. K e y , V. O. — O bra citada, p g. 329.**

P a k t i d o s p o l í t i c o s e S i s t e m a s E l e i t o r a i s (^) 1 0 5

O segundo princípio de D u v e r g e r , bem menos categórico, é por êle mesmo resumido assim: “ Sous certes réserves, la ten- dence du seconde tour à engendrer un multipartisme ne parait pas douteuse. Son mécanisme est assez simple: la diversité des partis voisins ne porte pas atteinte à leur représentation globale dans ce système, puisqu’ils peuvent toujours se regruper lors du scrutin de “ballottage”. Les phenomènes de polarisation et de sous représentation ne jouent pas ici, ou jouent seulement au deuxième tour, chaque parti conservant intégralement ses chances au prémier. En fait, 1’observation confirme le résultat du raisonnement: presque tous les pays à seconde tour sont également des pays à multipartisme” .2 5 Também estas conclusões são impugnadas por L a v a u , que atribui a êste sistema uma ação “ coagulante” sôbre os grupos partidários, exemplificando com o caso da terceira repúplica francêsa, onde teria contribuído para a separação entre a es- querda e a direita. Neste passo, achamos convincentes as análises de D u v e r g e r e subscrevemos suas conclusões, aliás formuladas com restrições que as tornam plenamente aceitáveis. A terceira conclusão de D u v e r g e r , que neste ponto mos- tra-se bastante hesitante, pode ser sintetizada da seguinte for- ma: “ La représentation proportionnelle áboutit à la formation de partis nombreux et rigides” ,2 6 O primeiro fato, certo e incon- testável, notado por D u v e r g e r , é o que a representação propor- cional coincide sempre com o pluripartismo, e impede a pola- rização dualista. Já o efeito multiplicador da R .P ., embora não possa ser negado, é de pequena amplitude, reconhece D u - v e r g e r. Esta multiplicação pode dar-se em virtude do estí-

mulo trazido pela R. P. à cristalização de cisões partidárias já

existentes ou pelo aparecimento de novos partidos. Neste último caso, entretanto, os sistemas eleitorais tomam medidas para evitar a multiplicação excessiva, não aplicando

25. D u v e r g e r , M aurice — O bra citada, pg. 270. 26. B u r e a u , G eorges — Traité de Science Politique, LG D J, Paris, 1949, tomo I, p g. 464.

P a r t i d o s P o l I t ic o s e S i s t e m a s e l e i t o r a i s (^) 1 0 7

Êste fenômeno apresenta-se paralelamente, ou mesmo como conseqüência da crescente rigidês dos quadros partidários.

“L ’irrigidimento (Parteizwang) dei vincolo di grupo è um dato sociologico che constituische um logico ed inevitabile risul- tato dell’evoluzione sociale moderna che tende alia orga- nizzazione ed alia razionalizzazione”, afirma P ietro V irg a nas pegadas de K o llr e u t t e r .3 0

Desde um ponto de vista mais geral o que temos é apenas mais um fracasso da organiação racional, principal caracterís- tica de nossa era, que mata as coisas orgânicas, substituindo-as pelas organizadas, no dizer de S p e n g l e r.

Em uma outra ordem de considerações, notamos que os partidos em geral caracterizam-se pelo fim de conquistar o po- der, mas os partidos fechados, de minorias, anti-democráticos para S i m o n , não perdem sua função histórica e social, pois como adverte B e n e d e t t o C r o c e “ la sintesi delle antitesi dei partiti non é il governo, ma la storia” .3 1

B I B L I O G R A F I A

B a r g h o o r n , F rederick C. e outros — Moderil Political Parties. — The U niversity of Chicago Press, 1956.

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