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para o presídio de Fernando de Noronha. ... o personagem de Jean-Claude Van Damme no filme O Grande Dragão Branco. (Bloodsport). A questão é infelizmente o ...
Tipologia: Notas de estudo
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Universidade Federal Fluminense Instituto de Artes e Comunicação Social Departamento de Cinema e Vídeo Bacharelado em Cinema e Audiovisual Fabricio Barros Rodrigues Capoeira e Cinema: Memória e Imagens de Arquivo Monografia Niterói 2016
Fabricio Barros Rodrigues Capoeira e Cinema: Memória e Imagens de Arquivo Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Bacharel em Cinema e Audiovisual, como requisito parcial para conclusão do curso.Orientadora: Eliany Salvatierra Niterói 2016
Esta pesquisa pretende traçar uma filmografia da capoeira, analisando sua representação ao longo da história do cinema. Para aproximar o leitor e servir como parâmetro de referencial, o trabalho apresenta uma narrativa da história da capoeira, investigando suas matrizes africanas e seu desenvolvimento como prática de resistência das populações negras. Pretende-se também iniciar um estudo de imagens de arquivo do Mestre Gato Preto de Santo Amaro, para fins de pesquisa para a realização de um documentário sobre o mestre. Palavras-chave: capoeira; resistência; cinema; imagens; arquivo; memória.
Thisresearchintendsto trace a filmographyofthe capoeira, byanalysing its representationalongthecinema'shistory. Togetthereaderacquaintedtothethemeandtobeused as a parameterto future researches, thisworkpresents a narrationofcapoeira'shistory, aninvestigationof its Africanoriginsand its development as a formofresistancebyblackpeople. Thisworkalsomeansto start animagestudyfromthearchivesofthe capoeira master Gato Preto, for therealizationof a documentary in thenear future. Key-words: capoeira; resistance; cinema; images; archives; memory;
8 INTRODUÇÃO A capoeira é hoje uma importante manifestação cultural brasileira. O ritual da roda de capoeira e o ofício dos Mestres de capoeira foram reconhecidos como patrimônio imaterial pelo IPHAN em 2008, e estão inscritos no Livro de Registro das Formas de Expressão e no Livro de Registro dos Saberes, respectivamente. Seu valor enquanto expressão artística é exaltado por sua complexidade e riqueza. A beleza dos movimentos, da musicalidade, o conjunto de valores e sua própria ética são elementos singulares que fazem da capoeira uma manifestação cultural única. Não à toa é hoje praticada em todo o Brasil e também no mundo. Ultrapassou as barreiras do idioma e é desenvolvida em países como Israel, Indonésia, Japão, Estados Unidos e toda Europa e América Latina. Não à toa é hoje a maior expressão propagadora da língua portuguesa no mundo. No entanto, nem sempre foi assim. A capoeira – como todas as demais expressões culturais dos negros no Brasil – foi reprimida e criminalizada ao longo dos séculos. Esteve presente no Código Penal Brasileiro de 1890 até 1930 e por muito tempo ainda se manteve sob o estigma do preconceito por parte das elites como coisa de vagabundos e marginais. A história da capoeira é, em certa medida, a história do negro no Brasil. Foi usada como arma e defesa pelos escravos no período colonial e durante o Brasil Império e a República Velha também, os capoeiristas se fizeram presentes em diversas revoltas populares e foram protagonistas no surgimento das maltas na cidade do Rio de Janeiro no final do século XIX. A história da capoeira foi marcada pela marginalidade e como prática de resistência das populações negras. A diáspora africana privou as populações negras das Américas de sua própria história, de sua ancestralidade. A própria história da escravidão nas colônias é uma história que sobreviveu nas brechas, uma história não contada – que tentou ser apagada pelo Estado, a exemplo da queima dos arquivos da escravidão pelo então ministro Rui Barbosa em 1890. Contar a história da capoeira é, portanto, um problema arqueológico. Existem poucos vestígios materiais para compor essa narrativa. Os únicos documentos oficiais que servem em alguma medida como fonte de pesquisa são boletins de ocorrência policiais, ordens de prisão e atestados de óbito. Mais tarde umas poucas
10 No último capítulo desenvolvo uma pesquisa mais pessoal, focada na figura do Mestre Gato Preto de Santo, já falecido. Mestre Gato tem uma importante presença dentro da minha trajetória na capoeira angola, uma vez que o Grupo Ilê de Angola de Mestre Formiga – do qual eu faço parte – é descendente de sua genealogia, sendo fundamentado por seus ensinamentos e tradições através do Mestre Zé Baiano – do Grupo de Capoeira Angola Rei Zumbi – que foi discípulo de Mestre Gato. Tal pesquisa tem por objetivo se desdobrar em um documentário audiovisual sobre Mestre Gato. Como recorte para esse TCC, decidi por me focar apenas em uma pesquisa de imagens e materiais de arquivo do Mestre, como ponto de partida para uma pesquisa mais aprofundada, na qual caberá também a realização de entrevistas com seus discípulos e demais pessoas que com ele conviveram. Para isso, uma série de entrevistas realizada pelo Mestre Dorado com Mestre Gato entre os anos de 1998 e 2002, foram de grande valia, compondo a maior parte do material investigado nessa pesquisa. Convido o leitor a se aproximar desse tema – muitas vezes pouco compreendido pelo senso comum – e compartilhar talvez de ao menos uma parcela do encantamento que eu desenvolvi pela arte da capoeira. Axé!
11 1 A CAPOEIRA E SUAS ORIGENS O surgimento da capoeira ainda hoje é um mistério. Como grande parte da história das culturas afro descendentes de todo mundo, a carência de fontes escritas é um entrave e os pouco registros históricos que chegaram nos dias de hoje, foram em sua maioria escritos por homens brancos. Para além dessa questão, como uma manifestação cultural viva, em movimento, entendemos hoje que precisar uma única raiz para o surgimento dessa dança-luta não só seria impossível como também equivocado. Importante compreender que a capoeira esteve em constante transformação ao longo dos séculos, em diálogo direto com os processos político-sociais de seu tempo, muitas vezes inserida em disputa no centro desses acontecimentos. Para traçarmos algum tipo de panorama histórico da capoeira, precisamos distinguir de alguma forma o que hoje é o ritual da capoeira, da capoeira escrava praticada nos tempos do Brasil Colônia/Império. A capoeira ritual é essa manifestação cultural que vemos nos dias de hoje, que ainda que se encontre expressa em diferentes estilos e linhagens, compartilha elementos rituais bem delimitados, tais como a roda, as cantorias, o acompanhamento musical e a performance de dois jogadores dentro do círculo. Essa organização ritual da capoeira pode ser mais precisamente localizada em um período histórico mais recente, ao que tudo indica em Salvador no início do séc. XX. O que podemos chamar capoeira escrava, que se desdobrou na capoeira ritual, ainda permanece um problema historiográfico. A origem do próprio termo capoeira ainda é motivo de controvérsias. Existem duas hipóteses mais difundidas entre pesquisadores do assunto. A primeira aponta que teria se originado do termo tupi kapu'era, que significa “o que foi mata.” Seria uma junção de ka'a (“mata”) e pûera (“que foi”). Esse termo se refere às áreas de vegetação rasteira onde era praticada a agricultura indígena. A partir dessa suposição, os antigos escravos se escondiam sobre esse mato rasteiro para praticar movimentos atléticos longes da vigia dos feitores e capitães do mato. A segunda hipótese já aponta para um contexto mais urbano, associando o termo a uma espécie de cesto homônimo que os escravos usavam para transportar aves capadas até os mercados, onde seriam comercializadas para seus senhores. Nesse meio tempo, os escravos se distraíram
13 Figura 1 - Anúncio oferecendo recompensa pela captura de um escravo fugido publicado no AlmanakLaemmert, 1854. Fundação Biblioteca Nacional. Uma maior ocorrência do registro da prática da capoeira em documentos oficiais e de polícia se iniciaa partir de 1808, com a chegada da corte portuguesa ao Brasil. Nesse período, D. João VI cria a Intendência Geral de Polícia da Corte do Estado do Brasil, iniciando grandes modificações no sistema policial (SOARES, 2002). Além desses documentos oficiais, outra importante fonte de registro desse período histórico vem de viajantes estrangeiros, que em suas expedições e viagens pelo Brasil, registravam os costumes e práticas sociais do povo brasileiro. Um célebre registro textual e imagético dessa ordem, é a pintura “Jogar capoera ou danse de laguerre” do pintor Rugendas^2. (^2) Johann Moritz Rugendas (1802 —1858) foi um pintor alemão nascido em Augsburgo que viajou por todo o Brasil durante o período de 1822 a 1825, pintando os povos e costumes que de fato ele pode encontrar. Rugendas era o nome que usava para assinar suas obras.
14 Figura 2 - Datada em 1834, encontramos a descrição "Jogar Capüera ou dance de laguerre" - do do artista alemão Rugendas e Deroy como gravador. A partir desse período, a capoeira começa a proliferar no meio urbano. Nas primeiras décadas do século XIX, nota-se que a capoeira ainda se restringia a parcela negra da população, em sua grande maioria escravos e uns poucos libertos. Desde a criação da intendência em 1908, não só a capoeira como todas as outras manifestações de matriz africana, foram fortemente reprimidas pelas autoridades brasileiras. Existia uma política de estado para conter “A Barbárie Negra”. Esses fatos se verificam em inúmeros documentos oficiais, tais como algumas prisões ocorridas no Rio de Janeiro no ano de 1820, que evidenciam esse cenário de perseguição e os motivos pelas quais elas eram cumpridas: “15 de março… João Benguela, escravo de Joaquim de Souza, preso por capoeira, com umanavalha de ponta mão, 300 açoites e três meses na Tijuca. 10 de novembro… Francisco Cabinada, escravo de João Gomes Barros, preso por estar tocando batuque com grande ajuntamento de negros e se apreendeu o tambor. 300 açoite.” (HOLLOWAY, 97. p.54). Enquanto nas primeiras décadas do século, estava restrita a negros - escravos e libertos - no decorrer da primeira metade do séc. XIX esse cenário vai se
16 1.1 Guerra do Paraguai Iêtava em casa Sem pensá nem imaginá Quando bateram na porta, ô meu bem Salomão mandô chamar Para ajudar a vencê, ô meu bem A guerra com Paraguá Gente de Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará (D.P.) Em 1965, o Brasil junto com Argentina e Uruguai, declara guerra ao Paraguai. Muitos capoeiras foram recrutados para servirem as forças armadas. Alguns agarrados à força nas ruas do Rio de Janeiro e outras províncias, outros de dentro das prisões e aos escravos foi feita a promessa de “liberdade” após o fim do conflito. O envio dos capoeiras à guerra foi uma manobra estratégica das autoridades para se livrar de sua indesejável presença nas cidades brasileiras, em especial do Rio de Janeiro. Os capoeiristas estiveram presentes até mesmo na Marinha Brasileira durante a guerra, considerada o ramo mais aristocrático das forças armadas. Obviamente não figuravam entre os oficiais, mas como marujos “buchas de canhão”. “Marcílio Dias (o herói da Batalha do Riachuelo, embarcado no "Parnahyba") era rio-grandense e foi recrutado quando capoeirava à frente de uma banda de música. Sua mãe, uma velhinha alquebrada, rogou que não levassem seu filho; foi embalde, Marcílio partiu para a guerra e morreu legando um exemplo e seu nome. (Correio Paulistano, 17/6/1890)” (CAPOEIRA, 2007, pag. 7) O batalhão de Zuavos ficou renomado como especialista na invasão de trincheiras e no manejo de armas brancas. “Manuel Querino descreve-nos "o brilhante feito d'armas" levado a efeito pelas companhias de "Zuavos Baianos" no assalto ao forte Curuzu, quando os paraguaios foram debandados. Destacam-se dois capoeiras nos combates corpo-a-corpo: o alferes Cezario Alves da Costa - posteriormente condecorado com o hábito da Ordem do Cruzeiro pelo marechal Conde d'Eu - , e o alferes Antonio Francisco de Melo, também tripulante da já citada corveta "Parnahyba" que, entretanto, teve sua promoção retardada devido ao seu comportamento, observado pelo comandante de corpos: "O cadete Melo usava calça fofa, boné ou chapéu à banda pimpão e não dispensava o jeito arrevesado dos entendidos em mandinga". (REIS, 1997, p.55)
17 Figura 4 - Um negro do batalhão dos Zuavos em meio a outros integrantes do Exército Brasileiro na Guerra do Paraguai. A desenvoltura dos capoeiras durante a guerra, contribuíram para a propagação do mito do capoeira como um genuíno guerreiro brasileiro, inclusive dentro das próprias forças armadas. Se antes da guerra a capoeira estava ainda restrita às camadas populares e muito associada à vadiagem e marginalidade, cinco anos depois, com o fim da guerra, os capoeiras retornam as capitais como heróis nacionais e começam a exercer grande influência nas ruas do Rio de Janeiro. 1.2 AS MALTAS CARIOCAS Vamos jogar capoeira enquanto a polícia não vem Mas quando a polícia chegar quebra a polícia também (D.P.) Nesse contexto se prolifera o fenômeno das maltas cariocas, que embora já existissem antes de 1965, ganham muita força e poder após a guerra. As maltas eram grupos organizados de capoeiras e valentões que disputavam o domínio de diferentes regiões da capital carioca e exerciam diversas atividades ligadas a contravenção e a marginalidade. As maltas em um primeiro momento, assim como a
19 Figura 5 - Cada malta apoiava um partido político e recebia proteção dos respectivos parlamentares. Acima, Nagoas carregam nos ombros o deputado conservador Duque- Estrada Teixeira, que criticou a polícia em plena assembléia. Com a instauração do governo republicano provisório, uma das principais medidas adotadas foi a criação do Decreto n 847, intitulado “Dos Vadios e Capoeiras”, na revisão do Código Penal em 1890. Decreto no 847 Capítulo XIII -- Dos vadios e capoeiras Art. 402. Fazer nas ruas e praças públicas exercício de agilidade e destreza corporal conhecida pela denominação Capoeiragem; andar em carreiras, com armas ou instrumentos capazes de produzir lesão corporal, provocando tumulto ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal; Pena - de prisão celular por dois a seis meses. A penalidade é a do art. 96. Parágrafo único. É considerada circunstância agravante pertencer o capoeira a alguma banda ou malta. Aos chefes ou cabeças, se imporá a pena em dobro. Art. 403. No caso de reincidência será aplicada ao capoeira, no grau máximo, a pena do art. 400. Parágrafo único. Se for estrangeiro, será deportado depois de cumprida a pena. Art. 404. Se nesses exercícios de capoeiragem perpetrar homicídio, praticar alguma lesão corporal, ultrajar o pudor público e particular, perturbar a ordem, a tranquilidade ou segurança pública ou for encontrado com armas, incorrerá cumulativamente nas penas cominadas para tais crimes. A criminalização da capoeira a partir de sua entrada no código penal foi um ponto de virada na história da capoeiragem, em especial na cidade do Rio de Janeiro. A perseguição as maltas foi sistemática e cerco em torno dos capoeiras foi se fechando. Sampaio Ferraz, O Cavanhaque de Aço, chefe de polícia do então distrito federal, recebeu ordens diretas do Marechal Deodoro para tal campanha, e uma das penas a que eram impostas aos capoeiras condenados era a deportação para o presídio de Fernando de Noronha. Um caso que geral grave crise institucional
20 no início da república, foi a prisão e deportação do capoeirista Juca Reis, filho do Conde de Matosinho, milionário dono do jornal O Paiz. “(Juca Reis era uma) bela figura de rapaz forte, estroína e maneiroso, trajando sempre com apurada elegância. José Elísio dos Reis - o Juca Reis como era conhecido - , tinha-se tornado famoso nas vielas do crime, por seus constantes conflitos e violências, frequentes espancamentos em mulheres decaídas e pela autoria ou cumplicidade de um assassinato ocorrido em meados de 1888, na rua dos Andradas, junto ao largo de São Francisco de Paula... era um cordão elegante... cuja especialidade era promover conflitos e desordens nos teatros e casas de jogos, e demais lugares frequentados pela alta roda da Corte (SOARES, 1994, p.173-175).” Figura 6 - Detentos correcionais durante o trabalho em Fernando de Noronha. Fonte: Revista O Cruzeiro, 2 ago. 1930. Ao final do século XIX, a capoeiragem carioca não havia sido completamente erradicada, mas as maltas de capoeira foram desarticuladas e praticamente desapareceram. As escusas relações entre o estado, a polícia e as maltas já não perduravam. O Brasil republicano como um todo passava por grandes transformações e distrito federal estava no centro de todo esse processo. A república implementava mudanças profundas no espaço urbano e no comportamento social. A capoeiragem não seria mais a mesma dos tempos do império na cidade carioca e os capoeiras foram obrigados a encontrar novas formas de existir. No entanto, nomes como de Manduca da Praia, Ciríaco, Plácido de Abreu, deixariam seu legado à cidade do Rio de Janeiro na futura figura do Bamba, muito presente no universo do samba carioca.