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CAPÍTULO 5
PESQUISA QUALITATIVA: APONTAMENTOS, CONCEITOS E
TIPOLOGIAS
Ângela Mara de Barros Lara
Adão Aparecido Molina
INTRODUÇÃO
Ao trabalharmos com metodologia da pesquisa, especialmente na área das Ciências
Humanas, percebemos as dificuldades que os alunos encontram para compreender o que é
pesquisa qualitativa e para viabilizar sua metodologia durante os trabalhos que realizam. Alunos
da graduação ou da pós-graduação levantam questionamentos sobre esse tipo de pesquisa e sua
metodologia confundindo, muitas vezes, a proposta teórica e o método com os procedimentos
na pesquisa.
Este texto procura auxiliar no entendimento do que é a pesquisa qualitativa nas ciências
humanas, bem como no desenvolvimento de propostas metodológicas nessa área. Num primeiro
momento localizamos a pesquisa qualitativa no tempo, ou seja, buscamos o seu surgimento na
América Latina, discutindo a dicotomia entre pesquisa qualitativa e pesquisa quantitativa e,
também, sobre as bases dessas investigações na educação.
Num segundo momento, apresentamos o conceito e a tipologia da pesquisa qualitativa
dialogando com vários autores sobre esse tema. Como contraponto apresentamos “outros tipos
de pesquisa” que estão vinculados à pesquisa quantitativa, pois, acreditamos que a pesquisa
qualitativa pode e deve ser mediada, em sua coleta de dados, por outros tipos de pesquisa.
Assim sendo, é necessário ir além da dicotomia entre a pesquisa qualitativa e a quantitativa. Em
função disso, entendemos que ao apresentarmos esses teóricos e os encaminhamentos para a
pesquisa, possibilitamos uma discussão mais ampla entre os pesquisadores e os seus
orientadores.
DISCUTINDO A DICOTOMIA ENTRE A PESQUISA QUALITATIVA E A PESQUISA
QUANTITATIVA
Depois de centralizar a discussão sobre a formação do pesquisador nas técnicas e metodologias, na década dos 70, de destacar a importância das teorias (críticas e não críticas) nos anos 80 e da discussão sobre os paradigmas epistemológicos no começo da década dos anos 90 e, ainda, de anunciar a crise dos paradigmas na segunda metade dessa última década, hoje parece ganhar consistência a discussão em torno das teorias do conhecimento que fundamentam a pesquisa educacional. As teorias do conhecimento tornam-se espaços mais amplos que permitem um debate que compreende as anteriores dimensões da pesquisa (técnicas, métodos, teorias, epistemologias) e ajuda a elucidar melhor as tendências atuais da pesquisa e suas relações com o mundo da necessidade e dos desafios da educação no limiar do próximo milênio (GAMBOA, 2000, p. 14).
Alguns termos são fundamentais para iniciar esta discussão, por isso é preciso buscar no
Dicionário Aurélio as definições de palavras como: teoria, teoria do conhecimento, pesquisa,
metodologia e método.
Teoria é conhecimento especulativo, meramente racional; conjunto de princípios fundamentais duma arte ou duma ciência; Doutrina ou sistema fundado em princípios e opiniões sistematizadas. Teoria do conhecimento é o estudo do Valor e dos limites do conhecimento, e especialmente da relação entre sujeito e objeto – GNOSIOLOGIA. Pesquisa é ato ou efeito de pesquisar; indagação ou busca minuciosa para averiguação da realidade, investigação, inquirição; investigação e estudo, minudentes e sistemáticos,
com o fim de descobrir ou estabelecer fatos ou princípios relativos a um campo qualquer do conhecimento. Metodologia é a arte de dirigir o espírito na investigação da verdade; estudo dos métodos e, especialmente, dos métodos das ciências. Método é o caminho pelo qual se atinge um objetivo; programa que regula previamente uma série de operações que se devem realizar, apontando erros evitáveis, em vista de um resultado determinado; processo ou técnica de ensino: método direto; modo de proceder; maneira
de agir; meio (FERREIRA, 1987).
No dicionário estes verbetes apresentam uma visão da discussão que é fundamental para
o entendimento do conhecimento científico que leva ao desenvolvimento da pesquisa.
Para fazer pesquisa é necessário ter uma dúvida, um questionamento, uma pergunta.
Fala-se do problema, o que se quer investigar? É a partir desta dúvida ou desta pergunta inicial,
que parte do senso comum, que se procura a teoria e o método que fundamentarão a pesquisa.
Parece simples colocar as coisas nestes termos, tenho um problema, procuro uma teoria, uma
metodologia e está resolvido o meu projeto de pesquisa. Bom, é claro que o conhecimento
científico não é elaborado de forma simplista, este entendimento seria temerário e porque não
dizer ingênuo. Ao propor uma discussão de base científica são necessários: clareza, rigor,
domínio de conceitos, teorias e métodos.
É neste sentido que iniciamos a discussão da pesquisa qualitativa. Muitos autores já
fizeram um histórico sobre essa forma de fazer pesquisa^1 , é importante, entretanto salientar que
na América Latina ela surgiu na década dos setenta do século vinte. O enfoque da educação na
região possui aspectos qualitativos, por essa razão é imprescindível compreender que o ensino
sempre apresentou um destaque pela sua realidade qualitativa, como salienta Triviños (1987). O
que nos motiva a entender o percurso da pesquisa qualitativa na região é justamente a ideia de
perceber as perspectivas e os fundamentos da pesquisa educacional no Brasil.
A pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa vêm sendo tratadas de variadas formas
por diferentes pesquisadores, mas escolhemos um encaminhamento para tratarmos desta
questão. No que tange à dicotomia entre pesquisa qualitativa e pesquisa quantitativa procuramos
fundamentar esta discussão sob a teoria de dois autores: Silvio Sanchez Gamboa e José Camilo
dos Santos Filho, teóricos que tratam das questões da pesquisa e auxiliam na compreensão desta
dicotomia. Ela é necessária? É cabível? Para Gamboa (2000) este conflito é falso, ou seja, ele
aparece enquanto reducionismo no que diz respeito às alternativas de pesquisa considerando
apenas as opções técnicas sem observar outros processos e níveis no desenvolvimento da
pesquisa científica. É preciso que se avance nesta discussão, tendo em vista que é necessário
admitir a distinção entre níveis técnicos, metodológicos, teóricos e epistemológicos. Conforme
o autor anteriormente citado, deve-se racionalizar as formas de articulação entre os níveis.
A questão perpassa as bases históricas nas quais os paradigmas da pesquisa estão
inseridos. Faz-se necessário, portanto, ressaltar dois pontos, conforme aponta Santos Filho
(2000). 1º) Problema do contexto histórico, ou seja, as bases conceituais da discussão atual
estão enraizadas em ideias do século XIX; 2º) É necessário discutir as teses da
incomensurabilidade, da complementaridade e da unidade dos paradigmas nas Ciências
Humanas e na Educação.
Cabe levantar o contexto histórico dos paradigmas da pesquisa nas décadas passadas,
onde na década de 1980 os paradigmas dominantes das ciências humanas e da educação eram:
qualitativo-realista, quantitativo-realista e neomarxistas, este último desafiando a hegemonia
dos dois anteriores a partir do final dos anos 1970. Os neomarxistas tratam as categorias de
quantidade e qualidade na perspectiva da dialética materialista, conforme Santos Filho (2000). É
preciso refletir sobre a possibilidade da superação desta contradição entre as pesquisas
qualitativas e quantitativas. A defesa neste momento é com relação à unidade dos paradigmas.
Os diferentes níveis, tipos e abordagens de problemas educacionais, e os diversos objetos de pesquisa requerem métodos que se adequem à natureza do problema pesquisado. Em última instância, porém, essas abordagens e metodologias precisam contribuir para a explicação e compreensão mais aprofundada dos fenômenos humanos
(^1) Os autores que já fizeram um histórico sobre a pesquisa qualitativa foram Gamboa (2000); Santos Filho
(2000); Lara (1992); Triviños (1987); Hirano (1987) entre outros.
CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DA PESQUISA QUALITATIVA
É importante apresentar, a partir daqui, o conceito e as características da pesquisa
qualitativa. Para alguns autores a Pesquisa Qualitativa é uma “expressão genérica”. Deve-se
verificar que ela possui atividades de investigação que se apresentam de forma específica e
possuem características de traços comuns. Devendo-se perceber dois aspectos: o primeiro, as
peculiaridades da pesquisa qualitativa e o segundo, as modalidades dos tipos de investigação.
A pesquisa qualitativa surgiu na antropologia de maneira mais ou menos naturalística, e
na sua tradição antropológica ficou conhecida como investigação etnográfica. Alguns a definem
como sendo “o estudo da cultura”^2. Cabe aqui salientar algumas de suas denominações:
A pesquisa qualitativa é conhecida também como "estudo de campo", "estudo qualitativo", "interacionismo simbólico", "perspectiva interna", "interpretativa", "etnometodologia", "ecológica", "descritiva", "observação participante", "entrevista qualitativa", "abordagem de estudo de caso", "pesquisa participante", "pesquisa fenomenológica", "pesquisa-ação", "pesquisa naturalista", "entrevista em profundidade", "pesquisa qualitativa e fenomenológica", e outras [...]. Sob esses nomes, em geral, não obstante, devemos estar alertas em relação, pelo menos, a dois aspectos. Alguns desses enfoques rejeitam total ou parcialmente o ponto de vista quantitativo na pesquisa educacional; e outros denunciam, claramente, os suportes teóricos sobre os quais elaboraram seus postulados interpretativos da realidade (TRIVIÑOS, 1987, p. 124).
As bases teóricas do pesquisador no início da utilização da pesquisa qualitativa eram
dominadas pelo Funcionalismo e pelo estrutural funcionalismo, com raízes no positivismo,
exemplificadas pela Antropologia de Malinowski^3. Na década de 1970 foram três bases teóricas
que influenciaram a pesquisa qualitativa: o enfoque estrutural-funcionalista, o enfoque
fenomenológico e o enfoque histórico-estrutural que emprega o método materialista dialético.
Estas três bases teóricas, a estrutural-funcionalista, a fenomenológica e a materialista dialética, tornam impossível uma definição da pesquisa qualitativa em termos que satisfaçam os requisitos destas direções fundamentais. Por isso, o teor de qualquer enfoque qualitativo que se desenvolva será dado pelo referencial teórico no qual se apóie o pesquisador. [...] cabe levantar três ressalvas. Em primeiro lugar, esta dificuldade para definir a pesquisa qualitativa com validade absoluta não significa que não sejamos capazes de caracterizá-la através de peculiaridades essenciais que justifiquem sua existência. [...] Em segundo lugar, apesar de haver afirmado que a dimensão teórica da pesquisa qualitativa seria dada pelo pesquisador, devemos afirmar, sem que isto se constitua numa proposição essencial, que o tipo de pesquisa qualitativa denominada "pesquisa participante" (ou "participativa") pode prestar-se melhor a um enfoque dialético, histórico-estrutural que tenha por objetivo principal transformar a realidade que se estuda. Em terceiro lugar, não obstante reconhecer os obstáculos que existem para caracterizar genericamente a pesquisa qualitativa, vamos intentar esboçar um corpo de ideias que trazem uma linha identificadora deste tipo de investigação. Nossa tentativa peca, talvez, por ser relativamente parcial, já que, quando assinalamos traços peculiares, estamos com a ideia em mente, de maneira principal, do enfoque qualitativo de natureza fenomenológica (TRIVIÑOS, 1987, p. 125-126).
2 Spradley (1979 apud TRIVIÑOS, 1987, p. 121).
(^3) Bronislaw Kasper Malinowski (1884-1942). Antropólogo polonês nascido em Cracóvia, um dos mais
importantes antropólogos do século XX e conhecido como o fundador da antropologia social. Disponível em: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/BronKMal.html.
Outra questão importante sobre a pesquisa qualitativa é a tratada por Bogdan (
apud TRIVIÑOS, 1987, p. 128-130) onde se destaca a investigação do tipo fenomenológico e da
natureza histórico-estrutural, dialética. O autor apresenta cinco características:
1º) A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta dos dados e o pesquisador como instrumento-chave; 2º) A pesquisa qualitativa é descritiva; 3º) Os pesquisadores qualitativos estão preocupados com o processo e não simplesmente com os resultados e o produto; 4º) Os pesquisadores qualitativos tendem a analisar seus dados indutivamente; 5º) O significado é a preocupação essencial na abordagem qualitativa [...].
É importante ressaltar os pressupostos que servem de fundamentos para a pesquisa
qualitativa, conforme registra Triviños (1987). Segundo esse autor, no Positivismo esses
pressupostos foram considerados como óbvios ou não investigáveis. O enfoque fenomenológico
valorizou a análise dos pressupostos, porque entendia que os significados que os sujeitos davam
aos fenômenos dependiam essencialmente dos pressupostos culturais próprios do meio no qual
viviam. No que diz respeito à pesquisa de caráter Histórico-Estrutural-Dialético, ela não ficou
somente na compreensão dos significados que surgiam dos pressupostos, mas buscou as raízes
desses pressupostos “[...] as causas de sua existência, suas relações num quadro amplo do
sujeito como ser social e histórico, tratando de explicar e compreender o desenvolvimento da
vida humana e de seus diferentes significados no devir dos diversos meios culturais”
(TRIVIÑOS, 1987, p. 130).
O teórico que é a base desta discussão sugere alguns esclarecimentos importantes com
relação ao processo de investigação sobre a pesquisa qualitativa.
1º) A pesquisa qualitativa não segue sequência tão rígida das etapas assinaladas no
desenvolvimento da Pesquisa Quantitativa;
2º) O pesquisador deve iniciar sua investigação, apoiado numa fundamentação teórica geral,
numa revisão aprofundada da literatura em torno do tópico em discussão. A maior parte do
trabalho se realiza no processo de desenvolvimento do estudo. A necessidade da teoria surge em
face das interrogativas que se apresentarão no decorrer do estudo;
3º) As variáveis deverão ser descritivas e seu número pode ser grande;
4º) Com relação à população e amostra:
- Na pesquisa fenomenológica os recursos podem ser aleatórios para fixar amostra,
buscando uma representatividade do grupo maior de sujeitos;
- A pesquisa Materialista-Dialética não reconhece a dicotomia qualidade/quantidade,
podendo apoiar-se na estatística para determinar a representatividade da amostragem.
Cabe enfatizar que para Triviños (1987, p. 133) o pesquisador, que utiliza o enfoque
qualitativo, poderá contar com uma liberdade teórico-metodológica para desenvolver seus
trabalhos. “[...] Os limites de sua iniciativa particular estarão exclusivamente fixados pelas
condições da exigência de um trabalho científico [...]”.
A socióloga e pesquisadora Maria Cecília de Souza Minayo, escrevendo sobre a
pesquisa qualitativa, explica que essa modalidade de pesquisa responde a questões que são
muito específicas. Para ela, a pesquisa qualitativa, nas Ciências Sociais, trabalha com uma
realidade que não pode ser apenas quantificada, porque essa realidade possui um universo de
significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. Tudo isso corresponde a relações,
processos e fenômenos que não podem ser reduzidos apenas a operações variáveis.
A diferença entre qualitativo-quantitativo é de natureza. Enquanto cientistas sociais que trabalham com estatística apreendem dos fenômenos apenas a região “visível, ecológica, morfológica e concreta”, a abordagem qualitativa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas, um lado não perceptível e não captável
em equações, médias e estatísticas (MINAYO, 2003, p. 22).
Essa autora afirma também que, o conjunto de dados quantitativos e qualitativos não se
opõe, ao contrário, esses dados se complementam, pois a realidade que eles abrangem exclui a
elementos ou dimensões poderão ser acrescentados, na medida em que o estudo avance. [...] o
pesquisador estará sempre buscando novas respostas e novas indagações no desenvolvimento do
seu trabalho.
2. Os estudos de caso enfatizam a "interpretação em contexto ". Um princípio básico desse tipo
de estudo é que, para uma apreensão mais completa do objeto, é preciso levar em conta o
contexto em que ele se situa. Assim, para compreender melhor a manifestação geral de um
problema, as ações, as percepções, os comportamentos e as interações das pessoas devem ser
relacionadas à situação específica onde ocorrem ou à problemática determinada a que estão
ligadas.
3. Os estudos de caso buscam retratar a realidade de forma completa e profunda. O pesquisador
procura revelar a multiplicidade de dimensões presentes numa determinada situação ou
problema, focalizando-o como um todo. Esse tipo de abordagem enfatiza a complexidade
natural das situações, evidenciando a inter-relação dos seus componentes.
4. Os estudos de caso usam uma variedade de fontes de informação. Ao desenvolver o estudo de
caso, o pesquisador recorre a uma variedade de dados, coletados em diferentes momentos, em
situações variadas e com uma variedade de tipos de informantes.
5. Os estudos de caso revelam experiência vicária e permitem generalizações naturalísticas. O
pesquisador procura relatar as suas experiências durante o estudo de modo que o leitor ou
usuário possa fazer as suas "generalizações naturalísticas". Em lugar da pergunta: este caso é
representativo do quê? O leitor vai indagar: o que eu posso (ou não) aplicar deste caso na minha
situação? A generalização naturalística ocorre em função do conhecimento experiencial do
sujeito, no momento em que este tenta associar dados encontrados no estudo com dados que são
frutos das suas experiências pessoais.
6. Estudos de caso procuram representar os diferentes e às vezes conflitantes pontos de vista
presentes numa situação social. Quando o objeto ou a situação estudada, podem suscitar
opiniões divergentes, o pesquisador procurará trazer para o estudo essa divergência de opiniões,
revelando ainda o seu próprio ponto de vista sobre a questão. Desse modo é deixado aos
usuários do estudo tirarem conclusões sobre esses aspectos contraditórios.
7. Os relatos do estudo de caso utilizam uma linguagem e uma forma mais acessíveis do que os
outros relatórios de pesquisa. Os dados do estudo de caso podem ser apresentados numa
variedade de formas, tais como dramatizações, desenhos, fotografias, colagens, slides,
discussões, mesas-redondas etc. Os relatos escritos apresentam, geralmente, um estilo informal,
narrativo, ilustrado por figuras de linguagem, citações, exemplos e descrições. É possível
também que um mesmo caso tenha diferentes formas de relato, dependendo do tipo de usuário a
que se destina. A preocupação aqui é com uma transmissão direta, clara e bem articulada do
caso e num estilo que se aproxime da experiência pessoal do leitor. Pode-se dizer que o caso é
construído durante o processo de estudo; ele só se materializa enquanto caso, no relatório final,
onde fica evidente se ele se constitui realmente num estudo de caso.
Em vista dessas várias características, pode-se indagar: em que o estudo de caso se
distingue de outros tipos de pesquisa? A preocupação central ao desenvolver esse tipo de
pesquisa é a compreensão de uma instância singular. Isso significa que o objeto estudado é
tratado como único, uma representação singular da realidade que é multidimensional e
historicamente situada. Desse modo, a questão sobre o caso ser ou não ser "típico", isto é,
empiricamente representativo de uma população determinada, torna-se inadequada, já que cada
caso é tratado como tendo um valor intrínseco (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 18-20).
2 Etnográfico/Etnometodológico:
Etnográfico
Definição:
A etnografia é um esquema de pesquisa desenvolvido pelos antropólogos para estudar a
cultura e a sociedade. Etimologicamente etnografia significa "descrição cultural". Para os
antropólogos, o termo tem dois sentidos: (1) um conjunto de técnicas que eles usam para coletar
dados sobre os valores, os hábitos, as crenças, as práticas e os comportamentos de um grupo
social; e (2) um relato escrito resultante do emprego dessas técnicas. (ANDRÉ, 1995, p. 27).
Engers (1994, p. 66) postula que Latorre et al. (1990), com base em estudos
anteriormente desenvolvidos, explicitam que esta abordagem de pesquisa descreve "etnoi", que
significa “outros” em grego, ou seja, é uma descrição detalhada do modo de vida dos outros
grupos de indivíduos ou raças (LATORRE et al ., 1990 apud ENGERS, 1994, p. 66).
Características do tipo de pesquisa etnográfica na educação:
1- Técnicas > observação participante, entrevista intensiva e análise de documentos, princípio
de interação entre o pesquisador e o objeto pesquisado;
2- O pesquisador é o instrumento principal na coleta e análise de dados;
3- Ênfase no processo, naquilo que está ocorrendo e não no produto ou nos resultados finais;
4- Preocupação com o significado, maneira própria com que as pessoas crêem em si mesmas,
suas experiências e o mundo que as cerca. O pesquisador deve apreender e retratar a visão
pessoal dos participantes;
5- Envolve um trabalho de campo;
6- Descrição e indução, ela utiliza grande quantidade de dados descritivos;
7- Busca a formulação de hipóteses, conceitos, abstrações, teorias e não sua testagem.
Visa à descoberta de novos conceitos, novas relações, novas formas de entendimento da
realidade.
Alternativa metodológica de investigação educacional:
[...] a Etnografia busca descrever, compreender e interpretar os fenômenos educativos que têm lugar no contexto escolar. É evidente que sempre se vincula à teoria e à descrição através de uma visão holística, naturalista e indutivista, que caracteriza a abordagem em questão (ENGERS, 1994, p. 67).
Perspectivas teóricas para estudar educação:
1ª) Ecologia cultural - o etnógrafo volta-se para um grupo específico e seleciona a teoria cultural que dê suporte para explorar o comportamento, as ações ou origens do analfabeto ou recursos do grupo ou comunidade; 2ª)Etnografia da comunicação - o pesquisador se detém na compreensão do fenômeno “alfabetização” para um grupo específico. O etnógrafo centralizará sua atenção nas ações e interações entre os membros do grupo, tanto interna como externamente a este. [...] Este utiliza a Cultura como orientação conceitual, a base teórica como abordagem do estudo do cotidiano do grupo e estabelece limites que servem para formulação das questões, planejamento de métodos e técnicas de coleta e análise de dados (ENGERS, 1994, p. 68).
O lugar do pesquisador:
É imprescindível que o investigador tenha presente seu grau de envolvimento na pesquisa, pois ele ocupa lugar de destaque para descrição e compreensão da relação e inter-relação do cotidiano escolar. A intensidade do envolvimento varia de acordo com as necessidades do trabalho e as opções feitas. O pesquisador atua como observador, entrevistador e analista entre teoria e empiria. Há autores que indicam um longo tempo de permanência em campo, para que o pesquisador possa descrever, concretamente, as relações que emergem desse cotidiano. Porém, parece que o importante é compreender esses fatos emergidos no e do grupo (ENGERS, 1994, p. 69).
Etnometodológico:
Definição:
"O ‘eu’ é a resposta do organismo às atitudes dos outros; o ‘ego’ é o conjunto organizado de
atitudes que atribuo aos outros. As atitudes dos outros constituem o ‘ego’ organizado e o
indivíduo reage, então, diante disso enquanto ‘eu’".
- o pensamento é o processo pelo qual, determinadas soluções potenciais são, em primeiro lugar,
examinadas sob o ângulo das vantagens e desvantagens que o indivíduo obteria em relação a
seus valores e, finalmente, escolhidas. Um "ato" é, portanto, uma interação contínua entre o 'eu'
e o ‘ego’, é uma sucessão de fases que acabam por se cristalizar em um comportamento único
(MEAD, 1934 apud COULON, 1995b, p. 60).
Abordagem dos problemas educacionais:
- teórica: [...] a abordagem etnográfica quer esteja ligada à tradição interacionista ou
etnometodológica, permite demonstrar, por exemplo, os processos do fracasso escolar, da
orientação ou seleção, enquanto a sociologia positivista da educação limita-se á identificar seus
efeitos;
- metodológica: [...] a sociologia interacionista serve-se da observação participante para ter
acesso direto aos fenômenos que pretende estudar;
- prática: o conhecimento de conjuntos sociais restritos é mais facilmente apreensível pelo
etnógrafo; um pesquisador isolado pode conseguir isso sem haver necessidade de recorrer a uma
grande, equipe ou a muitos meios;
- enfim, existencial: os indivíduos vivem em “grupos sociais naturais” e é aí que devemos
observá-los e compreender como organizam a vida em comum como a ordem social está
interacionalmente construída e como se perpetua (COULON, 1995b, p. 77).
Principais conceitos:
[...] contexto, perspectiva, cultura, estratégia, negociação e carreira (COULON, 1995b, p. 78-79).
3 Análise de contexto ou microetnografia:
Definição:
[...] Estudo do sistema social em miniatura: a observação do nível local, as interpretações de
situação feitas in situ reenviavam a hipóteses que podiam ser feitas no âmbito geral dos
sistemas.
Características:
- disponibilidade dos dados, suscetíveis de serem consultados (por exemplo, documentos áudio
ou vídeo, ou transcrição integral);
- exaustividade do tratamento dos dados que é um meio de luta contra a tendência a limitar a
exploração aos elementos favoráveis às hipóteses dos pesquisadores;
- convergência entre pesquisadores e participantes sobre a visão dos acontecimentos na medida
em que os pesquisadores garantem que a perfeita identidade entre a estrutura que descobrem nas
ações é aquela que orienta os participantes nessas ações. São utilizados “dispositivos de
verificação”: demanda de confirmação, junto aos entrevistados, de que os quadros de análise são
corretos;
- análise interacional que evita a redução psicológica e, ao mesmo tempo, a reificação
sociológica. Na medida em que a organização dos acontecimentos é socialmente construída,
procurar-se-á essa estruturação nas expressões e gestos dos participantes (COULON, 1995b, p.
4 Pesquisa-Ação/Pesquisa Participante:
Pesquisa-Ação:
Definição:
[...] tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (THIOLLENT, 1988, p. 15).
Principais aspectos:
a) há uma ampla e explícita interação entre pesquisadores e pessoas implicadas na situação
investigada;
b) desta interação resulta a ordem de prioridade dos problemas a serem pesquisados e das
soluções a serem encaminhadas sob forma de ação concreta;
c) o objeto de investigação não é constituído pelas pessoas e sim pela situação social e pelos
problemas de diferentes naturezas encontrados nesta situação;
d) o objetivo da pesquisa-ação consiste em resolver ou, pelo menos, em esclarecer os problemas
da situação observada;
e) há, durante o processo, um acompanhamento das decisões, das ações e de toda a atividade
intencional dos atores da situação;
f) a pesquisa não se limita a uma forma de ação (risco de ativismo): pretende-se aumentar o
conhecimento dos pesquisadores e o conhecimento ou o "nível de consciência" das pessoas e
grupos considerados (THIOLLENT, 1988, p. 16).
Metodologia:
[...] Trata-se de um método, ou de uma estratégia de pesquisa agregando vários métodos ou técnicas de pesquisa social, com os quais se estabelece uma estrutura coletiva, participativa e ativa ao nível da captação de informação. A metodologia das ciências sociais considera a pesquisa-ação como qualquer outro método. Isto quer dizer que ela a toma como objeto para analisar suas qualidades, potencialidades, limitações e distorções. A metodologia oferece subsídios de conhecimento geral para orientar a concepção da pesquisa-ação e controlar o seu uso (THIOLLENT, 1988, p. 25-26).
Estratégia:
Como estratégia de pesquisa, a pesquisa-ação pode ser vista como modo de conceber e de organizar uma pesquisa social de finalidade prática e que esteja de acordo com as exigências próprias da ação e da participação dos atores da situação observada. [...] Uma pesquisa concebida sem esse tipo de exigência corre o risco de se limitar a uma simples reprodução de lugares-comuns e de encobrir manipulações por parte de quem "fala mais alto" nas situações observadas. O fato de manter na pesquisa-ação algum tipo de exigência metodológica e científica não deve ser interpretado como "cientificismo", "positivismo" ou "academicismo". E apenas um elemento de defesa contra as ideologias passageiras e contra a mediocridade do senso comum (THIOLLENT, 1988, p. 26).
Diferença entre a pesquisa-ação e a pesquisa participante:
Isto é questão de terminologia – não há unanimidade;
Segundo o autor, toda pesquisa-ação é do tipo participativo, mas nem tudo que é
chamado pesquisa participante é pesquisa-ação.
[...] Isso porque pesquisa participante em alguns casos, é um tipo de pesquisa baseado numa metodologia de observação participante na qual os pesquisadores estabelecem relações comunicativas com pessoas ou grupos da situação investigada com o intuito de serem melhor aceitos. Nesse caso, a participação é sobretudo participação dos pesquisadores e consiste em aparente identificação com os valores e os comportamentos
dialética, comprometida com o processo de transformação. Ela até poderá extrapolar as metas
previstas ou tomar rumos diferentes da proposta inicial; entretanto, essa flexibilidade, quando
necessária, não significará um desvio metodológico. Ressalte-se que se trata de um trabalho
científico cuja linha de ação deve ser bem estruturada, crítica e criativa. Visa, sobretudo,
transformar o saber popular espontâneo em saber popular orgânico (GAJARDO, 1986 apud
ENGERS, 1994, p. 101-102).
5 Análise de Conteúdo:
Definição:
[...] a análise de conteúdo constitui-se de um conjunto de técnicas e instrumentos empregados na fase de análise e interpretação de dados de uma pesquisa, aplicando-se, de modo especial, ao exame de documentos escritos, discursos, dados de comunicação e semelhantes, com a finalidade de uma leitura crítica e aprofundada levando à descrição e interpretação destes materiais, assim como a inferências sobre suas condições de produção e recepção (MORAES, 1994 apud ENGERS, 1994, p. 103).
Grupos de materiais:
- Materiais de comunicação verbal, sejam textos, documentos oficiais, livros, jornais, documentos pessoais; material de comunicação oral, como transmissões de rádio, televisão, gravações de reuniões e similares;
- Materiais especialmente criados pela pesquisa, tais como entrevistas, discussões de grupos, respostas a questionários e depoimentos orais ou escritos (MORAES, 1994 apud ENGERS, 1994, p. 105).
Diferentes Perspectivas:
- Da perspectiva da profundidade da análise: A análise se limitará ao conteúdo manifesto ou procurará atingir o conteúdo latente? Historicamente, a análise de conteúdo iniciou examinando o conteúdo manifesto, mais facilmente passível de uma análise objetiva e quantitativa. Entretanto, a evolução do estudo da linguagem fez compreender que esta pretensão era ilusória, já que toda leitura é uma interpretação. Também a evolução da discussão da própria natureza da ciência, com a superação da concepção restritiva de objetividade e quantificação, fez com que as possibilidades da análise de conteúdo se expandissem consideravelmente. À medida que o analista de conteúdo compreende que uma mensagem pode possibilitar diferentes leituras, atingindo inclusive conteúdos dos quais nem o próprio emissor estava consciente ao produzir sua comunicação, amplia-se consideravelmente o campo de ação da análise de conteúdo.
- Da perspectiva da quantificação: A análise terá na quantificação sua principal preocupação ou se centrará no exame de aspectos qualitativos? A opção pela quantificação representa, necessariamente, um corte nas possibilidades de estudo da realidade. Os mesmos paradigmas que se propõem a superar a visão positivista, de modo geral, enfatizam a importância dos aspectos qualitativos, ainda que não desprezando a possibilidade da quantificação. Esta superação, de algum modo, está associada ao movimento que vai da explicação, fundamentada nas relações causais, para a compreensão, que supera a questão da causalidade. Não restam dúvidas de que estes novos paradigmas, enfatizando o qualitativo, ampliam enormemente as possibilidades da análise de conteúdo.
- Da perspectiva da utilização de hipóteses:
A pesquisa em que a análise está inserida é organizada em torno da testagem de hipóteses ou está orientada para a compreensão de um fenômeno? O exame das possibilidades da análise de conteúdo, no que se refere à utilização ou não de hipóteses, se aproxima muito da discussão anterior. Hipóteses implicam relações causais e, consequentemente, em geral, quantificação. A ausência de hipóteses corresponde, geralmente, ainda que não necessariamente, a uma opção pela compreensão. Assim, a análise de conteúdo amplia sensivelmente suas possibilidades quando se supera a concepção de que ela deva estar ligada ao teste de hipóteses. Alguns autores entendem e denominam os estudos sem hipóteses de exploratórios. Entendemos que isto traz o viés positivista e preferimos denominá-los estudos compreensivos, sendo então concebidos como um fim tão válido quanto a testagem de hipóteses e não um estágio preparatório para tais estudos.
- Da perspectiva dos elementos da comunicação: A análise volta-se aos significados ou pretende atingir os significantes? Historicamente, a análise de conteúdo nasceu com a preocupação de exame dos significados, a análise temática. Nesta perspectiva, a preocupação é aprofundar a compreensão da mensagem propriamente dita, seja da perspectiva do emissor, seja do receptor. Mas, aos poucos, esta perspectiva se ampliou, incluindo o exame dos significantes. Isto abriu toda uma nova gama de possibilidades para a análise de conteúdo, atingindo a análise léxica, a lógica, entre outras. Surgem, assim, diversas novas técnicas de análise, além da análise temática: análise de enunciação, análise de relações, análise estrutural, análise de avaliação e análise de discurso.
- Da perspectiva dos objetivos da análise: A análise pretende atingir objetivos essencialmente descritivos ou visa de modo mais aprofundado à inferência e à interpretação? A preocupação com uma descrição crítica, aprofundada e detalhada, seja dos conteúdos manifestos ou latentes de uma mensagem é, sem dúvida, uma preocupação inicial de qualquer análise de conteúdo. Entretanto, manter-se meramente na descrição seria assumir a posição de um estudo exploratório, anteriormente criticado. Uma boa pesquisa, utilizando análise de conteúdo, deveria pretender a inferência e a interpretação. A inferência é um termo mais relacionado ao paradigma positivista, à quantificação. Implica generalizar e estender as relações e constatações para o contexto. Interpretação é um termo que descreve melhor a pretensão compreensiva, portanto, preocupação de paradigmas que pretendem superar o positivismo e suas limitações. De qualquer modo, seja por inferência, seja por interpretação, as possibilidades de análise de conteúdo se ampliam significativamente. Entendemos que a análise de conteúdo também cresce em qualidade ao se superarem objetivos meramente descritivos.
- Da perspectiva do caráter objetivo/subjetivo: A análise é direcionada pelo rigor da objetividade ou pela fecundidade da subjetividade? O exame desta perspectiva se aproxima da perspectiva do manifesto/latente. Também aqui está subjacente a adoção dos pressupostos do paradigma positivista em contraste com paradigmas alternativos como o fenomenológico, o dialético ou naturalista. O primeiro enfatiza a necessidade de objetividade e neutralidade do pesquisador, o que é conseguido de modo mais fácil se a análise se limitar ao manifesto. Os outros reconhecem que nada é mais objetivo do que o que se manifesta diretamente ao sujeito, portanto, o subjetivo. Aspectos de qualidade, subjetivos, não diretamente explicitados, podem ser tão ou mais significativos do que os quantificáveis, objetivos e manifestos. Qualquer que seja a posição assumida, é fácil reconhecer que a ampliação das possibilidades de análise de conteúdo é máxima pelo envolvimento da análise dos aspectos subjetivos. É aí que esta técnica pode atingir sua fecundidade máxima. Poderá, mesmo assim, atingir o rigor que se exige de uma pesquisa de qualidade? Esta é uma questão cuja resposta tem constituído preocupação de muitos pesquisadores (MORAES, 1994 apud ENGERS, 1994, p. 105-108).
6 Análise do discurso:
Definição:
Estudo descritivo dos fenômenos sem o uso de teorias que os expliquem. A
Fenomenologia se baseia na experiência intuitiva do fenômeno, e tem como premissa que a
realidade consiste de objetos e eventos, perceptíveis conscientemente pelos seres humanos.
- [...] não existe “o” ou “um” método fenomenológico, mas uma atitude (MASINI, 1989 apud
FAZENDA, 1989, p. 62).
Atitude:
É a atitude de abertura do ser humano para compreender o que se mostra (abertura no sentido de estar livre para perceber o que se mostra e não preso a conceitos ou predefinições). Estamos livres quando sabemos de nossos valores, conceitos e preconceitos e podemos ver o que se mostra cuidando das possíveis distorções. (MASINI, 1989 apud FAZENDA, 1989, p. 62).
A Fenomenologia busca a compreensão dos múltiplos mundos construídos de acordo com as formas de perceber das pessoas, afastando-nos da visão de uma realidade única e independente do homem. Por isto, a pesquisa fenomenológica provoca a ruptura de um conceito de cientificidade fundamentado no positivismo, levando a uma nova concepção de ciência (METZLER et al ., 1994 apud ENGERS, 1994, p. 76).
Método:
O método fenomenológico trata de desentranhar o fenômeno, pô-lo a descoberto. Desvendar o fenômeno além da aparência. Exatamente porque os fenômenos não estão evidentes de imediato e com regularidade, faz-se necessária a Fenomenologia.
O método fenomenológico não se limita a uma descrição passiva. É simultaneamente tarefa de interpretação (tarefa da Hermenêutica) que consiste em pôr a descoberto os sentidos menos aparentes, os que o fenômeno tem de mais fundamental (MASINI, 1989 apud FAZENDA, 1989, p. 63).
[...] caracteriza-se, antes de tudo, por uma preocupação em dar uma descrição pura [...] do fenômeno. O fenômeno é aquilo que se oferece ao olhar intelectual [...]. É preciso orientar-se para as próprias coisas, interrogá-las na sua própria maneira de se oferecerem ao pensamento (HUSSERL, 1994 apud ENGERS, 1994, p. 76).
Pesquisa fenomenológica:
A Pesquisa Fenomenológica, portanto, parte da compreensão de nosso viver - não de definições ou conceitos - da compreensão que orienta a atenção para aquilo que se vai investigar. Ao percebermos novas características do fenômeno, ou ao encontrarmos no outro interpretações, ou compreensões diferentes, surge para nós uma nova interpretação que levará a outra compreensão (MASINI, 1989 apud FAZENDA, 1989, p. 63).
Etapas:
Discussão e ação
De reflexão
De ação
Procedimentos:
Fazer a leitura completa de cada descrição, para captar o sentido do todo. Captar o sentido do todo e, então, voltar ao início para discriminar as unidades de significado, conforme uma determinada perspectiva (psicológica ou educacional) e com o foco no fenômeno que está sendo investigado. Delinear as unidades de significado, retomar todas as unidades, reescrevendo-as em função do fenômeno que está sendo investigado, ou seja, fazendo uma transformação das unidades de significado em linguagem educacional.
Realizar a síntese de todas as unidades transformadas em uma perspectiva consistente. Isto de acordo com a estrutura da experiência, que pode ser expressa em diferentes níveis (GIORGI, 1985 apud ENGERS, 1994, p. 77-78).
O sentido do discurso descritivo e suas características:
Significante por ser capaz de atribuir valores e hierarquizar o que lhe parece significativo. Pertinente porque o senso da estrutura do fenômeno permite articular os sentidos que pertencem a esse fenômeno e não a outro; considerando sempre a complexidade da estrutura do todo. Relevante porque a significância e a pertinência do discurso fenomenológico reforçam a necessidade de descrever, por ser impossível expressar o fenômeno em uma palavra ou em uma frase. Referente porque a descrição estabelece relações, tanto no interior da estrutura do fenômeno como entre a estrutura e o seu contexto, que é o mundo. Provocante porque, na correspondência entre homens e mundo, o comportamento humano não se reduz a respostas determinadas por estímulos (behaviorismo), pois é livre e envolve ações imprevisíveis. Suficiente porque, mesmo sendo forçosamente inacabada, a descrição fenomenológica deve permitir a emergência do sentido (METZLER et al ., 1994 apud ENGERS, 1994, p. 81).
Pesquisador:
Os educadores que optam pela Fenomenologia reconhecem que a subjetividade isolada
não pode proporcionar respostas. É preciso buscá-la na intersubjetividade. Desse modo, a
consciência é ampliada e se transforma. O simples movimento em direção ao outro modifica
tudo. Compreendemos, então, que a Fenomenologia "[...] não é só um estilo de pensar, mas de
viver". (REZENDE, 1990, p. 77). Aprendemos Fenomenologia fazendo pesquisa
fenomenológica, em coerência com uma concepção de educação em que teoria e prática são
indissociáveis. Essa opção depende do pesquisador. Entretanto, destacamos, mais uma vez, que
a Fenomenologia não se reduz a métodos. Mais do que metodologia é um modo de assumir a
própria existência e de posicionar-se em face dos outros. Sendo a educação um processo de
imensa complexidade, imprevisível e sempre inacabado, consideramos que sua compreensão só
é viável através de pesquisas com abordagem qualitativa. Entre essas situa-se (sic) a
Fenomenologia, que exerce um fascínio especial sobre quem gosta de enfrentar desafios e
arriscar-se diante do desconhecido, na busca permanente do sentido, compreensão e abertura ao
mundo (METZLER et al ., 1994 apud ENGERS, 1994, p. 82).
8 A Dialética Materialista-Histórica na Pesquisa Educacional:
A Concepção Materialista:
[...] funda-se no imperativo do modo humano de produção social da existência (FRIGOTTO, 1989, p.76). O primeiro pressuposto de toda a história humana é naturalmente a existência de indivíduos humanos vivos. O primeiro fato a constatar é, pois, a organização corporal destes indivíduos e, por meio disto, sua relação dada com o resto da natureza. Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião, ou por tudo o que se queira. Mas eles próprios começam a se diferenciar dos animais tão logo começam a produzir seus meios de vida; passo esse que é condicionado por sua organização corporal (MARX; ENGELS, 1986, p. 27).
Categorias: Totalidade; contradição; mediação; ideologia; práxis, etc.
Método de análise:
a) Ao iniciarmos uma pesquisa, dificilmente temos um problema, mas uma problemática. O recorte que se vai fazer para investigar se situa dentro de uma totalidade mais ampla. b) No trabalho propriamente de pesquisa, de investigação, um primeiro esforço é o resgate crítico da produção teórica ou do conhecimento já produzido sobre a problemática em jogo. Aqui se podem identificar as diferentes perspectivas de análise, as conclusões a que se chegou pelo conhecimento anterior e a indicação das premissas do avanço do novo conhecimento. c) Feito o levantamento do material da realidade que se está investigando, necessita-se definir um método de organização para a análise e exposição. Trata-se de discutir os conceitos, as categorias que permitem organizar os tópicos e as questões prioritárias e orientar a interpretação e análise do material. d) A análise dos dados representa o esforço do investigador de estabelecer as conexões, mediações e contradições dos fatos que constituem a problemática pesquisada. Mediante este trabalho, vão-se identificando as determinações fundamentais e secundárias do problema. É no trabalho de análise que se busca superar a percepção imediata, as impressões primeiras, a análise mecânica e empiricista, passando-se assim do plano pseudoconcreto ao concreto que expressa o conhecimento apreendido da realidade. É na análise que se estabelecem as relações entre a parte e a totalidade. e) Finalmente busca-se a síntese da investigação. A síntese resulta de uma elaboração. É a exposição orgânica, coerente, concisa das "múltiplas determinações" que explicam a problemática investigada. Aqui não só aparece o avanço em cima do conhecimento anterior, mas também questões pendentes e a própria redefinição das categorias, conceitos etc. Na síntese, de outra parte, discutem-se as implicações para a ação concreta. Repõe-se aqui o ciclo da práxis, onde o conhecimento ampliado permite ou deveria permitir uma ação mais consequente, avançada, que por sua vez vai tornando o conhecimento ampliado base para uma nova ampliação. Por essa razão a pesquisa mantida como "segredo do pesquisador", ou dos pesquisadores, é uma dupla sonegação: não questiona e nem permite ser questionada e acaba não tendo, por isso, nenhum sentido histórico e político (FRIGOTO, 1989 apud FAZENDA, 1994, p. 87-89).
OUTROS TIPOS DE PESQUISA
É importante destacar que existem outros tipos de pesquisa que estão voltados para
questões mais específicas, como as pesquisas empíricas nas áreas da saúde, da linguagem, nas
ciências humanas e sociais, entre outras. Sugerimos estes outros enfoques na pesquisa para que
os acadêmicos tenham base metodológica para viabilizarem suas pesquisas, stricto e latu sensu ,
bem como as de graduação. Acrescentamos ainda a preocupação em oferecer aos professores-
orientadores uma proposta de material de apoio que eles podem somar aos que já apresentam
aos seus orientandos.
1 Amostragem:
Definição:
Chamaremos de universo ou população o conjunto de todos os seres (pessoas, objetos ou fatos) que apresentem pelo menos uma característica em comum. Se o número total de elementos for N, podemos designar a característica comum representada genericamente por X, de tal forma que assuma valores tais que: X = X1; X2; X3;... ; XN A amostra que é uma parte ou fração desse universo, com um número n de elementos, deve ser selecionada por um dos métodos que descreveremos adiante; de modo que, sendo o número de elementos da amostra n < N, a totalidade da amostra poderá ser representada por: x = x1; x2; x3;... ; xn
Ela deve ser, tanto quanto possível, representativa do universo de onde foi extraída. Para alcançar esse objetivo, utiliza-se em geral uma técnica probabilística, definida como aleatória ou de escolha "ao acaso". Nessas condições, a amostra presta-se para o tratamento estatístico dos dados (REY, 1998, p. 40).
Método:
Método aleatório simples - É aquele em que cada elemento de uma população tem a mesma probabilidade de ser escolhido para a amostra que os demais. A escolha requer prévia atribuição de números aos membros da população e posterior sorteio baseado, por exemplo, em uma tabela de números aleatórios. Amostragem estratificada - Ao submeter-se uma população a esse tipo de amostragem, divide-se a população em grupos homogêneos ou estratos. Em cada um deles, toma-se a amostra aleatória dos indivíduos que participarão do estudo. Amostragem por conglomerados (ou em cacho) - Em geral, não se dispõe de uma lista de indivíduos ou de unidades estatísticas sobre as quais seria feito o sorteio de amostragem. Mais fácil é ter-se o registro de grupos, ou de entidades em que os indivíduos estejam agrupados, tais como casas, escolas, hospitais, localidades etc. Amostragem aleatória por estágios múltiplos - Sempre que, pelo tamanho da população ou por outras circunstâncias, não for possível atribuir a cada elemento um número com que participe do sorteio, podemos optar por sorteios preliminares das áreas geográficas, das localidades, dos grupos ou conglomerados e, depois, numerar e sortear os membros dessas partes escolhidas que integram o universo (REY, 1998, p. 40-41).
2 Estudos Etiológicos:
Definição:
Compreendem não só pesquisas destinadas a estabelecer relações de causalidade (a etiologia de uma doença, por exemplo), como também a definir fatores de risco, pelos quais se podem, mesmo na ausência de um conhecimento da causa, identificar populações expostas a determinados riscos. Pode-se chegar lá, por exemplo, pelo estudo de dois fenômenos ou de dois fatores que se suponha possam ter relações estreitas. Assim, para se verificar a influência do alcoolismo sobre a frequência do câncer do esôfago, sugerida pela alta ocorrência da doença em países de grande consumo alcoólico, buscou-se estudar na França a distribuição geográfica dessa variedade de câncer e a do consumo de álcool, encontrando-se forte correlação positiva entre os dois fenômenos (REY, 1998, p. 41).
Estudos:
Estudos retrospectivos - Consistem em identificar os indivíduos com determinado problema (D) e compará-los com um certo número de outros indivíduos sem essa característica (não-D), através de questionários em que se procura relacionar D com fatores (f) suspeitos de serem causa ou contribuírem para a ocorrência de D. O estudo pode incidir sobre uma população completa (inquérito exaustivo) ou sobre uma amostra representativa, onde os fatores a serem investigados conservem uma distribuição aleatória. Em razão das dificuldades de se trabalhar com a totalidade de uma população e de seu alto custo operacional, prefere-se proceder à amostragem aleatória, com pequeno número de indivíduos de cada categoria escolhidos por sorteio. Estudos prospectivos - Partem da observação dos indivíduos com determinadas características (f), suspeitas de produzirem ou de contribuírem para o problema em estudo (D). Os pacientes serão futuramente examinados para a análise da correlação entre D e f, juntamente com outros indivíduos sem as mesmas características (não-f), utilizados para comparação. Um trabalho desse tipo consiste, por exemplo, no estabelecimento do diagnóstico de infecção por Trypanosoma Cruzi , em uma parte da população, e seguimento dos casos positivos e negativos para detectar o aparecimento de doença cardíaca, de megaesôfago ou de outros problemas, no fim de determinados prazos (REY, 1998, p. 42).
3 Experimental:
Definição: