









Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Este documento investiga o conceito de técnica e sua evolução histórica, baseado nos pensamentos de ortega y gasset e heidegger. Discutindo a técnica como satisfação de necessidades humanas, pulsão técnica e técnica como desvelamento da natureza, o texto também aborda a relação entre técnica e consumo de recursos naturais, e a possibilidade de uma técnica autossustentável.
O que você vai aprender
Tipologia: Slides
1 / 17
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Na busca por uma técnica que seja autossustentável, vamos investigar o próprio conceito de técnica. A técnica nasce da relação do homem com a natureza
que se limitará a viver sem bem-estar, pode vir a se suicidar ( Ibid ). O viver, no sentido biológico é uma noção unívoca, definida. Já a noção de bem-viver ou bem-estar, é equívoca – é uma noção variável, que se modifica ao longo do tempo e é diferente para cada sociedade. Buscando adaptar-se às ideias de bem-estar, a técnica está em constante transformação. Mas o que a técnica de fato possibilita é poupar esforço e tempo com as tarefas que se impõem primariamente ao homem. Facilitando a satisfação das necessidades básicas, a técnica possibilita a ele vivenciar seu lado não-natureza, realizar seu programa de existência, sua pretensão de ser, que poderá lhe trazer o bem-estar almejado. Pois o homem se caracteriza por esta capacidade de construir projetos de vida, sendo esta a principal característica que o diferencia dos animais. Para Gasset ( Ibid ), diferentemente dos animais, o homem não coincide plenamente com a natureza. Uma metade é natureza e vive – a outra metade transcende a natureza e, para ela, não basta viver, é preciso o bem-estar. A metade não-natureza é a que consideramos nosso verdadeiro ser, nossa personalidade, mas é algo não realizado, é um projeto, algo que quer ser. Nossa vida é o afã de realizar determinado programa de existência – o homem é uma pretensão de ser. Enquanto os outros animais já nascem sendo, o homem tem que se auto-fabricar, tem que se esforçar para que exista o que ainda não existe. A técnica nasce daquilo que um povo ou pessoa deseja ser. Trata-se de um desejo original pré-técnico, que está na base de toda invenção – primeiro, o homem deve saber o que quer se tornar. Em nome desse desejo, é desenvolvida a técnica. Assim, a origem da técnica reside no desejo humano de construir um projeto de vida que lhe trará o bem-estar. É essencial, então, a distinção que Gasset faz entre o viver, de ordem biológica – e o bem-estar, algo essencialmente humano, em nome do qual será criada a técnica. Na modernidade, ocorre uma potencialização da técnica. A fim de entender este fato, Gasset ( Ibid ) faz uma breve retrospectiva da técnica em nossa sociedade
2.2 Progresso técnico A partir das ideias de Ortega y Gasset sobre a história da técnica, vamos desenvolver um pouco mais a discussão sobre a evolução da técnica. Lendo A meditação sobre a técnica ( Ibid ), percebemos que pode ser feita uma associação entre a concepção de técnica moderna apresentada e o conceito de pulsão na psicanálise. Como vimos, para Gasset, a técnica não se limita à satisfação das necessidades básicas humanas, pois o ser humano aspira a algo mais, para além dessas necessidades. O ser humano busca o bem-estar, que é uma noção ampla, variável. De forma análoga à distinção de Gasset entre viver e bem-estar, na psicanálise é estabelecida uma distinção entre os conceitos de instinto e de pulsão. O instinto é uma noção biológica e tem um fim específico – um objeto para a sua satisfação, que pode ser a reprodução ou a alimentação, por exemplo. Nos animais, o instinto funciona como uma programação que reage sempre da mesma forma ao se defrontar com determinada configuração (MAGNO, 1986, p.20). Diante de um certo tipo de objeto que o animal está “programado” para reconhecer, ele tem uma reação determinada, e este objeto pode lhe trazer satisfação. Já a noção psicanalítica de pulsão se caracteriza pela ausência de um objeto determinado para sua satisfação. Trata-se de um impulso interno, que está na fronteira entre o mental e o somático, e que é constante, estando presente independente das circunstâncias. Ao contrário dos estímulos externos, dos quais se pode fugir ou se libertar com movimentos musculares, a pulsão segue fluindo continuamente, não havendo fuga possível. Assim, ela impõe difíceis exigências ao sistema nervoso, levando o homem a complexas atividades de interferência no mundo externo (FREUD, 1915). Diferentemente do instinto, que é satisfeito quando vai ao encontro de seu objeto, a pulsão é uma força constante que, por mais que encontre seu objeto, continua, paradoxalmente, insatisfeita. Pois, ao contrário do instinto, não há uma configuração que será sempre reconhecida – um objeto que levará à satisfação. O ser humano traz em si uma incompletude e não faz ideia do que a possa preencher (MAGNO, 1986). Portanto, a pulsão impede o sistema nervoso de se ver livre de
todos os estímulos, o que seria um estado ideal (FREUD, 1915). Será que a pulsão pode encontrar uma satisfação? Pode-se acreditar que a satisfação ocorra quando atinge a sua meta. Mas, como vimos, a pulsão permanece insatisfeita após atingir seu objeto. Pois o objeto da pulsão, afirma Freud ( Ibid ), não é o mais importante – ele é totalmente indiferente. Se não é o objeto da pulsão que lhe traz satisfação, deve haver alguma outra forma de contentamento. Para entender que tipo de satisfação seria essa, Lacan (1973) recorre à experiência clínica. Na análise, percebe-se que, apesar de o paciente estar infeliz, há um contentamento em seu estado de infelicidade. Apesar das reclamações do paciente, há um sistema que está fluindo perfeitamente bem e que gera uma forma de satisfação. É aí que Lacan faz a distinção entre aim (objetivo) e goal (meta) da pulsão. Ele utiliza os termos em inglês por acreditar que nesta língua a distinção fica mais clara. A meta é o fim almejado, enquanto o objetivo é o caminho tomado para se chegar lá, a trajetória (LACAN, 1973, p. 163). Por exemplo, se a meta for alimentar-se, o objetivo é o ato de comer. Mas, ao contrário do que possa parecer, o verdadeiro propósito da pulsão não é o de atingir sua meta, mas seu objetivo é reproduzir seu movimento circular ao redor da meta. É próprio ao humano a repetição de uma ação que nunca se completa, mas que, na repetição, o verdadeiro objetivo é atingido. A pulsão, na realidade, não aspira à plenitude, mas seu sucesso está em circular em torno do vazio. Assim, não é a satisfação de uma necessidade biológica que está em questão, mas é algo que vai além do biológico. A pulsão pode ser percebida em outras esferas, conforme sustenta Zizek (2008), que apresenta a ideia da pulsão capitalista. Para ele, o capitalismo está constantemente criando desejo de consumo, promovendo faltas, gerando um ambiente de crescentes trocas monetárias. E a pulsão faz parte do capitalismo, pois o objetivo maior em todas as negociações, compras e criação de desejos é a continuidade da circulação de capital, gerando um movimento circular de expansão e auto-reprodução. Entramos no modo de pulsão no momento em que a circulação de dinheiro como capital se torna um fim em si, pois a expansão de valor só ocorre dentro desse movimento constante e renovado. ( Ibid , p.89) Sendo assim, não podemos ver na técnica moderna o modo de
sociedades primitivas, a técnica costuma ser mais estável, não havendo anseio por novas conquistas – para elas, não faria sentido buscar mais. Não são sociedades da incompletude ou da falta, como muitos pensadores queriam anteriormente – são sociedades que escolhem não produzir mais se já têm o suficiente – elas se recusam a buscar mais. Para Clastres ( Ibid ), não se pode falar de inferioridade técnica das sociedades primitivas com relação à sociedade industrial. Para ele, a técnica deve ser vista como uma forma de dominar o meio natural e adaptá-lo à satisfação das necessidades humanas. Assim, as sociedades primitivas não seriam inferiores, uma vez que sabem bem como satisfazer suas necessidades através do domínio da natureza. Ademais, não teriam por que aprimorar sua técnica, uma vez que, com três ou quatro horas diárias de trabalho, já satisfazem as suas necessidades e podem dedicar-se ao lazer. Pierre Clastres ( Ibid ) lembra que o antropólogo Marshall Sahlins considerou serem estas as primeiras sociedades do lazer e da prosperidade. Sahlins (1966) acredita que, na sociedade moderna, deseja-se muito e espera-se que a produção industrial crescente satisfaça estes desejos. Desta forma, a sociedade está constantemente produzindo escassez. Já as sociedades nômades poderiam ser consideradas prósperas por desejarem pouco, ficando assim facilmente satisfeitas. Para Sahlins ( Ibid ), o fato de a técnica das sociedades nômades ser mais simples, não significa que elas tenham maior escassez – pois com poucos instrumentos de fácil fabricação, eles já são capazes de conseguir seu alimento. E, para tais sociedades, quanto menos, melhor, já que não é bom carregar muito peso em suas caminhadas constantes. Assim, a acumulação de objetos não é associada a uma elevação de status. Percebemos, então, que as sociedades primitivas não entraram na pulsão técnica – este movimento de desenvolvimento infinito de suas possibilidades. A sociedade industrial está em um processo de desenvolvimento constante da técnica; e podemos afirmar que não é uma técnica da abundância, mas da escassez
estabelecidas algumas metas de pesquisa, o verdadeiro objetivo é o desenvolvimento constante de técnicas. Isso pode ser visto no LILD, em que o mais importante é o ato de pesquisar técnicas e não atingir as metas – frequentemente, quando atingimos uma meta, começamos o trabalho novamente, para pesquisar outra possível técnica a ser usada naquele caso. Por outro lado, esta 'pulsão técnica' pode ser relacionada ao movimento de constante crescimento no consumo de recursos naturais que ocorre no mundo contemporâneo (e do qual falamos no capítulo anterior). Ao contrário da técnica da abundância, das sociedades primitivas, a técnica na sociedade industrial está sempre em desenvolvimento, havendo uma substituição constante de um produto por outro. Neste sentido, podemos até nos questionar: se percebermos a técnica como uma pulsão, haveria como ela ser autossustentável, limitar-se ao uso de poucos recursos locais? Para além da questão da sustentabilidade, o progresso técnico tem também uma dimensão social. Milton Santos (2000) defende que as técnicas contemporâneas são usadas de forma perversa pelas corporações, criando desigualdades, de forma que apenas uma minoria tem acesso a todas as possibilidades das tecnologias ( Ibid , p.20). Todas as possibilidades que as novas técnicas trouxeram, em termos de comunicação, transporte e conhecimento de mundo, são apresentadas como um grande benefício para toda a humanidade. Mas estas técnicas estão a serviço do lucro, e as diferenças locais são aprofundadas. No entanto, para o geógrafo, essa perversidade não é intrínseca às técnicas
elas parecem ser sociedades sem progresso, permanecendo indefinidamente em seu estado inicial. À medida que o mundo foi tornando-se globalizado, essa diferença social se expressou também como o domínio de uma nação sobre a outra. E se esta grande diferença social constitui o mecanismo que possibilita o movimento de progresso, cabe perguntar se as atuais tecnologias poderiam ter surgido em uma sociedade igualitária. Ou ainda – se poderiam continuar a existir em um mundo sem fortes diferenças sociais, como quer Milton Santos. A questão do progresso técnico suscita, de fato, questões complexas. Não pretendemos respondê-las, mas, se queremos construir uma técnica ambientalmente sustentável e socialmente justa, não podemos deixar de ter em mente a série de paradoxos contidos neste ideal. 2.3 A técnica como desvelamento da natureza O tipo de pensamento de Gasset, que percebe a técnica como um meio para um fim, como um instrumento para se realizar um projeto, é questionado por Martin Heidegger. No conferência “A questão da técnica”, Heidegger (1953) se propõe a questionar a técnica, vendo o que ela não é e qual seria a sua essência. Para Heidegger, podemos entender a técnica a partir da palavra grega téchne , que significa ter conhecimentos na produção. No entanto, a produção não deve ser entendida como uma operação, uma elaboração, mas um deixar acontecer
desenvolvidas. Este questionamento de Heidegger serve tanto para as técnicas tradicionais como para as modernas. Mas, para o filósofo, na técnica artesanal, há uma verdadeira revelação da phisis^2 , enquanto a técnica moderna não tem tanto o caráter de deixar a coisa acontecer, se apresentar – aí o desencobrimento ocorre como uma forma de exploração da natureza – é uma forma de interpelação. Para o homem moderno, desocultar é tirar proveito. A natureza é vista como um reservatório de energias a ser explorado (CRITELLI, 2002). A extração desmedida de petróleo, por exemplo, pode ser vista como uma forma de o homem desvelar a natureza para explorá-la. O petróleo poderia ter outros usos que a natureza ainda pudesse vir a revelar, em que poderiam ser usadas quantidades menores – em vez de ser extraído em grandes quantidades, poderiam ser descobertos outros potenciais. Heidegger vê a origem da técnica na Grécia antiga, quando ela começa a ser pensada como tal. Mas, naquela época, a técnica provinha diretamente da phisis , que abrangia e englobava tudo – as coisas surgiam e eram produzidas a partir dela, dispensando processos de fabricação planejados. A técnica era um saber dos processos naturais, era apenas auxiliar aos processos da phisis. A medicina, por exemplo, era considerada uma técnica, mas o médico não curava – a cura vinha da phisis. O médico apenas possibilitava o aparecimento da phisis saudável em um corpo doente. Da mesma forma, o artesão nada criava, mas deixava surgir seu objeto a partir da phisis. Os gregos viam na phisis toda a sua potência, usando a técnica apenas para auxiliar o processo natural das coisas. (RÜDIGER, 2006) Na técnica da Grécia antiga, ocorria um processo de desvelamento em uma multiplicidade de desdobramentos possíveis. A técnica se revelava em diferentes áreas – nas artes, na medicina, na oratória. Na técnica moderna, acontece a multiplicação do mesmo, uma uniformização, um desvelamento baseado no cálculo. O pensamento técnico moderno procura fixar e controlar, criando situações previsíveis e de resultados sempre iguais. ( Ibid ) Para o filósofo, a técnica moderna está na essência do pensamento 2 Phisis , do grego antigo, é um conceito mais amplo do que natureza – é toda a realidade e matéria do universo, em constante movimento e transformação
da racionalidade produtiva, em que havia maior contato com o ser. As técnicas artesanais, como vimos, são uma forma mais direta de revelação do potencial da natureza. A presença mais direta da natureza nas técnicas artesanais também é percebida por Ezio Manzini, em “A matéria da invenção” (MANZINI, 1993). Para ele, antes da Revolução Industrial e das criações materiais da tecnociência, a natureza estava muito mais presente e visível nos produtos. Os nós da madeira e veios da pedra eram características com as quais o artesão aprendia a lidar – os materiais naturais usados tinham características já conhecidas. Atualmente, frequentemente pegamos um objeto e não sabemos do que ele é feito – a tecnociência foi criando novos materiais e beneficiando-os, de forma a torná-los homogêneos e de fácil manipulação. Ainda não conhecemos bem todas as características dos novos materiais criados, mas sabemos que os nossos produtos não têm mais as limitações dos materiais naturais, mas têm muito mais possibilidades. Este crescente distanciamento da matriz natural, vista com bons olhos por muitos designers, por ampliar as possibilidades criativas, certamente não seria bem visto por Heidegger. Pois a natureza está cada vez mais dominada pela racionalidade produtiva, transformada em materiais facilmente manipulados industrialmente, materiais frutos do pensamento calculante. Para finalizar, devemos acrescentar que o pensamento de Heidegger, com sua forte crítica à técnica moderna e ao pensamento calculante, serviu de inspiração para correntes da ética ambiental. Trata-se de um pensamento de crítica ao antropocentrismo – o homem já não pode ser visto como medida de todas as coisas. Para a ética ambiental, a natureza não pode mais ser vista como objeto sem substância, desprovida de direitos e valores, encarada matematicamente, de forma a ser manipulada. A natureza deve ser vista como sujeito, em toda a sua plenitude, e com direitos a serem respeitados. 2.4 A autossustentabilidade e a técnica que usa recursos locais Sabemos que a sustentabilidade é um assunto polêmico, cujos parâmetros não são consensuais. Neste trabalho, não pretendemos abranger todo o problema,
mas refletir sobre como o design pode ter uma interação com o ambiente de uma forma mais autossustentável. O termo sustentável é definido, de uma maneira ampla, como aquilo que pode ser mantido ao longo do tempo. Neste trabalho, falamos em autossustentabilidade como a capacidade de um sistema se manter ao longo do tempo, em um espaço limitado, sem precisar de recursos vindos de fora. Estes conceitos são, naturalmente, relativos, já que sabemos que, de qualquer forma, a terra não durará para sempre e que a própria luz solar é um recurso vindo de fora. Mas há algumas condições básicas para que uma sociedade possa reproduzir-se ao longo dos séculos. É importante que a sociedade não utilize recursos que são essenciais para o seu funcionamento de forma desmedida. Deve haver uma progressiva redução no uso dos recursos não-renováveis, dos quais a sociedade depende, de forma que, à medida que o recurso se esgote, a sociedade deixe de precisar dele. Os recursos renováveis utilizados não podem ser consumidos em um ritmo mais acelerado do que seu ritmo de reposição natural. E as substâncias emitidas pelas atividades humanas devem se ater a uma quantidade que a biosfera possa reabsorver sem problemas (HEINBERG, 2007). Uma fonte para o conhecimento sobre a sustentabilidade nas comunidades humanas é estudo de sociedades que podem ser consideradas sustentáveis, por um lado, e de sociedades insustentáveis, por outro. Muitas sociedades no passado não puderam se sustentar, devido ao uso indiscriminado de recursos, e entraram em colapso, sofrendo grande redução populacional e perda da complexidade social ( Ibid ). Em busca de se atingir a sustentabilidade das sociedades humanas, é preciso que haja uma abordagem sistêmica. Nas produções, o foco não deve ser apenas em um objeto ou processo, mas nas diferentes relações que se estabelecem. Em uma produção sustentável, idealmente, todos os resíduos e emissões liberados em um processo servem de matéria-prima e energia em outro processo. Desta forma, não haveria geração de lixo e liberação de substâncias poluentes, da mesma forma como acontece em ecossistemas em estado de equilíbrio. A sustentabilidade busca a criação de sistemas que, de alguma forma, mimetizem a
E, como dissemos anteriormente, a técnica tem, na era moderna, um movimento que denominamos “pulsão técnica”, por estar em um aprimoramento constante e ter como objetivo o próprio desenvolvimento técnico. Este movimento, conforme também vimos, pode ser percebido em lugares de pesquisa, como o LILD, onde o desenvolvimento contínuo da técnica é o objetivo maior. Desta forma, podemos nos perguntar se, em nosso caso, o movimento de pulsão técnica pode ser usado a nosso favor em busca de uma técnica que demande cada vez menos recursos importados, uma técnica que interaja de forma autossustentável com o meio-ambiente. No nosso caso, estamos em busca de uma técnica simples, com meios mais limitados do que as técnicas industriais. Dificilmente chegaremos a uma técnica que não use nenhum recurso vindo de fora, mas estaremos em um constante esforço em direção a este ideal, sempre buscando um aprimoramento. Desta forma, a meta do trabalho é chegar a uma técnica de uso exclusivo de recursos locais – mas seu objetivo é reproduzir este movimento de tentativas e experimentações constantes com os materiais. Teremos isto em mente ao realizar as experimentações práticas. Mas, se, por um lado, estamos em busca de um ideal, por outro, a técnica que queremos desenvolver vai partir do meio-ambiente ao nosso redor. Neste sentido, ela será um desvelamento da natureza local, uma investigação de como podemos trabalhar com esta natureza, como manuseá-la para produzir algo. No nosso trabalho não visamos apenas o fim – visamos o meio. Investigaremos as possibilidade de nosso contexto e perceberemos como nossa produção vai interagir com as pessoas presentes no local. O mais importante aqui, então, não é apenas o fim, até porque não vamos apresentar objetos de design completos, mas explorar as possibilidades que o meio pode nos oferecer. Assim, a 'escuta da natureza' de que fala Heidegger é essencial, percebendo todas as suas potencialidades. Visto de forma mais ampla, o processo de desvelamento também pode ocorrer com objetos industrializados. Em um material que seria jogado fora, pode-se perceber o potencial para torná-lo outra coisa. Além disso, como vimos, para Heidegger, a técnica original da phisis tem
uma multiplicidade de desdobramentos possíveis. Não é uma técnica de repetição contínua e uso controlado de um material. Entendemos que cada material tem muitos potenciais a serem descobertos. Se pretendemos trabalhar com os materiais presentes no nosso meio, é importante saber perceber estes diferentes potenciais, a fim de aproveitar ao máximo o que temos. A visão de técnica de Heidegger também tem certa afinidade com a metodologia de trabalho do LILD. A pesquisa no LILD envolve a manipulação direta dos materiais e prioriza o uso de materiais naturais e não processados industrialmente. O trabalho direto com estes materiais, como coloca o ex- pesquisador do LILD Luciano Alvares “pode ajudar no entendimento destes materiais e estabelecer novas possibilidades de manipulação e uso dos mesmos.” (ALVARES, 2008, p. 14). Este contato direto, de fato, pode nos mostrar mais sobre a potencialidade dos materiais – cada material não precisa ser usado sempre para o mesmo fim já consagrado, mas podemos descobrir mais com ele. É uma metodologia diferente da que costuma acontecer nos cursos de arquitetura e design, que priorizam a forma e a funcionalidade, não havendo contato direto com os materiais. Se quisermos chegar à técnica como manifestação da phisis , de que fala Heidegger, é preciso manipular os materiais da natureza diretamente. A partir daí, a própria natureza conduzirá a técnica. Mas, para que ocorra o desvelamento da natureza, é preciso ter um conhecimento prévio acerca da técnica que se quer desenvolver. Sem ter qualquer noção prévia, é muito difícil saber escutar a natureza. Antes de falarmos sobre nossa pesquisa prática no laboratório, vamos debater, no próximo capítulo, um pouco sobre as diferentes técnicas e movimentos que se relacionam com a técnica que queremos desenvolver.