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Calabar – o elogio da traição, de Chico Buarque e Ruy Guerra, Notas de estudo de Radiografia

Calabar – o elogio da traição, de Chico Buarque e Ruy Guerra - Uma Radiografia Estética dos Anos de Chumbo. Christian Alves Martins – PPG-UFU. A mais bela.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Kaka88 🇧🇷

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Calabar – o elogio da traição, de Chico Buarque e Ruy Guerra - Uma Radiografia Estética
dos Anos de Chumbo
Christian Alves Martins – PPG-UFU
A mais bela
De todas as certezas
É quando os fracos
E desencorajados
Levantam suas cabeças
E deixam de crer
Na força de seus
opressores.
Bertold Brecht
Nosso trabalho tem como principal objetivo a análise da peça teatral Calabar o
elogio da traição (1973), texto escrito por Chico Buarque de Hollanda em parceria com o
cineasta Ruy Guerra, com o fim de descortinar a historicidade presente na peça. Em
verdade, nossa proposta é compreender o passado através da arte. Para tanto, a obra
Calabar – O elogio da traição será adotada como nosso documento central, subsidiado por
coerente revisão bibliográfica envolvendo a linha Teatro e História.
Fruto de exaustiva pesquisa histórica, os autores da peça fazem uma verdadeira
“viagem” até o Nordeste do século XVII, durante as Invasões Holandesas, para revisar a
história de Domingos Fernandes Calabar, considerado traidor por abandonar o front
português, e passar para o lado dos invasores batavos.
ANPUH – XXIII SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – Londrina, 2005.
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Calabar – o elogio da traição, de Chico Buarque e Ruy Guerra - Uma Radiografia Estética dos Anos de Chumbo

Christian Alves Martins – PPG-UFU

A mais bela De todas as certezas É quando os fracos E desencorajados Levantam suas cabeças E deixam de crer Na força de seus opressores.

Bertold Brecht

Nosso trabalho tem como principal objetivo a análise da peça teatral Calabar – o elogio da traição (1973), texto escrito por Chico Buarque de Hollanda em parceria com o cineasta Ruy Guerra, com o fim de descortinar a historicidade presente na peça. Em verdade, nossa proposta é compreender o passado através da arte. Para tanto, a obra Calabar – O elogio da traição será adotada como nosso documento central, subsidiado por coerente revisão bibliográfica envolvendo a linha Teatro e História. Fruto de exaustiva pesquisa histórica, os autores da peça fazem uma verdadeira “viagem” até o Nordeste do século XVII, durante as Invasões Holandesas, para revisar a história de Domingos Fernandes Calabar, considerado traidor por abandonar o front português, e passar para o lado dos invasores batavos.

Que tipo de traição, estaria sendo elogiada na peça? Afinal, quais são os traidores da pátria? Na década de 1970, o que significava ser herói ou traidor? Em verdade, a peça é uma alegoria histórica que aborda a questão do patriotismo e da traição, numa clara alusão à conjuntura política do período em que foi escrita. Para tanto, os autores utilizam a relação passado/presente entre o Nordeste do século XVII e o Brasil do início da década de 1970. Para este Simpósio, propomos fazer um recorte a partir deste projeto maior, com o intuito de refletir sobre as linguagens estéticas que a publicação da peça utilizou, como as artes plásticas, o texto dramático e a música/poesia, como forma de compreender o momento histórico na qual ela foi escrita. De início, a capa do livro já traz muitos códigos repletos de significados. Um velho muro, de aspecto lúgubre, pichado com a palavra “Calabar” e cores bem sombrias foi encomendado pelos autores da peça à pintora e desenhista carioca, Regina Vater. A capa esta impregnada de representações simbólicas que possuem fortes relações com as lutas de poder travadas naquele tempo. Chartier escreve que todo historiador trabalha com uma representação do real: o documento. Contudo, este conceito é ampliado quando a representação denota a substituição do ausente, como um artefato, uma escultura ou uma montagem teatral, que possa representar a historicidade de seu tempo, produzindo práticas sociais e combates políticos, pensando no campo simbólico o palco de lutas. Sobre isto ele assevera que: Numerosos foram os trabalhos de história que manipularam recentemente a noção de representação. Há duas razões para isso. De um lado, o recuo da violência, que caracteriza as sociedades ocidentais entre a Idade Média e o século XVIII e que decorre da confiscação (ao menos tendencial) do monopólio sobre o emprego legítimo da força pelo Estado, faz com que os confrontos sociais fundados sobre os afrontamentos diretos, brutais, sangrentos, cedam cada vez mais o lugar a lutas que têm por armas e por fundamentos as representações. De outro lado (...) definiu-se assim uma história das modalidades do fazer-crer e das formas da crença, que é

Todas as músicas compostas em parceria com Ruy Guerra, exclusivamente para a peça teatral, formam uma verdadeira simbiose com o texto dramático e naturalmente carregam marcas da época em que foram produzidas, como é o caso da música Vence na Vida Quem Diz Sim em que se discutem temas candentes daquele período como liberdade, tortura e traição:

Vence na vida quem diz sim. Vence na vida quem diz sim. Se te dói o corpo, Diz que sim. Torcem mais um pouco, Diz que sim. Se te dão um soco, Diz que sim. Se te deixam louco, Diz que sim. Se te babam no cangote, Mordem o decote, Se te alisam com o chicote, Olha bem para mim. Vence na vida quem diz sim, Vence na vida quem diz sim^3.

Ou então a emblemática Fado Tropical, com seus arranjos melancólicos e melodias lusitanas, que fala sobre patriotismo, autoritarismo e ingratidão:

Oh, minha mãe gentil. Te deixo, consternado,

No primeiro abril. Mas não sê tão ingrata, Não esquece quem te amou. E em tua densa mata Se perdeu e se encontrou Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal, Ainda vai tornar-se um imenso Portugal^4.

Assim, seja na imagem, no texto ou na música, ficam patentes as representações de seu tempo, observadas na peça, através destas linguagens artísticas. Isto corrobora para nosso estudo de que os autores, como afirmou Chico “falava através de personagens, enxergava através de outros olhos”^5 o contexto em que viviam, através da obra em análise. Notas

  1. CHARTIER, Roger. À Beira da Falésia: A História entre Certezas e Inquietude. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2002., p. 94-
  2. Ibid., p. 90
  3. Ibid., p. 80.
  4. Ibid., p. 14
  5. BUARQUE, Chico. Chico Buarque completa 50 anos amanhã. Folha de São Paulo, São Paulo, junho de 1994. Disponível em: http://www.chicobuarque.com.br. Acesso em 06 jun. 2005.