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Este texto oferece uma reflexão crítica sobre a crônica no brasil, seu significado, natureza e desenvolvimento na literatura brasileira. O autor discute a variedade e flexibilidade do gênero, classificando-o em quatro tipos: crônica diálogo, crônica narrativa, crônica dos jesuítas e crônica mundana. Além disso, ele aponta alguns cronistas importantes na história da crônica no brasil, como pero vaz de caminha, joão do rio e machado de assis.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de aula
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Juiz de Fora, v. 9, n. 17, jan./jun. 2010
Aspectos da crônica no Brasil: uma reflexão crítica, p.133 - 142
William Valentine Redmond (CES/JF)
RESUMO A crônica em geral, a sua natureza, o seu desenvolvimento e o seu significado na literatura do Brasil. Palavras-chave: Crônica. Natureza. Desenvolvimento
ABSTRACT The literary form of the chronicle in Brazil, its nature and its development. The place it has acquired in the literature of Brazil. Keywords: The chronicle. Nature. Development.
Artigo recebido em: 11/11/ Aceito para publicação:21/12/
Verbo de Minas: letras
William Valentine Redmond
A crônica, em seu sentido geral, é um breve comentário sobre algum fato do cotidiano. Trata-se de um gênero literário produzido para ser veiculado na imprensa, de finalidade utilitária, com o objetivo de agradar aos leitores dentro de um espaço de mesma localização. Poética ou irônica, seu motivo são os pequenos acontecimentos: a notícia em que ninguém prestou atenção, cenas do cotidiano, tudo o que é corriqueiro, criando-se, assim, no transcurso do tempo - dias, semanas - uma familiaridade entre o escritor e aqueles que o leem. Porém, existe muita controvérsia sobre a natureza, a definição e o significado da Crônica. Algumas sugestões de definições mostram essa complexidade. “Peça literária em prosa, de pequena extensão, que versa o dia-a-dia”. (ROCHA, 1996, p.178). Aqui, a ligação com a literatura é evidente, bem como a identificação temática. No entanto, é aconselhável afirmar que a temática é sempre o cotidiano? Mesmo entre aqueles que a produzem, não há um acordo. Na abertura do livro da série Para gostar de ler : Porta de colégio e outras crônicas, Affonso Romano de Sant’Anna discorre sobre o que é ser cronista:
O que é um cronista? Luís Fernando Veríssimo diz que o cronista é como uma galinha, bota seu ovo regularmente. Carlos Eduardo Novaes diz que crônicas são como laranjas, podem ser doces ou azedas e ser consumidas em gomos ou pedaços, na poltrona de casa ou espremidas nas salas de aula. Já andei dizendo que o cronista é um estilista. Não confundam, por enquanto, com estilista. Estilista era o santo que ficava anos e anos em cima de uma coluna, no deserto, meditando e pregando. [...] O cronista é isso: fica pregando lá de cima de sua coluna no jornal. [...] Que tipo de crônicas escrevo? De vários tipos. Conto casos, faço descrições, anoto momentos líricos, faço críticas sociais. Uma das funções da crônica é interferir no cotidiano. (1995, p. 3-4)
Reafirma-se que é impossível classificar a crônica de forma fechada, visto que sua estrutura variada e variável a caracteriza como um tipo de texto adequado à sociedade contemporânea. Antonio Candido (1992), importante estudioso da crônica, contribui para este estudo e sugere uma classificação para o gênero, apontando quatro tipos de crônicas:
Verbo de Minas: letras
William Valentine Redmond
um cronista, oferecendo-lhe a matéria para o texto que seria considerado a certidão de nascimento do país. Caminha (1999, p. 11) buscou a fidelidade ao relatar os fatos:
Senhor. Mesmo que o Capitão-mor desta vossa frota e também os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento desta vossa Terra Nova que, agora, nesta navegação se achou, não deixarei, também, de dar disso minha conta a Vossa Alteza, tal como eu melhor puder, ainda que para bem contar e falar o saiba fazer pior que todos. Mas tome Vossa Alteza minha ignorância por boa vontade; e creia, como certo, que não hei de pôr aqui mais que aquilo que vi e me pareceu, nem para aformosear nem para afear.
Segundo alguns historiadores e críticos literários, a Carta de Caminha pode ser considerada o marco inicial da crônica no Brasil, levando-se em conta que essa narrativa, enquanto relato histórico, possui características próprias da crônica. Outros cronistas portugueses além de Caminha noticiaram aos europeus o aspecto exótico e as possibilidades de exploração das terras brasileiras. Destacam-se, entre eles, Pero Lopes de Souza, Pero de Magalhães Gândavo e Gabriel Soares de Souza. Em paralelo à crônica narrativa dos aspectos gerais dos novos territórios, existe a crônica dos jesuítas, cujos precursores foram Manuel da Nóbrega, Fernão Cardim e José de Anchieta – missionários e religiosos que tinham como objetivo principal documentar os passos da catequese indígena. No sentido histórico da palavra, podemos designar como crônicas todos os textos produzidos por eles. Em 1854, José de Alencar passa a assinar a série “Ao correr da pena” a convite do amigo Francisco Otaviano para ser folhetinista do Correio Mercantil. Aos 25 anos, Alencar, em um de seus primeiros textos, inquieto diante da angústia de ver uma nova semana começar, imaginando o trabalho que virá pela frente, diante da sucessão de fatos a serem comentados no domingo seguinte: saraus, bailes, além das notícias, após fazer um breve relato da inauguração do Jockey Club, faz considerações acerca do folhetim com alguma ironia, assim compreendido como a crônica dominical. Os textos tinham características mais informativas, relatando fatos e acontecimentos da sociedade. Resumia-se o texto a “um rodapé onde eram publicados
Juiz de Fora, v. 9, n. 17, jan./jun. 2010
Aspectos da crônica no Brasil: uma reflexão crítica, p.133 - 142
pequenos contos, pequenos artigos, ensaios breves, poemas em prosa”. (SÁ, 1985, p. 8). A partir do século XIX, João do Rio (pseudônimo de Paulo Barreto), que simbolizou uma outra fase da crônica no Brasil, é apontado por Sá (1985, p. 9) como o responsável pela roupagem literária que caracterizou a crônica desde então:
João do Rio consagrou-se como cronista mundano, que, ao invés de um simples registro do formal, fazia o comentário dos acontecimentos que tanto podiam ser do conhecimento público quanto da imaginação do cronista, tudo examinado pelo ângulo da recriação do real. Ele inventava personagens e dava aos seus relatos um toque ficcional.
Em estudos de Coutinho (2003, p. 121-127) há o esclarecimento de que os pequenos contos, poemas em prosa, ensaios breves e outras séries de gêneros apresentados tinham como destino informar os acontecimentos do dia ou da semana, mas sem a característica jornalística das outras seções do jornal e muito menos o olhar crítico e o conteúdo político das crônicas de Machado de Assis que se destinavam a tecer comentários irônicos e, muitas vezes, divertidos sobre as principais notícias políticas e econômicas da semana. Então, por trás dessa aparente despretensão, o objetivo do autor era conquistar a confiança por meio do riso para depois rompê-la, fazendo assim, do leitor, uma vítima do próprio riso do qual compartilha. Machado de Assis, em 1859, indicado por Quintino Bocaiúva, entrou para a redação do Diário do Rio de Janeiro , onde exerceria as funções de cronista. Escreveu na Semana Ilustrada (1860-1875), n’ O Futuro (1862), na Ilustração Brasileira (1876-1878), no Cruzeiro (1878) e, por fim, na Gazeta de Notícias , a partir de
Juiz de Fora, v. 9, n. 17, jan./jun. 2010
Aspectos da crônica no Brasil: uma reflexão crítica, p.133 - 142
Braga é conhecido como um dos cronistas brasileiros que conheceram com profundidade a importância dos mínimos detalhes do quebra-cabeça da vida. Dotado de uma sensibilidade notável e um aguçado lirismo reflexivo, escreveu contos, novelas e romances, ocupando um lugar de destaque na história da crônica brasileira. A Semana de Arte Moderna, de 1922, incitou um movimento de brasilidade, favorecendo a produção da literatura local e valorizando os assuntos e estilos referentes ao Brasil. Nesse momento, ocorreram as principais alterações no processo textual da crônica. Nos textos, as temáticas e a linguagem foram se aproximando da realidade nacional. E a partir dessa realidade, toda a imprensa brasileira foi influenciada pelas alterações linguísticas e aderiu à simplicidade nos textos. Os escritores, estimulados, tiveram uma nova visão, deixaram de lado o estilo discursivo e formal dos textos e passaram a produzir suas obras em linguagem coloquial. Nas décadas de 40 e 50, Fernando Sabino e Paulo Mendes Campos, influenciados pela nova tendência modernista, beneficiaram-se da nova roupagem da crônica brasileira que deixa de ser um comentário argumentativo e expansivo e passa à conversa fiada, mantendo um ar despreocupado. Entretanto, apresentam uma escrita belíssima, criativa e liricamente literária, deixando transparecer, por meio de seus textos, uma simplicidade muito significativa. O fato de escrever crônicas parece obrigar o cronista a estabelecer uma comunhão com seu meio e produzir um ar familiar. Assim, por meio da singularidade e da diferença, consegue sutilmente aproximar-se de seu leitor e fazer parte do ritual cotidiano. Além disso, consegue incorporar a visão do leitor, dando-lhe oportunidade de captar o perfil do mundo e dos homens. É admirável a comunhão entre o leitor e o cronista. A crônica brasileira explora uma linguagem lírica, irônica, casual, ora precisa, ora vaga, amparada por um diálogo rápido e certeiro. Registra o circunstancial e o efêmero; o real é recriado com engenho e arte. Cultiva a função poética da linguagem, imprime leveza ao discurso, revela e valoriza, na visão do autor, a crítica de um momento histórico, atenuando o vínculo de temporalidade que eterniza o texto. A crônica, por possuir uma linguagem que se aproxima do modo de ser mais natural das pessoas, age como uma quebra monumental e dá
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ênfase aos fatos, apresentando uma singularidade insuspeitável. Estende-se, notadamente, às outras formas literárias, tais como livros, revistas, telejornais, entre outros, podendo-se afirmar que é apreciada por ilustres e consagrados escritores. No texto “Há mil e tantas crônicas”, publicado em O Globo, em 5 de novembro de 1978, Artur da Távola (1985 p. 54) faz referência ao gênero, afirmando:
A crônica é (e será) a leitura do futuro: compacta, rápida, direta, aguda, penetrante, instantânea (dissolve-se com o uso diário). [...] A crônica é um hiato, uma interrupção da notícia, um suspiro da frase, um desabafo do parágrafo, um relax do estilo direto e seco da escrita do jornal, do qual se arroga ser o hiato literário, a literatura do jornal. O jornalismo da literatura. Literatura jornalística. Uma pausa de subjetividade, ao lado da objetividade da informação. Um instante de reflexão, diante da opinião peremptória da editoria.
Assim, a partir das considerações apresentadas, pode-se afirmar que, historicamente, desde o século XIX, há poucas mudanças na estrutura da crônica, pois não há uma regra para a redação desse tipo de texto formalmente elaborado. Entre as primeiras crônicas de Machado de Assis e as mais recentes de Veríssimo, por exemplo, há elementos muito próximos que vão além da temática, apesar de todas as mudanças ocorridas na sociedade brasileira desde os seus primórdios. Machado de Assis (1994, p. 10) assim se expressa sobre a origem da crônica:
Não posso dizer positivamente em que ano nasceu a crônica; mas há toda a probabilidade de crer que foi coletânea das primeiras duas vizinhas. Essas vizinhas, entre o jantar e a merenda, sentaram-se à porta, para debicar os sucessos do dia. Provavelmente começaram a lastimar-se do calor. Uma dizia que não pudera comer ao jantar, outra que tinha a camisa mais ensopada do que as ervas que comera. Passar as ervas às plantações do morador fronteiro, e logo às tropelias amatórias do dito morador, e ao resto, era a coisa mais fácil, natural e possível do mundo. Eis a origem da crônica.
Ao analisar alguns aspectos da crônica, pode-se afirmar que se trata de um gênero brasileiro, considerado por muitos um gênero menor e maior. Menor pela sua origem, características e classificação de alguns estudiosos em literatura. A crônica é quase sempre um texto curto, apressado, redigido
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REFERÊNCIAS
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BRAYNER, Sônia. Machado de Assis: um cronista de quatro décadas. In: CANDIDO, Antonio. A crônica, o gênero e suas fixações no Brasil. São Paulo: UNICAMP, Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1992. p 407-
CAMINHA, Pero Vaz. Carta ao Rei Dom Manuel. 2. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1999.
CANDIDO, Antonio. A vida ao rés-do-chão. In: ANDRADE, Carlos Drummond de et al. Para gostar de ler : crônicas. São Paulo: Ática, 1980. v. 5, p. 5-23.
______. A vida ao rés-do-chão. In: ______. A crônica : o gênero, sua fixação e suas transformações no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1992. p.13-23.
COUTINHO, Afrânio. A literatura no Brasil: relações e perspectivas. 6. ed. Rio de Janeiro: Global, 2003.
PORTELLA, Eduardo. Visão prospectiva da literatura brasileira. In: ______. Vocabulário técnico da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Ouro, 1979. p. 23-44.
SÁ, Jorge de. A crônica. 2. ed. São Paulo: Ática, 1985.
SANT’ANNA, Affonso Romano de. Para gostar de ler: porta de colégio e outras crônicas. São Paulo: Ática, 1995. v. 16.
TÁVOLA, Artur da. Ser jovem. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
VERÍSSIMO, Luís Fernando. Comédias da vida privada: 101 crônicas escolhidas. Porto Alegre: L&PM, 1982.