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Uma análise detalhada das classes formais no português, incluindo as classes i, ii e iii, e o papel das vogais atonas finais em relação a elas. Além disso, discute-se a relação entre gênero e classe formal, e a importância da morfologia distribuída na identificação dessas classes.
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Tipologia: Notas de aula
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As classes formais do português brasileiro 5 LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE LETRAS DE HOJE
Cíntia da Costa Alcântara UFPel RESUMO – Na linha da Morfologia Distribuída (Halle e Marantz, 1993, 1994; Harris 1999), este artigo se detém nos agrupamentos de vocábulos não-derivados do português terminados em /o/, /e/, /a/ átonos ou ‘zero’ fonológico, considerando-os em quatro classes formais. Os resultados permitem reconhecer as vogais /o/ e /a/ como legítimas “vogais temáticas” (VT) – morfemas de classe formal –, e a vogal /e/ com dois status: morfema de classe formal e vogal epentética. Palavras-chave: Morfologia distribuída; Vocábulos não-derivados; Vogal átona final; Classes formais ABSTRACT – In the line of Distributed Morphology (Halle and Marantz, 1993, 1994; Harris 1999), this paper proposes to describe and analyze groups of Portuguese non derived words ended in non stressed vowels /o, a, e/ or phonological “zero” that constitute form-classes (or declational classes). In this language there are four form-classes. The results permite to recognize the vowels /o/ and /a/ as creators of non-marked form-classes. The vowel /e/ has two different status, it can be either thematic vowel or epenthetic vowel. Keywords: Distributed morphology; Non derived words; No stressed final vowel; Form- classes Este estudo apresenta uma análise das classes formais do Português Brasileiro (PB), grupos temáticos que compartilham a mesma terminação, à luz da Teoria da Morfologia Distribuída (HallE e MaraNTz, 1993, 1994), com inspiração em Harris (1999). Tem por orientação os seguintes objetivos: descrever o papel desempenhado pelas vogais átonas finais /a, e, o/, interpretadas como “morfemas de classe formal” ou vogal epentética, no caso da vogal /e/, investigar a constituição de cada classe formal no português bem como a relação entre gênero e classe formal. As classes formais do português: Uma visão geral A classificação dos vocábulos nominais em classes temáticas não é nova na língua portuguesa, assim como não era no latim, em que foi observada e discutida por eminentes estudiosos (MEyEr-lüBkE, 1923; CâMArA Jr., 1969, entre outros). No português é referência de muitos estudos entre os quais Câmara Jr. (1969), Lee (1995) e Moreno (1997). Contudo, aqui se pretende realizar uma análise mais detalhada com base na Teoria da Morfolo- gia Distribuída (doravante DM, do ingl. Distributed Morphology ). Defende-se que o português possui quatro classes formais. Três delas terminam, respectivamente, nas vogais /o, a, e/ e uma não possui elemento terminal, como se verá mais adiante. A hipótese defendida é que as vogais átonas finais /o/, /a/ e /e/ são morfemas de classe formal, embora a última vogal citada seja por vezes também uma vogal epentética. Os dados a serem apresentados não sofreram tratamento quantitativo, em virtude do caráter estritamente teórico do trabalho. Salienta-se, não obstante, que as fontes consultadas foram inúmeras – a partir delas construíram- se as listas não-exaustivas de vocábulos nominais do português, subsequentemente organizadas em diferentes classes formais, seguindo a proposta de Harris (1999). Apresenta-se, no Quadro 1, a classificação das quatro classes formais da língua^1. Como se pode observar, no Quadro 1, nomes e adjetivos do português estão distribuídos entre quatro classes formais que são heterogêneas com respeito ao gênero, não podendo, logo, ser consideradas classes de gênero. (^1) Em Alcântara (2003), defendi a existência de cinco classes formais no PB, as quais, agora reformuladas, são em número de quatro. as razões que nortearam tal modificação na proposta serão expostas neste estudo.
6 Alcântara, C. C. QUADRO 1 – Classes Formais do Português Classe Formal a. I /o/ m f astr o , bel o , calm o , dad o , fig o , imens o , jat o , lob o , maestr o , noiv o , oc o , peit o , quadr o , rat o , sin o , urs o , vândal o , zel o , ... libid o , trib o , virag o , ... b. II /a/ f m alamed a , bel a , cav a , dam a , fad a , giraf a , ilh a , jut a , lâmpad a , net a , ostr a , pedr a , quimer a , rúcul a , cest a , test a , uv a , vac a , zebr a , ... arom a , comet a , dram a , edem a , fantasm a , goril a , idiom a , lema, map a , naut a , ômeg a , plasm a , pran a , rap a , sistem a , tem a , ... c III /e m f m/f abacat e , acord e , açougu e , alard e , bagr e , bandeid e , basquet e , blef e , bos/k/ e , club e , debo/S/ e , dot e , eslaid e , ford e , lan/S/ e , nocaut e , padr e , tigr e , verd e , ... algoz, anis, bolor, capuz, convés, feliz, mártir, revés, teor, tenaz,... ar e , apêndic e , bul e , cárcer e , do/s/ e , escor e , folclor e , tul e , val e , ... art e , av e , boat e , buti/ k / e , chanc e , chav e , cidad e , hast e , lápid e , madr e , mascot e , metad e , nev e , noit e , pared e , saúd e , seb e , sort e , trav e , ... cor, cruz, dor, espiral, flor, foz, paz, tez, ... alfa/s/ e , árvor e , cla/s/ e , fa/s/ e , índol e , mu/s/ e , pel e , prol e , to/s/ e , ... alegr e , chef e , célebr e , client e , consort e , cra/k/ e , mestr e , pedestr e , trist e , ... bene/s/ e , céler e , mol e , preco/s/ e , súpli/s/ e , ... d. IV Ø m/f bagageN, corageN, joveN, homeN, álbuN, treN, armazeN, jardiN, ... frei, lei, rei, boi, apogeu, mausoléu, troféu, ... araçá, pá, vatapá, chá, jabuti, pajé, ... vil, farol, papel, ... A Classe I, identificada pelo morfema de classe formal /o/, parece ser a que mais palavras abriga na língua, sendo, por isso, um dos agrupamentos formais mais produtivos. Nela prevalecem palavras masculinas
8 Alcântara, C. C. e o italiano (PEPErkaMP, 1997). Note-se, mais uma vez, que essa adjunção ocorre no componente morfoló- gico, uma vez que tais sufixos não têm função sintática. Enfim, a estrutura constitutiva completa de palavras como mito, faxina e pele , em (4), é configurada a partir de (2) e (3). (4) Estrutura Constitutiva das Palavras Não-Verbais a idéia de a derivação basear-se em radicais^2 e não em palavras flexionadas, cujo proponente é o próprio Harris (1983, 1985, 1991a), é também defendida em modelos teóricos diferentes, como vemos em Peperkamp (1997), Villalva (1994), Moreno (1997), entre outros. A constituição das classes formais do português Conforme se observou anteriormente, as classes apresentadas no Quadro 1 não são agrupamentos de gênero, pois reúnem tanto palavras masculinas como femininas, mas são classes formais. Como a informação de classe formal é geralmente imprevisível, espera-se que seja incluída como parte da informação das entradas vocabulares de muitas raízes, o que é ilustrado não somente com referência a nomes (6a), bem como a adjetivos (6b). Particularmente a esses últimos, a configuração de suas entradas vocabulares são aquelas anteriores à concordância de gênero com um dado nome. (6) Entradas Vocabulares de Nomes e adjetivos O morfema de classe formal, /o/, /a/ ou /e/, é selecionado pelo licenciador da raiz (morfema derivacional), quando este possui conteúdo fonológico; de outra forma, é a própria raiz que toma para si esta responsabilidade. Este é o caso de todos os exemplos ilustrados em (4). Considerando-se que, à luz da DM, a adjunção de um morfema de classe formal às raízes não-verbais, necessariamente formadas pela adjunção de uma raiz a um morfema derivacional doador de categoria morfossintática (N), (a) – acontece em cumprimento a uma condição de boa-formação morfológica da língua, (3), todas as palavras não-verbais do português, nomes e adjetivos, carregam necessariamente em sua representação morfossintática um morfema de classe formal, cuja manifestação pode se dar através de um item vocabular (expressão fonológica) ou pode ser nula – Ø fonológico, conforme pode ser visto em (8a). ressalta-se ainda que o morfema de classe formal pode ser seguido unicamente pelo sufixo de plural, /S/. Defende-se, nesta análise, a inexistência da regra de apagamento de morfema de classe formal, o que pôde ser observado formalmente em (4), ilustrado em (5). A N A N A N √ ℑ ??? √i [Ø]N o √aSin [Ø]N a √pεl [Ø]N e
(5) Formação de Palavras Não-Verbais de Português a. mit-o mít+ic-o (*mit-o+ic-o ) b. crem-e crem+os-o (*crem-e+os-o) c. faxin-a faxin+eir-a (*faxin-a+eir-a) 2 Em (6a), observam-se três distintas informações: categoria morfossintática (N), classe formal (III) e gênero (feminino). Uma vez que o gênero dos nomes, em português, assim como em muitas línguas, é, em geral, arbitrário, essa informação tem de ser especificada na entrada vocabular, como um traço idiossincrático. E, pelo fato de assumir-se que o gênero marcado é o feminino, somente este deverá ocorrer nas entradas vocabulares, no (^2) O termo radical , na presente análise, não goza de status teórico; mas, sim, a raiz. a. (Nomes) [/aRiS/, N, III, fem ...] variz [/naRiS/, N, III, - ...] nariz [/koER/, N, III, fem ...] colher [/SoER/, N, III, - ...] chofer b. (Adjetivos) [/piR/, A, III, ...] pior [/enaS/, A, III, ...] tenaz [/Raes/, A, - ...] travesso(a)
As classes formais do português brasileiro 9 português. O gênero masculino é, por sua vez, considerado não-marcado, ou seja, a ausência do feminino (CâMArA Jr., 1966, para o português; HarrIS, 1996, para o espanhol); portanto, o traço que identifica nomes masculinos está ausente das entradas vocabulares no português. Por outro lado, todos os nomes com a configuração mostrada em (6a) têm de carregar a informação de classe formal, III, o que denota a sua imprevisibilidade nesta classe. No que concerne aos adjetivos mostrados em (6b), observe-se que todos carregam a informação de categoria morfossintática (a), porém lhes falta totalmente a informação de gênero, cuja adição, em suas entradas vocabulares, somente se concretizará após a concordância com um dado nome; se feminino, esse traço deverá aparecer na entrada vocabular do adjetivo, se, por outro lado, o nome for masculino, essa informação não aparecerá. É interessante notar que, no último exemplo ilustrado em (6b), estão ausentes não só a informação de gênero bem como a de classe formal. Isso ocorre porque a classe à qual pertencerá tal adjetivo é I ou II, as maiores do português, como foi referido. Em alguns casos, contudo, a informação de classe formal pode ser fornecida mediante regras de redundância morfológica, como é o caso em (7). (7) regra de redundância para Classe fem → II que pode ser inserido, ou seja, o morfema que receberá tal manifestação fonológica. Assim, verifica-se que a vogal /e/ é inserida (‘↔’), na posição do morfema de classe formal da classe III – seja no componente morfológico da gramática, para o grupo de exceção (cf. pele ) , seja no componente fonológico como vogal epentética (cf. parke(s), bote(s )). as demais entradas informam que a vogal /a/ é inserida no morfema de classe formal quando este contiver o traço [II] e, finalmente, /o/ é inserido quando o morfema não contiver qualquer informação em termos de traços gramaticais, ou seja, no caso default. Em (8b), tem-se a informação de que o único conteúdo fonológico que o morfema de plural pode receber é a fricativa coronal /S/. Em suma, a formalização em (8) permite observar que o conteúdo fonológico a ser inserido em um dado contexto de traços decorre sempre da exigência desse contexto, o qual é traduzível em termos de traços. Esta proposta fornece os resultados corretos em todos os casos. Classe formal I Todas as palavras da língua portuguesa terminadas na vogal /o/, majoritariamente masculinas, estão elencadas sob a classe formal I, ilustrada no Quadro 2. QUADRO 2 – Classe I: Palavras terminadas em /o/ a regra formalizada em (7) mostra que a classe II, cuja terminação é a vogal /a/, é previsível para as raízes do gênero feminino no caso não-marcado. Tal classe não é, contudo, a única a ser identificada a partir de regra de redundância morfológica; o mesmo acontece à classe I, o caso default , assim denominada pelo fato de as raízes masculinas a ela afiliadas não conterem em suas respectivas entradas vocabulares quaisquer informações idiossincráticas de classe formal, a menos que o contexto determine diferentemente. Isso acontece em outras classes formais, conforme pode ser visto em (8). (8)(8) (^) Entradas Vocabulares paraEntradas Vocabulares para ℑ ℑ a. ℑ ↔ Ø / IV ___ e /^ III^ ___ a / II ___ o ( default ) b. entrada única de [plural] em nomes e adjetivos plural ↔ S As informações em (8a) representam, de acordo com Halle (1997: 430), os itens vocabulares que os falantes têm de memorizar. E os itens vocabulares são a relação entre um conteúdo fonológico, que pode ser qualquer seqüência fonológica, incluindo Ø, e a informação do contexto em a classe formal I é a menos marcada, reúne todas as raízes que não foram direcionadas às demais classes, seja por não conterem quaisquer informações – no caso das masculinas –, seja por conterem uma informação idiossincrática, no caso das poucas femininas que ela contém. Em (9), ilustra-se o que ocorre no componente morfológico da gramática com raízes afiliadas à classe I. (9) Ilustrações de Membros da Classe I a. entradas vocabulares das raízes /liid/, f, I /enin/ b. derivações libido menino [/liid/]ℑ [/enin/]ℑ 1 MORFOLOGIA [ ] [ ] f a I b ?? o o 2 Inserção vocabular libid+o menin+o
ℑ masculino feminino / o / astr- o , bel- o , calm- o , dad- o , eix- o , fig- o , imens- o , jat- o , lob- o , med- o , peit- o , quadr- o , rat- o , sin- o , tet- o , urs- o , vas- o , zel- o , ... libid- o , trib- o , virag- o , ...
As classes formais do português brasileiro 11 condição de coda da língua, em (12) apresentada. além desse reduzido número de vocábulos portador de /e/ final, atribuído no módulo da Morfologia – assim como /a/, da classe II, e /o/, da classe I –, há vocábulos terminados em consoantes licenciadas pela coda do português e há, também, um grande número de palavras que devem receber /e/ em virtude de não satisfazerem a condição de coda da língua, como se verá a seguir. acrescente-se ainda o fato de os membros dessa classe carregarem, nas entradas vocabulares, tanto informação de gênero, (‘f’), quanto informação de classe formal, seme- lhantemente aos casos marcados afiliados às classes I e II, o que a torna, entretanto, marcada em relação a essas. Uma das justificativas para tal marcação assenta no fato de não haver correlação estreita entre gênero e classe formal, conforme anteriormente referido. Esta classe reúne tanto palavras masculinas quanto femininas, ao passo que as classes I e II dão primazia às palavras masculinas e femini- nas, respectivamente, embora não exclusivamente. a outra justificativa para a marcação da classe III – relativamente às classes I e II – reside no fato de cada um de seus integrantes carregarem, nas entradas vocabulares, um traço diacrítico que obsta sua equivocada integração às duas maiores classes. Em (11), apresentam-se exemplos de membros da classe III, nos quais pode ser observada, em negrito, a informação fonológica de que as raízes são portadoras. (11) Classe III: /e/ ~ Ø Como se pode observar, em (11), os vocábulos da classe III alternam Ø e /e/ em contexto específico. Defende-se que tal classe está subdividida em três subgrupos – de raízes bem-formadas, (11a’), de raízes não bem-formadas (11b) e, ainda, de um grupo de exceção, (11a’’), conforme já mencionado. Em (11a’), as raízes bem-formadas são aquelas que terminam por segmentos que satisfazem a Rima e sua Condição de Coda (12)^3 ; daí o Ø fonológico no singular, o qual será substituído por /e/ no plural; em (11a’’), são apresentadas raízes que terminam em consoantes que poderiam ser segmentos finais de uma sílaba, as quais, contudo, apresentam imprevisivelmente um /e/, o que as torna palavras de exceção, em virtude do /e/ final ser inserido na Morfologia. Um argumento em prol da excepcionalidade das palavras sob (11a’’) é que se a vogal átona final /e/, que aparece em vocábulos como vale-vala-valo , passe-passa-passo, are-ara-aro , não fosse inserida no componente morfológico da gramática, de acordo com os pressupostos da DM, em chegando ao componente fonológico, nada indicaria a necessidade de seguir tautossilabicamente às soantes /l R/ ou à fricativa surda /s/^4. Por fim, em (11b), aparecem raízes não bem- formadas, isto é, que carregam segmentos não-licenciados para a posição de coda silábica, seja um só segmento (C) (e.g. chef-e(s), bot-e(s) ), seja uma sequência de segmentos (CC) – entre os quais está incluído o glide derivado por silabação de vogal alta (e.g. bail-e(s), freir-e(s), caul-e(s), noit-e(s) ), além dos grupos de legítimas consoantes (e.g. par[k]-e(s), cond-e(s), pest-e(s) ). Note-se ainda que às formas em (11b) será adjungida a vogal epentética /e/ pelo processo de epêntese, em (13) apresentado, o que só ocorrerá no módulo fonológico da gramática, uma vez que a estrutura silábica ainda não está disponível para ser acessada no módulo morfológico, como preconiza a Teoria da Morfologia Distribuída. Em termos de traços, na acepção standard , o que faz com que todas essas palavras estejam reunidas sob a mesma classe formal é o fato de carregarem, nas respectivas entradas vocabulares, o traço idiossincrático de classe [III], cuja manifestação fonológica é a vogal /e/, conforme apresentado em (8a), salvo para os exemplos em (11a’), no singular. O que se deve pôr em relevo é que a classe III compreende não só palavras cujos segmentos em posição final atendem à restrição de coda – (11a’) ( liláS, flor ), (11a’’) ( cla/s/e, folclore, pele ) –, como também as que não atendem, (11b) (* seb, * part, *fraud ), conforme anteriormente referido. Enfim, independentemente das propostas teóricas sob as quais diversos estudiosos empreenderam seus trabalhos, destaca-se o fato de que a (^3) A lateral e a nasal em coda identificam membros da classe formal IV, da qual a presente exposição não tratará, por razões de espaço. (^4) A realização não-marcada do arquifonema /S/, em final absoluto seguido de pausa (cf. Câmara Jr., 1976), é a fricativa coronal surda. a’. / S / algo S - ∅/algo z - es cru S - ∅/cru z - es feli S - ∅/feli z - es / R / a R - ∅/a R - es deve R - ∅/deve R - es flo R - ∅/flo R - es márti R - ∅/márti R - es a’’. / s / alfa/ s /-e(s) cla/ s/ - e(s) mu/ s/ - e(s) / R / folclo R - e(s) esco R - e(s) árvo R - e(s) / l / contro l - e(s) mo l - e(s) pe l - e(s) va l - e(s) b. C a v - e(s) ble f - e(s) cra/ z /-e(s) clu b - e(s) cra/ k /-e(s) deta//-e(s) debo/ S /-e(s) pirâmi d - e(s) pre/ - e(s) ti m - e(s) sorve t - e(s) CC ala Rm - e(s) ale gR - e(s) ba il - e(s) bande id - e(s) bo s/k/ - e(s) ca Rn - e(s) céle bR - e(s) cipre st - e(s) cha n/s/ - e(s) cha Rm - e(s) ci sn - e(s) clie nt - e(s) conso Rt - e(s) ento Rs - e(s) fi lm - e(s) humi ld - e(s) pa R/k/ - e(s) u Rz - e(s)
12 Alcântara, C. C. vogal /e/ é inserida em final de palavra após consoantes ou grupos de consoantes não licenciados para a posição de coda (LEITE, 1974; GIrELLI, 1988; LEE, 1995; COLLISCHONN, 1997; BISOL, 1999a; entre outros). Em (12) apresenta-se a estrutura da rima em português, em que está implícita uma condição de coda. (12) A rima e sua Condição de Coda conseguinte, a substituição de Ø fonológico pela vogal /e/, só ocorrerá se a posição do morfema de classe formal (ℑ) estiver vazia – morfema este que pode estar seguido ou não do morfema de plural –, e se a consoante (C) precedente estiver silabicamente desassociada. apresenta-se em (14) ilustrações de membros da classe III, e a atuação do processo de epêntese. (14) Ilustrações de Membros da Classe III σ | r N (Cd) | | V C onde C → [+soante] ou [-soante, +cont, coronal] as sílabas do português podem terminar em uma vogal nuclear ou podem ter coda. as codas podem ser constituídas de segmentos [+soa][+voc], isto é, vogais altas /i/, /u/, que nessa posição passam automaticamente a glides, de segmentos [+soante], como /l R N/ ou ainda de segmentos [-soante, +cont, coronal], ou seja, /S/^5. Em se tratando de raízes não bem-formadas, por não contemplarem essas exigências, há que ser chamado o processo de epêntese, (13), a fim de que possam emergir formas licenciadas na língua. (13) Operação de epêntese em ‘ℑ' ℑ | Ø → e / C ___ ]σ Note-se que o processo formalizado em (13) – que pode operar seja no singular, seja no plural (cf. mares (11a’); parques (11b) – embora ocorra no módulo fonológico da gramática, não prescinde de informações do módulo morfológico para que possa atuar. Por (^5) Salienta-se, com respeito às consoantes licenciadas por (12), o fato de as únicas que se manifestam como legítimas consoantes na forma de superfície são /R/ e /S/ (cf. poma/ R / → [po'aR]; xadre/S/ → [Sa'dres]). A soante /N/ manifesta-se como glide vocalizado em posição final de palavra (e.g. comu/N/ → [ko'u )~w)] ~ [ko'u)N], viage/N/ → [vi'aZi )N] ~ [vi'aZĩ N)] (~ [vi'aZi])) e /l/, a seu turno, tende também à vocalização como glide dorsal [w] no singular e coronal [j] no plural (cf. cana/l/ → [ka'naw], [ka'najs]; azu/l/ → [a'zuw], [a'zujs]; anil → [a'niw], [a'nijs]). a vocalização vem se mostrando incidente no português brasileiro. a’ mar a’’. pele b. parque [/aR/]ℑ [/pEl/]ℑ [/paRk/]ℑ 1 MOrFOLOGIA [ ] [ ] [ ] f a III III III b ↕ ↕ ↕ aR +∅ pEl + e paRk + ∅ 2 Inserção vocabular a R p E l e p a R k FONOLOGIA \ ׀ / ׀ \ ׀ \ \ / ׀ σ σ σ σ Silabação e Epêntese (13) p a R k e Silabação \ ׀ / ׀
σ σ [ 'aR ] [ 'pEli ] [ 'paRki ] Saída Nas três derivações acima, em que a primeira é um membro da subclasse III, explicitada em (11a’), maR- , e as duas seguintes membros das outras duas subclasses, explicitadas, respectivamente, em (11a’’) e (11b), cujos exemplos são pel-e e paRk- , observa-se que a única diferença entre esses membros da classe III, em termos formais, concerne ao número de propriedades que carregam em suas entradas vocabulares. Na linha 1a das derivações somente a raiz pel- traz especificada a marca do gênero que deve aparecer sempre nas entradas vocabulares, ‘f’; o gênero masculino, conforme referido anteriormente, em sendo a ausência do feminino, não requer especificação, como é o caso em maR- e paRk-. Na linha 1b é apresentado o traço de classe formal [III] que deve constar das entradas vocabulares das três formas em pauta. Se assim não fosse, todas as raízes em questão seriam incorretamente direcionadas às duas maiores classes formais do português, em conseqüência os resultados seriam agramaticais; funcionam como instrumento bloqueador de regras que inexoravelmente produziriam formas incorretas. São apresentados, na linha 2 do componente morfológico, por meio da operação de Inserção vocabular , os resultados esperados, dos quais somente pel-e recebe o morfema de classe formal /e/, por ser um membro do grupo de exceção, em (11a’’) ilustrado. No módulo subsequente, o da Fonologia, a Silabação atua e produz as estruturas que são submetidas à apreciação da Rima e sua Condição de Coda (12), a qual permite que a soante /R/ seja silabificada, em mAR- ,
14 Alcântara, C. C. quaisquer razões fonológicas para tal, uma vez que a configuração segmental dessas raízes, em posição final, poderia emergir sem quaisquer elementos vocálicos que se lhes seguisse, porque se trata de segmentos licenciados pela condição de coda da língua; há um outro subgrupo bastante numeroso, constituído de vocábulos que terminam em consoantes licenciadas pela condição de coda do português e que recebem /e/ somente na forma plural, o que se deve, sobretudo, à presença do morfema [plural] na estrutura morfológica do vocábulo, mas também por razões fonológicas, a fim de se adequarem ao “gênio da língua”, segundo o mestre Mattoso Câmara; por fim, há um terceiro subgrupo, o maior em extensão, cujos integrantes têm as raízes terminadas em segmentos ou seqüências de segmentos não- licenciados na língua, que devem, logo, ser submetidos ao processo de epêntese que trabalha com informações não só fonológicas, em termos de estrutura silábica, mas também morfológicas, ou seja, o preenchimento da posição destinada à manifestação fonológica do morfema de classe formal, a qual é preenchida com a vogal /e/ somente no componente fonológico da gramática. Enfim, o comportamento da classe III reflete a sua maior complexidade relativamente às duas maiores classes formais do português, as classes I e II. b) as vogais /o/ e /a/ são morfemas de classe formal, independentemente de estarem correlacionadas ao gênero, pois identificam agrupamentos formais cuja semelhança única entre si consiste em carregarem a mesma terminação. c) O gênero é fator relevante para a atribuição de classe formal aos vocábulos não-verbais do português do Brasil, somente no que concerne às duas maiores classes formais, I e II. Isso porque, nessas duas classes, normalmente, a informação de classe formal é previsível a partir do gênero de que são portadoras as raízes. No caso dos membros das demais classes, entretanto, não só o gênero, bem como a classe formal são informações idiossincráticas das raízes. Referências ALCâNTArA, Cíntia da Costa. As classes formais do português e sua constituição: um estudo à luz da teoria da morfologia distribuída. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica do rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003. BISOl, leda. O clítico e seu status prosódico. Revista de Estudos da Linguagem , v. 9, n. 1, p. 5-30, 2000. BISOl, leda. a sílaba e seus constituintes. Gramática do português falado. 1999a. v. 7, p. 701-742. CALABrESE, Andrea. Some remarks on the Latin case system and its development in romance. In: TrEVINO, E.; lEMa, J. (Ed.). Theoretical analysis of romance languages. amsterdam: John Benjamins, 1998. CâMArA Jr., Joaquim M. História e estrutura da língua portuguesa. rio de Janeiro: Padrão, 1976. CâMArA Jr., Joaquim M. Problemas de lingüística descritiva. Petrópolis: Vozes, 1969. CâMArA Jr., Joaquim M. Considerações sobre o gênero em português. Revista Brasileira de Lingüística Teórica e Aplicada, v. I, n. 2, p. 1-9, 1966. COLLISCHONN, Gisella. Análise prosódica da sílaba em português. Tese (Doutorado) – Pontifícia Universidade Católica do rio Grande do Sul, Porto alegre, 1997. GIrELLI, Carl A. Brazilian Portuguese syllable structure. Tese (Doutorado) – University of Connecticut, 1988. HallE, Morris. The russian declension: an illustration of the theory of distributed morphology. In: COLE, J.; KISSEBErTH, C. (Ed.). Perspectives in phonology. CSLI Lectures Notes , n. 51, p. 29-60, 1994. HallE, Morris. Distributed morphology: impoverishment and fission. MITWPL PF – Papers at the Interface , v. 30, p. 425-449, 1997. HallE, Morris; MaraNTz, alec. Distributed morphology and pieces of inflection. In: HalE, k.; kEySEr, S. J. (Ed.). The view from the Building 20: Essays in honor of Sylvain Bromberger. Cambridge/Massachusetts: MIT Press, 1993. HallE, Morris; MaraNTz, alec. Some key features of distributed morphology. MITWPL – Papers on Phonology and Morphology , v. 21, p. 275-288, 1994. HarrIS, James W. Nasal depalatalization no , morphological wellformedness sí ; the structure of Spanish word classes. MITWPL – Papers on Syntax and Morphology , v. 33, p. 47-82,
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