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Uma análise teórica sobre o gênero plano de aula, sua produção e importância no contexto do ensino. O artigo aborda os pressupostos teóricos do grupo de genebra e do isd, as características do gênero plano de aula como atividade de linguagem, e as conclusões finais. Além disso, o texto discute as condições de produção do gênero plano de aula, como o lugar social, a posição social do emissor e receptor, e o objetivo da interação.
Tipologia: Notas de aula
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Ângela Francine FUZA^2
RESUMO Este artigo tem o objetivo de compreender quais as categorias que constituem o gênero textual plano de aula, fundamentando-se nas teorias desenvolvidas a partir dos princípios teóricos do interacionismo sociodiscursivo (ISD), principalmente em sua vertente mais didática, destacando-se, também, o Interacionismo Social (IS). Para o desenvolvimento do estudo foram selecionados quatro planos de aula de professores em formação inicial do Curso de Letras, da disciplina de Prática de Ensino, de uma Instituição Pública do Norte do Paraná, referentes aos anos de 1990, 2000, 2005 e 2010, tendo em vista a heterogeneidade de categorias ali apresentadas. Dentre os níveis de análise, propostos por Bronckart (2006), realizaram-se, neste trabalho, apenas as análises das representações sobre o contexto e a infra-estrutura textual. Os resultados mostram que há categorias comuns nos planos de aulas, assim como categorias que se diferem, tendo em vista principalmente o momento de produção do texto. O tipo de discurso predominante é o expositivo-interativo e o acontecimento verbalizado está em um tempo e em um espaço de conjunção com o momento e o lugar da interação. Há o predomínio das sequências descritivas, assim como o uso da esquematização, configurando-se em outra forma de planificação.
Palavras-chave: Interacionismo sociodiscursivo. Gênero textual. Categorias. Plano de aula.
1 Introdução
O preparo das aulas pelos professores é uma das atividades mais relevantes do trabalho do profissional da educação. Todavia, constatamos que, no contexto escolar, há a ausência do processo de planejamento de ensino, fazendo com que haja a contínua improvisação pedagógica das aulas, quando, na realidade não se pode improvisar educação, conforme postulam Fusari (1998) e Schmitz (2000). O plano de aula configura-se como a sequência de tudo que vai ser desenvolvido em um dia letivo, é a sistematização de todas as atividades que se desenvolvem no período de tempo em que o professor e o aluno interagem, numa dinâmica de ensino- aprendizagem (PILETTI, 2001). Para isso, é preciso considerar as diretrizes, a escola, a direção, o professor, os alunos e os objetos de conhecimento.
(^1) Artigo desenvolvido para a disciplina de “Gêneros do discurso: uma perspectiva enunciativa para o ensino de línguas”, ministrada pela professora Doutora Elvira Lopes Nascimento, do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem (PPGEL), da Universidade Estadual de Londrina (UEL). (^2) Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Membro do Grupo de Pesquisa: “Interação e Escrita” (CNPq/UEM). angelafuza@hotmail.com
Diante disso, algumas teorias, voltadas ao processo de ensino e de aprendizagem, reforçam a necessidade de se trabalhar o gênero plano de aula nos cursos de formação, possibilitando que os professores em formação se apropriem das teorias a respeito desse gênero textual, uma vez que planejar é antecipar mentalmente uma ação, é agir em função daquilo que se pensa, sendo uma mediação teórica metodológica para a ação, que passa a ser consciente e intencional (VASCONCELLOS, 2000), remetendo-nos aos processos psicológicos superiores (VYGOSTKY, 1988). Alguns estudos, principalmente, da área da Didática, desenvolvem questões voltadas para o plano de aula, demarcando apenas sua função quanto à organização de informações, não destacando seu valor enquanto um gênero textual, reforçando a necessidade de novos estudos a fim de aprofundar as teorias e disseminar novos conhecimentos. Logo, este artigo busca promover a reflexão a respeito das categorias que constituem o plano de aula, enquanto um gênero textual, possibilitando uma visão mais detalhada de como tal texto se constituiu no decorrer dos anos dentro do curso de Letras. O corpus desta análise é composto por quatro planos de aula produzidos por professores em formação do curso de Letras, de uma instituição Pública do Norte do Paraná, correspondendo às décadas de 1990, 2000, 2005 e 2010. Para traçarmos algumas reflexões sobre o gênero proposto, voltamo-nos aos pressupostos teóricos do grupo de Genebra conhecido como interacionismo sociodiscursivo, doravante ISD, pois acreditamos que ao desenvolvermos a capacidade de linguagem tornamos nossos alunos mais críticos. Importante mencionar que, dentre os níveis de análise, propostos por Bronckart (2006), realizamos, neste trabalho, apenas as análises das representações sobre o contexto e a infra-estrutura textual. Na primeira parte do artigo, apresentaremos alguns pressupostos teóricos do grupo de Genebra e o ISD; na segunda, trataremos do contexto sócio-histórico e das características do gênero plano de aula, como uma atividade de linguagem; na terceira, realizaremos uma breve análise das atividades propostas a partir dos estudos dos quatro planos de aula, considerando a ação individual de linguagem; por fim, teceremos as conclusões finais.
situações cotidianas mais espontâneas, e os gêneros secundários (mais complexos), próprios de esferas públicas e mais complexas (tais como a ciência, o jornalismo, a arte, etc.). São estes últimos, pela sua natureza, que requerem mediação e que precisam ser ―ensináveis‖. De acordo com os dizeres de Bakhtin (2003), os gêneros discursivos secundários surgem nas condições de um convívio cultural mais complexo e relativamente muito desenvolvido e organizado (predominantemente o escrito). No processo de sua formação, eles incorporam e reelaboram diversos gêneros primários que se formaram nas condições de comunicação discursiva imediata. Dessa forma, os gêneros secundários são aqueles baseados na atenção voluntária, na memória, na inteligência prática, caracterizando os processos psicológicos superiores (PPS) expostos nas teorias de Vygotsky, havendo, assim, a necessidade de um tempo de sedimentação de conhecimentos para que sejam utilizados. Bronckart (2006), um dos estudiosos de Bakhtin e Vygotsky e, também, pertencente ao grupo de Genebra, postula por meio do interacionismo sociodiscursivo^4 , algumas reflexões a respeito da noção de gênero como instrumento fundador e organizador das funções psicológicas superiores (VYGOSTSKY, 1988). Para essa perspectiva, o pensamento consciente manifesta-se através da linguagem por meio de processo inter e intra pessoal. Além disso, Bronckart (2006, p. 122) indica que a linguagem não é apenas um meio de expressão de processos que seriam estritamente psicológicos (como a percepção, os sentimentos, as emoções, etc.), mas se configura como ―o instrumento fundador e organizador desses processos, em suas dimensões especificamente humanas‖. Isso significa que as unidades de análise do ISD não são os gêneros, mas as ações verbais e não-verbais do agente produtor. O aspecto do agir humano, que tem respaldo na teoria da ação comunicativa de Habermas (1981), centra-se na construção do sujeito na e pela avaliação de seu agir mediante a linguagem. Dessa maneira, há a noção de ―mundo da vida‖, que só pode ser acessada em interação com o outro e com os três mundos representados – o objetivo/físico (envolve o ato material da enunciação); o social (compreende os
(^4) O interacionismo sociodiscursivo considera as ações humanas em suas dimensões sociais e discursivas constitutivas e, ao considerar o sujeito como parte e fruto de interações sociais, defende a importância de se ter em mente o contexto no qual determinado discurso ou texto foi produzido para que se possam compreender os seus objetivos.
conhecimentos coletivos acumulados entre os membros de um grupo, suas normas, valores, regras, etc.) e o subjetivo (compreende a imagem que o agente-produtor dá de si ao agir, sua auto-representação e a imagem que faz do outro). Esses elementos, conforme Bronckart (2003), explicitam a tese principal do ISD de que a ação é resultado da apropriação^5 pelo sujeito e que o agir comunicativo produz formas semiotizadas veiculadoras dos conhecimentos coletivos/sociais, que se organizam nesses três mundos representados que definem o contexto do agir humano. De acordo com os dizeres de Schneuwly, citado por Bronckart (2003), essas representações constituiriam somente uma base de orientação, a partir da qual decisões seriam tomadas, dentre escolher o gênero mais apropriado à situação de comunicação, os tipos de discurso, os mecanismos de textualização, os mecanismos enunciativos, dentre outros. Ao produzir um texto, por exemplo, o agente-produtor cria uma base de orientação para a sua ação de linguagem, considerando um contexto específico de produção. Para o ISD, o contexto de produção pode ser definido como ―o conjunto dos parâmetros que podem exercer uma influência sobre a forma como um texto é organizado‖ (BRONCKART, 2006, p. 93). Na visão do autor, essa influência é necessária, porém não mecânica sobre a organização textual. Os parâmetros mencionados se voltam para as representações que o agente encontra-se ao produzir um texto, o mundo objetivo, o mundo social e o mundo subjetivo, as quais constituem a base para Bronckart (2006) estabelecer o contexto de produção de um texto e seus elementos e que serão considerados, neste estudo, ao se tratar do gênero plano de aula:
(^5) Leontiev, na Teoria da Atividade (2001; 2004), faz uso do termo apropriação, enquanto que o mesmo processo na Teoria Histórico-Cultural, a partir dos trabalhos de Vygotsky (1988; 2000; 2001; 2005), recebe o nome de internalização. Em ambos os conceitos, prevalece a ideia de que o processo de internalização/apropriação de um novo conceito é sempre realizado de forma mediada por instrumentos, o que reafirma os postulados do Materialismo- histórico, de Marx e Engels (2005, p. 109): “a apropriação não é senão o desenvolvimento das capacidades individuais correspondentes aos instrumentos materiais de produção. A apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é o desenvolvimento de uma totalidade de capacidades nos próprios indivíduos”. Dessa forma, os termos internalização/apropriação são usados como sinônimos, neste trabalho, havendo menção ao nome Leontiev quando utilizarmos o termo apropriação e internalização, ao mencionar Vygotsky.
1. MUNDO FÍSICO:
ELEMENTOS DO CONTEXTO DE PRODUÇÃO [PARÂMETROS FÍSICOS]
SCHNEUWLY, 2004, p. 64). Podemos demarcar que são ferramentas imprescindíveis para o desenvolvimento das funções superiores dos alunos – e também dos docentes – para a sua participação nas mais diversificadas atividades. Schneuwly (2004), com base em Marx, enuncia que a ação humana é tripolar, envolvendo o sujeito, o objeto ou situação e os instrumentos de mediação. O instrumento faz a mediação entre a atividade do sujeito e sobre seu objeto, ao mesmo tempo em que a representa e a materializa. Se um instrumento se transforma, pensando na interação do ensino-aprendizagem, a própria atividade relacionada a seu uso também pode ser modificada, o que reforça a hipótese de que o conhecimento pelo docente formador de novos instrumentos de trabalho pode diferenciar ou (re) construir sua percepção em relação à situação em que se encontra. Nesse âmbito, os gêneros são concebidos como instrumentos ou artefatos simbólicos que se encontram à disposição dos sujeitos de determinada sociedade para seu agir se os sujeitos deles se apropriarem. Diante dessas pressuposições, o Grupo de Genebra, objetivando permitir o contato, o estudo e o domínio de diferentes gêneros utilizados na sociedade, voltou-se para a elaboração de materiais didáticos adequados para a transposição didática em conformidade com as capacidades dos alunos. Constatamos, assim, que os gêneros se constituem como instrumentos para possibilitar as operações de linguagem necessárias para o desenvolvimento de três tipos de capacidades: (1) capacidades de ação , que possibilitam ao sujeito entender o contexto de produção de um determinado gênero, sua sócio-história, as representações ali incluídas; (2) capacidades discursivas , que permitem reconhecer e operar com o plano global do texto (ou a forma composicional bakhtiniana), os tipos de discurso e os tipos de sequências; (3) capacidades linguístico-discursivas , que levam o sujeito a saber operar e a compreender os mecanismos de textualização, a utilização das vozes e das modalizações para a produção dos gêneros. Cabe ressaltar algumas considerações a respeito do termo ―transposição didática‖. Schneuwly, Bronckart e Plazaola Giger ( apud GONÇALVES, 2008) explicitam que o conceito não diz respeito à simples aplicação de uma teoria científica qualquer ao ensino, mas pode ser entendido como um conjunto de rupturas, de deslocamentos e de
transformações que são realizadas no momento em que um elemento do saber teórico é tomado pela escola para ser trabalhado em um determinado programa de ensino. Na acepção dos autores, essas transformações ocorrem em três níveis: (1) o conhecimento científico sofre um primeiro processo de transformação para constituir o conhecimento a ser ensinado; (2) o conhecimento a ser ensinado se transforma em conhecimento efetivamente ensinado; e (3) o conhecimento efetivamente ensinado ainda se constituirá em conhecimento efetivamente aprendido. Para que haja tal transposição didática do gênero, é preciso que haja a exploração das características didáticas do modelo do gênero, constituindo-se como uma fonte de informações para que o professor possa fazer as adaptações necessárias em seu trabalho em sala de aula. De acordo com Nascimento, Gonçalves e Saito (2007), o modelo didático, assim como a sequência didática são ferramentas para o delineamento dos objetivos na didatização dos gêneros. Para as autoras, o modelo didático precisa se sustentar a partir de um tripé: desconstrução, descrição e indicação das dimensões ensináveis do gênero. A denominação modelo didático surgiu em Genebra-Suiça com a intenção de subsidiar o trabalho docente, favorecendo o ensino e a aprendizagem de texto em língua materna, no caso, o francês. Para o Grupo de Genebra, o ensino e a aprendizagem de um gênero textual, em sala de aula, pressupõem atividades norteadas por um modelo didático de gênero. Para Pietro & Schneuwly (2003 apud NASCIMENTO; GONÇALVES; SAITO, 2007), o modelo didático tem as seguintes características: I) Uma dimensão praxeológica; II) Uma força normativa (da qual é impossível fugir); III) É o centro do processo de todo ensino e posterior aprendizagem; IV) Pode ser implícito/intuitivo ou explicito e conceitualizado; V) É o ponto de início e o ponto de chegada do trabalho a ser realizado; VI) É uma teoria mais genérica das atividades linguageiras; VII) É sempre o resultado de práticas de linguagens anteriores, portanto, históricas; VIII) Permite, a partir das práticas sociais referenciais, produzir SDs; IX) É o lugar de reflexões e práticas pedagógicas. Diante do exposto, constatamos que ―os modelos didáticos são objetos potencializadores para o ensino. Ou seja, parte-se do modelo didático, pede-se uma
No Brasil, o regime autoritário fez com que muitos educadores criassem uma resistência com relação à elaboração de planos, uma vez que planos eram supervisionados. ―Num regime político de contenção, o planejamento passa a ser bandeira altamente eficaz para o controle e ordenamento de todo o sistema educativo.‖ (KUENZER, 2003, p. 41). Hoje, o planejamento já não tem a função reguladora dentro das escolas, mas serve como uma ferramenta importante para organizar e subsidiar o trabalho do professor. De forma geral, o plano de aula é a sequência de tudo que vai ser desenvolvido em um dia letivo, é a sistematização de todas as atividades que se desenvolvem no período de tempo em que o professor e o aluno interagem, numa dinâmica de ensino- aprendizagem (PILETTI, 2001, p. 73). Cabe ressaltar que dentro da esfera escolar, o plano de aula se desenvolve, pressupondo-se que, em sua constituição, sejam consideradas as diretrizes, a escola, a direção, o professor, os alunos e os objetos de conhecimento. Algumas teorias reforçam a necessidade de se trabalhar tal gênero nos cursos de formação, uma vez que planejar é antecipar mentalmente uma ação, é agir em função daquilo que se pensa, sendo uma mediação teórica metodológica para a ação, que passa a ser consciente e intencional (VASCONCELLOS, 2000). Por meio de tal atividade, o sujeito coloca em funcionamento suas funções psicológicas superiores (VYGOTSKY, 1988), envolvendo consciência, intenção, planejamento, ações voluntárias e deliberadas, que dependem de processos de aprendizagem. São processos mediados por sistemas simbólicos, como a escrita do gênero. Dessa forma, o planejamento da aula pressupõe: a análise da situação; a reflexão sobre os recursos disponíveis; a definição dos objetivos educacionais; a seleção e a estruturação dos conteúdos a serem assimilados, distribuindo-os ao logo do tempo para seu desenvolvimento; a previsão e a organização dos procedimentos do professor; a previsão e a escolha dos recursos de ensino; a previsão dos procedimentos de avaliação mais condizentes com os objetivos propostos. Notamos que alguns estudos, principalmente, da área da Didática, desenvolvem questões voltadas para o plano de aula, demarcando apenas sua função quanto à organização de informações, não destacando seu valor enquanto um gênero textual,
reforçando a necessidade de novos estudos a fim de aprofundar as teorias e disseminar novos conhecimentos. Sendo assim, ao retomar os postulados de Bronckart (2006), na perspectiva do ISD, concebe-se a linguagem como um instrumento semiótico por meio do qual o homem existe e age, o que permite interpretar os fatos da linguagem como traços das condutas humanas socialmente contextualizadas. O conceito de contexto de produção, voltado para as aulas de leitura e de escrita, no âmbito do ISD e do interacionismo social, parte da premissa de que a produção de sentidos é decorrente de duas visões. De um lado, as particularidades constitutivas daquilo que cerca o texto ou o seu contexto e, de outro, das características do próprio texto (BRONCKART, 2006). Em relação aos princípios do ISD, postula-se o contexto de produção de um texto (oral ou escrito) como o conjunto de parâmetros que podem exercer influência sobre a organização do texto (BRONCKART, 2006). Esses parâmetros se voltam para as representações que o agente encontra-se ao produzir um texto, o mundo objetivo, o mundo social e o mundo subjetivo, as quais constituem a base para Bronckart (2006) estabelecer o contexto de produção de um texto e seus elementos, conforme já apontado. A partir desse quadro e dos estudos do interacionismo social de forma didática, Saito e Nascimento (2010) categorizam os elementos constitutivos do contexto de produção. Destacaremos os elementos do contexto de produção voltados ao gênero plano de aula, de forma geral, pensando nas atividades de linguagem, a fim de, posteriormente, destacar a ação de linguagem deste gênero em uma ação singular do agente. Dessa forma, os elementos do contexto são, respectivamente: a esfera da comunicação; a identidade social dos interlocutores; a finalidade; a concepção de referente; o suporte material e a seleção interdiscursiva, que correspondem aos aspectos apontados por Bronckart (2006) e, consequentemente, aos mundos físico e sociossubjetivo, fazendo-se referências aos mundos formais postulados por Habermas. Um dos elementos que é a base de orientação do mundo sociossubjetivo recebe o nome de esfera da comunicação, conforme Saito e Nascimento (2010). Ela corresponde ao cenário ou formação social com as regras e rotinas interacionais em
desenvolvido considerando-se os outros aspectos da atividade educacional que exercem influência direta no modo de conceber a aula e registrá-la no papel, referindo- se às diferentes representações que o sujeito tem, de acordo com sua posição social. Logo, o plano de aula, dependendo do modo como é concebido, pode ser considerado como instrumento de mediação entre os sujeitos; como objeto, ao focarmos apenas a sua escrita e como ferramenta, ao ser um parâmetro a ser seguido pelos professores em sala de aula. Diante da apresentação da esfera de comunicação, temos como segundo elemento das condições de produção, referindo-se ao parâmetro físico/mundo físico, a identidade social dos interlocutores, ou seja, o lugar social de onde falam os parceiros da interação. As marcas que os interlocutores deixam das imagens de si mesmos e dos outros nesse contexto particular. Em relação à produção do plano de aula, os professores falam a partir do ambiente escolar, sendo que os participantes (emissor e receptor) desse diálogo podem ser: o professor com ele mesmo, tendo em vista a necessidade de organização e atitudes conscientes em relação aos conteúdos a serem aplicados em sala de aula; o professor com seu coordenador, na medida em que organiza suas aulas e é cobrada a realização do plano, pressupondo-se, também, os aspectos apontados pelo nível educacional e pelo sistema de ensino, que exercem influência na concepção de ensino e de aprendizagem do professor. Machado (2007, p. 93) expõe que o trabalho docente: [...] consiste em uma mobilização, pelo professor, de seu ser integral, em diferentes situações – de planejamento, de aula, de avaliação – , com o objetivo de criar um meio que possibilite aos alunos a aprendizagem de um conjunto de conteúdos de sua disciplina e o desenvolvimento de capacidades específicas relacionadas a esses conteúdos, orientando-se por um projeto de ensino que lhe é prescrito por diferentes instâncias superiores e com a utilização de instrumentos obtidos do meio social e na interação com diferentes outros que, de forma direta ou indireta, estão envolvidos na situação. (MACHADO, 2007, p. 93).
Constatamos, assim, a relação do gênero com sua esfera de produção, fato que orienta o emissor do texto no momento de sua constituição. Ao demarcar que o plano de aula está na esfera escolar, tendo como emissor o professor, é preciso que ele
tenha uma finalidade para a produção desse gênero, correspondendo ao terceiro elemento das condições de produção: a finalidade, isto é, o intuito discursivo da interação, ou seja, a sua intenção nessa interação. O professor tem o objetivo de ordenar e planejar suas ideias antes de realizar as atividades em sala de aula, sendo assim, tem como intuito discursivo cumprir sua necessidade de ordenação metodológica dos conhecimentos e atividades, realizando a apropriação do plano, enquanto gênero, e dos conhecimentos ali expostos. Há, ainda, a exigência, muitas vezes, da instituição para que haja a produção do plano. Ao estudar o gênero plano de aula, promove-se sua internalização, pressupondo-se que, ao necessitar de organizar uma atividade de ensino, em práticas sociais do cotidiano, o professor fará uso deste instrumento, adaptando-o a sua situação e a sua finalidade. O quarto elemento das condições de produção refere-se à concepção de referente, o conteúdo temático, o referente de que se fala e como é julgado/avaliado nessa situação de interação. De acordo com as atividades a serem desenvolvidas pelos alunos, o conteúdo variará, mas foca-se, neste gênero, particularmente os encaminhamentos metodológicos que serão desenvolvidos nas aulas, exigindo-se uma atitude consciente e refletida dos professores, haja vista que devem selecionar conteúdos e ordená-los de forma consciente para a efetivação do ensino. Para que haja a circulação dos assuntos demarcados no gênero, é preciso o suporte material, as circunstâncias físicas em que o ato de interação se desenrola. O plano de aula pode ter como suporte o planejamento geral de ensino (plano de unidade), dentro do qual se organizam as aulas em sequência. Assim como a maioria dos gêneros que circulam socialmente, o plano de aula apresenta a seleção interdiscursiva, ou seja, o modo como se dá o diálogo entre as vozes que circulam na sociedade. As vozes que emanam do gênero plano de aula são as do professor; vozes dos autores teóricos que subsidiam a produção do material; vozes dos autores dos textos usados nas atividades que legitimam o conteúdo a ser estudado pelos alunos.
correspondendo ao modelo descendente de estudo do texto, partindo-se do geral para o particular. Neste momento, focamos as ações de linguagem do gênero em questão, ou seja, a ação singular do agente. O plano de aula é produto de ação de linguagem, materializado por um professor empírico como forma particular de representação social de um agente. A perspectiva interacionista sociodiscursiva entende que a noção de ação de linguagem está relacionada ao contexto de produção e ao conteúdo temático em que o texto analisado está inserido. Desse modo, descrever uma ação de linguagem consiste em identificar os valores precisos que estão atribuídos pelo agente produtor a cada um dos parâmetros do contexto aos elementos do conteúdo temático mobilizado. O agente constrói uma certa representação sobre a interação comunicativa em que se insere e tem, em princípio, um conhecimento exato sobre sua situação no espaço-tempo. (BRONCKART, 2006, p. 99).
De acordo com a afirmação anterior, podemos depreender que a capacidade de ação é responsável por situar o sujeito com relação ao contexto em que o gênero estudado foi produzido. Desse modo quando situado com relação ao contexto em que o texto foi produzido, o sujeito é capaz de construir certa representação a respeito do autor do texto, do contexto sócio-histórico, o lugar social em que o mesmo foi produzido, ainda sem utilizar-se dos aspectos linguísticos contidos no texto. Sendo assim, as condições de produção do gênero plano de aula dentro da esfera acadêmica, voltada aos professores em formação, foi realizada em diferentes momentos históricos, correspondendo às décadas de 1990, 2000, 2005 e 2010. Diante disso, os elementos das condições de produção que constituem tal gênero diferem-se quanto ao momento de produção, haja vista que foram produzidos em: 1990, 2000, 2005, 2010. O contexto de produção dos gêneros planos de aula foi o mesmo, ou seja, o contexto universitário, voltando-se para a universidade, na qual os professores em formação estudavam. Quanto ao emissor de tal gênero, temos os professores em formação em Letras, escrevendo para seu professor de Prática de ensino (destinatário), tendo em vista o cumprimento das atividades da disciplina. O lugar social do gênero plano de aula apresenta o professor em formação ocupando a posição de enunciador, estando o professor de Prática de ensino na posição de
destinatário. O objetivo da escrita dos planos de aula se volta, de um lado, para a posição do enunciador (professor em formação), que visa à ordenação e ao planejamento de suas ideias antes de realizar as atividades em sala de aula, sendo assim, tem como intuito discursivo cumprir sua necessidade de ordenação metodológica dos conhecimentos e atividades, realizando a apropriação do plano, enquanto gênero, e dos conhecimentos ali expostos. De outro lado, há a posição do destinatário que exige a produção de tal gênero, tendo em vista a necessidade da disciplina. Observamos que há uma padronização quanto às condições de produção do gênero, alterando-se apenas a data de realização do material, fato que interferirá diretamente na arquitetura textual do gênero, sendo relevante a exploração a respeito do momento histórico de produção de cada um dos planos de aula. A fim de explorar tal fato, é possível fazermos um retrospecto do ensino da língua materna. Apresentamos, brevemente, os postulados das décadas de 60 a 80, tendo em vista algumas nomenclaturas presentes nos planos de aula analisados e que, com o passar dos anos, adquiriram novo entendimento, assim como os postulados dos anos de 90-2000 (em diante). Tal percurso é relevante, pois, segundo Geraldi (1996), antes de qualquer atividade em sala de aula, é necessário considerar que toda e qualquer metodologia de ensino relaciona-se a uma opção política que envolve teorias de compreensão e de interpretação da realidade com mecanismos usados em sala de aula. Ao entender os momentos históricos, é possível compreender algumas das categorias que constituíram o gênero plano de aula e sua mudança no decorrer dos anos. Durante a década de 60, de acordo com Zanini (1999), no ensino, concretizava- se uma concepção tradicional, cujo enfoque era a transmissão de conhecimentos, entendo-se que o domínio de conhecimentos gramaticais levava ao conhecimento da língua materna, evidencia-se, assim, a concepção de que ―a linguagem é a expressão do pensamento‖ (TRAVAGLIA, 1996). Logo, segundo Bakhtin/Volochinov (1992), demarca-se a visão de subjetivismo idealista, na qual as leis da criação linguística são essencialmente aquelas da psicologia individual, fazendo com que a enunciação ganhe o percurso do interior para o exterior, não considerando os fatores externos à
(2004) expõe que Chomsky utilizou o conceito de competência como o conhecimento da língua, e o de desempenho como o uso da língua, buscando descobrir as propriedades universais da língua. Logo, Chomsky refuta a relação entre linguagem e vida social, com o propósito de desenvolver sua gramática gerativa transformacional, ancorada em abstrações. É no final da década de 70, que os professores procuram agir em relação aos postulados da concepção de linguagem como instrumento de comunicação, chegando- se à década de 1980. Zanini (1999) afirma que a década de 80 é designada a década dos discursos. Desejava-se que o professor assumisse uma postura de entender a gramática de forma contextualizada, condenando-se uma visão puramente gramatical do estudo da língua, abandonando-se a gramática. Os conceitos, antes considerados, esfacelaram-se, passando-se a considerar o contexto como referência para o estudo da língua, vislumbrando-se os sujeitos da interação verbal. Nesse momento, então, tem-se o foco na linguagem como um processo sociointeracionista, dando abertura para a terceira concepção de linguagem, desenvolvida pelo Círculo de Bakhtin, e definida como forma de interação. Segundo Bakhtin/Volochinov (1992), a língua se constitui de um processo ininterrupto, realizado através da interação verbal social dos locutores e não um sistema estável de formas normativamente idênticas. Sendo assim, os sujeitos são vistos como construtores sociais, pois é por meio da interação de diálogos entre os indivíduos que ocorrem as trocas de experiências e conhecimentos. A expressão transmitida pelos interlocutores, segundo os autores, não é simplesmente organizada pela atividade mental e transmitida pelo indivíduo para o meio social. Na verdade, o que ocorre é que as situações ou ideias do meio social são responsáveis por determinar como será produzido o enunciado. Desse modo, a formação da expressão depende das condições sociais, pois são elas que irão interferir em sua formação, assim, ensinam que o social interfere no individual para formar a expressão. Zanini (1999) postula que esse pensamento indica uma prática de ensino de língua materna que afasta o ensino da gramática descritiva, o treinamento de estruturas sintáticas. Essa mudança de paradigma ocorreu, no Brasil, entre os anos 80 e 90, com
a redemocratização da nação e com a chegada das ciências linguísticas à escola, trazendo a concepção interacionista de linguagem, alterando ―o ensino da leitura e da escrita, agora vistas como processos de interação autor-texto-leitor‖ (SOARES, 1998, p. 59). A reflexão sobre a língua é feita mediante a compreensão, a análise, a interpretação e a produção de textos verbais. Desse modo, podemos considerar que, na concepção interativa de linguagem, o discurso, quando produzido, manifesta-se por meio de textos, que se organizam dentro de determinados gêneros discursivos. Diante desse panorama, a década de 90 tem o foco na interação. Souza (2010) expõe que, nesse período, promulga-se a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB/96, que busca vincular, no ensino de língua, teoria e prática em um único processo, seguida do lançamento dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN-LP- BRASIL), em 1997, propondo a centralização do currículo que apontava para uma reforma na organização curricular, em que os conteúdos são abordados por meio de Temas Transversais, interdisciplinaridade e currículo por competências. A autora afirma que os PCN-LP (BRASIL, 1997) possuem documentos específicos para os diferentes níveis e modalidades de educação básica, contemplando as diversas áreas do conhecimento. Os ideais políticos e sociais disseminados via PCN, justificados pelo processo de mudanças no mundo contemporâneo, vincularam-se às mudanças curriculares e reforçaram a aceitação das transformações do mundo globalizado. Esse processo conferiu ao Currículo não só uma capacidade de solução dos problemas sociais, que ele não tem, mas também a disseminação dos ideais neoliberais. É, na década de 90, que se volta a utilizar o termo competência por meio dos PCN-LP (BRASIL, 1997), contrapondo-se à visão de Chomsky, relacionando-o à organização curricular por competências e habilidades^10. Dessa forma, se o objetivo é fazer com que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não se pode tomar como unidade básica do ensino:
(^10) De acordo com Perrenoud ( 1999 ), as competências são traduzidas em domínios práticos das situações cotidianas que passam compreensão da ação empreendida e do uso a que essa ação é destinada. Já as habilidades são representadas pelas ações em si, isto é, pelas ações determinadas pelas competências de forma concreta.