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sociologia da literatura, pois esta não propõe a questão do valor da obra, e pode interessar-se, justamente, por tudo que é condicionamento.
Tipologia: Esquemas
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a edição revista pelo autor Ouro sobre Azul | Rio de Janeiro 2006
combinam como momentos necessários do processo interpretativo. Sabemos, ainda, que o externo (no caso, o social) importa, não como causa, nem como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel na constituição da estrutura, tornando-se, portanto, interno. Aqui, é preciso estabelecer uma distinção de disciplinas, lembrando que o tratamento externo dos fatores externos pode ser legítimo quando se trata de sociologia da literatura, pois esta não propõe a questão do valor da obra, e pode interessar-se, justamente, por tudo que é condicionamento. Cabe-lhe, por exemplo, pesquisar a voga de um livro, a preferência estatística por um gênero, o gosto das classes, a origem social dos autores, a relação entre as obras e as idéias, a influência da organização social, econômica e política etc. É uma disciplina de cunho científico, sem a orientação estética necessariamente assumida pela crítica. O problema desta é diverso, e pode ser ilustrado por uma questão formulada por Lukács no início da sua carreira intelectual, antes de adotar o marxismo, que o levaria a concentrar-se por vezes demasiadamente nos aspectos políticos e econômicos da literatura. Discutindo o teatro moderno, estabelecia em 1914 a seguinte alternativa: "O elemento histórico-social possui, em si mesmo, significado para a estrutura da obra, e em que medida?" Ou "seria o elemento sociológico na forma dramática apenas a possibilidade de realização do valor estético (…) mas não determinante dele?". 1 É este, com efeito, o núcleo do problema, pois quando estamos no terreno da crítica literária somos levados a analisar a intimidade das obras, e o que interessa é averiguar que fatores atuam na organização interna, de maneira a constituir uma estrutura peculiar. Tomando o fator social, procuraríamos determinar se ele fornece apenas matéria (ambiente, costumes, traços grupais, idéias), que [pág. 14] 1| Georg Lukács, ZUR SOZIOLOGIE DES MODERN DRAMAS, in Schriften zur Litera-tursoziologie, Herman Luchterhand Verlag, Neuwied, 1961, p. 262.
serve de veículo para conduzir a corrente criadora (nos termos de Lukács, se apenas possibilita a realização do valor estético); ou se, além disso, é elemento que atua na constituição do que há de essencial na obra enquanto obra de arte (nos termos de Lukács, se é determinante do valor estético). É o que vem sendo percebido ou intuído por vários estudiosos contemporâneos, que, ao se interessarem pelos fatores sociais e psíquicos, procuram vê-los como agentes da estrutura, não como enquadramento nem como matéria registrada pelo trabalho criador; e isto permite alinhá-los entre os fatores estéticos. A análise crítica, de fato, pretende ir mais fundo, sendo basicamente a procura dos elementos responsáveis pelo aspecto e o significado da obra, unificados para formar um todo indissolúvel, do qual se pode dizer, como Fausto do Macrocosmos, que tudo é tecido num conjunto, cada coisa vive e atua sobre a outra: … alies sich zum Ganzen webt! Eins in dem andem wirkt und lebt! Tomemos um exemplo simples: o do romance Senhora, de José de Alencar. Como todo livro desse tipo, ele possui certas dimensões sociais evidentes, cuja indicação faz parte de qualquer estudo, histórico ou crítico: referências a lugares, modas, usos; manifestações de atitudes de grupo ou de classe; expressão de um conceito de vida entre burguês e patriarcal. Apontá-las é tarefa de rotina e não basta para definir, o caráter sociológico de um estudo. Mas acontece que, além disso, o próprio assunto repousa sobre condições sociais que é preciso compreender e indicar, a fim de penetrar no significado. Trata-se da compra de um marido; e teremos dado um passo adiante se refletirmos que essa compra tem um sentido social simbólico, pois é ao mesmo tempo representação e desmascaramento de costumes vigentes na época, como o casamento por dinheiro. Ao inventar a situação crua do esposo que se vende em contrato, mediante pagamento estipulado, o romancista desnuda as raízes da relação, isto é, faz uma análise
elemento social, não exteriormente, como referência que permite identificar, na matéria do livro, a expressão de uma certa época ou de uma sociedade determinada; nem como enquadramento, que permite situá-lo historicamente; mas como [pág. 16] fator da própria construção artística, estudado no nível explicativo e não ilustrativo. Neste caso, saímos dos aspectos periféricos da sociologia, ou da história sociologicamente orientada, para chegar a uma interpretação estética que assimilou a dimensão social como fator de arte. Quando isto se dá, ocorre o paradoxo assinalado inicialmente: o externo se torna interno e a crítica deixa de ser sociológica, para ser apenas crítica. O elemento social se torna um dos muitos que interferem na economia do livro, ao lado dos psicológicos, religiosos, linguísticos e outros. Neste nível de análise, em que a estrutura constitui o ponto de referência, as divisões pouco importam, pois ludo se transforma, para o crítico, em fermento orgânico de que resultou a diversidade coesa do todo. Está visto que, segundo esta ordem de idéias, o ângulo sociológico adquire uma validade maior do que tinha. Em compensação, não pode mais ser imposto como critério único, ou mesmo preferencial, pois a importância de cada fator depende do caso a ser analisado. Uma crítica que se queira integral deixará de ser unilateralmente sociológica, psicológica ou linguística, para utilizar livremente os elementos capazes de conduzirem a uma interpretação coerente. Mas nada impede que cada crítico ressalte o elemento da sua preferência, desde que o utilize como componente da estruturação da obra. E nós verificamos que o que a crítica moderna superou não foi a orientação sociológica, sempre possível e legítima, mas o sociologismo crítico, a tendência devoradora de tudo explicar por meio dos fatores sociais. Coisa semelhante aconteceu, aliás, na própria sociologia, cuja evolução modificou as suas relações com a crítica. Os estudiosos estão habituados a pensar, neste tópico, segundo posições estabelecidas no século XIX, quando ela estava na fase
das grandes generalizações sistemáticas, que levavam a conceber um condicionamento global da obra, da personalidade literária ou dos conjuntos de obras pelos sistemas sociais, principalmente do ângulo histórico. Todavia, a marcha da pesquisa e da teoria levou a um senso mais agudo das relações entre o traço e o contexto, permitindo desviar a atenção para o aspecto estrutural e funcional de cada unidade considerada. [pág. 17] Isto se deu ao mesmo tempo em que nos estudos críticos a análise descia ao papel das unidades estilísticas, consideradas chaves para conhecer o sentido do todo; e, em ambos os casos, com absoluta predominância do aspecto sincrônico sobre o diacrônico. Portanto, falar hoje em ponto de vista sociológico nos estudos literários deveria significar coisa bastante diversa do que foi há cinquenta anos. A mudança nos dois campos provocará certamente um refluxo sobre a sociologia da literatura, que não apenas tenderá à pesquisa concreta (como vem sugerida, por exemplo, no livro de Robert Escarpit, La Sociologie de la Littérature), mas deixará de lado as ambiciosas explicações causais de sabor oitocentista. O perigo, tanto na sociologia quanto na crítica, está em que o pendor pela análise oblitere a verdade básica, isto é, que a precedência lógica e empírica pertence ao todo, embora apreendido por uma referência constante à função das partes. Outro perigo é que a preocupação do estudioso com a integridade e a autonomia da obra exacerbe, além dos limites cabíveis, o senso da função interna dos elementos, em detrimento dos aspectos históricos, — dimensão essencial para apreender o sentido do objeto estudado. De qualquer modo, convém evitar novos dogmatismos, lembrando sempre que a crítica atual, por mais interessada que esteja nos aspectos formais, não pode dispensar nem menosprezar disciplinas independentes como a sociologia da literatura e a história literária sociologicamente orientada, bem como toda a gama de estudos aplicados à investigação de aspectos sociais das obras, — frequentemente com finalidade não literária.
Um segundo tipo poderia ser formado pelos estudos que procuram verificar a medida em que as obras espelham ou representam a sociedade, descrevendo os seus vários aspectos. É a modalidade mais simples e mais comum, consistindo basicamente em estabelecer correlações entre os aspectos reais e os que aparecem no livro. Quando se fala em crítica sociológica, ou em sociologia da literatura, pensa-se geralmente nessa modalidade, que tem um arquétipo ilustre no La Fontaine et ses Fables, de Taine. Um exemplo de bom nível é o estudo de W. F. Bruford sobre a fidelidade com que a sociedade russa do tempo de Checov é representada nas suas peças e contos (Chekhov and his Rússia). [pág. 19] Se este segundo tipo tende mais à sociologia elementar do que à crítica literária, o terceiro é apenas sociologia, e muito mais coerente, consistindo no estudo da relação entre a obra e o público, — isto é, o seu destino, a sua aceitação, a ação recíproca de ambos. Exemplo conhecido é o ensaio de Lewin Schücking, no Handwörterbuch der Soziologie, de Vierkandt, SOCIOLOGIA DO GOSTO LITERÁRIO, mais tarde posto em volume e traduzido em várias línguas. Apesar do renome, não passa de uma indicação das pesquisas a serem feitas neste sentido. Há outros de teor menos sistemático, e em compensação mais ancorados nos fatos, como Le Public et la Vie Littéraire à Rome, de A. M. Guillemin. Fiction and the Reading Public, de Q. D. Leavis, explora a função da literatura junto aos leitores. Quando o autor aborda o problema histórico da aceitação pública através do tempo, surge uma variante geralmente menos sociológica e mais baseada nos levantamentos tradicionais da erudição; é o que se observa igualmente em estudos similares de literatura comparada, como o Byron et le Romantisme Français, de Edmond Esteve. Ainda quase exclusivamente dentro da sociologia se situa o quarto tipo, que estuda a posição e a função social do escritor, procurando relacionar a sua posição com a natureza da sua produção e ambas com a organização da sociedade. No terreno genérico, temos uma série de obras fora do âmbito literário, como a de Geiger sobre o
estatuto e a tarefa do intelectual (Aufgabe und Stellung der Intelligenz in der Gesellschaft), ou as importantes considerações da sociologia do conhecimento, em particular de Mannheim. É exemplar, no campo histórico, o espírito com que Henri Brunschvicg utiliza este ângulo para analisar a situação e o papel dos intelectuais na formação da sociedade alemã moderna (La Crise de L'État Prussien à la Pin du XVIIP Siècle). No campo literário, é conhecida a monografia de Alexandre Beljame sobre o homem de letras na Inglaterra setecentista. Desdobramento do anterior é o quinto tipo, que investiga a função política das obras e dos autores, em geral com intuito ideológico marcado. Nos nossos dias tem tido a preferência dos marxistas, — compreendendo desde as formulações primárias da crítica [pág. 20] de partido até as observações matizadas e não raro poderosas de Lukács, na obra posterior a 1930. Na Itália, além dos fragmentos de Gramsci, há uma floração significativa de obras deste tipo, com uma liberdade pouco frequente nos autores de orientação marxista em outros países, como é o caso de Galvano delia Volpe. Lembremos, finalmente, um sexto tipo, voltado para a investigação hipotética das origens, seja da literatura em geral, seja de determinados gêneros. Estão nesta chave certas obras clássicas, como a de Gunmere sobre as raízes da poesia, a de Bücher sobre a correlação entre o trabalho e o ritmo poético, ou a investigação marxista de Christopher Caudwell sobre a natureza e as origens da poesia. Muito mais sólido é o estudo de George Thomson sobre as raízes sociais da tragédia grega, norteado igualmente pelas diretrizes do marxismo (Aeschylus and Athens). Todas estas modalidades e suas numerosas variantes são legítimas e, quando bem conduzidas, fecundas, na medida em que as tomarmos, não como crítica, mas como teoria e história sociológica da literatura, ou como sociologia da literatura, embora algumas delas satisfaçam também as exigências próprias do crítico. Em todas
(com o pseudônimo de Alcides Flávio), que o seu amigo Aluísio Azevedo o consultou, durante a composição de O homem, sobre o envenenamento por estricnina; mas não seguiu as indicações recebidas. Apesar do escrúpulo informativo do Naturalismo, desrespeitou os dados da ciência e deu ao veneno uma ação mais rápida e mais dramática, porque necessitava que assim fosse para o seu desígnio. Esta liberdade, mesmo dentro da orientação documentária, é o quinhão da fantasia, que às vezes precisa modificar a ordem do mundo justamente para torná-la mais expressiva; de tal maneira que o sentimento da verdade se constitui no leitor graças a esta traição metódica. Tal paradoxo está no cerne do trabalho literário e garante a sua eficácia como representação do mundo. Achar, pois, que basta aferir a obra com a realidade exterior para entendê-la é correr o risco de uma perigosa simplificação causai. Mas se tomarmos o cuidado de considerar os fatores sociais (como foi exposto) no seu papel de formadores da estrutura, veremos que tanto eles quanto os psíquicos são decisivos para a análise literária, e que pretender definir sem uns e outros a integridade estética da obra é querer, como só o barão de Münchhausen conseguiu, arrancar-se de um atoleiro puxando para cima os próprios cabelos. [pág. 22]
Em muitos críticos de orientação sociológica já se nota o esforço de mostrar essa interiorização dos dados de natureza social, tornados núcleos de elaboração estética. O próprio Lukács, quando não incorre em certas limitações do sectarismo político, indica de maneira convincente que, por exemplo, I Promessi Sposi, de Manzoni, é um supremo romance histórico porque a construção literária exprime uma visão coerente da sociedade descrita (Der Historische lioman). De maneira mais detalhada, Arnold Kettle sugere que a estrutura do Oliver Twist, de Dickens, é literariamente eficaz e sugestiva enquanto o autor desenvolve o contraste entre o
egoísmo bem pensante e a inconsciência da burguesia com o mundo revolto do crime, que se pressupõem mutuamente, e entre os quais é sacudido o pequeno protagonista. Mas, quando o recolhe ao seio da bondade conciliadora do avô, que atenua o travo da desigualdade e das contradições sociais, a composição perde o mordente e mesmo a coerência profunda, causando a queda de qualidade que todo leitor sensível repara a certa altura (The English Novel, vol. I). Num caso e noutro, temos o efeito de uma determinada visão da sociedade atuando como fator estético e permitindo compreender a economia do livro. Este problema ocorre, amplificado em sentido diverso, e prejudicado por certo luxo especulativo, na obra de Lucien Goldmann, que tem procurado mostrar como a criação, não obstante singular e autônoma, decorre de uma certa visão do mundo, que é fenômeno coletivo na medida em que foi elaborada por uma classe social, segundo o seu ângulo ideológico próprio. Embora não considere os problemas de fatura (como Kettle), tenta demonstrar que a visão peculiar transmitida pela tragédia raciniana se aparenta com a que deriva do pensamento de Pascal; e que ambas radicam, de maneira especial e independente, no pessimismo jansenista, por meio do qual um importante setor da burguesia francesa, desajustado na estrutura de castas então reinante, exprimiu ideologicamente este desajuste (Le Dieu Cachê). [pág. 24] Em todos estes casos, o fator social é invocado para explicar a estrutura da obra e o seu teor de idéias, fornecendo elementos para determinar a sua validade e o seu efeito sobre nós. Num plano menos explícito e mais sutil, mencionemos a tentativa de Erich Auerbach, fundindo os processos estilísticos com os métodos histórico- sociológicos para investigar os fatos da literatura (Mimesis — Dargestellte Wirklichkeit in der Abendländischen Literatur). Foi a propósito de tentativas semelhantes que Otto Maria Carpeaux aludiu a um método sintético, a que chamou "estilístico-sociológico", na INTRODUÇÃO da sua magnífica História da literatura ocidental. Tal método, cujo aperfeiçoamento será decerto uma das tarefas desta segunda metade do século, no campo dos estudos literários, permitirá levar o ponto de vista sintético à intimidade da interpretação, desfazendo a dicotomia tradicional entre