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Guias e Dicas
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Anemia Falciforme (hematologia), Resumos de Hematologia

Resumo detalhado sobre a doença Anemia Falciforme.

Tipologia: Resumos

2022

À venda por 17/01/2022

fvclara
fvclara 🇧🇷

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Clara Feitosa
sobre a anemia falciforme
O eritrócito tem estrutura e propriedades metabólicas extremamente complexas que ainda hoje
são objeto de investigações. O perfeito equilíbrio entre seus diversos constituintes como a
membrana celular, as enzimas e a hemoglobina, é extremamente precário e, na opinião de vários
investigadores, um verdadeiro “convite ao desastre”
A hemoglobina representa importante fator do controle da integridade do eritrócito. Sua elevada
concentração, próxima de 30 g/dL, leva à hemácia operar com máxima eficiência, mas implica em
um potencial letal. A anemia falciforme é um exemplo clássico de uma alteração mínima na
estrutura de hemoglobina capaz de provocar, sob determinadas circunstâncias, redução na sua
solubilidade
A alteração molecular primária na anemia falciforme é a substituição de uma única base no códon
6 do gene da globina b, uma adenina (A) é substituída por uma timina (T) (GAGGTC). Esta
mutação resulta na substituição do resíduo glutamil na posição b 6 por um resíduo valil
(β6GluVal) e tem como consequência final a polimerização das moléculas dessa hemoglobina
anormal (HbS) quando desoxigenadas
A substituição do ácido glutâmico por valina na posição β6 ocorre na superfície da molécula, sem
provocar alterações significativas na sua conformação global. A hemoglobina S na conformação
oxi é isomorfa à hemoglobina normal, sugerindo que a estrutura das duas moléculas (exceto pela
substituição do aminoácido) é similares
As solubilidades das hemoglobinas oxigenadas A e S são semelhantes, embora pequenas diferenças
tenham sido detectadas em tampão fosfato concentrado. Em soluções diluídas, as propriedades
físicas das hemoglobinas desoxigenadas A e S são também parecidas. No entanto, soluções
concentradas de desoxi-hemoglobina S e desoxi-hemoglobina A diferem grandemente, e este fato
fornece as bases físico-químicas da gelificação e falcização
A hemoglobina S, quando desoxigenada in vitro, torna-se relativamente insolúvel e agrega-se em
longos polímeros. Esses polímeros resultam do alinhamento de moléculas de hemoglobina S, unidas
por ligações não covalentes e, na descrição desse fenômeno, os termos polimerização, agregação
e gelificação são usados como sinônimos
A polimerização da desoxi-hemoglobina S depende de numerosas variáveis, como concentração
de oxigênio, pH, concentração de hemoglobina S, temperatura, pressão, força iônica e presença
de hemoglobinas normais. Somente a forma desoxigenada de hemoglobina S sofre polimerização;
o fenômeno não ocorre, normalmente, com nenhuma das formas cuja conformação se assemelha
à oxi-Hb S, como meta-Hb S, carboxi-Hb S ou cianometa-Hb S
A polimerização da hemoglobina S é o evento fundamental na patogenia da anemia falciforme,
resultando na alteração da forma do eritrócito e na acentuada redução de sua deformabilidade
A Hemoglobina Fetal (HbF) inibe a polimerização, fenômeno responsável pela redução de
sintomatologia clínica nos pacientes com elevados níveis de Hb fetal. Da mesma forma, a HbA
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sobre a anemia falciforme

  • O eritrócito tem estrutura e propriedades metabólicas extremamente complexas que ainda hoje são objeto de investigações. O perfeito equilíbrio entre seus diversos constituintes como a membrana celular, as enzimas e a hemoglobina, é extremamente precário e, na opinião de vários investigadores, um verdadeiro “convite ao desastre”
  • A hemoglobina representa importante fator do controle da integridade do eritrócito. Sua elevada concentração, próxima de 30 g/dL, leva à hemácia operar com máxima eficiência, mas implica em um potencial letal. A anemia falciforme é um exemplo clássico de uma alteração mínima na estrutura de hemoglobina capaz de provocar, sob determinadas circunstâncias, redução na sua solubilidade
  • A alteração molecular primária na anemia falciforme é a substituição de uma única base no códon 6 do gene da globina b, uma adenina (A) é substituída por uma timina (T) (GAG→GTC). Esta mutação resulta na substituição do resíduo glutamil na posição b 6 por um resíduo valil (β6Glu→Val) e tem como consequência final a polimerização das moléculas dessa hemoglobina anormal (HbS) quando desoxigenadas
  • A substituição do ácido glutâmico por valina na posição β6 ocorre na superfície da molécula, sem provocar alterações significativas na sua conformação global. A hemoglobina S na conformação oxi é isomorfa à hemoglobina normal, sugerindo que a estrutura das duas moléculas (exceto pela substituição do aminoácido) é similares
  • As solubilidades das hemoglobinas oxigenadas A e S são semelhantes, embora pequenas diferenças tenham sido detectadas em tampão fosfato concentrado. Em soluções diluídas, as propriedades físicas das hemoglobinas desoxigenadas A e S são também parecidas. No entanto, soluções concentradas de desoxi-hemoglobina S e desoxi-hemoglobina A diferem grandemente, e este fato fornece as bases físico-químicas da gelificação e falcização
  • A hemoglobina S, quando desoxigenada in vitro, torna-se relativamente insolúvel e agrega-se em longos polímeros. Esses polímeros resultam do alinhamento de moléculas de hemoglobina S, unidas por ligações não covalentes e, na descrição desse fenômeno, os termos polimerização, agregação e gelificação são usados como sinônimos
  • A polimerização da desoxi-hemoglobina S depende de numerosas variáveis, como concentração de oxigênio, pH, concentração de hemoglobina S, temperatura, pressão, força iônica e presença de hemoglobinas normais. Somente a forma desoxigenada de hemoglobina S sofre polimerização; o fenômeno não ocorre, normalmente, com nenhuma das formas cuja conformação se assemelha à oxi-Hb S, como meta-Hb S, carboxi-Hb S ou cianometa-Hb S
  • A polimerização da hemoglobina S é o evento fundamental na patogenia da anemia falciforme, resultando na alteração da forma do eritrócito e na acentuada redução de sua deformabilidade
  • A Hemoglobina Fetal (HbF) inibe a polimerização, fenômeno responsável pela redução de sintomatologia clínica nos pacientes com elevados níveis de Hb fetal. Da mesma forma, a HbA

participa pouco do polímero e esta é a razão para a quase ausência de anormalidades clínicas nos heterozigotos para o gene da hemoglobina S

  • Todas as hemácias contendo predominantemente hemoglobina S podem adquirir a forma falciforme clássica após desoxigenação, em decorrência da polimerização intracelular da desoxi- Hb S, processo reversível após a reoxigenação. No entanto, a repetição frequente desse fenômeno provoca lesão de membrana em algumas células, fazendo com que a rigidez e a forma de foice persistam mesmo após a reoxigenação
  • Assim, esses eritrócitos, denominados genericamente “células irreversivelmente falcizadas” ou células densas, retêm permanentemente a forma anormal, mesmo na ausência de polimerização intracelular de hemoglobina
  • Em decorrência de sua acentuada rigidez, as células irreversivelmente falcizadas têm vida-média reduzida e contribuem para a anemia hemolítica. O quadro clínico da anemia falciforme não depende dos sintomas causados pela anemia propriamente, mas, sim, da ocorrência de lesões orgânicas causadas pela inflamação e obstrução vascular e das “crises de falcização”. Nos períodos entre as crises, a “fase estável”, os pacientes evoluem praticamente assintomáticos com hemoglobina ao redor de 8 g/dL
  • O fenômeno de vaso-oclusão ocorre geralmente na microcirculação. No entanto, grandes artérias, principalmente nos pulmões e cérebro, também podem ser afetadas. Acredita-se que o fenômeno vaso-oclusivo compreende um processo com várias etapas que envolve interações de hemácias, leucócitos ativados, células endoteliais, plaquetas e proteínas do plasma. A liberação intravascular de hemoglobina pelas hemácias fragilizadas provoca:

capacidade adesiva devido ao grande número de moléculas de adesão como a integrina VLA- 4 (integrina a4b1), CD36, ICAM-4 e BCAM/Lu que interagem com:  Moléculas subendoteliais da parede vascular: ➢ Laminina ➢ Trombospondina ➢ Fibronectina  Moléculas das células endoteliais: ➢ CD ➢ VCAM- 1 ➢ BCAM/Lu ➢ P-selectina

  • Os leucócitos, geralmente encontrados em estado ativado na circulação de indivíduos com AF, também aderem com mais facilidade ao endotélio vascular. Acredita-se que o processo vaso- oclusivo é desencadeado pela adesão de leucócitos, especialmente neutrófilos, já que são células grandes (12- 15 μm) e relativamente rígidas
  • Os leucócitos aderidos podem provocar a adesão secundária de hemácias à parede vascular e a combinação desses episódios inicia o processo vaso-oclusivo, uma vez que ocorre a obstrução física dos pequenos vasos da microcirculação
  • A interação dos leucócitos com o endotélio é intermediada pelas integrinas Mac-1 e LFA-1, pela L- selectina e pela E-selectina na superfície dos leucócitos que, por sua vez, interagem com ICAM-1, P-selectina e E-selectina na superfície das células endoteliais. Há indícios de que um número elevado de granulócitos circulantes está associado à maior incidência de complicações na anemia falciforme. As plaquetas, também encontradas em estado ativado na AF, podem aderir ao endotélio vascular, exacerbando a inflamação local pela liberação de mediadores inflamatórios potentes. Assim sendo, as plaquetas também apresentam papel importante no mecanismo de vaso-oclusão VASO-OCLUSÃO E O ÓXIDO NÍTRICO (NO)
  • O NO é um gás sinalizador produzido pelas células endoteliais e é responsável pela regulação do tônus vasomotor. A biodisponibilidade do NO está reduzida na AF, principalmente devido ao seu consumo pela hemoglobina livre, liberada na circulação após a hemólise das hemácias
  • O resultado principal da redução da disponibilidade do NO é a inibição da vasodilatação dependente de NO na vasculatura, contribuindo com a vasoconstrição, favorecendo potencialmente a vaso- oclusão e participando da fisopatogenia de algumas manifestações da AF (hipertensão pulmonar e priapismo) VASO-OCLUSÃO, PLAQUETAS E A COAGULAÇÃO
  • A fisiopatologia da AF está associada a um estado de hipercoagulabilidade. Indivíduos com AF apresentam níveis elevados de marcadores de ativação de trombina, plaquetas e células endoteliais, tais como:  Dímero-D  Trombina-Antitrombina (TAT)  Ligante de CD40 solúvel (CD40L)  Fator Tecidual (FT)  Fator Ativador de Plaquetas (FAP)  Fator de von Willebrand (FvW)
  • Há dados que indicam uma associação na AF entre a hemólise e a ativação da coagulação, bem como uma possível contribuição da ativação plaquetária para o AVC na doença. Contudo, é provável que a vaso-oclusão recorrente contribua com a hipercoagulabilidade por aumentar a ativação do endotélio e das plaquetas VASO-OCLUSÃO E O ESTRESSE OXIDATIVO
  • A produção de Espécies Reativas de Oxigênio (ROS) é neutralizada, em condições normais, por antioxidantes que previnem os danos causados pelas ROS
  • Na anemia falciforme, múltiplos mecanismos são responsáveis por aumentar a produção de ROS na vasculatura, como lesões por isquemia-reperfusão que ocorrem nos vasos sanguíneos devido à interrupção e subsequente reestabelecimento do fluxo sanguíneo
  • A presença de ROS no vaso sanguíneo e a baixa concentração de oxigênio apresentam um papel importante na ativação das células endoteliais, em que a produção de ROS é amplificada pela ativação da enzima xantina oxidase e pela inativação da enzima sintase de óxido nítrico
  • A atividade aumentada da NADPH oxidase (devido à leucocitose), a formação de Dimetilarginina Assimétrica (DMAA) e a auto-oxidação da própria hemoglobina S na presença de oxigênio também contribuem com a produção de ROS. Por outro lado, importantes mecanismos de defesa antioxidantes, como os níveis das vitaminas A, C e E e a atividade das enzimas glutationa peroxidase e superóxido dismutase, estão diminuídos na anemia falciforme
  • O estresse oxidativo ativa do endotélio, facilitando a hemólise, aumentando as propriedades adesivas das células brancas e vermelhas e elevando a oxidação dos lipídios presentes na membrana celular, o estresse oxidativo também participa do consumo intravascular de NO HIDROXIUREIA (HU) E A VASO-OCLUSÃO
  • A terapia com hidroxiureia está geralmente associada a um aumento nos níveis de Hemoglobina Fetal (HbF) nos pacientes com anemia falciforme, diminuindo a falcização das hemácias e promovendo melhora significativa nos níveis de hemólise. Uma taxa menor de hemólise pode reduzir o consumo de NO intravascular e diminuir a ativação do endotélio. Efeitos da HU:  Pode agir como um doador de NO, melhorando a biodisponibilidade desse vasodilatador na anemia falciforme  Redução na contagem de leucócitos, já que os leucócitos participam de forma significativa na inflamação e na oclusão física dos vasos  Redução indireta na expressão das moléculas de adesão na superfície das células brancas e vermelhas, além de melhorar parcialmente o estado inflamatório e reduzir o estado de hipercoagulabilidade dos pacientes PADRÕES DE HERANÇA NA ANEMIA FALCIFORME
  • SÍNDROME, DOENÇA E ANEMIA FALCIFORME:  Síndromes falciformes: é o termo que identifica as condições em que o eritrócito sofre falcização após redução na tensão de oxigênio  Doenças falciformes: é o termo reservado às situações em que a falcização das hemácias conduz a manifestações clínicas evidentes. Assim, as doenças falciformes incluem a anemia falciforme, que representa o estado homozigoto para a hemoglobina S (SS), e as interações hemoglobina S/Beta-talassemia (S/β tal), hemoglobinopatia SC (SC), hemoglobinopatia SD (SD) e hemoglobina S-persistência hereditária de hemoglobina fetal (S/PHHF). Nessa definição, o estado heterozigótico para hemoglobina S (“traço falciforme”) é classificado como síndrome falciforme, mas não como doença falciforme
  • GENÉTICA POPULACIONAL DAS SÍNDROMES FALCIFORMES: a distribuição geográfica do gene da hemoglobina S (HbS) na África é expressivamente semelhante àquela do Plasmodium falciparum (protozoário que causa a malária). Indivíduos com HbS em heterozigose, quando infectados por Plasmodium falciparum, apresentam vantagem seletiva em relação a indivíduos que não carregam esse gene anômalo. A vantagem seletiva das células AS sobre as AA foi demonstrada in vitro. É interessante observar que propriedades semelhantes de resistência à malária também são relatadas em heterozigotos para hemoglobina. A vantagem seletiva do heterozigoto teve como consequência o aumento da frequência do gene da HbS em áreas do mundo em que a malária foi endêmica. A anemia falciforme prevalece na raça negra e sua maior incidência ocorre na África,

 S/ β 0 talassemia: com ausência total de produção de HbA. Os pacientes com S/β0 talassemia têm evolução mais grave, semelhante aos homozigotos SS  S/ β + talassemia: em que ocorre produção predominante de HbS e de quantidades reduzidas de HbA Apesar de a eletroforese de hemoglobina mostrar HbS sem HbA (como na homozigose SS), 3 achados contribuem para o diagnóstico diferencial:  Microcitose  Hipocromia  Níveis elevados de HbA O estudo familiar é fundamental para o diagnóstico correto, e mostrará que um dos pais é heterozigoto AS e o outro heterozigoto para β-talassemia (microcitose, hipocromia, elevação de HbA2 e ausência de HbS na eletroforese). No Brasil, a associação mais comum é com a mutação βo do códon 39 (C→T). Os pacientes com S/β+ talassemia podem apresentar evolução clínica grave ou moderada, dependendo da mutação de β-talassemia envolvida  Mutação IVS- 1 - 110 (G A): está associada com evolução mais grave Mutação IVS- 1 - 6 (T C): acompanha-se de evolução clínica mais benigna Essas duas mutações são, após a mutação βo do códon 39, as mutações talassêmicas mais frequentes no estado de São Paulo. Importa lembrar que a frequência de talassemia b em negros é reduzida, em geral abaixo de 1%. Assim, a associação entre HbS e β talassemia em negros não é frequente. Nesses casos, a mutação mais comum é na região promotora do gene β-globina (- 88 C→T), também caracterizada por evolução clínica benigna

  • O diagnóstico das síndromes falciformes pode ser feito por:  Eletroforese de hemoglobinas: comprova a presença da hemoglobina S  Cromatografia Líquida de Alta Performance (HPLC)  Eletroforese com Focalização Isoelétrica (FIE)  Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), seguida de sequenciamento do DNA ou digestão com uma enzima de restrição apropriada: é o método utilizado no diagnóstico pré-natal das doenças falciformes, ou em alguns casos de difícil diagnóstico pela eletroforese de hemoglobinas
  • É importante ressaltar que é quase sempre indispensável para o diagnóstico correto das síndromes falciformes o estudo de todos os familiares disponíveis. Todos os recém-nascidos de grupos populacionais onde a frequência da mutação para HbS é elevada devem ser submetidos à triagem neonatal para detecção de doença falciforme. Atualmente, são bem conhecidos os benefícios do diagnóstico precoce, introdução de antibioticoterapia profilática e programa adequado de vacinação
  • Os procedimentos laboratoriais para recém-nascidos devem separar com segurança a HbF das outras hemoglobinas. As técnicas utilizadas são a focalização isoelétrica ou cromatografia líquida de alta performance. O teste pode ser realizado em:  Sangue de cordão umbilical  Sangue venoso coletado em papel de filtro, podendo ser utilizada a mesma estratégia de coleta de amostras para outros testes neonatais, como de fenilcetonúria e de hipotireoidismo congênito (“testes do pezinho”)

CARACTERÍSTICAS LABORATORIAIS DA ANEMIA FALCIFORME:

  • HEMOGLOBINA EM PACIENTES NA FASE ESTÁVEL DA DOENÇA: varia entre 6 a 10 g/dL  Anemia é normocítica e normocrômica  Elevação de reticulócitos (entre 5 e 20%)  Eritroblastos circulantes (ocasionalmente observados)  Deficiência de ferro (ocasionalmente observada), podendo levar à microcitose e hipocromia  Leucocitose (às vezes com desvio à esquerda) que nem sempre está relacionada a infecção  Trombocitose (elevação das plaquetas) de até 1.000.000/μL; - Velocidade de hemossimentação (VHS) geralmente baixa, não sendo parâmetro útil nas doenças falciformes, pois as hemácias falcizadas dificilmente formam os grupamentos que facilitam a sedimentação
  • HEMÁCIAS EM FORMA DE FOICE: são caracteristicamente observadas nas doenças falciformes, embora outras formas aberrantes possam também ser visualizadas:  Em recém-nascidos poucas células falcizadas podem ser observadas, devido à elevada porcentagem de HbF  Após 1 ano de idade, as células falcizadas tornam-se mais evidentes  Hemácias em alvo também podem aparecer, principalmente na S/β talassemia e na hemoglobinopatia SC  Corpos de Howel-Jolly são identificados com a redução da função esplênica. A hipofunção esplênica pode ser avaliada também pela contagem de inclusões intracelulares observadas por microscopia de contraste de interferência (quantificação de hemácias com pits)
  • HEMÓLISE:  Elevação da bilirrubina indireta  Elevação de urobilinogênio  Redução da haptoglobina  Hiperplasia eritroide na medula óssea
  • PROVAS DE COAGULAÇÃO:  Normal durante a fase estável  Hipercoagulabilidade durante os episódios vaso-oclusivos
  • FERRITINA:  Normal em pacientes não submetidos a transfusões crônicas, podendo apresentar discreta elevação após a terceira década de vida  Elevada em pacientes submetidos a transfusões crônicas, podendo ocorrer hemocromatose secundária. Muitas vezes, é necessária a terapia com quelantes de ferro, embora as lesões orgânicas sejam menos acentuadas que aquelas observadas nos pacientes com β-talassemia  É sempre importante estabelecer os valores hematológicos basais para cada paciente, pois esses valores permanecem relativamente estáveis em um deles, mas variam grandemente em diferentes pacientes. Redução do VCM indica S/β talassemia ou associação com α-talassemia  A leucocitose e a trombocitose estão associadas à hiperplasia de medula óssea em pacientes com hipofunção esplênica, além do estado inflamatório crônico
  • Apesar de a alteração molecular ser a mesma, diferentes pacientes com anemia falciforme podem apresentar evoluções clínicas significativamente distintas. O mais conhecido e o mais importante modulador fenotípico da anemia falciforme, é o nível de HbF
  • Outros possíveis indicadores da variação fenotípica da anemia falciforme são os haplótipos do gene da β-globina, a região controladora da expressão do complexo do gene da β-globina (LCR = Locus Control Region), mutações que causam persistência hereditária de hemoglobina fetal e talassemia alfa

 Desidratação  Tensão emocional de qualquer natureza As crises dolorosas são mais frequentes na terceira e quarta décadas de vida e a taxa de mortalidade é mais alta em adultos que as apresentam com maior frequência

  • A oclusão microvascular, sobretudo na medula óssea, é o fator inicial do episódio doloroso. Essa oclusão, secundária à falcização das hemácias, causa isquemia dos tecidos, resultando em uma resposta inflamatória aguda. As crises dolorosas típicas atingem principalmente:  Ossos longos  Articulações  Região lombar  Outras (couro cabeludo, face, tórax e pelve)
  • Episódios agudos de dor e inchaço de mãos e pés (síndrome das mãos e pés ou dactilite) são frequentes em crianças entre 6 meses e 2 anos de idade e extremamente raras após os 7 anos de idade. Essas crises vaso-oclusivas são autolimitadas e desaparecem após 1 semana, embora possam ocorrer ataques recorrentes
  • O tratamento é sintomático e, se os sinais persistirem, é importante afastar o diagnóstico de osteomielite. Uma crise dolorosa grave é definida como aquela que exige tratamento hospitalar com analgésico parenteral por mais de 4 horas. A ocorrência de mais de 3 episódios graves em um mesmo ano caracteriza doença falciforme com evolução clínica grave. CRISES APLÁSTICAS
  • São caracterizadas por:  Redução acentuada da hemoglobina  Redução do nível de reticulócitos  Insuficiência transitória da eritropoese
  • Em geral, esse tipo de crise é desencadeado pela infecção por parvovírus B19 e ocorre, em 68% dos casos, em crianças. No entanto, em adultos a presença de imunização natural por exposição prévia ao vírus torna mais frequentes infecções por Streptococcus pneumoniae, salmonelas e pelo vírus Epstein-Barr, além de necrose medular óssea extensa, com febre, dor óssea, reticulocitopenia e reação leucoeritroblástica
  • Outra causa de queda na contagem de reticulócitos é o uso iatrogênico de tensões supramáximas de oxigênio inalatório, que podem suprimir a produção endógena de eritropoetina após 2 dias de uso. Essa complicação é autolimitada, e no período de 5 a 10 dias a eritropoese volta ao normal. No entanto, no período agudo de anemia, pode ser necessária a terapêutica com transfusões de concentrado de hemácias. A insuficiência medular também pode resultar da deficiência de ácido fólico, especialmente durante a gravidez (também conhecida como crise megaloblástica) CRISES HEMOLÍTICAS
  • Também denominadas de crises hiper-hemolíticas
  • Caracterizada por aumento brusco na taxa de hemólise
  • Esse tipo de crise é raro
  • Relacionado a infecções por Mycoplasma, deficiência de G6PD ou esferocitose hereditária
  • Quadro clínico pode incluir agravamento da anemia e acentuação da icterícia. No entanto, antes de fazer o diagnóstico de crise hemolítica, devem ser afastadas outras causas mais frequentes de elevação dos níveis de bilirrubinas, como obstrução por cálculo de vesícula, hepatite ou falcização com colestase intra-hepática CRISES DE S EQUESTRO ESPLÊNICO
  • Episódio agudo caracterizado pelo acúmulo rápido de sangue no baço
  • Redução nos níveis basais de hemoglobina de pelo menos 2 g/dL
  • Hiperplasia compensatória de medula óssea
  • Aumento rápido do baço
  • Ocorre geralmente após o 6º mês de vida e torna-se menos frequente após os 2 anos de idade. No entanto, pode ocorrer mesmo em adultos portadores de esplenomegalia, especialmente portadores de S/β-talassemia ou hemoglobinopatia SC
  • Crises de sequestro esplênico são responsáveis por elevado percentual de mortes nos primeiros 10 anos de vida (10 a 15% em alguns estudos) INFECÇÕES
  • Infecções são a principal causa de hospitalização e morbimortalidade na anemia falciforme, principalmente na infância
  • O risco de infecções graves é maior em pacientes com menos de 4 anos de idade e entre estas se destaca a meningite bacteriana, causada em 78% dos casos por pneumococos
  • Outros tipos de infecções frequentes são:  Pneumonia  Osteomielite  Septicemia  Infecção urinária
  • As bactérias envolvidas são mais comumente (embora não exclusivamente) aquelas que possuem envoltório de polissacarídeos tais como:  Streptococcus pneumoniae  Haemophilus influenzae tipo B  Neisseria meningitidis  Escherichia coli  Enterobacter sp  Klebsiella sp  Staphylococcus aureus  Mycoplasma sp
  • As razões da maior suscetibilidade à infecção ainda não são totalmente conhecidas. Aparentemente, as múltiplas lesões orgânicas e a asplenia (orgânica ou funcional) têm papel preponderante. Além disso, são descritas deficiências de opsoninas séricas, defeito na via alternativa do complemento, falta de tuftsina, alteração na atividade da via hexose-monofosfato dos leucócitos e defeitos imunes
  • É relevante ressaltar que intervenções diagnósticas e terapêuticas rápidas nos casos com suspeitas de infecção bacteriana podem ser cruciais para salvar a vida do paciente. As alterações histopatológicas no baço de pacientes com anemia falciforme são conhecidas: 1. Inicialmente, há uma esplenomegalia consequente à congestão da polpa esplênica em virtude da obstrução por grandes quantidades de células falcizadas, acompanhada de hemorragias ao redor dos corpúsculos de Malpighi 2. A oclusão vascular provoca repetidos microinfartos, tornando o órgão fibrótico e atrófico. Esses fenômenos são coincidentes com os achados clínicos da palpação do baço nos pacientes com anemia falciforme 3. Comumente, há esplenomegalia nos primeiros anos de vida, seguida de ausência do órgão após os 6 anos de idade, resultante da autoesplenectomia acompanhada de fibrose 4. As repercussões da hipofunção esplênica nas doenças falciformes é maior suscetibilidde a infecções. O grau de comprometimento da função esplênica é mais acentuado em pacientes com anemia falciforme e S/β 0 talassemia, quando comparados aos pacientes com hemoglobinopatia SC ou HbS/β+ talassemia. No entanto, mesmo em pacientes que conservam

 Um valor de PSAP de 35 mmHg equivale aproximadamente a uma velocidade de fluxo regurgitante da válvula tricúspide de 2,5 m/s, enquanto valores de entre 2,5 e 2,9 m/s se associam a um risco relativo de óbito de 4,4, e acima de 3,0 m/s, o risco é de 10,6 vezes  Assim, recomenda-se rastreamento anual com ecocardiograma transtorácico, com medida da PSAP e fluxo regurgitante da válvula tricúspide. Se o fluxo regurgitante for > 2.5 m/s e/ou PSAP elevada, considerar cateterismo cardíaco direito para confirmação, e se o fluxo for >3. m/s ou sinais de disfunção cardíaca direita, deve-se realizar cateterismo cardíaco direito e considerar programa regular de transfusão e hidroxiureia. O uso crônico do inibidor de fosfodiesterase-5 sildenafil não foi bem-sucedido e aumentou a incidência de crises dolorosas

  • DIAGNÓSTICO: radiografias de tórax seriadas, cultura de secreção pulmonar quando possível, hemoculturas, monitoramento da gasometria, acompanhamento dos níveis de hemoglobina, estudo da ventilação-perfusão ou angiotomografia quando indicada a pesquisa de tromboembolismo COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS
  • Algum tipo de comprometimento neurológico acomete cerca de 25% dos pacientes com doenças falciformes
  • As alterações são mais comuns em pacientes SS do que em pacientes com hemoglobinopatias SC ou S/β talassemia
  • As complicações clínicas no SNC incluem:  Acidente vascular cerebral  Hemorragia cerebral é mais frequente em adultos entre as 2ª e 3ª décadas de vida  Ataques isquêmicos transitórios  Infartos cerebrais são mais frequentes em crianças com pico de incidência até os 6 anos de idade e em adultos após os 30 anos de idade
  • Novelos vasculares (conhecidos como moya moya) envolvendo vasos frágeis e dilatados, que se desenvolvem como circulação colateral ao redor de áreas de infarto e aneurismas, são os fatores causais das hemorragias em adultos
  • No sistema nervoso, ao contrário de outras regiões, vasos maiores parecem ser os locais mais acometidos por vaso-oclusão
  • As complicações neurológicas são graves e podem ser fatais em até 15% dos casos
  • DIAGNÓSTICO: o diagnóstico preciso e o início rápido da terapêutica transfusional impedem a progressão da doença e podem mesmo reverter as manifestações clínicas  A hemoglobina S deve ser mantida abaixo de 30% durante a terapêutica transfusional, cuja duração deve ser superior a 5 anos. Alguns dados indicam que provavelmente essa terapêutica deve ser mantida indefinidamente  O exame com Doppler ultrassonográfico transcraniano detecta precocemente as lesões, com base na medida das velocidades do fluxo sanguíneo nos principais vasos que irrigam o encéfalo. Altas velocidades identificam as crianças potencialmente suscetíveis a sofrer AVC, que pode ser evitado por um esquema de transfusão crônica
  • TRATAMENTO: a terapêutica básica nas alterações vaso-oclusivas no SNC é a transfusão de concentrado de hemácias COMPLICAÇÕES HEPATOBILIARES
  • A etiologia dessa complicação não está ainda bem elucidada
  • A excreção contínua e elevada de bilirrubinas leva à formação de cálculos biliares
  • Embora tenham sido relatados cálculos em crianças de 3 ou 4 anos de idade, essa complicação é comum em pacientes adultos
  • A colecistectomia era anteriormente reservada para pacientes com sintomas significativos (2 ou 3 episódios de dor no período de 6 meses), porém pode ser indicada mesmo nos pacientes assintomáticos, pelo alto risco de complicações com crises vaso-oclusivas graves e síndrome torácica aguda no caso de colecistite aguda
  • As alterações na função hepática podem ser relacionadas à falcização intra-hepática, infecções adquiridas na transfusão ou hemossiderose transfusional
  • A denominação síndrome do quadrante superior direito designa episódio agudo caracterizado por hiperbilirrubinemia extrema, aumento rápido do fígado, febre e dor acentuada
  • Diagnóstico diferencial inclui colecistite aguda, pancreatite, hepatite aguda, crise dolorosa e um possível sequestro hepático
  • Os níveis de enzimas hepáticas são anormais e os níveis de bilirrubina podem chegar até a 100 mg/dL
  • TRATAMENTO: transfusão de substituição, mantendo níveis de HbS menores que 10%. Em crianças, a evolução é, em geral, favorável, mas em adultos o quadro pode ser de difícil resolução COMPLICAÇÕES GENITOURINÁRIAS
  • O rim é extremamente suscetível a complicações em pacientes com doenças falciformes devido às características peculiares de seu microambiente, que incluem reduzidas tensões de oxigênio, pH ácido e alta tensão osmótica. Esse tipo de ambiente facilita a ocorrência de falcização e infarto na medula renal, com consequente hematúria e inabilidade de concentrar urina (hipostenúria). É importante lembrar que essas complicações podem ocorrer não somente em pacientes com doenças falciformes, mas também em heterozigotos para hemoglobina S (traço falciforme, AS)
  • O tratamento da hematúria é conservador, em geral, repouso no leito e hidratação adequada levam à remissão espontânea. No entanto, algumas vezes a hematúria é de tal intensidade que é necessária transfusão de sangue. A excreção de potássio também está reduzida e episódios de hipercalemia foram descritos. Ocasionalmente, podem ser observados níveis elevados de ácido úrico devido à hiperplasia de medula óssea e consequente aumento na produção de urato em razão do metabolismo das purinas, além da redução na depuração de urato pelos túbulos renais
  • PROTEINÚRIA:  Ocorre em 26% dos pacientes com doença falciforme e creatinina sérica elevada em 7%  A lesão anatomopatológica é representada por aumento glomerular e glomeruloesclerose periférica focal segmentar  O tratamento com enalapril (IECA - inibidor da enzima conversora de angiotensina), parece reduzir a proteinúria, sugerindo que a hipertensão capilar pode ser um fator patogênico na nefropatia da anemia falciforme. Em pacientes com insuficiência renal crônica, deve ser iniciado programa de hemodiálise e, se possível, indicado transplante renal
  • PRIAPISMO:  Complicação relativamente frequente  Ocorre quando as células falcizadas obliteram os corpos cavernosos e esponjoso e impedem o esvaziamento do sangue do pênis  Existem 2 apresentações clínicas: ➢ Priapismo agudo: corresponde à ereção dolorosa, prolongada, que persiste por várias horas ➢ Priapismo recorrente ou “intermitente” (do inglês stuttering): caracterizado por episódios reversíveis da ereção que podem ocorrer em períodos variáveis, com duração de minutos, e também em múltiplos episódios no mesmo dia

 É uma complicação altamente incapacitante, principalmente para jovens. Uma complicação que deve sempre ser pesquisada é a osteomielite

  • TRATAMENTO: sempre insatisfatório e inclui cuidados locais da ferida (higiene, antibióticos, e repouso). O repouso prolongado é fundamental, mas quase sempre é difícil de ser realizado por pacientes com atividade física normal GRAVIDEZ
  • Com os cuidados terapêuticos atuais, a morte materna é complicação rara nas doenças falciformes. Algumas das principais complicações durante a gravidez e o puerpério incluem:  ABORTOS ESPONTÂNEOS: ➢ Complicação de etiologia desconhecida ➢ Parece ter menor frequência nas portadoras de hemoglobinopatia SC em relação às SS, mas tem incidência desconhecida nas S-β-talassêmicas ➢ Especula-se que lesões microvasculares na placenta causadas pelas hemácias falcizadas tenham papel mais importante na fisiopatologia das perdas gestacionais do primeiro trimestre do que o próprio grau de anemia das doentes acometidas  RETARDO DE CRESCIMENTO INTRAUTERINO: ➢ Ocorre com frequência elevada em pacientes com anemia falciforme, e com menor frequência em portadoras de hemoglobinopatia SC ou S-β-talassemia ➢ Numerosas causas contribuem para esse quadro, porém 2 fatores que agem desfavoravelmente no crescimento fetal intrauterino são a hipóxia e a desnutrição ➢ A placenta de portadoras de anemia falciforme é anormal em tamanho, localização, inserção na parede uterina e histologia ➢ A anemia materna promove diminuição do fluxo sanguíneo na região placentária, causando déficit de crescimento da membrana placentária. Episódios frequentes de vaso-oclusão podem ainda contribuir para o retardo do crescimento intrauterino, sendo possível que arteríolas deciduais sejam obstruídas por agrupamentos de hemácias falcizadas, promovendo hipoperfusão e hipóxia da membrana placentária ➢ Provavelmente essas lesões ocorrem precocemente no período gestacional, explicando por que programas profiláticos de transfusões sanguíneas realizadas em período ulterior não modificam significativamente a evolução desse processo  INFECÇÕES: ➢ São as complicações mais comuns das doenças falciformes, com frequência estimada em 28 a 67% dos casos ➢ A infecção urinária é encontrada em 28% dos casos ➢ Inicialmente, a infecção urinária é assintomática, mas com o transcorrer da gravidez, há possibilidade de exacerbação da bacteriúria com aumento na frequência de prematuridade e de recém-nascido pequeno para a idade gestacional (PIG) ➢ As pacientes devem, pois, ser investigadas e tratadas precocemente durante o acompanhamento pré-natal  DORES ÓSSEAS: ➢ São frequentemente observados nas doenças falciformes ➢ Durante a gravidez, principalmente no terceiro trimestre, pode haver maior incidência dessa complicação  ANEMIA: ➢ Durante o terceiro trimestre, principalmente ao redor de 32 a 34 semanas de gravidez, há redução nos níveis de hemoglobina, tanto em mulheres normais como em mulheres com doenças falciformes

➢ Essa redução é de aproximadamente 30%, sendo agravada por deficiência de folato, quadros infecciosos ou inflamatórios, crises aplásticas ou acentuação da hemólise  PRÉ-ECLÂMPSIA: ➢ A frequência é elevada em mulheres com doenças falciformes, podendo agravar as doenças renais preexistentes ➢ A presença de proteinúria e hipertensão arterial em pacientes com lesão renal prévia pode ser confundida com o diagnóstico de pré-eclâmpsia ➢ O diagnóstico deve ser sugerido quando há hipertensão arterial associada com edema e proteinúria após a 20ª semana de gravidez. Essa afirmação é consequência do fato de que, habitualmente, na doença falciforme, os níveis pressóricos são inferiores aos de indivíduos normais, e durante a gestação normal observa-se pressão arterial mantida em níveis inferiores aos de mulheres grávidas normais até a 20ª semana ➢ Dessa forma, níveis pressóricos ≥ 125 × 75 mmHg devem ser rigorosamente monitorizados, pois a existência de pré-eclâmpsia é acompanhada de alta taxa de mortalidade MORBIMORTALIDADE PERINATAL

  • Recém-nascidos de baixo peso são comumente observados, com incidência de 31%
  • As razões desse fato provavelmente estão relacionadas à anemia e ao comprometimento de vasos placentários, como descrito anteriormente INFERTILIDADE E CONTRACEPÇÃO
  • Existe atraso puberal significativo nas pacientes com anemia falciforme
  • Entre os métodos contraceptivos mais empregados em portadoras de doenças falciformes, encontram-se os de barreira, géis espermicidas, dispositivos intrauterinos, acetato de medroxiprogesterona e anticoncepcionais orais. Aparentemente, não há aumento da incidência de infecções ginecológicas com os métodos utilizados
  • Pacientes com doenças falciformes devem, sempre que possível, ser acompanhados regularmente em serviços especializados (Centros de Atenção a Doenças Falciformes) com a presença de equipes multidisciplinares (médicos, psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais e fisioterapeutas)
  • Desse modo, os objetivos básicos da terapêutica consistem no tratamento das complicações específicas e em cuidados gerais da saúde. Além dos cuidados gerais para acompanhamento do crescimento, desenvolvimento somático e psicológico e tratamento específico de lesões orgânicas (como colecistopatia, úlceras de pernas, osteomielite etc.)
  • O tratamento a longo prazo apoia-se em:  Suplementação com ácido fólico (5 mg/dia) que deve ser sempre realizada devido à hiperplasia eritropoética  Uso de medicamentos que promovem o aumento da hemoglobina fetal (como a hidroxiureia) em pacientes selecionados  Profilaxia de infecções  Tratamento das crises dolorosas vaso-oclusivas  Tratamento das demais crises agudas (aplásticas, sequestro esplênico, neurológicas, síndrome torácica aguda)  Tratamento das infecções

TRATAMENTO DAS INFECÇÕES:

  • A conduta global relacionada às infecções em pacientes com doenças falciformes inclui:  Imunização para prevenir infecção  Penicilina profilática  Tratamento adequado do paciente com febre
  • Crianças com doenças falciformes apresentam produção normal de anticorpos após vacinação e devem receber todas as imunizações recomendadas para uma criança normal. Além disso, devem ser imunizadas contra pneumococo, pela asplenia funcional
  • Todas as crianças com doenças falciformes devem receber penicilina profilática com início aos 2 ou 3 meses de idade, mantida continuamente até pelo menos os 5 anos de idade. Em locais onde a disponibilidade de acesso a serviços médicos seja limitada, a profilaxia com penicilina após os cinco anos pode ser benéfica. A profilaxia pode ser feita com penicilina oral ou com penicilina benzatina a cada 21 dias. Os benefícios desse tratamento são tão significativos, que em todas as populações em que a frequência do gene βs for elevada, devem ser realizados programas de rastreamento neonatal para identificação precoce de afetados e início do tratamento profilático o mais cedo possível
  • Febre em pacientes com doenças falciformes deve sempre ser considerada um problema grave e potencialmente fatal  Nunca deve ser presumido que o paciente tem uma doença viral  A avaliação de episódios febris inclui anamnese e exame físico cuidadosos, exame hematológico com contagens diferenciais, estudos bacteriológicos (culturas de sangue, de urina e de secreção de orofaringe, punção liquórica se houver suspeita de meningite) e radiografia de tórax  Antibioticoterapia sistêmica deve ser instituída rapidamente com fármacos que sejam efetivos contra S. pneumoniae e H. influenzae. A escolha do antibiótico apropriado para prosseguir o tratamento deve ser feita após identificação do organismo envolvido na infecção  Se os exames laboratoriais não revelarem infecção bacteriana, e o exame clínico também não conduzir à detecção de infecção a antibioticoterapia pode ser suspensa após 3 dias. No entanto, o paciente deve ser cuidadosamente observado por pelo menos mais 24 a 48 horas
  • O tratamento da síndrome torácica aguda inclui antibioticoterapia agressiva com drogas de atividade ampla contra germes gram-negativos e gram-positivos (associação de penicilinas e macrolídeos, ou fluoroquinolonas, por exemplo), oxigênio inalatório se saturação abaixo de 92%, transfusões simples nos casos moderados ou transfusão de substituição nos casos graves TRATAMENTO TRANSFUSIONAL
  • Pacientes com anemia falciforme toleram bem a anemia crônica e necessitam de transfusões somente em circunstâncias especiais, como, por exemplo, crise de sequestro, AVC, crise aplástica, preparação para cirurgia, gravidez, hipóxia com síndrome torácica aguda e priapismo
  • Crises de sequestro e crise aplástica: transfusões simples são necessárias para restaurar a massa sanguínea circulante e garantir uma oferta adequada de oxigênio aos tecidos
  • Nas outras situações: transfusão de substituição é provavelmente mais adequada que transfusão simples, pois reduz a viscosidade que poderia ser causada por elevação do hematócrito. No entanto, esse é ainda um assunto controverso
  • Na indicação de regime transfusional na anemia falciforme, o objetivo deve ser manter o nível de HbS abaixo de 30%. Nesses casos, deve ser lembrado que o acúmulo de ferro é inevitável, e pode ser tratado com quelantes de ferro por via parenteral com desferoxamina ou via oral com

deferiprone ou deferasirox. Além disso, devem ser avaliados todos os riscos inerentes às transfusões sanguíneas, tais como reações transfusionais, transmissão de patógenos e aloimunização

  • Redução de 60 a 80% nas células falciformes circulantes pode ser atingida em crianças com anemia falciforme em 6 a 12 horas pela troca de 2 vezes a massa de hemácias (2× volume sanguíneo × hematócrito). Nos centros em que for disponível separador automático de células, a transfusão de substituição (2 volumes) pode ser feita em 90 minutos. Um estudo demonstrou que o nível de HbS ˂ 30% reduz enormemente o risco do primeiro episódio de AVC em crianças com Doppler Ultrassonográfico Transcraniano (DTC) alterado. Esse procedimento deve ser aplicado rotineiramente para todos os pacientes com anemia falciforme CONDUTA NAS GESTANTES COM DOENÇAS FALCIFORMES
  • PRÉ-NATAL: acompanhamento pré-natal cuidadoso deve ser realizado com visitas médicas frequentes, principalmente após a 26ª semana de gestação. São essenciais os controles dos níveis de hemoglobina, ganho de peso corporal, detecção de proteinúria e observação dos níveis da PA
  • TRABALHO DE PARTO: deve ser conduzido de forma a haver menor esforço físico possível pela paciente, equivalente àqueles cuidados levados a efeito para pacientes com doenças cardiovasculares. O tempo de trabalho de parto é fundamental na prevenção de complicações e deve ser o mais breve possível. As medidas que habitualmente devem ser tomadas incluem: diminuir o trabalho cardíaco, evitar crises vaso-oclusivas com hidratação e monitorização fetal cuidadosa. A indicação de via de parto é obstétrica, não sendo indicado parto cesáreo rotineiramente
  • TERAPÊUTICA NA GRAVIDEZ: o seguimento clínico de gestantes com doença falciforme baseia-se no acompanhamento obstétrico e hematológico com o objetivo de reconhecer precocemente as complicações relacionadas à gravidez e à doença falciforme. Não há dados suficientes sobre a segurança do uso de drogas como hidroxiureia na gestação, principalmente quanto à possibilidade de teratogênese e neoplasias secundárias. O tratamento preconizado visa à prevenção dos fatores capazes de desencadear crises vaso-oclusivas e terapêutica rápida e agressiva durante quadros infecciosos, desequilíbrios hidroeletrolíticos e hipóxia. O uso profilático de ácido fólico é fundamental em quadros hemolíticos crônicos, além do que a suplementação de folato no período periconcepcional e nas primeiras semanas de gestação é altamente recomendável como medida eficaz na redução da incidência de defeitos de fechamento do tubo neural. Transfusões podem ser empregadas de forma profilática ou apenas durante intercorrências que necessitem de transfusão