Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Prisão Civil por Dívida: Análise Jurídica e Histórica, Teses (TCC) de Direito Civil

Uma discussão sobre a prisão civil por dívida de alimentos no brasil, examinando suas aspectos históricos, conceituais e jurídicos. O texto também aborda as implicações da pandemia de covid-19 no tema e analisa a jurisprudência relativa à prisão civil durante este período. Além disso, o documento discute as opiniões contrárias à prisão civil e propõe soluções alternativas.

Tipologia: Teses (TCC)

2021

Compartilhado em 28/04/2022

lorenalpaiva
lorenalpaiva 🇧🇷

1 documento

1 / 63

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
1
FACULDADE EVOLUÇÃO ALTO OESTE POTIGUAR - FACEP
CURSO DE DIREITO
LORENA LAUANA DE PAIVA
ANÁLISE JURISPRUDENCIAL EM TORNO DA PRISÃO CIVIL POR DÉBITO
ALIMENTAR PERANTE O ADVENTO DA PANDEMIA COVID-19
PAU DOS FERROS/RN
2020
pf3
pf4
pf5
pf8
pf9
pfa
pfd
pfe
pff
pf12
pf13
pf14
pf15
pf16
pf17
pf18
pf19
pf1a
pf1b
pf1c
pf1d
pf1e
pf1f
pf20
pf21
pf22
pf23
pf24
pf25
pf26
pf27
pf28
pf29
pf2a
pf2b
pf2c
pf2d
pf2e
pf2f
pf30
pf31
pf32
pf33
pf34
pf35
pf36
pf37
pf38
pf39
pf3a
pf3b
pf3c
pf3d
pf3e
pf3f

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Prisão Civil por Dívida: Análise Jurídica e Histórica e outras Teses (TCC) em PDF para Direito Civil, somente na Docsity!

FACULDADE EVOLUÇÃO ALTO OESTE POTIGUAR - FACEP

CURSO DE DIREITO

LORENA LAUANA DE PAIVA

ANÁLISE JURISPRUDENCIAL EM TORNO DA PRISÃO CIVIL POR DÉBITO

ALIMENTAR PERANTE O ADVENTO DA PANDEMIA COVID-

PAU DOS FERROS/RN

LORENA LAUANA DE PAIVA

ANÁLISE JURISPRUDENCIAL EM TORNO DA PRISÃO CIVIL POR DÉBITO

ALIMENTAR PERANTE O ADVENTO DA PANDEMIA COVID-

Monografia apresentada à Faculdade Evolução Alto Oeste Potiguar como parte dos requisitos para obtenção do título de bacharel em Direito. Orientador: Prof. Me. Francisco Luã Costa

PAU DOS FERROS/RN

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho primeiramente a Deus, que esteve ao meu lado durante toda a minha vida, a minha família que foi minha base durante todo o período da graduação, em especial aos meus avós seu Chico Ozana e dona Tetê que não mais se encontram entre nós, mas foram de fundamental importância em minha vida e no meu crescimento pessoal.

AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, que me sustentou nos momentos mais difíceis e permitiu que tudo isso fosse possível.

A minha mãe Antônia que mesmo diante das dificuldades me proporcionou todo o possível para meu sustendo tanto financeiro como afetivo, que foi minha base durante toda a vida, que com muita dedicação e amor formou a minha personalidade e me deu a educação sem a qual eu não teria chegado até aqui.

A meu pai Roberto, que embora distante, sempre se fez presente, me apoiando em todo o processo.

Ao meu irmão Leonardo e minha cunhada Santana que tiveram participação em todo o caminho da graduação, a presença de vocês em minha vida foram de total importância para a conclusão desse curso.

Ao meu sobrinho Bernardo, por me dar o carinho e amor necessário para enfrentar os momentos difíceis durante o período da graduação.

A minha tia Rita e minha prima Fernanda, por sempre se fazerem presentes e me apoiarem incondicionalmente.

A meu namorado Breno, por todo amor e paciência que dispôs durante o percurso.

A minha família e amigos no geral que contribuíram direta ou indiretamente para eu ter chegado até aqui. Aos grandes profissionais das mais variadas áreas do direito que tive a honra de conhecer e ser aluna, e me transmitirem seus conhecimentos.

Obrigado.

RESUMO

A pandemia covid-19 trouxe consigo a emergência por tomada de medidas de enfrentamento, e em âmbito jurídico essa questão foi sentida pelos seus diversos ramos, a exemplo das relações de família. Emblemático nesse sentido se tornou a discussão sobre a prisão civil do devedor de alimentos, que levou aos tribunais a querela de decidir sobre a possibilidade da conversão da prisão em regime fechado pela domiciliar. Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo estudar os entendimentos jurisprudenciais sobre a prisão civil do devedor de alimentos no contexto da pandemia do novo coronavírus. Para tanto, valeu-se de pesquisa do tipo bibliográfica, com fonte doutrinaria, legislativa e jurisprudencial. Viu-se que ao início do momento pandêmico ocorreu divergência entre os tribunais, vez que uns decidiram pela substituição do regime fechado da prisão civil pela modalidade domiciliar, enquanto outros optaram pela suspensão enquanto perdurasse o isolamento social. Não obstante, a situação foi pacificada por ventura da Lei nº 1 4.010/20, que por sua vez determinou a prisão domiciliar como alternativa. Ademais, concluiu-se que a medida deixou de analisar outras possibilidades executórias para a obrigação alimentar, e que a adotada pode não ter a eficácia pretendida, já que a modalidade domiciliar acaba por retirar o caráter coercitivo da prisão civil, restando prejudicado o adimplemento da obrigação alimentícia, e por consequência, o direito do alimentando.

Palavras-chave : Obrigação alimentar. Pandemia. Prisão civil. Jurisprudência.

ABSTRACT

The covid-19 pandemic brought about the emergency by taking coping measures, and in legal terms this issue was felt by its various branches, such as family relationships. Emblematic in this sense, it became the discussion on the civil debtor of the maintenance debtor, which led the courts to dispute about the possibility of converting the prison into a closed regime by the domicile. In this sense, the present study aims to study the jurisprudential understandings on the civil debtor of the food debtor in the context of the new coronavirus pandemic. For this, it used bibliographic research, with doctrinal, legislative and jurisprudential source. It was seen that at the beginning of the pandemic moment there was a divergence between the courts, since some decided to replace the closed regime of civil prison with home modality, while others opted for suspension while social isolation continued. However, the situation was pacified by Law No. 14.010 / 20, which in turn determined that house arrest was an alternative. In addition, it was concluded that the measure failed to analyze other enforceable possibilities for the maintenance obligation, and that the adopted one may not have the intended effectiveness, since the home modality ends up removing the coercive character of the civil prison, leaving the compliance with the maintenance obligation and, consequently, the right of the person being fed.

Keywords: Food obligation. Pandemic. Civil prison. Jurisprudence

1 INTRODUÇÃO

Questão sempre recorrente nos debates jurídicos diz respeito ao direito a alimento, que em virtude de sua essencialidade nas relações de família, encontra-se constitucionalmente garantido, bem como tem assento em outros diplomas infraconstitucionais. A doutrina considera o dever de prestar alimentos como uma relação credito- débito, porquanto se verifique a escassez de recursos necessários para manter-se por parte do alimentando, bem como a impossibilidade de provê-los por si mesmo. Sabe-se, nesse sentido, que os indivíduos sempre buscaram determinar meios eficazes que garantissem o adimplemento de suas obrigações pecuniárias, e um deles, embora envolto de controvérsias, é a privação da liberdade. Em âmbito civil, é hipótese considerada, hodiernamente, apenas nos casos do devedor de alimentos inadimplente, uma vez que funciona como instrumento para coagir o devedor a dar cumprimento àquelas obrigações certas e determinadas, que lhe sejam cabidas. Entretanto, essa é uma questão que levanta discussões jurídicas contrárias, donde se pode identificar entre elas, à sua eficácia quanto a decorrente supressão da liberdade individual, e o que diz respeito ao regime legal definido para o cumprimento da prisão civil por débito alimentar. Esse debate tornou-se ainda mais acentuado no corrente ano de 2020, quando a população (não só a brasileira, mas a mundial), se viu diante das consequências ocasionadas pela pandemia de um vírus que impactou diretamente a vida dos indivíduos e a economia dos países. Perante então o cenário da pandemia da Covid-19, o âmbito jurídico não deixou de sentir seus efeitos, e muitos assuntos foram postos em questionamento, a exemplo da prisão civil do devedor de alimentos. Isso porque, as medidas de isolamento social recomendadas e o impacto no setor econômico acabaram debilitando ainda mais essa relação entre alimentando e alimentante, colocando em destaque também a importância de seguir as recomendações sanitárias de contenção do vírus. A situação requereu debates e medidas jurídicas emergenciais, que por seu turno, também envolveu argumentos

contrários e favoráveis no que diz respeito à manutenção da prisão civil nesse cenário. Ante o fato de já se tratar de um tema que tradicionalmente se mostra emblemático, oportuno verificar como o jurídico brasileiro enfrentou a questão, já que o momento crítico não dispensou a análise acurada e cuidadosa sobre como a prisão civil poderia (ou não) afetar as medidas sanitárias recomendadas, sem, contudo, ferir o direito do alimentante. Nesse norte, o presente estudo tomou como partida a seguinte questão problemática: qual o posicionamento jurisprudencial acerca da aplicação da prisão civil do devedor de alimentos no contexto da pandemia do Covid-19? Partindo desse questionamento, o objetivo é estudar os entendimentos jurisprudenciais sobre a prisão civil do devedor de alimentos no contexto da pandemia do novo coronavírus. Como objetivos específicos, foram delimitados: a) Analisar a arquitetura constitucional da prisão civil no Brasil; b) Investigar as medidas executivas em caso de débito alimentar, e; c) Estudar a Lei da Pandemia (14.010/2020) sob uma perspectiva jurisprudencial dos tribunais de aplicação da medida executiva de prisão civil durante a pandemia do novo coronavírus. A relevância jurídica desse estudo está justamente em levantar o comportamento jurisprudencial em torno de um tema de ampla importância dentro do direito de família, revelando como situações emergenciais podem trazer elementos novos e divergentes de medidas tomadas até então perante uma dada demanda. Ademais, ressalta-se ainda a relevância acadêmica por desvelar como o cenário jurídico pode se mostrar instável, e como a insurgência de novos contextos requerem reflexão constante de possibilidades outras que não aquelas que muitas vezes são sedimentadas em diplomas legais antigos, revelando a importância da atualidade dos debates jurídicos. Metodologicamente, o estudo se apresenta de natureza bibliográfica com abordagem qualitativa, pelas quais se utilizou como fontes de pesquisa desde a doutrina pertinente à temática, estudos publicados, tais como artigos ou aqueles de natureza acadêmica, além da análise da legislação e jurisprudências, direcionados sempre a partir dos objetivos propostos.

2 NOTAS SOBRE A PRISÃO CIVIL NO BRASIL

A liberdade da pessoa humana presume um bem e direito de valor incalculável, o que justifica estar abrigada no âmbito dos regimes democráticos e amplamente protegida pela Constituição Federal brasileira de 1988. Malgrado haja diversas formas de manifestação da liberdade, destaca-se a chamada liberdade de locomoção, tutelada pelo art. 5º, XV, da Constituição Federal. Tal liberdade é abrangida pelo conceito mais amplo de liberdade da pessoa física, colacionado por Silva (2015, p. 237) como “a possibilidade jurídica que se reconhece a todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de locomoverem- se desembaraçadamente dentro do território nacional”. Não obstante, embora assento constitucional, existem possibilidades de que a liberdade de locomoção venha a sofrer restrições, que no campo do direito se dá através de normas restritivas, cujo maior expoente exemplificativo é a prisão. Tourinho filho (2013, p. 431) clarifica o entendimento sobre esse mecanismo ao defini-lo:

Em princípio, prisão é a supressão da liberdade individual, mediante clausura. É a privação de liberdade individual de ir e vir; e, tendo em vista a prisão em regime aberto e a domiciliar, podemos definir a prisão como a privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória.

Embora a conceituação acima aproxime de aspectos relacionados ao processo penal brasileiro, entende-se como uma definição ampla, uma vez que se aplica a todas as modalidades de prisão previstas na legislação pátria. Nesse norte, cabe registrar que existem dois tipos de prisão, a penal e a civil, que embora culminem ambas na privação de liberdade do indivíduo, distingue-se em seus fundamentos. Assim, a prisão penal possui o fito de promover o isolamento daquele que venha a transgredir as normas da sociedade, possuindo, portanto, três objetivos específicos: punir o indivíduo com a privação de sua liberdade; proteger a sociedade, e; a ressocialização do preso (CAPEZ, 2018). Noutro giro, tem-se a prisão civil, citada pela doutrina majoritária como um instrumento coercitivo, vez que, sendo utilizado na jurisdição civil, possui objetivo diverso do tipo penal, pois somente pretende compelir o devedor a cumprir sua obrigação. Esta que pode ter diversos conteúdos, porém, a que se encontra em

evidência através da história humana é a obrigação de cunho econômico. Essa premissa casa-se com o conceito elucidado por Azevedo (2012, p. 36) para quem a prisão civil se trata de:

[...] um instrumento de coercibilidade, utilizado na jurisdição civil, de cunho eminentemente econômico, previsto em lei com o objetivo de compelir o devedor a cumprir seu dever ou obrigação. [...] o instituto da prisão civil por dívida não foi mais considerado como um modo de cumprimento forçado da obrigação, mas como um meio de experimentar a soavabilidade do devedor sendo certo que, por este aspecto, essa espécie de prisão está quase cancelada nas legislações dos países civilizados.

Numa releitura didática do conceito acima, a prisão civil refere-se ao recolhimento a um estabelecimento carcerário de um indivíduo, sendo originada pelo inadimplemento de uma dívida. E, não envolvendo um crime, não se pode dizer tratar-se de pena, mas sim de um meio de coerção utilizado pelo Estado para que o inadimplente cumpra a obrigação. Conforme clarificam o Professor e Ministro Gilmar Mendes e o jurista Gustavo Branco (2014), esse tipo de prisão realiza-se no âmbito estritamente do Direito Privado e se consuma em razão de um dever ou de uma obrigação descumprida e fundada em norma jurídica de natureza civil. Historicamente, o instituto da prisão civil é antigo, sendo que a maioria dos doutrinadores aponta que sua evolução histórica iniciou-se através do conhecido Código de Hamurabi^1 , considerado uma das mais antigas compilações de leis da humanidade. Segundo referido código, se um indivíduo deixasse de cumprir uma obrigação, o credor poderia constrangê-la ao adimplemento fosse por meio da força física ou, fosse ainda, tomando como garantia de crédito a própria pessoa (devedor), algum de seus familiares ou escravos, obrigando-os a trabalhar até a quitação do débito (AZEVEDO, 2012). A experiência das civilizações antigas também se deram no mesmo sentido, a exemplo da egípcia, no qual o devedor inadimplente que não tinha como solver sua dívida respondia com a servidão pessoal até quitar sua obrigação. Mais tarde passou-se a execução patrimonial (LIMA; DIAS, 2015).

(^1) Em 1800 antes de Cristo, os povos que viviam na Mesopotâmia eram muito diversificados e para administrar melhor essa diversidade, o rei Hamurabi criou o Código de Leis na cidade da Babilônia, fundando assim, o primeiro Império Babilônico. Baseado nas Leis de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), o Código de Hamurabi é um conjunto de leis para controlar e organizar a sociedade.

Ademais, convém percorrer, ainda que brevemente, sobre como a prisão civil surgiu e foi tratada no cenário brasileiro, bem como fazer referencia a sua natureza jurídica, e é o que cuida o tópico seguinte.

2.1 ORIGEM NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E NATUREZA JURÍDICA

No Direito brasileiro, as primeiras narrativas sobre a prisão civil são notificadas do período colonial, vindas, portanto, do Direito português, e estavam previstas nas Ordenações Filipinas (Livro IV, Título LXXVI), sendo detalhadas especialmente a prisão do detentor que não devolvesse o objeto que tinha em sua posse ou o usasse sem autorização do seu dono, bem como a prisão daquele que não pagasse as custas quando fosse condenado (PINTO, 2017). Com o advento da proclamação da independência, em 1824, mantiveram-se as normas em vigor em Portugal, sendo então revogadas as Ordenações Filipinas, em 1830, entrando em vigência, nesse mesmo ano, o Código Criminal do Império. Em relação às Constituições brasileiras, observa-se que nem a de 1824 e a de 1891 fizeram referência à prisão civil. Contudo, Pinto (2017) observa que alguns diplomas legais passaram a prevê essa modalidade de prisão, a exemplo do Código Comercial de 1850, que previu a prisão civil do depositário mercantil, em seu art. 284. Já em 1858, foi assentido a Consolidação das Leis Civis, considerado verdadeiro Código Civil brasileiro por mais de meio século, até 1916, quando foi publicado o Código Civil de Beviláqua, no qual estava elencada a prisão do depositário infiel, conforme o era nas Ordenações Filipinas. O código Civil de 1916 tratou o tema em seu art. 1.287, prevendo a prisão para o depositário infiel que, voluntário ou necessário o depósito, quando não o restituísse quando exigido, seria compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano, e a ressarcir os prejuízos (BRASIL, 1916). Em 1939 o Código de Processo Civil acrescentou através do art. 920 a hipótese de prisão para os casos de devedor de pensão alimentícia, cujo teor infere que “o não cumprimento de pensão alimentícia será punido com prisão decretada pelo juízo cível” (BRASIL, 1939). Vale lembrar que, antes do Código Civil de 1916,

foram realizados vários projetos de lei no sentido de normatizar a questão alimentícia (AZEVEDO, 2012). O referido dispositivo foi mantido no Código de Processo Civil de 1973, que por sua vez, fixou o período de três meses como prazo máximo para a duração da prisão (art. 733, § 1º). Na linha constitucional, em 1934 a Constituição consagrou expressamente a garantia da inexistência de prisão por dívidas, multas ou custas. A Constituição seguinte foi omissa quanto à questão. A Constituição de 1946 novamente vedou a prisão por dívidas de cunho civil, mas previu as exceções em relação ao depositário infiel e ao inadimplemento de obrigação alimentar. O regramento foi mantido na Constituição de 1967 (AZEVEDO, 2012). Lei infraconstitucional foi criada em 1968, a Lei de Alimentos (Lei nº 5.478), na qual a prisão civil está previsto no artigo 19, in verbis :

Art. 19. O juiz, para instrução da causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias (BRASIL, 1968).

Observe-se que o legislador deixa bem claro que a prisão civil é uma medida de exceção, pois a regra é a liberdade do indivíduo. Como se verifica, não só as constituições trataram de pontificar a prisão civil, mas, diversas leis infraconstitucionais que ao longo do tempo tem de se aperfeiçoar diante às necessidades das relações humanas em sua época. Lembre-se ainda, que no período ditatorial, o governo militar institui o Decreto-Lei 911/1969^4 , transformando o devedor fiduciante em depositário, e conferindo ao credor fiduciário a oportunidade de transformar a ação de busca e apreensão em ação de depósito, fazendo incidir a previsão legal de prisão civil destinada ao depositário que não devolve o bem ao final do contrato (PINTO, 2017). Quando incidiu o processo de redemocratização do país, o texto constitucional de 1988 ao arrolar os direitos e garantias fundamentais, situou a proibição de que ninguém será preso por dívida, mas manteve as ressalvas do depositário infiel e do devedor de alimentos, como pontificado pela referida Carta Magna:

(^4) Altera a redação do art. 66, da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, estabelece normas de processo sobre alienação fiduciária e dá outras providências.

Portanto, é hoje pacífico que não cabe a prisão do depositário infiel, sendo permitida a prisão civil somente do devedor de obrigação alimentar, pois tal exceção também encontra sustentação no próprio Pacto de São José da Costa Rica. Embora tenha findado o debate sobre a pertinência da prisão civil do depositário infiel, na doutrina ainda existem posicionamentos que são contrários a qualquer tipo de prisão na esfera civil, e, portanto, também acham ineficaz a medida no caso do inadimplemento da obrigação alimentar. Eis aqui o momento oportuno para discutir a natureza jurídica da prisão civil, que conforme sustenta maior parte da doutrina, é de ordem coercitiva e não uma medida punitiva em si mesma. Esse fato já afasta qualquer analogia com a pena prevista na legislação penal e processual penal. Desse modo, apresenta Cahali (2013, p. 737) sobre a natureza e teleologia da prisão civil:

Assim, a prisão civil é meio executivo de finalidade econômica; pretende-se o executado não para puni-lo, como se criminoso fosse, mas para forçá-lo indiretamente a pagar, supondo-se que tenha meios de cumprir a obrigação e queira evitar sua prisão, ou readquirir sua liberdade.

Entende-se, pois, que na prisão civil o sujeito não pratica um ato tipificado como crime, mas somente descumpriu o seu dever de restituir uma dívida, o que configuraria um ilícito meramente civil, e certamente denuncia seu caráter não sancionatório. Como aduzem Gagliano e Pamplona Filho (2016, p.318), “trata-se, portanto, de uma medida de força, restritiva da liberdade humana, que, sem conotação de castigo, serve como meio coercitivo para forçar o cumprimento de determinada obrigação”. Nessa vertente, pode-se entender que a ordem de prisão acaba funcionando como um fator que pressiona psicologicamente o devedor, de forma que o instiga a cumprir com sua obrigação (CAHALI, 2013; AZEVEDO, 2012). Observe-se ainda que, justamente por não possuir analogia com a pena sancionatória, a prisão civil não é alcançada por institutos e vantagens típicas da prisão criminal (a exemplo da progressão de regime prisional ou da detração penal). A prisão civil tem natureza estritamente coercitiva, de modo que sua aplicação deve nortear-se apenas por esta finalidade. Desse modo, apenas o adimplemento das

parcelas devidas (ou o esgotamento do prazo máximo admitido) poderá ter o efeito de autorizar a libertação do devedor (MARINONI; ARENHART; MITIDIERO, 2018). Pinto (2017), no entanto discorda ao observar que embora a doutrina majoritária situe entendimento que a prisão civil não possui caráter penal, é questionável que no próprio corpo do art. 528, § 5º, do Código de Processo Civil de 2015 a considera como “pena”, in verbis : “O cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas” (BRASIL, 2015, Grifo nosso). O autor então discorda dos inúmeros doutrinadores que entendem ser a prisão civil medida coercitiva, alegando que independente da forma (penal e civil) todos experimentam o cerceamento da liberdade do indivíduo, o que certamente possui a mesma conotação para quem está preso (PINTO, 2017). Essa questão suscita o questionamento se de fato é coerente admitir que a medida prisional possa ser concebida por uma dupla identidade: ora como medida preventiva de liberdade, ora como medida coercitiva. A todo modo, é uma análise que vem sendo amplamente debatida, haja vista haver desacordo entre importantes nomes da doutrina civil, e discuti-las requereria um olhar mais restrito sobre esse aspecto especial, o que não é objetivo desse estudo. Contudo, embora pareça contraditória que a prisão assuma dupla finalidade a depender de ser medida penal ou cível, não se pode deixar de verificar que no âmbito da obrigação alimentar esse tem sido um meio que tem alcançado a tutela jurisdicional buscada, em certa medida, mas ainda considerada importante aos olhos de quem a defende. Acerca da utilidade da prisão civil, entendem Gagliano e Pamplona Filho (2018, p. 700):

A prisão civil decorrente de inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentar, em face da importância do interesse em tela (subsistência do alimentando) é, em nosso entendimento, medida das mais salutares, pois a experiência nos mostra que boa parte dos réus só cumpre a sua obrigação quando amealhada pela ordem de prisão.

Essa compreensão também é assente em Grisard Filho (2006), para quem a coerção pessoal não tem contribuído à superação da questão, mas reconhece que sem ela, tampouco se veria algum resultado positivo no sentido da adimplência do débito alimentar, já que, em sua visão, além dos que persiste no não cumprimento