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unicelulares abundantes no solo e na água, posicionados na classe Euglenoidea do filo. Euglenozoa, junto às classes Kinetoplastea e Diplonemea.
Tipologia: Notas de estudo
Compartilhado em 07/11/2022
4.5
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São Paulo
Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo, para a obtenção do Título de Mestre em Ciências Área de Concentração: Biologia da Relação Patógeno- Hospedeiro Orientadora: Profa. Dra. Marta Maria Geraldes Teixeira
Martins AVC. Caracterização molecular e morfológica de isolados brasileiros do gênero Euglena [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade de São Paulo; 2008.
Os membros do gênero Euglena formam um grupo heterogêneo de flagelados unicelulares abundantes no solo e na água, posicionados na classe Euglenoidea do filo Euglenozoa, junto às classes Kinetoplastea e Diplonemea. Apesar de avanços recentes, o relacionamento filogenético de flagelados do gênero Euglena está longe de ser entendido, e as relações filogenéticas entre as espécies variam de acordo com o conjunto de taxa, genes e metodologias filogenéticas empregadas. Para avaliar a real diversidade e melhor resolver o relacionamento de espécies classificadas no gênero Euglena , é necessário analisar um maio número de isolados provenientes de diversos habitats, com origens geográficas mais abrangentes. Neste estudo foram isolados, cultivados e caracterizados flagelados de 20 amostras de solo e água dos biomas brasileiros da Mata Atlântica, Pantanal, Amazônia e Cerrado. Os isolados foram classificados no gênero Euglena com base em parâmetros taxonômicos morfológicos tradicionais, microscopia de luz, que permitiu distribuiros isolados em 5 grupos de acordo com forma e mobilidade da célula e presença ou ausência de cloroplastos e flagelo. Todas as culturas foram caracterizadas por comparação de seqüências do gene SSU rDNA, e de 20 culturas foram obtidas 25 seqüências, indicando a presença de 5 culturas mistas contendo dois isolados. Análises filogenéticas do gene SSU rDNA foram realizadas a fim de avaliar a diversidade genética e inferir relações filogenéticas entre isolados brasileiros e espécies de Euglena da Europa, América do Norte e Ásia. As árvores geradas com os métodos de ML e Bays posicionaram os novos isolados do gênero Euglena nos grupos A1, A2 e A3, previamente definidos em estudos baseados em genes ribossômicos nucleares (18S e 24S) e do cloroplasto (16S e 23S). Essas análises corroboraram a classificação de todos os isolados brasileiros no gênero Euglena e distribuíram 24 seqüências no grupo A3 e uma no grupo A2. Nenhum isolado brasileiro foi posicionado no grupo A1. Embora os isolados tenham se posicionado no grupo A3, que segregou os isolados brasileiros em 7 clados nas análises bayesianas e ML, o relacionamento entre os subclados do grupo A3 foram diferentes de acordo com o método utilizado e foram pouco suportados nas análises por ML.Para melhor resolver as relações filogenéticas entre os isolados do grupo A3, foi utilizado um alinhamento da SSU rDNA restrito a este grupo, que geraram árvores congruentes e subclados bem suportados independentemente da metodologia utilizada (ML ou
Martins AVC. Molecular and morphological characterization of Brazilian isolates of the genus Euglena [Master thesis]. São Paulo: Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade de São Paulo; 2008.
The genus Euglena is a heterogeneous group of unicellular flagellates abundant in soil, freshwater and marine environments, positioned within the class Euglenoidea of the phylum Euglenozoa, together with the classes Kinetoplastea and Diplonemea. Despite recent improvements, the phylogenetic relationships within the genus Euglena are far from understood, with relationships between species varying according to taxa, genes and phylogenetic methodologies. For a real appraisal of the diversity and better resolution of relationships within Euglena it is necessary to analyse a bigger amount of isolates from a range of habitats and geographical origins. In this study, we isolated in culture and characterized flagellates from 20 samples of soil and water of the Brazilian biomes of the Atlantic Forest, the Pantanal, Amazonia and Cerrado. The isolates from the 20 established cultures were classified as Euglena by traditional taxonomic parameters through light morphology, which allowed the distribution of isolates in 5 main morphological groups according to cell shape and motility, and presence or absence of chloroplasts and flagellum length. These cultures were all characterized by sequencing analysis of whole SSU rDNA, and from 20 cultures it was obtained 25 different sequences, indicating the existence of 5 mixed cultures containing two highly distinct isolates. Phylogenetic analyses using SSU rDNA were carried out to evaluate the genetic diversity, and to infer phylogenetic relationships between Brazilian isolates and Euglena spp. from Europe, North America and Asia. Trees generated by ML and Bayesian analyses divided the genus Euglena in groups A1, A2 and A3, as previously defined in studies based on nuclear (18S and 24S) and chloroplast (16S and 23S) genes. Both phylogenetic analyses corroborated the classification of all Brazilian isolates as members of the genus Euglena and positioned 24 sequences in group A3, one sequence in group A2, while no Brazilian isolate was positioned within group A1. Although the clustering of isolates within group A3 as well as the segregation of Brazilian isolates in 7 clades were congruent in both ML and Bayesian analyses, the relationships among the subclades of A3 differed according to the methods used, and were weakly supported in ML analysis.To better resolve the relationships between isolates of group A3, an alignment restricted to SSU rDNA sequences of this group was used, generating congruent ML and Bayesian trees and subclades well supported in both analyses. All
analyses corroborated the distribution of Brazilian isolates in 6 clades formed exclusively by isolates from Brazil. Exception was only E. intermedia from China that clustered with three Brazilian isolates. Isolates representative of each species were analysed through scanning electron microscopy and revealed two major patterns of pellicle strip and pore patterns shared by isolates positioned in different clades. Only the isolates of clade Braziliensis exhibited a peculiar pattern of strip reduction.Therefore, molecular phylogenetic analyses revealed a larger diversity than disclosed by light morphological analysis. The phylogenetic trees inferred in this study greatly improved the taxa sample from previous studies providing a better understanding of the genetic diversity and relationships among clades within the genus Euglena. This study corroborated the high complexity of this genus, disclosing new subclades, and enabling the identification of 6 new species of Euglena nested in group A3_._ Isolates characterized in this study are the first in Brazil to be described, established in culture, validated by phylogenetic analyses and morphologically characterized by light and scanning electron microscopy.
Key words: Euglena ; Phylogeny and Evolution; Taxonomy; SSU rDNA; Morphology; Scanning electron microscopy.
1.1 Filo Euglenozoa
O filo Euglenozoa é composto por um grupo diverso de eucariotos unicelulares que apresentam uma grande variedade de estilos de vida, incluindo organismos de vida livre fototróficos, osmotróficos ou fagotróficos, além de parasitas facultativos ou obrigatórios de plantas, invertebrados e vertebrados. O filo Euglenozoa foi subdividido com base em parâmetros morfológicos no subfilo Plicostoma, que engloba os diplonemídeos e euglenídeos, e no subfilo Saccostoma, que engloba os cinetoplastídeos (Cavalier-Smith, 1981; Moreira et al. , 2001; Busse e Preisfeld, 2002, 2003; Adl et al ., 2005). Os membros deste grupo são unidos por características morfológicas singulares, como a presença de uma película, ausência de parede celular, uma mitocôndria com cristas discóides e presença de um ou dois flagelos emergentes na região anterior da célula com mastigonemas não tubulares (Cavalier-Smith, 1981). As espécies fototróficas possuem cloroplastos envoltos por três membranas e produzem clorofila A e B (Cavalier-Smith, 1981; 1999). Com o avanço do conhecimento sobre os organismos do filo Euglenozoa, especialmente das espécies de vida livre, e com base em informações geradas em análises filogenéticas moleculares, os organismos do filo Euglenozoa foram reclassificados em três classes: Kinetoplastea, Diplonemea e Euglenoidea (Moreira et al ., 2001; Busse e Preisfeld, 2002, 2003; Adl et al. , 2005). A classe Kinetoplastea, que compreende as subordens Trypanosomatina e Bodonina, se caracteriza pela presença do cinetoplasto, uma região especializada da mitocôndria constituída por moléculas de DNA circulares concatenadas (Vickerman, 1976). Os tripanossomatídeos apresentam um único flagelo e são parasitas obrigatórios de invertebrados, plantas e de todas as ordens de vertebrados, com uma grande distribuição geográfica. Quando patogênicos, estes organismos são responsáveis por doenças de grande importância médica humana e veterinária, como a doença de Chagas, a Tripanossomíase Africana e as leishmanioses. Os bodonídeos são organismos biflagelados que apresentam diferentes estilos de vida, com espécies de vida livre e importantes parasitas de peixes ( Bodo , Cryptobia e Trypanoplasma ). As espécies de vida livre são abundantes na natureza, presentes tanto no solo como em água doce e salgada, e desempenham um papel importante no controle de bactérias, além de servirem como fonte de alimento para alguns invertebrados (Vickerman, 1976). A classe Diplonemea (diplonemídeos) é formada por organismos biflagelados heterotróficos divididos nos gêneros Diplonema e Rhynchopus , que compreendem organismos de vida livre geralmente encontrados em sedimentos do fundo do mar. Os
diplonemídeos não possuem cloroplasto, cinetoplasto, ou mastigonema. Estes organismos são considerados fagotróficos ou, ocasionalmente, parasitas facultativos de crustáceos (Kent et al. , 1987; Simpson e Roger, 2004; Von der Heyden et al ., 2004). A classe Euglenoidea (euglenídeos) compreende organismos de vida livre encontrados de forma abundante no solo e em água-doce, com algumas espécies encontradas em água do mar (Hollande, 1952; Pringsheim, 1953; Esson e Leander, 2008). Os euglenídeos estão divididos em seis ordens de acordo com parâmetros morfológicos e fisiológicos: Euglenales, Eutreptiales, Rhabdomonadales, Sphenomonadales, Euglenamorphales e Heteronematales (Leedale, 1967). A monofília desses grupos, assim como os gêneros que constituem essas ordens tem sido bastante discutida e revista com base em estudos moleculares (Preisfeld et al., 2000; Marin et al,. 2003; Milanowski et al., 2001, 2006).
1.2 Filogenia e Evolução do Filo Euglenozoa
O posicionamento do filo Euglenozoa na árvore filogenética universal permanece controverso, embora estudos morfológicos e moleculares recentes posicionem o filo junto ao infra-reino Excavata, em conjunto com os filos Loukozoa, Percolozoa e Metamonada (Cavalier-Smith, 2002, 2003; Simpson, 2003; Keeling et al. , 2005; Moreira et al ., 2007ś). Inicialmente, os Excavata foram definidos com base em características morfológicas do canal de alimentação ventral por onde passam um ou mais flagelos (Cavalier-Smith, 2002). No entanto, estudos baseados em análises moleculares posicionaram organismos que não apresentavam este aparato morfológico junto aos Excavata, sugerindo que esta característica tenha sido perdida (Cavalier-Smith, 2002; Simpson, 2003). Este fato é exemplificado pelos membros do filo Euglenozoa, que não possuem nenhuma das apomorfias dos membros do infra-reino Excavata, mas são fortemente posicionados neste grupo por filogenias moleculares (Simpson, 2003; Simpson e Roger, 2004). Inicialmente, os filos Euglenozoa e Percolozoa foram incluídos no superfilo Discicriscata com base em características morfológicas da mitocôndria e dados moleculares (Cavalier-Smith, 2002; Baldauf, 2003; Keeling et al. , 2005). Entretanto, estudos moleculares recentes indicaram que membros da classe Jakobea (filo Loukozoa) se posicionam junto aos Discicriscata, apesar de não partilharem características morfológicas da mitocôndria (Cavalier-Smith, 2003; 2004; Simpson et al. , 2006). Deste modo, além de existirem controvérsias quanto à monofilia dos Excavata (Cavalier-Smith, 2003, 2004; Baldauf, 2003; Simpson e Roger, 2004; Adl et al. , 2005; Yoon et al. , 2008),
Rhynchopus ). Além destes diplonemídeos, existem seqüências de DNA de organismos não cultivados que se posicionam em filogenias do gene SSU rDNA como um grupo irmão, embora muito distante, do gênero Diplonema e Rhynchopus. Estes estudos incluem seqüências de organismos de amostras de água hidrotermais (900 m) e de plâncton (3000 m) do fundo do mar (López-García et al ., 2001; 2007). Estudos recentes aumentaram consideravelmente o conhecimento da diversidade dos diplonemídeos, revelando a existência de dois novos clados com diferentes filotipos (Lara et al ., 2008) amplamente distribuídos no plâncton do fundo do mar e que exibem uma estratificação nas colunas de água, como já observado para outros organismos do filo Euglenozoa (Countway et al ., 2007). Durante muitos anos, os euglenídeos foram classificados como microalgas devido à presença de cloroplastos nos organismos da ordem Euglenales (euglenídeos). No entanto, a maioria dos membros da classe Euglenoidea não apresenta coloração e exibem estilos de vida fagotróficos e osmotróficos. Quando fototróficos, os euglenídeos apresentam cloroplastos com clorofila A e B nas membranas tilacóides. Esta é a principal
Figura 1. Árvore filogenética baseada na análise combinada das proteínas Hsp90 e Hsp70, construída pelo método de Máxima Verossimilhança (MV). Os números superiores correspondem aos valores de suporte por “bootstrap” por MV, e os números inferiores correspondem aos valores de suporte de MV de distância (MVdist). Valores <25% foram omitidos. A caixa corresponde ao suporte para o clado cinetoplastídeos-diplonemídeos (K, D). FONTE: Modificado de Simpson e Roger, 2004.
característica que levou à associação desses organismos com a classe Clorophyceae ou “algas-verdes”. Atualmente, esta relação ainda é considerada na literatura, embora a única semelhança entre os dois grupos (euglenídeos autotróficos e algas verdes), tanto fisiológica quanto estrutural, seja a similaridade dos cloroplastos. Em 1981, Gibbs sugeriu que os euglenídeos adquiriram os seus cloroplastos por endosímbiose secundária ao fagocitar uma alga verde, explicando assim a similaridade de seus cloroplastos. Estudos moleculares reforçaram esta hipótese ao mostrar, por análises de SSU rDNA, que os euglenídeos são filogeneticamente mais relacionados aos tripanossomatídeos do que às algas verdes (Sogin et al. , 1986). Recentemente, foram encontrados genes similares aos de planta (genes “plant-like”) em cinetoplastídeos que não possuem cloroplastos, sugerindo que a endossimbiose secundária de cloroplastos neste grupo ocorreu num ancestral comum aos euglenídeos e cinetoplastídeos (Hannaert et al. , 2003). No entanto, análises filogenéticas sugerem que a origem da fototrofia ocorreu em um ancestral da ordem Euglenales, composta por euglenídeos fotossintéticos (Montegut-Felkner e Triemer, 1997; Preisfeld et al. , 2000; Müllner et al. , 2001). Além disso, estudos moleculares e comparações ultra-estruturais da película sugeriram que os euglenídeos fototróficos evoluíram de organismos fagotróficos (Montegut-Felkner e Triemer, 1997; Leander, 2004). Assim, é atualmente sugerido que a endosímbiose secundária que deu origem aos cloroplastos dos Euglenales é um evento recente (Nozaki et al. , 2003b; Leander, 2004), enquanto os genes “plant-like” encontrados nos cinetoplastídeos provavelmente resultam de uma endosímbiose primária ancestral (Nozaki et al. , 2003a; Nozaki, 2005). Com base em análises moleculares do gene ribossômico acredita-se que após a aquisição dos cloroplastos houve uma redução na pressão seletiva para manter a metabolia da célula (movimento euglenóide), dando origem aos táxons fotossintéticos rígidos (Nudelman et al. , 2003). O posicionamento de espécies osmotróficas junto a espécies fotossintéticas sugere que a osmotrofia tenha surgido múltiplas vezes nos euglenídeos (Linton et al. , 1999; Müllner et al. , 2001; Nudelman et al. , 2003). O gênero Euglena foi, até recentemente, considerado polifilético. No entanto, filogenias baseadas no gene ribossômico (SSU rDNA e LSU rDNA) resultaram na transferência de algumas espécies rígidas de Euglena para o gênero Lepocinclis (Marin et al. , 2003), assim como na criação de um novo gênero, Discoplastis, para acomodar espécies não rígidas de Euglena (Triemer et al. , 2006) restabelecendo a monofília do gênero Euglena.
características da película e condensação dos cromossomos durante o ciclo celular (Leedale, 1967). Hipóteses de que euglenídeos fagotróficos teriam adquirido cloroplastos por endosímbiose secundária de uma alga verde (Leedale, 1978; Gibbs, 1978, 1981) levaram a modificações taxonômicas. Assim, a classe Euglenoidea foi dividida nas ordens Euglenales, Eutreptiales e Euglenamorphales, com organismos fotossintéticos e alguns sem pigmentação, e nas ordens Rhabdomonales (organismos osmotróficos), Sphenomonadales (osmotróficos e fagotróficos) e Heteronematales (organismos fagotróficos), que compreendem apenas organismos sem pigmentos (Triemer e Farmer, 2007). Apesar da grande diversidade das ordens que compõem a classe Euglenoidea, existem poucos estudos que visam entender o seu relacionamento. Na classe Euglenoidea, a mais estudada é a ordem Euglenales, que é dividida em nove gêneros: Euglena; Phacus; Trachelomonas; Colacium; Lepocinclis; Strombomonas; Monomorphina; Cryptoglena e Discoplastis. Estes organismos, coletivamente referidos como euglenídeos, são os principais gêneros de vida livre estudados no filo Euglenozoa, especialmente Euglena gracilis , um importante modelo para diversos estudos celulares e moleculares.
1.3.1.1 Morfologia dos euglenídeos
Os euglenídeos são organismos eucariontes unicelulares que apresentam diversas características morfológicas e ultra-estruturais, algumas utilizadas na sua identificação: a) flagelo com mastigonemas (fileiras de filamentos); b) grãos de paramilo que reservam carboidratos na forma de paramilo ß-1: 3 glucan; c) estigma, com acúmulos de gotículas de lipídios sensíveis à luz; d) condensação dos cromossomos durante o ciclo celular (Leedale, 1967), (Fig. 2). Além destas características, os euglenídeos possuem uma película complexa, que consiste de uma membrana plasmática composta por estrias protéicas que se articulam com estrias adjacentes ao longo das margens laterais da célula de forma longitudinal ou helicoidal. Alguns estudos sugerem que os diferentes modos de nutrição e locomoção estão intimamente relacionados com as características da película, especialmente quanto ao padrão e morfologia das estrias (Sommer e Blum 1965; Leander e Farmer, 2000). Esta associação se evidencia em euglenídeos rígidos, que não conseguem alterar a sua forma e apresentam estrias organizadas de forma longitudinal. Por outro lado, espécies de
Euglena apresentam uma película helicoidal que permite a metabolia ou “movimento euglenóide” (Fig. 3) (Leander et al ., 2001). A diversidade das estruturas na película de euglenídeos tem sido analisada por diversos estudos a fim de definir caracteres úteis na sua classificação, tendo sido sugerido um modelo para a morfogênese de redução das estrias da película (Esson e Leander, 2006) que se mostrou útil em estudos taxonômicos e filogenéticos (Leander e Farmer, 2001; Leander et al ., 2001). Estes estudos descreveram padrões de estrias e poros presentes na superfície de vários euglenídeos e sugeriram que
Figura 2. Características morfológicas de euglenídeos. A) morfologia ilustrativa de Euglena representando as principais estruturas e organelas presentes em euglenídeos; B) flagelo visualizado por microscopia eletrônica de varredura, apresentando vários mastigonemas (filamentos); C) região anterior indicando (seta) o estigma visualizado por microscopia de luz; D) cloroplastos de euglenóides fotossintéticos e pirenóides (seta), visualizado por microscopia luz. FONTE: As imagens A, C e D foram retiradas do Projeto Euglenóide (http://euglena.msu.edu/) e a imagem B obtida neste estudo.
Figura 4. Padrões das estrias e poros na película de Euglena evidenciados por microscopia eletrônica (ME). A) Padrões de redução de estrias na região anterior de Euglena sp. apresentando 1) 28 estrias na periferia da célula reduzidos exponencialmente (i) para 12 estrias e 2) ME de transmissão de corte transversal do canal com 56 estrias periféricas (setas) e 14 estrias distintas rodeando o canal (pontas de seta) indicando duas espirais de redução no canal; B) Espirais de redução na região posterior da célula: 1) ME de varredura de E. gracilis com 40 estrias na periferia reduzidas exponencialmente de 3 espirais de redução para 20 (I), 10 (II) e 5 (III) estrias; 2) padrão de redução linear em E. mutabilis com 3 espirais I, I´ e II e 3) diagrama ilustrando o padrão linear de redução de 40 estrias para 30 (I), 20 (I´) e 10 (II); C) Poros na película de Euglena : 1) ME de varredura de E. laciniata com 4 estrias entre poros; 2) ME de transmissão de corpos mucíferos (seta) de E. perty e 3) de E. laciniata. FONTE: Leander e Farmer (2000) e Leander et al. (2001).
lentes permitiram a observação de diversos microorganismos, entre eles bactérias, nematóides, rotíferos e bodonídeos. Em 1967, em uma carta à Royal Society of London, Van Leeuwenhoek escreveu: “These animalcules had divers colours, some being whitish and transparent; others with green and very glittering little scales; others again were green...And the motion of most of these animalcules in the water was so swift, and so various, upwards, downwards, and round about, that ´twas wonderful to see “(Ford, 1981). Um século mais tarde, Müller descreveu um organismo semelhante que denominou Cercaria viridis. No entanto, o gênero Euglena foi criado apenas em 1830, com as observações deste organismo por Ehrenberg, com Euglena viridis sendo denominada como espécie-tipo do gênero (Fig. 5) (Triemer e Farmer 2007). E. gracilis é a espécie mais utilizada em diversos estudos, devido a facilidade de manter em laboratório. O efeito de luz, inibição química, temperatura e outros agentes importantes do desenvolvimento de cloroplastos e outras organelas podem ser estudados facilmente nessa espécie (Vacula et al. , 2007; Fugita et al. , 2008).
1.4.1 Taxonomia do gênero Euglena
A taxonomia do gênero Euglena acompanhou a taxonomia dos euglenídeos, onde os primeiros estudos atribuíam grande importância à presença ou ausência de cloroplastos. Conseqüentemente, esses parâmetros foram refletidos nas primeiras tentativas de organização do gênero Euglena. Variações na morfologia dos cloroplastos (forma de laço, estrela ou disco) levaram à divisão do gênero Euglena nos grupos I, II e III por Lemmerman em 1913. Chu em 1947 associou a presença de pirenóides à morfologia dos cloroplastos, dividindo o gênero Euglena em quatro grupos. Por sua vez, quando o número de cloroplastos foi associado à sua morfologia, o gênero Euglena foi subdividido em oito grupos de A-H por Gojdics em 1953 (Johnson, 1968). O estudo de Hollande (1942, 1952), que sugeria que a separação de euglenídeos com e sem cloroplastos gerava grupos artificiais, repercutiu na taxonomia do gênero Euglena (Pringsheim, 1948). Assim, os parâmetros morfológicos do cloroplasto foram refinados e associados ao formato da célula e ao grau de metabolia, dividindo o gênero em seis grupos (Rigidae, Lentiferae, Catilliferae, Radiatae, Serpentes e Limpidae), que incluíram, pela primeira vez, espécies sem pigmentação em uma subdivisão do gênero Euglena (Pringsheim, 1956).
1.4.2 Morfologia de espécies do gênero Euglena
Os membros do gênero Euglena apresentam grandes variações no comprimento da célula (10-400 μm), podendo variar de tamanho dentro de uma mesma espécie de acordo com a fase de crescimento em cultura, ou com a fase do ciclo celular (Gojdics, 1953; Johnson, 1968). O formato da célula varia de formas esféricas, cilíndricas ou fusiformes (afilada em direção às extremidades) (Fig.6). No entanto, o formato da célula pode ser alterado devido à metabolia da célula, o “movimento euglenóide” característico deste grupo (Fig. 3). Além do formato geral da célula, as características da região anterior e posterior da célula também podem ser utilizadas como parâmetros morfológicos deste gênero (Fig. 6). Os cloroplastos de Euglena podem ser únicos ou numerosos, além de variar no seu posicionamento na célula (central, parietal ou disperso) e em seu formato (Fig. 6). Devido à presença de clorofila nos cloroplastos, a grande maioria das espécies de Euglena exibe uma coloração verde. As espécies osmotróficas, E. longa e E. quartana, não possuem cloroplastos. No entanto, foi demonstrado por metodologias moleculares que E. longa possui um genoma de cloroplasto, porém, os genes responsáveis por fotossíntese estão ausentes (Gockel e Hatchel, 2000). Estudos prévios demonstraram experimentalmente que amostras de E. gracilis que perderam os seus cloroplastos (temporária ou permanentemente) continuaram a se dividir normalmente (Pringsheim e Pringsheim, 1952). Além de espécies verdes e sem coloração, algumas espécies de Euglena podem apresentar pequenos grânulos vermelhos (hematocromos) que se dispersam no citoplasma quando expostos a altas temperaturas (>30 ºC), conferindo à célula uma coloração avermelhada (Buetow, 1968). Os cloroplastos podem por vezes estar associados a pirenóides, que são áreas especializadas do cloroplasto que contêm grandes concentrações da enzima Rubisco (ribulose-bisfosfato carboxilase oxigenase) responsável pela fixação de dióxido de carbono durante a fotossíntese (Osafune et al ., 1990). Os grãos de paramilo de Euglena, que são responsáveis pelo armazenamento de carboidratos, exibem variações de tamanho, além de apresentar formas diferentes (redondo, oval ou tubular). A maioria das células de uma mesma espécie apresenta apenas um tipo morfológico de grãos de paramilo (monomórfico), mas algumas espécies podem apresentar grãos de diferentes tamanhos e formatos na mesma célula (dimórficos). Estudos morfológicos continuam a auxiliar na distinção de espécies de Euglena. Recentemente, estudos detalhados da ultra-estrutura da película, cloroplastos,
Figura 6. Parâmetros morfológicos utilizados para espécies de Euglena representadas esquematicamente e por microscopia de luz_._ A) Formato da célula: 1) arredondada; 2) fusiforme; 3) afunilada nas duas pontas; 4) cilíndrica; B ) Formato da região anterior: 1) arredondada; 2) afunilada; 3) alongada; 4) truncada; C ) Formato da região posterior: 1) arredondada; 2) alongada; 3) com cauda e D ) Formato dos cloroplastos: 1) discóide; 2) ovóide; 3) laço. FONTE: Imagens obtidas de “Lucid key to the genus Euglena “, University of Queensland, obtidas no endereço eletrônico: (http://bio.rutgers.edu/euglena/taxkeys.htm).