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Guias e Dicas
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ABC do eletrocardiograma 2012, Esquemas de Cardiologia

Livro aborda sobre como ler um eletrocardiograma.

Tipologia: Esquemas

2019

Compartilhado em 24/10/2019

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1. Introdução
A vetorcardiografia é um método de registro das forças eletromotri-
zes do coração no tempo e no espaço, de forma que a magnitude e a
direção das referidas forças possam ser representadas por uma sucessão
de vetores instantâneos. A sua representação é de ordem didática, pois,
sendo as curvas vetorcardiográficas bidimensionais, apresentam elemen-
tos adicionais para o entendimento e memorização inteligente do Eletro-
cardiograma (ECG). O VCG tem a sua expressão em planos, uma vez que o
fenômeno elétrico relacionado à atividade elétrica cardíaca se desenvolve
de um modo tridimensional.
A aplicação prática da vetorcardiografia tem grande importância, por-
que pode explicar e facilitar o entendimento do ECG. O VCG pode suple-
mentar informações, não facilmente detectáveis por meio da análise ele-
trocardiográfica convencional.
2. Derivações do VCG
No VCG, o coração funciona como um gerador elétrico representado
por um dipolo único com magnitude e direção. Ele pode ser desdobra-
do em tantos vetores instantâneos quantos se queira, com magnitudes
e orientações específicas. O todo mais conhecido, de maior aceitação
na literatura, foi introduzido por Frank em 1956, de maior aceitação na
literatura. É relativamente simples, pois utiliza apenas 7 eletrodos para
determinar os componentes, horizontal (X), vertical (Y) e anteroposterior
(Z). A Figura 1 demonstra as 3 derivações, perpendiculares entre si, com a
direção da positividade de cada uma delas.
Vetorcardiograma (VCG)
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Carlos Alberto Pastore
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Baixe ABC do eletrocardiograma 2012 e outras Esquemas em PDF para Cardiologia, somente na Docsity!

1. Introdução

A vetorcardiografia é um método de registro das forças eletromotri- zes do coração no tempo e no espaço, de forma que a magnitude e a direção das referidas forças possam ser representadas por uma sucessão de vetores instantâneos. A sua representação é de ordem didática, pois, sendo as curvas vetorcardiográficas bidimensionais, apresentam elemen- tos adicionais para o entendimento e memorização inteligente do Eletro- cardiograma (ECG). O VCG tem a sua expressão em planos, uma vez que o fenômeno elétrico relacionado à atividade elétrica cardíaca se desenvolve de um modo tridimensional. A aplicação prática da vetorcardiografia tem grande importância, por- que pode explicar e facilitar o entendimento do ECG. O VCG pode suple - mentar informações, não facilmente detectáveis por meio da análise ele - trocardiográfica convencional.

2. Derivações do VCG

No VCG, o coração funciona como um gerador elétrico representado por um dipolo único com magnitude e direção. Ele pode ser desdobra- do em tantos vetores instantâneos quantos se queira, com magnitudes e orientações específicas. O método mais conhecido, de maior aceitação na literatura, foi introduzido por Frank em 1956, de maior aceitação na literatura. É relativamente simples, pois utiliza apenas 7 eletrodos para determinar os componentes, horizontal (X), vertical (Y) e anteroposterior (Z). A Figura 1 demonstra as 3 derivações, perpendiculares entre si, com a direção da positividade de cada uma delas.

1^ Vetorcardiograma (VCG)

Capítulo Carlos Alberto Pastore

ABC do ECG

Figura 1 - Eixos ortogonais do corpo, cruzando-se perpendicularmente no ponto E (centro do tórax). Os eixos (ou componentes) seguem a seguin- te orientação: X, da direita para a esquerda; Y, da cabeça aos pés; Z, da parte anterior para a posterior

Os eletrodos do sistema de Frank são colocados em posições padronizadas, ao longo do 5º espaço intercostal, com o pa- ciente em decúbito supino. Na Figura 2, o eletrodo A foi colocado na linha médio-axi- lar esquerda, o E na linha médio-esternal e o C à meia distância entre os 2 primeiros; o eletrodo I posicionado na linha médio- axilar direita e o M na linha médio-espi- nal. Os H e F, colocados, respectivamente, na face posterior do pescoço, junto à linha espinal, e na perna esquerda. O eletrodo da perna direita – usado como terra – e todos os demais são aplicados com pasta apropriada à pele, previamente atritada com álcool.

Figura 2 - Posição dos eletrodos no sistema de derivações ortogonais corrigidas, proposto por Ernst Frank

O método de Frank é denominado sis- tema de derivações ortogonais corrigidas. Esse sistema procura corrigir a posição excêntrica do gerador cardíaco e a não ho- mogeneidade do meio condutor, além de eventuais variações da superfície corpórea. A intercomunicação adequada dos eletro- dos por intermédio de resistências de va- lores bem calculados, além de uma rede de compensadores, determina os eixos dos componentes ortogonais X, Y e Z. Desta forma, temos os seguintes eixos: X, transversal ou componente esquerda- direita, derivado dos eletrodos A, C e I; Y, vertical ou componente crânio-caudal, resultante dos eletrodos H, M e F e Z, an- teroposterior ou componente frente-trás, procedente de todos os eletrodos precor- diais, situados no 5º espaço intercostal (A, C, E, I e M).

Esses componentes, combinados 2 a 2, dão origem aos 3 planos ortogo- nais, em que se projetarão as curvas espaciais representativas dos fenôme- nos elétricos do coração (Figura 3). Assim, dos componentes X e Z decorre o plano horizontal, dos X e Y, o plano frontal, e dos Z e Y, o plano sagital (visto pela direita).

ABC do ECG

Figura 4 - Alças vetorcardiográficas nos 3 planos habituais: frontal, sagital direito e horizontal. Observar as coordenadas X, Y e Z correspondentes a D1, aVF e V1, respectivamente

Na Figura 5, observam-se esquematicamente as estruturas envolvidas na geração e propagação desse impulso elétrico pelo miocárdio. Em condi- ções normais, o impulso cardíaco se origina nas células do nódulo sinusal. Após seu surgimento, se propaga por meio dos tratos internodais (P, M, A e B), deflagrando, também, a contração dos átrios. A despolarização atrial é vista no ECG pela onda P, suas partes inicial, associada ao átrio direito, e final, ao átrio esquerdo (Figura 6). Ao chegar ao nódulo AV, o impulso é retardado por alguns centésimos de segundo, o que é importante para per- mitir o enchimento dos ventrículos com o sangue bombeado pelos átrios. Este atraso é representado no ECG pelo segmento PR. A despolarização ventricular (em condições normais) se inicia com a propagação do impulso pelo feixe de His e seus ramos direito e esquer- do (Figura 5). O ventrículo esquerdo possui mais massa muscular do que o

Vetorcardiograma (VCG)

direito. Para que esta carga muscular extra se despolarize em sincronia, o ramo esquerdo possui 3 fascículos: anterosseptal (AS), anteromedial (AM) e posteroinferior (PI). A despolarização ventricular como um todo é vista no ECG como o complexo QRS. Por último, o segmento ST e a onda T represen- tam a repolarização ventricular.

Figura 5 - Representação esquemática do sistema de condução elétrica do miocárdio e sua localização no músculo cardíaco. O trato internodal tem representados os seus 4 fascículos: Bachman (B); Anterior (A); Medial (M); Posterior (P), assim como o ramo esquerdo do feixe de His: fascículos anterosseptal (AS); anteromedial (AM) e posteroinferior (PI). VD: Ventrículo Direito. VE: Ventrículo Esquerdo. AD: Átrio Direito; AE: Átrio Esquerdo

Figura 6 - Várias formas de representação da despolarização atrial. a) A onda P como soma das despolarizações dos átrios direito e esquerdo. b) Esquema representativo da onda P bifásica em V1, ressaltando a polaridade da derivação eletrocardiográfica e a associação de cada fase da onda P com uma câmara atrial. c) A alça vetorcardiográfica da despolarização atrial como a soma dos vetores gerados pelos átrios durante a onda P

Vetorcardiograma (VCG)

Após a ativação septal, há a ativação das paredes livres (Figura 8). O qua- dro interno mostra um esboço do vetor resultante (vetor 2) da ativação das paredes livres dos ventrículos direito e esquerdo, também com predomínio deste último na definição da direção e sentido. Na ativação das paredes li- vres dos ventrículos, o vetor resultante tem sentido e direção concordantes com as derivações V5 e V6, e opostos à polaridade de V1. Então, o mesmo vetor é visto naquelas derivações como uma onda R de grande magnitude e, em V1, como uma onda S, de magnitude semelhante.

Figura 8 - Dois momentos da ativação ventricular vista no plano horizontal por derivações precordiais distintas: septal (vetor 1) e das paredes livres (vetor 2). O mesmo instante provoca ondas distintas do ECG conforme a polaridade da derivação. Dentro do Quadro em detalhe há a representação do vetor resultante da despolarização das paredes livres (vetor 2) neste instan- te, como sentido negativo em V1 e ao, mesmo tempo, de sentido positivo em V5 e V

A última etapa da ativação ventricular é a despolarização das porções basais dos ventrículos (Figura 9). O quadro interno mostra o cálculo do vetor resultante (vetor 3) da soma de todos os vetores locais de ativação elétrica. Como nos instantes anteriores da ativação ventricular, a deflexão que esse vetor resultante causa em uma determinada derivação do ECG depende de como ele é projetado sobre o eixo e da polaridade desta. O vetor resultante da ativação das porções basais dos ventrículos se situa de forma quase to- talmente perpendicular a V1 – nenhuma onda é gerada no complexo QRS dessa derivação, e esta tem a configuração típica rS após a total despolari- zação dos ventrículos. Em relação a V5 e V6, contudo, o mesmo vetor causa uma deflexão negativa, originando o complexo QRS típico e completo após a total ativação ventricular.

ABC do ECG

_Figura 9 - Ativação das porções basais dos ventrículos vista no plano horizontal por derivações precordiais distintas. O mesmo instante pode ser representado ou não no ECG conforme a polari- dade da derivação. Dentro do Quadro em detalhe há a representação do vetor resultante (vetor

  1. neste instante, perpendicular a V1 – e, portanto, de magnitude inexistente – sendo representa- do pela deflexão nula da linha isoelétrica; e, ao mesmo tempo, de sentido negativo em V5 e V_

A Figura 10 mostra, no mesmo plano horizontal das imagens anteriores, a alça vetorcardiográfica completa da ativação ventricular, sua correspondên- cia com diferentes morfologias de complexos QRS e os 3 vetores resultantes discutidos anteriormente, sendo cada vetor um instante específico de tempo. A alça vetorcardiográfica é a composição de todos os vetores instantâneos registrados durante a ativação ventricular, unidos entre si pelas setas. Quanto à leitura deste VCG, no plano horizontal, a ativação septal ocorre sempre na porção anterior, iniciando-se pelo seu lado direito e seguindo à esquerda (linha contínua próxima ao vetor 1). A ativação das paredes livres (linha tracejada próxima ao vetor 2) se mantém à esquerda, com um claro predomínio da localização da alça na parte posterior. Isto se dá em acordo com a noção anatômica

  • no plano horizontal, o ventrículo esquerdo, de maior massa e, con- sequentemente, maior deflexão no ECG, situa- se posteriormente ao ventrículo direito. Por conseguinte, acontece a ativação das porções basais dos ventrículos (linha contínua próxi- ma ao vetor 3), ainda na parte posterior do plano, mas já com uma orientação à direita. Figura 10 - Alça vetorcardiográfica típica da ativação ventri- cular no plano horizontal (A: Anterior; P: Posterior; D: Direita; E: Esquerda). Para fins de comparação e clareza didática são

De todos os capítulos do livro, este, sem dúvida, é um dos mais impor-

tantes. Isto porque é necessário entender como surge o registro eletrocar-

diográfico normal antes de estudar todas as alterações patológicas. Uma

vez aprendido o ECG normal, a compreensão das alterações torna-se muito

mais fácil.

Este capítulo será dividido em 4 partes: surgimento dos vetores de des-

polarização e repolarização; registro eletrocardiográfico; derivações eletro-

cardiográficas e o eletrocardiograma normal.

1. Surgimento dos vetores de despolarização e repolarização

A - Anatomia cardíaca

Os pontos relacionados à anatomia cardíaca que são importantes para a compreensão do ECG normal serão apresentados a seguir. O coração é um

órgão muscular divido em 4 câmaras: átrio direito, ventrículo direito, átrio

esquerdo e ventrículo esquerdo.

Na topografia anatômica real, as câmaras direitas não estão exatamente

à direita, mas sim, à direita e à frente, enquanto que as câmaras esquerdas

não estão exatamente à esquerda, mas sim, à esquerda e atrás.

Desta forma, num corte transversal do tórax na altura do coração, na

direção de frente para trás, a primeira estrutura vista é a parede livre do

Ventrículo Direito (VD); a seguir vem o septo interventricular e, por último, a parede livre do Ventrículo Esquerdo (VE).

2^ O ECG normal

Capítulo Rafael Munerato

O ECG normal

Figura 1 - Corte transversal do tórax na altura do coração

Devido ao fato explicado anteriormente, tem-se que o septo interventri- cular encontra-se quase paralelo ao plano frontal e, para o estudo do ECG, o septo representa a parede anterior do coração (sendo, inclusive, a primeira porção dos ventrículos a ser ativada). O fato do Ventrículo Direito (VD) estar à frente e não só à direita explica o por que, na sobrecarga do VD, o vetor resultante do QRS esteja direcio- nado para frente.

B - Células marca-passo e sistema de condução cardíaco

No coração normal existem grupos de células que possuem a capacida- de de produzir o impulso cardíaco. Estas células são chamadas de células marca-passo e este fenômeno ocorre porque essas células possuem um potencial de ação que, espontaneamente, é deflagrado e manda uma onda de despolarização que pode ativar as demais células cardíacas. Para que esta onda de despolarização possa atingir todas as células musculares do coração, é necessário o “sistema de condução”, no qual o impulso caminha com grande velocidade. No coração existem vários grupos de células marca-passo, mas o grupo capaz de mandar ondas de despolarização numa frequência maior é que comanda o ritmo cardíaco. Nos corações normais esse grupo está localizado no nódulo sinusal e, por esse motivo, o ritmo cardíaco normal é chamado Ritmo Sinusal. A cada batimento cardíaco as células marca-passo do nódulo sinusal mandam uma onda de despolarização. Esta onda é conduzida pelo sistema de condução a todo o coração. Quando ela alcança as células musculares

O ECG normal

de condução é essencial para dar tempo dos átrios se esvaziarem e preencherem os ventrículos na última fase da diástole ventricular);

  • Após passar pelo nódulo AV, o impulso entra no feixe de His novamente com grande velocidade e se divide aos ramos direito e esquerdo, e destes para os fascículos e fibras de Purkinje, para chegar às células musculares. Nos corações normais, a única forma de um impulso originado nos átrios descer aos ventrículos é através do nódulo AV. Como exposto anteriormen- te, o nódulo AV provoca um grande alentecimento do impulso e isto confi- gura proteção para que fenômenos taquicárdicos dos átrios não cheguem com frequência tão elevada aos ventrículos. Se o sistema de condução não funcionar em algum local no coração, a onda de despolarização vai ter que passar pelas células musculares cardí- acas célula-a-célula, fenômeno que leva muito mais tempo que o impulso, caminhando pelo sistema de condução. Esta situação ocorre nos bloqueios de ramo e explica por que o QRS é alargado nesta condição.

C - Célula muscular cardíaca

A onda de despolarização chega até a célula cardíaca, onde vai provocar a contração muscular. Mas como isto ocorre? Por meio da troca de polarida- de da membrana celular e liberação de cálcio armazenado. Depois da con- tração vai ocorrer o relaxamento da fibra muscular e também a nova troca de polaridade, para que a célula, ao final, retorne às condições existentes antes da onda de despolarização. Vamos detalhar o fenômeno chamado de Despolarização e Repolarização.

D - Despolarização

As células musculares em repouso são ditas polarizadas porque possuem a somatória das cargas predominantemente negativas no meio intracelular. Consequentemente, a somatória das cargas é predominantemente positiva no meio extracelular (Figura 3). Com a onda de despolarização, ocorrem al- terações da membrana e da permeabilidade dela a determinados íons, que vão entrar na célula e inverter a polaridade, tornando-a predominantemente positiva no meio intracelular. A esta inversão dá-se o nome de despolarização (Figura 4). Isto é necessário para liberação de cálcio armazenado e contração muscular. Com a troca de polaridade intracelular, o meio extracelular tam- bém sofre alteração de sua polaridade, passando de positiva para negativa_._

Figura 3 - Células musculares cardíacas polarizadas (repouso)

ABC do ECG

Atenção: No momento que o meio extracelular está trocando de polaridade surge o dipolo (presença de 2 cargas opostas). A carga negativa está surgindo com a onda de despolarização e a carga positiva é que já estava presente no meio extracelular. No momento em que surge o dipolo aparece um vetor de uma grandeza física chamada momento elétrico. Este vetor caminha nas células cardíacas conforme essas vão sofrendo o efeito da onda de despolarização e cria o vetor da despolarização. Isso tudo já era conhecido bem antes de ser desenvolvido o eletrocardiograma. Os médicos e cientistas da época sabiam que este vetor surgiria, mas não sabiam como captá-lo.

Dipolo e vetor da despolarização

Com todas as células musculares contraídas, o meio intracelular vai estar predominantemente positivo e o extracelular negativo. Neste momento não há vetor, pois o vetor só aparece na troca das cargas. Na sequência, começa a fase de relaxamento muscular, em que as bombas iônicas restabelecerão os íons e cargas presentes antes da célula se contrair. Neste momento ocorre a fase de repolarização, em que o meio intracelular volta a ficar negativo e o extracelular, positivo. No momento das trocas de cargas no meio extracelular aparece novamente o dipolo (+ -) e com isso surge o vetor de repolarização. Com todo o músculo repolarizado, as células musculares estão relaxadas, o meio intracelular predominantemente negativo e o extracelular positivo (Fi- gura 5).

Figura 4 - Despolarização

ABC do ECG

F - Vetor de repolarização dos átrios e ventrículos

No caso dos átrios, no mesmo ponto em que teve origem a despolariza- ção, também tem origem a repolarização e, por isso, o vetor de repolariza- ção dos átrios tem o mesmo sentido do vetor da despolarização, mas com direção oposta (Figura 8).

Figura 7 - Vetores da despolarização e repolarização atrial

Figura 8 - A: despolarização ventricular; B: vetor resultante; C: repolarização ventricular; D: vetor resultante

O ECG normal

O vetor de repolarização dos átrios pode originar uma onda negativa, mas que quase nunca é vista, pois se inscreve ao mesmo tempo da despo- larização dos ventrículos e porque também tem pouca expressão eletrofi- siológica. No caso dos ventrículos, após o surgimento da despolarização, a massa ventricular se encontra contraída e ocorre uma isquemia fisiológica do en- docárdio. Assim, a onda de repolarização não ocorre no mesmo ponto da onda de despolarização. A repolarização se inicia no epicárdio e se dirige para o endocárdio. Por esse motivo, o vetor da repolarização tem o mesmo sentido e direção do vetor da despolarização.

Figura 9 - A: despolarização atrial; B: repolarização atrial

Nos casos de síndrome coronariana aguda, em que ocorre obstrução coronária e diminuição do fluxo de sangue para o epicárdio, tem-se que o epicárdio sofre maior isquemia que o endocárdio nesta condição e, por isso, a onda de repolarização tem início no endocárdio para o epicárdio. Ou seja, o vetor terá mesmo sentido, mas direção oposta da despolarização. Esta in- versão da onda de repolarização provoca no ECG inversão da onda T, o que é considerado sinal precoce de isquemia.

G - Surgimento da onda P e do complexo QRS

Com o surgimento do eletrocardiógrafo (máquina capaz de captar e re- gistrar os vetores de despolarização e repolarização), surge a inscrição, no papel, da onda P, do complexo QRS e da onda T (Figura 10). A onda P é formada pela captação do vetor resultante de despolarização dos átrios e representa a contração muscular dos átrios. O complexo QRS é formado pela captação do vetor resultante de despola- rização dos ventrículos e representa a contração muscular dos ventrículos.

Figura 10 - Onda P, complexo QRS e onda T

A onda T é formada pela captação do vetor re- sultante de repolarização dos ventrículos e repre- senta o relaxamento muscular dos ventrículos.

O ECG normal

Em casos de traçados com amplitude muito pequena, nos quais é difícil visualizar as ondas do ECG, pode-se mudar a padronização para 2n, ou seja, os mesmos 1mV de cada vetor captado serão inscritos em 20mm (dobro do tamanho habitual). Em casos de sobrecargas ou em alguns ECG pediátricos, em que a inscrição das ondas é muito grande, atrapalhando a análise, pode- se mudar a padronização para n/2, ou seja, os mesmos 1,0mV de cada vetor captados serão inscritos em 5mm (metade do tamanho habitual). O papel usado para inscrição das ondas do ECG é um papel milimetrado, sendo que a cada 5mm há uma marcação com uma linha mais escura. Obser- vando a inscrição da onda no papel milimetrado, tem-se que em cada milíme- tro na abscissa deve ser analisada a duração da onda e, na ordenada, a ampli- tude da onda. Como foi exposto, o papel corre no aparelho a uma velocidade de 25mm/s. Deste modo, cada 1mm na abscissa corresponde à duração de 0,04 segundos ou 40 milissegundos (ms). Já na ordenada, a inscrição padrão n determina que cada 1,0mV do vetor ocupe 10mm. Com isso, cada 1mm na ordenada corresponde à amplitude de 0,1mV (Figura 12).

Figura 12 - Papel usado para inscrição das ondas do ECG

3. Derivações eletrocardiográficas

Como já exposto, os vetores originados pelos fenômenos cardíacos são captados pelos eletrodos do aparelho eletrocardiográfico. Estes eletrodos formam as derivações, sendo retas que unem eletrodos negativo-positivo (no caso dos eletrodos bipolares, como, por exemplo, D1, D2 e D3) ou unem os eletrodos unipolares ao centro de projeção (como, por exemplo, aVR, aVL, aVF, V1, V2, V3, V4, V5, V6). Cada uma das derivações consegue analisar um mesmo vetor de formas diversas, por exemplo, um vetor que tem inscrição espacial vai aparecer projetado nas derivações do plano frontal (D1, D2, D3, aVR, aVL e aVF) e em cada uma destas derivações vai provocar a inscrição de uma onda no papel do ECG. O mesmo vetor no plano horizontal vai ser inscrito nas derivações V1, V2, V3, V4, V5 e V6 e em cada uma destas derivações causará o desenho de uma onda no papel do ECG. Com isso, será possível examinar um vetor de projeção espacial nos planos frontal e horizontal.

ABC do ECG

Para que os traçados sejam reprodutíveis nos diferentes locais do mun- do, as derivações são padronizadas, ou seja, os locais no corpo onde são colocados os eletrodos são pré-estabelecidos.

A - Plano frontal

O plano frontal é representado pelas derivações chamadas clássicas ou dos membros. Estas derivações são obtidas colocando-se 4 eletrodos:

  • 1 no braço direito;
  • 1 no braço esquerdo;
  • 1 na perna direita;
  • 1 na perna esquerda.

A máquina alterna a positividade de cada eletrodo e, desse modo, ela- bora as diferentes derivações.

Quadro 1 - Derivações bipolares

Derivações bipolares Eletrodo positivo Eletrodo negativo D1 Braço esquerdo Braço direito D2 Perna esquerda Braço direito D3 Perna esquerda Braço esquerdo

Quadro 2 - Derivações unipolares

Derivações unipolares Potencial registrado em aVR Braço direito aVL Braço esquerdo aVF Perna esquerda

O eletrodo colocado na perna direita funciona como fio terra. As derivações clássicas for- mam um sistema de retas separa- das por ângulos de 30o. Logo, o es- tudo de um vetor cardíaco nestas derivações permite a determina- ção do ângulo deste vetor no pla- no frontal. Convencionou-se que estes ângulos seriam positivos no sentido horário, partindo de D1 e parando na extremidade oposta desta mesma derivação. No sen- tido anti-horário os ângulos rece- bem o sinal negativo (Figura 13). (^) Figura 13 - Estudo de vetor cardíaco