Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Trajetória da Sexualidade na Época Moderna: Um Estudo por Scarlett Beauvalet, Resumos de Desvio

Um estudo sobre a sexualidade na época moderna, realizado pela historiadora scarlett beauvalet. Ela aborda como a sexualidade foi configurada e controlada através de redes simbólicas sociais, como as representações religiosas, jurídicas e médicas. O texto explora como a sexualidade foi gradualmente condenada pelo cristianismo e tornou-se um problema médico e jurídico. Além disso, ele discute as representações e práticas da sexualidade na frança através de textos religiosos, médicos, jurídicos e testemunhos privados.

Tipologia: Resumos

2022

Compartilhado em 07/11/2022

EmiliaCuca
EmiliaCuca 🇧🇷

4.5

(111)

219 documentos

1 / 3

Toggle sidebar

Esta página não é visível na pré-visualização

Não perca as partes importantes!

bg1
958 Estudos Feministas, Florianópolis, 20(3): 955-972, setembro-dezembro/2012
Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:
Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:
Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:
a trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na época
a trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na época
a trajetória da sexualidade na época
moderna, na Fmoderna, na F
moderna, na Fmoderna, na F
moderna, na Françarança
rançarança
rança
Histoire de la sexualité à l’époque
moderne.
Paris: Armand Colin, 2010. 320 p.
BEAUVALET, Scarlett.
Scarlett Beauvalet é historiadora professora
do Centro de História das Sociedades da
Universidade de Picardie e do Centro de
Pesquisas sobre as Civilizações da Europa
Moderna na Universidade de Paris IV, Sorbonne.
Ela é uma estudiosa no campo de estudos de
gênero e tem diversas publicações prestigiadas
na França, como Les femmes à l’époque
moderne (XVIe-XVIIIe siècles), pela editora Belin
em 2003, e Être veuve en France à l’époque
moderne, pela mesma editora em 2001. Na
própria Revista Estudos Feministas foi publicado,
em 2002, seu artigo intitulado As parteiras-chefes
da maternidade Port-Royal de Paris no século
XIX: obstetras antes do tempo?
A autora apresenta nesta obra um
importante e atual debate sobre a sexualidade
recreativa ou reprodutiva a partir das leituras
religiosas, jurídicas e médicas. Citando Maurice
Godelier, ela revela que a sexualidade é
configurada a partir de redes simbólicas sociais
consideráveis nesses três campos.
Beauvalet aponta neste trabalho como a
sexualidade foi pouco a pouco condenada
pelo cristianismo, principalmente a partir do
século XVI, e constituída ao estatuto de problema
médico e jurídico. A obra se propõe a revisitar
as representações e as práticas da sexualidade
na modernidade e a mostrar a relação existente
entre as normas e as práticas sociais na França
através de textos religiosos, médicos, jurídicos e
testemunhos privados, além de obras literárias e
artísticas.
O livro está dividido em cinco capítulos.
No primeiro, intitulado “Sexe bridé, sexe libéré”,
a autora inicia falando sobre o papel da
sexualidade no fim da Antiguidade, apontando
para a importância do prazer na sociedade
greco-romana. Mas logo o estoicismo do
pensamento de São Paulo vai indicar o pecado
da carne como um problema de saúde. São
Paulo introduz uma dissociação entre a “carne”
e o espírito. Aos poucos a ideia da “carne” vai
se confundindo com o “corpo” e os assuntos
sobre o corpo tornam-se mais significativos nos
discursos religiosos.
Na visão da Igreja Católica, o pecado
original fez os homens perderem a capacidade
que Deus lhes tinha dado de subordinar suas
paixões à sua vontade. Assim os seres humanos
tinham se insubordinado a Deus e, por isso, a
Bíblia fez representações da mulher como
aquela que tenta o homem, com a ideia de
que o pecado iniciou por causa dela. A visão
sobre o papel das mulheres oscilava, portanto,
entre a Virgem Maria, com sua virtude, e aquelas
que seriam perigosas e sem virtude.
No Capítulo 2, intitulado “La sexualité
conjugale: amour, sexe et procréation, a autora
aponta que a relação estreita sobre controle da
sexualidade inicia com o Concílio de Trento (entre
1545 e 1563). Essa reunião, segundo ela, foi uma
forma de controle tanto do Estado quanto da
Igreja sobre a vida privada das pessoas.
A partir desse concílio, a sexualidade do
casal foi percebida e relatada como um mar
revolto incontrolável – tudo isso para expressar o
medo do exercício da sexualidade no leito do
casal. O controle passou a ser, inclusive, sobre
as posições sexuais do casal; por exemplo, a
mulher não deveria ficar sobre o marido na
relação sexual, pois isso indicaria que ela era
superior a ele.
Beauvalet cita padres como Thomaz
Sanchez, que discutia a permissão que a Igreja
deveria dar para que existissem, entre o casal,
“abraços, beijos e carícias”, por exemplo, antes
das relações sexuais. Aqui a autora identifica
algo que será marcante em toda a sua obra e
talvez o mais significativo: a concordância dos
sistemas médicos e jurídicos com a Igreja. Por
exemplo, os médicos estabeleciam uma
relação direta, concordando com a Igreja, entre
sexualidade e procriação. Eles defendiam que
uma boa reprodução dependia da boa moral
pf3

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Trajetória da Sexualidade na Época Moderna: Um Estudo por Scarlett Beauvalet e outras Resumos em PDF para Desvio, somente na Docsity!

Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:Entre crucifixos, códigos e estetoscópios:

a trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na épocaa trajetória da sexualidade na época

moderna, na Fmoderna, na Fmoderna, na Françamoderna, na Fmoderna, na Françarançarançarança

Histoire de la sexualité à l’époque

moderne.

Paris: Armand Colin, 2010. 320 p.

BEAUVALET, Scarlett.

Scarlett Beauvalet é historiadora professora do Centro de História das Sociedades da Universidade de Picardie e do Centro de Pesquisas sobre as Civilizações da Europa Moderna na Universidade de Paris IV, Sorbonne. Ela é uma estudiosa no campo de estudos de gênero e tem diversas publicações prestigiadas na França, como Les femmes à l’époque moderne (XVIe-XVIIIe siècles) , pela editora Belin em 2003, e Être veuve en France à l’époque moderne , pela mesma editora em 2001. Na própria Revista Estudos Feministas foi publicado, em 2002, seu artigo intitulado As parteiras-chefes da maternidade Port-Royal de Paris no século XIX: obstetras antes do tempo? A autora apresenta nesta obra um importante e atual debate sobre a sexualidade recreativa ou reprodutiva a partir das leituras religiosas, jurídicas e médicas. Citando Maurice Godelier, ela revela que a sexualidade é configurada a partir de redes simbólicas sociais consideráveis nesses três campos. Beauvalet aponta neste trabalho como a sexualidade foi pouco a pouco condenada pelo cristianismo, principalmente a partir do século XVI, e constituída ao estatuto de problema médico e jurídico. A obra se propõe a revisitar as representações e as práticas da sexualidade na modernidade e a mostrar a relação existente entre as normas e as práticas sociais na França através de textos religiosos, médicos, jurídicos e testemunhos privados, além de obras literárias e artísticas. O livro está dividido em cinco capítulos. No primeiro, intitulado “Sexe bridé, sexe libéré”, a autora inicia falando sobre o papel da sexualidade no fim da Antiguidade, apontando

para a importância do prazer na sociedade greco-romana. Mas logo o estoicismo do pensamento de São Paulo vai indicar o pecado da carne como um problema de saúde. São Paulo introduz uma dissociação entre a “carne” e o espírito. Aos poucos a ideia da “carne” vai se confundindo com o “corpo” e os assuntos sobre o corpo tornam-se mais significativos nos discursos religiosos. Na visão da Igreja Católica, o pecado original fez os homens perderem a capacidade que Deus lhes tinha dado de subordinar suas paixões à sua vontade. Assim os seres humanos tinham se insubordinado a Deus e, por isso, a Bíblia fez representações da mulher como aquela que tenta o homem, com a ideia de que o pecado iniciou por causa dela. A visão sobre o papel das mulheres oscilava, portanto, entre a Virgem Maria, com sua virtude, e aquelas que seriam perigosas e sem virtude. No Capítulo 2, intitulado “La sexualité conjugale: amour, sexe et procréation” , a autora aponta que a relação estreita sobre controle da sexualidade inicia com o Concílio de Trento (entre 1545 e 1563). Essa reunião, segundo ela, foi uma forma de controle tanto do Estado quanto da Igreja sobre a vida privada das pessoas. A partir desse concílio, a sexualidade do casal foi percebida e relatada como um mar revolto incontrolável – tudo isso para expressar o medo do exercício da sexualidade no leito do casal. O controle passou a ser, inclusive, sobre as posições sexuais do casal; por exemplo, a mulher não deveria ficar sobre o marido na relação sexual, pois isso indicaria que ela era superior a ele. Beauvalet cita padres como Thomaz Sanchez, que discutia a permissão que a Igreja deveria dar para que existissem, entre o casal, “abraços, beijos e carícias”, por exemplo, antes das relações sexuais. Aqui a autora identifica algo que será marcante em toda a sua obra e talvez o mais significativo: a concordância dos sistemas médicos e jurídicos com a Igreja. Por exemplo, os médicos estabeleciam uma relação direta, concordando com a Igreja, entre sexualidade e procriação. Eles defendiam que uma boa reprodução dependia da boa moral

decorrente da religião. Outro exemplo que a autora relata é o de que os médicos revelavam o cuidado necessário para não desperdiçar sêmen, pois isso poderia acarretar problemas às gerações futuras; assim, concordavam com a Igreja, reprovando a masturbação. No Capítulo 3, intitulado “La sexualité préconjugale”, a autora aponta que, com a mudança da sociedade rural para a urbana, algumas transformações começam a acontecer; com o adiamento dos casamentos, na Idade Moderna, o controle sobre a sexualidade dos jovens foi ainda maior. Beauvalet descreve que as crianças até os seis ou sete anos de idade tinham contato e manipulavam tanto seus órgãos sexuais quanto os de adultos. Essa brincadeira não era julgada perigosa, pois a criança não era considerada como alguém que tinha sexualidade. Mas a sexualidade adolescente foi pouco a pouco sendo vista como uma ameaça. Aqui mais uma vez o conhecimento supostamente científico teve muita influência para o controle da sexualidade. Por exemplo, alguns alimentos eram indicados para o controle da sexualidade e outros, tidos como afrodisíacos, deveriam ser evitados, como o café e o chocolate. Já existia no século XVI uma forte preocupação com qualquer coisa que pudesse estimular a sexualidade. Esses tratados eram formas de controle e indicadores de “ savoir- vivre ”. Podemos aqui identificar aquilo que Foucault 1 chamou de dispositivos da sexualidade, tanto do ponto de vista da higiene quanto da moral. Para as crianças e os adolescentes da burguesia, a educação se dava principalmente através da internação em conventos, prática muito comum, onde o controle sobre a sexualidade era ainda maior. Existem diversos relatos da autora sobre manuais que orientavam como os preceptores dos jovens deveriam proceder para evitar, por exemplo, que os alunos entrassem em contato com o próprio corpo, onde deveriam colocar suas mãos para evitar a masturbação etc. O interessante é que, ao mesmo tempo que a Igreja fazia o papel de controle da sexualidade, era lá que as meninas iam para se mostrar aos seus futuros pretendentes. Outro fato interessante é que nessa época já haviam livros que auxiliavam os/as jovens a entender como conquistar o parceiro. Além disso, a autora apresenta vários relatos sobre documentos que apontam divergências entre os costumes locais e a própria Igreja. Um deles, chamado

alberger ”, é formado por permissões conce- didas pelos pais às suas filhas, que em dias de festas poderiam receber os namorados em seus quartos. Esse costume acontecia não só na França, mas também no norte da Europa, na Suíça, na Alemanha e na Escandinávia; portanto, não se pode dizer que as práticas de controle da Igreja eram aceitas sem resistência. Essa pode ser uma pista interessante para a compreensão de uma antropologia da sexualidade no mundo contemporâneo. O Capítulo 4, intitulado “Le sexe alternatif: vivre differémment sa sexualité”, demarca as tipificações consideradas clandestinas da sexualidade. Mas a autora destaca algumas peculiaridades interessantes em seu texto; muitas vezes, por exemplo, a justiça fazia um papel tão disciplinador quanto a própria Igreja, principal- mente em relação aos sexos. Por exemplo, o adultério era visto pela Igreja como um pecado, tanto para os homens quanto para as mulheres, mas para os juristas era um crime apenas quando cometido pelas mulheres, e não pelos homens. A imagem do “corno” era muito corriqueira nas rodas de encenações e literatura burlesca e algo muito temido pelos maridos, pois colocava em xeque sua honra. A autora cita uma série de poemas e obras que abordam o assunto, como, por exemplo, L’Isle des hermaphrodites, de Charles Sorel, e L’école des femmes, de Molière, em que a temática do adultério era frequente. A maior parte dos adultérios, segundo a autora, devia-se ao fato de os casamentos acontecerem por interesse político ou financeiro, e não por amor. O amor por outro começa a ser citado como uma das causas das traições, não somente a voluptuosidade e a impetuosidade dos desejos. O livro apresenta algumas curiosidades, como a origem do termo “masturbação”, empregado pela primeira vez num tratado escrito por um médico chamado Tissot. A autora relata uma cruzada da medicina contra a masturbação, pois os médicos acreditavam que o homem produzia uma quantidade limitada de sêmen. Para as mulheres, a situação era a mesma, mas com o agravante de que, para elas, Tissot considerava a prática “suicida e autodestrutiva” (p. 225). Sobre a sodomia, a autora aponta que a prática era condenada tanto para homens quanto para mulheres, considerada uma inversão. Mas somente foi chamada de “homossexualidade” a partir do fim do século XIX. Segundo a autora, a Itália era tida como uma terra onde a Sodomia se apresentava com muita frequência, a cidade de Florença era