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Teoria da Pessoa de Tim Ingold: Um Novo Paradigma de Engajamento Humano, Notas de estudo de Cultura

Neste documento, discutimos a teoria da pessoa de tim ingold, que propõe uma nova forma de pensar sobre seres humanos e seu lugar no mundo. Ingold desafia as perspectivas tradicionais de antropologia cultural e ciência biológica, oferecendo uma visão de mundo contínua em que cultura e natureza, pessoas e organismos estão interconectados. A teoria aborda percepção, sentidos, linguagem, tecnologia e arte, e enfatiza a importância do engajamento ativo dos seres humanos no mundo.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 17, n. 35, p. 357-389, jan./jun. 2011
A teoria da pessoa de Tim Ingold
A TEORIA DA PESSOA DE TIM INGOLD: MUDANÇA OU
CONTINUIDADE NAS REPRESENTAÇÕES OCIDENTAIS
E NOS CONCEITOS ANTROPOLÓGICOS?*
Regina Coeli Machado e Silva
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Brasil
Resumo: O objetivo deste artigo é discutir a proposta analítica de Tim Ingold para
compreender a noção de pessoa, que pretende superar a dualidade mente/corpo. Essa
dualidade é “repensada” através da objeção ao conceito de “representação coleti-
va”, em favor de uma abordagem que incorpora elementos biológicos na explicação,
concebendo a noção de pessoa como um aspecto da vida orgânica. O argumento aqui
desenvolvido é que a incorporação desses princípios como uma tentativa de superar
o dualismo mente/corpo nos obriga a enfrentar de modo renovado as questões aí
colocadas, mas questiona se o resultado não seria reiterar explicações das propostas
analíticas que quer refutar. Isto é, a base epistemológica da escola sociológica fran-
cesa que postula o fundamento social da cognição. Para isso, este artigo está organi-
zado em três partes. A primeira, introdutória, apresenta o contexto social recente e o
desenvolvimento das ciências cognitivas como condições propiciadoras da retomada
do tema em questão. A segunda apresenta a perspectiva analítica de Ingold para
compreender a noção de pessoa que, ao mesmo tempo, pretende ultrapassar dualis-
mos como natureza e cultura, mente e corpo. Finalmente, na terceira parte, discute
as implicações teóricas e ideológicas do argumento analítico proposto por Ingold.
Palavras-chave: cognicão, mente versus corpo, pessoa, Tim Ingold.
Abstract: The aim of this paper is to discuss the analytical proposition of Tim Ingold
in understanding the notion of Person who wants to overcome the duality of mind and
* Agradeço ao Prof. Dr. Luiz Fernando Dias Duarte a leitura e as sugestões para a elaboração deste artigo,
como também agradeço a um leitor anônimo, parecerista desta revista, pelas observações atentas e pro-
veitosas, que muito me benefi ciaram na revisão do mesmo.
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357 A teoria da pessoa de Tim Ingold

A TEORIA DA PESSOA DE TIM INGOLD: MUDANÇA OU

CONTINUIDADE NAS REPRESENTAÇÕES OCIDENTAIS

E NOS CONCEITOS ANTROPOLÓGICOS?

Regina Coeli Machado e Silva Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Brasil

Resumo: O objetivo deste artigo é discutir a proposta analítica de Tim Ingold para compreender a noção de pessoa, que pretende superar a dualidade mente/corpo. Essa dualidade é “repensada” através da objeção ao conceito de “representação coleti- va”, em favor de uma abordagem que incorpora elementos biológicos na explicação, concebendo a noção de pessoa como um aspecto da vida orgânica. O argumento aqui desenvolvido é que a incorporação desses princípios como uma tentativa de superar o dualismo mente/corpo nos obriga a enfrentar de modo renovado as questões aí colocadas, mas questiona se o resultado não seria reiterar explicações das propostas analíticas que quer refutar. Isto é, a base epistemológica da escola sociológica fran- cesa que postula o fundamento social da cognição. Para isso, este artigo está organi- zado em três partes. A primeira, introdutória, apresenta o contexto social recente e o desenvolvimento das ciências cognitivas como condições propiciadoras da retomada do tema em questão. A segunda apresenta a perspectiva analítica de Ingold para compreender a noção de pessoa que, ao mesmo tempo, pretende ultrapassar dualis- mos como natureza e cultura, mente e corpo. Finalmente, na terceira parte, discute as implicações teóricas e ideológicas do argumento analítico proposto por Ingold.

Palavras-chave: cognicão, mente versus corpo, pessoa, Tim Ingold.

Abstract: The aim of this paper is to discuss the analytical proposition of Tim Ingold in understanding the notion of Person who wants to overcome the duality of mind and

  • Agradeço ao Prof. Dr. Luiz Fernando Dias Duarte a leitura e as sugestões para a elaboração deste artigo, como também agradeço a um leitor anônimo, parecerista desta revista, pelas observações atentas e pro- veitosas, que muito me beneficiaram na revisão do mesmo.

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body. This duality is “rethought” through the objection to the concept of “collective representation”, in favor of an approach that incorporates biological principles in ex- plaining, to conceive the person as an aspect of organic life in general. The argument developed here is that the incorporation of these principles as an attempt to overcome the mind / body dualism forces us to confront the issues in a new way. And it also questions whether the result would not renew analytical explanations that he wants to refute. It means: the epistemological basis of the french sociological school in relation to the postulate of the social foundation of cognition. This article is organized into three parts. The fi rst, introductory, presents the social context and the recent develop- ment of the Cognitive Sciences conditions in the resumption of the theme. The second part presents the analytical perspective of Ingold understanding the notion of Person that intends to overcome dualisms such as nature and culture, mind and body. Finally, the third part, discusses the theoretical and ideological implications of the analytical argument proposed by Ingold.

Keywords: cognition, mind versus body, person, Tim Ingold.

Introdução

Parte de um debate desenvolvido na antropologia contemporânea, cen- trado em fundamentos teóricos de diferentes questões analíticas que se des- dobram a partir das relações entre natureza e cultura, o ensaio de Tim Ingold (1991) Become persons: consciousness and sociality in human evolution está inserido em uma teorização mais ampla e sistêmica, cuja especificidade é pressupor uma totalidade indivisível entre organismo e ambiente. Nela es- tão desenvolvidos desafios direcionados à antropologia cultural e à ciência biológica, pois concebe um mútuo envolvimento entre cultura e natureza e entre pessoas e organismos que, em sinergia, dão lugar à ação e à consciência dentro de um processo contínuo da vida (Ingold, 1990, 1991, 1994, 2002a). Embora esse ensaio seja de 1991, artigos posteriores retomam, enfocando sob outros ângulos e temas, desdobramentos do conceito de organismo/pes- soa, refinando-o por meio de uma reflexão que o articula ao ambiente. Nessa articulação, a centralidade da habilidade prática como um modus operandi do organismo humano é um importante interesse analítico de Ingold, evi- denciando a indissociabilidade mente/corpo, visível nos estudos da ação e da

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insere e dialoga ao retomar inquietações do segundo.^2 Por essa razão, o objeti- vo aqui é refletir sobre as implicações téoricas envolvidas na compreensão do organismo/pessoa da recente proposta analítica de Ingold, refletindo também sobre seu posicionamento na tensão universalismo/racionalismo versus singu- larismo romântico que caracteriza todo empreendimento antropológico. É evidente que estamos aí no horizonte amplo da “cultura ocidental”, noção que vem sendo cada vez mais problematizada pela antropologia, jun- tamente com a “ciência”^3 em geral e, particularmente, com as “ciências hu- manas”. Bruno Latour (1994) também expressa essa problematização através de uma crítica mais geral ao que ele denominou as Duas Grandes Divisões. Segundo este autor, a antropologia foi constituída pelos modernos ocidentais para compreender aqueles que não o eram, tendo interiorizado, em suas ques- tões, em seus conceitos e em suas práticas, esta divisão entre nós e eles. Tal divisão, naturalizada como diferença, foi elevada a um princípio fundador da sociologia do conhecimento, aparecendo em dois níveis. O primeiro nível des- sa partilha, externo, corresponde à divisão entre Nós (ocidentais) e Eles (não ocidentais) e o segundo, interno, é a partição entre a natureza e a cultura do Nós e a imbricação cultura e natureza do Eles (Latour, 1994, p. 98). É nos desdobramentos dessa crítica geral desenvolvida na antropologia, externa e internamente, que se insere a crítica de Tim Ingold (1990, 1991, 1994, 2002b) aos antropólogos, pois ele pretende romper com os modelos canônicos de explicação legados por Marcel Mauss e Émile Durkheim, em diferentes planos de análise – epistemológico e teórico-metodológico. Segundo Ingold, os antropólogos estão preparados para admitir que a divisão entre natureza e cultura é produto de uma construção cultural, mas não estão preparados para ver que suas próprias noções descansam precisamente nessa mesma “funda- ção ontológica”. Assim, prossegue ele, a confusão ameaça dissolver o argu- mento inteiro em uma infinita regressão – se as categorias opostas de natureza e cultura são elas mesmas construções culturais, assim deve ser a cultura que

(^2) O autor faz a crítica não somente a diversas filiações da tradição antropológica, mas às abordagens da biologia neodarwinista. Ele propõe uma abordagem relacional para a antropologia, incorporando a biologia de desenvolvimento (de Oyama), a psicologia ecológica (de Gibson) e a fenomenologia (de Merleau-Ponty). Essas apropriações são desenvolvidas a partir da reformulação e da problematização de outras contribuições antropológicas, como as de Bateson e de Bourdieu (Ingold, 2002a, p. 3-7, 2002b). (^3) Vale lembrar aqui as profundas implicações do advento da ciência como um fenômeno ocidental, apon- tadas pela literatura antropológica e sociológica clássicas.

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as construiu como opostas. É, portanto, uma ilusão, segundo Ingold (1991, p. 362, tradução minha), supor que considerações não ocidentais e ocidentais possam ser comparadas em termos de níveis, como “construções alternadas da realidade”, pois a “primazia ontológica das contribuições ocidentais – o suposto da cultura versus natureza, mente versus corpo – está implícita em todo o projeto que os reúne como objeto para comparação”. Isso resulta em uma concepção antropocêntrica da humanidade, dualista, que a vê em parte natureza, em parte cultura (Ingold, 1994). As razões para essa crítica são atribuídas, às vezes, a uma autorreflexão mais radical da antropologia em sua “volta para casa”,^4 mas também se ins- crevem em um contexto de questões surgidas bem recentemente, propiciadas pelo encontro das ciências da informação e da inteligência artificial com as ciências físico-químicas e biológicas, formando um conjunto de disciplinas dedicadas às questões do conhecimento (Atlan, 1998). Esse empreendimento, que passou a ser denominado mais amplamente como “ciências cognitivas”, deixou à filosofia as especulações sobre o conhecimento e passou a dar lugar às experimentações, utilizando processos computacionais para tentar simular o que ocorre na mente/cérebro durante a atividade cognitiva. Mesmo partindo de estudos dos processos gerais que regem as atividades parciais do tratamen- to da informação (percepção, transformação, armazenamento, recuperação e utilização) ou simulando os processos mentais, o que subjaz aos modelos te- óricos das ciências cognitivas é a tentativa de compreender as representações mentais. De maneira complementar, as representações ou os fenômenos men- tais são objeto da biologia genética e molecular (Searle, 1992, 1998), assim como da neurobiologia (Damásio, 1995).^5 Todo esse contexto afeta, em várias direções, a base epistemológica da antropologia e aparece em várias discussões contemporâneas que vêm

(^4) Essa volta para casa faz parte de um amplo movimento de crítica dentro da antropologia, induzido por mudanças no contexto histórico e social, tais como a reestruturação das relações entre as nações pós- colonialistas. Esse movimento, presente na Inglaterra, nos EUA e na França, questionava as noções de subjetividade e racionalidade, buscava um realinhamento da assimetria verificada entre sujeito e objeto, bem como alargava seus interesses de investigações através de um deslocamento de seus temas e objetos (Latour, 1994; Sangren, 1988). (^5) Em dois ensaios publicados recentemente no Brasil, Geertz (2001) expõe a proliferação de teorias e mé- todos que deu origem ao que ele denominou “revolução cognitiva” e seus desdobramentos na antropolo- gia em torno das questões que tentam resolver as dificuldades envolvidas na compreensão das diferentes equações dadas para a relação mente x cultura e sua polarização, como expomos aqui.

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reintroduzidos em sua análise, especialmente quando demonstra o processo de tonar-se pessoa como um processo integral de tornar-se um organismo. Certamente não podemos desconsiderar essas formulações que nos obrigam a retomar questões conhecidas e a enfrentá-las, com ânimo renovado, sobre- tudo diante desta possibilidade, aberta por Ingold, de pensar a antropologia como uma espécie de subárea da biologia. Nesse caso, a biologia que procura desvendar os processos de crescimento e amadurecimento que dão origem às formas e às capacidades dos organismos não como meras expressões de desenhos ou modelos que já foram estabelecidos por uma seleção natural e que são transmitidos a cada organismo – com seu complemento de genes – no momento da concepção. Como Ingold argumenta, essa biologia concebe as características do organismo não como expressas, mas geradas no curso do desenvolvimento, surgindo como propriedades emergentes dos campos de relacionamento estabelecidos por sua presença e atividade em um ambiente particular. É essa biologia que ajuda Ingold a sustentar o ponto de vista do organismo/pessoa crescendo e se desenvolvendo em um ambiente propiciado pelo trabalho e atividade e presença dos outros. Tal biologia aproxima-se da psicologia ecológica, que estuda a percepção, pois ambas tomam como pon- to de partida o desenvolvimento do organismo/pessoa no ambiente. Trata-se, segundo Ingold (2004, p. 220, tradução minha, grifo do autor), de oferecer uma “nova forma de pensamento sobre seres humanos e seu lugar no mun- do, centrado nos processos de desenvolvimento e nas propriedades dinâmicas de campos relacionais” que poderá “inaugurar uma nova era da antropologia como uma ciência do engajamento no mundo relacional ”.^7

Tornar-se pessoa como um processo integral de tornar-se um organismo

É com o objetivo de remover os “resíduos” que teriam sido deixados pela “fundação ontológica da lógica conhecida como ocidental” (Ingold, 1991, p. 356, tradução minha) – que separa natureza e cultura e outras dicotomias

(^7) No original, “a genuine new way of thinking about human beings and their place in the world, centred on process of development and the dynamic properties of relacional fields, that not only promises a new reintegration of social and biological anthropology, but also sets a radical evolucionary agenda for the twenty-first century. It will, I hope, inaugurate the coming-of-age of anthropology as a science of enga- gement in the relational world .”

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que lhes são subjacentes, como as que separam corpo/mente, humano/não hu- mano e organismo/pessoa, presentes no pensamento antropológico – que Tim Ingold (2002b) direciona sua crítica tanto aos biólogos neodarwinistas quanto aos antropólogos filiados à tradição téorica durkheimiana. Para os primeiros, prossegue ele, que veem os padrões de interação, cooperação e comunicação entre indivíduos como expressões fenotípicas de um código genético, disposi- ções herdadas no curso da filogenia evolucionista, a sociedade seria mantida e trazida biologicamente dentro de cada indivíduo. Para os segundos, que re- jeitam os apelos aos imperativos biológicos, as relações sociais pressupõem a emergência de regras dentro de um modelo de instituições, constituindo um fenômeno sociocultural (Ingold, 2002b). Essa separação – que subscreve, na academia, a divisão de trabalho entre “humanidades” e “ciências naturais” e, dentro da antropologia, a divisão entre os extremos biológicos e sociocultu- rais – repousa na distinção entre os domínios subjetivos (o mundo interno da mente e do significado) e os domínios objetivos (o mundo externo da matéria e da substância). A consequência dessa separação é uma posição ortodoxa, identificada por Ingold em Sahlins, que coloca a “essência humana” em um pedestal no qual a natureza pode ser apropriada conceitualmente e mesmo transformada fisicamente de acordo com os próprios modelos de significa- dos dos possuidores dessa existência humana (Ingold, 1991). Desse modo, quando se pensa no conceito de pessoa, há, pelo menos, três principais con- sequências dessa “fundação ontológica”, segundo Ingold. A primeira é que, desde que a distintividade repousa na parte em que o ser humano ultrapassa o organismo, o organismo humano parece ser essencialmente indiferenciado dos organismos de outras espécies. A segunda consequência é que essa sepa- ração supõe o desenvolvimento da pessoa como decorrente do “processo de socialização ou enculturação”, processo pelo qual a pessoa alcança sua huma- nidade. Finalmente, a terceira, é que os organismos (humano e não humano) são especificados pela sua constituição dos “genes”. Para o não humano, esta última especificação realiza o conjunto de suas possibilidades de desenvol- vimento, e para o ser humano, (parte organismo, parte pessoa), estabelece pré-requisitos para aquisição de uma personalidade do tipo “programa para aprender” (Ingold, 1991, p. 357-358). Contrapondo-se à investigação da gênese moral da noção de pessoa elaborada por Marcel Mauss (2003b), Ingold procura demonstrar como esta

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E isso através de seu engajamento direto no mundo das pessoas e dos relacionamentos reais.^8 O self é então equivalente ao que, segundo Ingold (1991), Jean Lave denomina de person-acting. Isto é, o self é muito diferente do significado da pessoa como parte de um sistema compreensivo de repre- sentações mentais construídas do mundo social, e da ideia de que as pessoas podem consultar/observar tais representações internalizadas e serem autores de sua própria ação, interpretando as ações dos outros como indivíduos auto- contidos. Por essa razão, também não se pode considerar o desenvolvimento da pessoa como resultante de um processo de socialização. Ao contrário, esse desenvolvimento para os organismos humanos, assim como para outros orga- nismos, a presença e contribuição de outros indivíduos

é vital para o desenvolvimento ontogenético normal tanto nos períodos pré-natal como pós-natal dos ciclos de vida. Consequentemente, o processo de tornar-se uma pessoa – o desenvolvimento dos poderes da consciência, da autoconsciên- cia e intencionalidade pelos quais cada um de nós é capaz de ter um papel ativo e responsivo na formação da nossa vida e de outros – é parte de um processo biológico de tornar-se um organismo. Este processo não é interrompido em um ponto qualquer ou quando se atinge a maturidade. Ao contrário, ele permanece ao longo de todo curso da vida, sendo verdadeiramente a vida. (Ingold, 1991, p. 369, tradução minha).

Se os poderes da consciência são parte de um processo biológico, não há sustentação, na prática, para a distinção organismo/pessoa. Assim, por exem- plo, a capacidade para falar é inata, intrínseca ao organismo humano, mas a linguagem particular de uma pessoa tem sua fonte na comunidade social e seu lugar na matriz relacional. Do mesmo modo, se pode ver que uma série de aptidões humanas é incorporada e não retirada de um sistema internaliza- do de regras mentais e representações (Ingold, 1991, 1993, 1994). A própria individualidade emerge dentro de um desenvolvimento do organismo humano em seu ambiente, no qual organismo e ambiente são biológicos. Interessante

(^8) “For what non-western peoples are telling us, in their thought and practice, is that neither as organisms nor as selves do humans come into being in advance of their entry into social relationships. Like orga- nisms, selves become , and they do so within a matrix of relations with others. The un folding of these relations in the process of social life is also their en folding within the selves that are constituted within this process, in their specific structures of awareness and response – strutures which are, at the same time, embodiments of personal identity.” (Ingold, 1990, p. 222, 1986, p. 207 apud Ingold, 1991, p. 367).

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mencionar que, para Ingold (1993, 2006), a relação entre organismo e ambien- te é uma propriedade emergente do processo de desenvolvimento da evolução, de modo que o desenvolvimento do organismo é também o desenvolvimento de um ambiente para o organismo. Se tornar-se pessoa é um processo integral de se tornar um organismo, continua Ingold (1991, p. 372), nós não poderíamos mais ver o desenvolvi- mento da pessoa como resultante de um processo de socialização. Essa é a razão pela qual a ideia de aprender adquire um papel diferente, pois o sig- nificado do mundo não é mais “recebido” e nem depende da aquisição de um esquema construído. Aprender e perceber é “understanding in pratice”, conforme expressão de Lave (1990, p. 310 apud Ingold, 1993, p. 463-464), que é inseparável do fazer, e ambos estão embebidos no contexto de um enga- jamento prático no mundo e com outros. Em outras palavras, aprender é uma “educação da atenção”, definição de Gibson (1979, p. 254 apud Ingold, 1991, p. 371; Ingold, 2002b), é um problema não de “enculturação”, mas de se tor- nar apto, experiente ( enskillment ) (Ingold, 1991, p. 371). Um dos exemplos desse tipo de aprendizagem é dado por Ingold ao comparar a aquisição da linguagem com o do desenvolvimento de aptidões perceptivas. Enquanto a aquisição da linguagem é vista como inseparável do desenvolvimento dos poderes da fala, o desenvolvimento de aptidões percep- tivas que nós aprendemos para conhecer os outros se desenvolve estando aten- tos para aquelas tramas sutis que revelam as nuances do nosso relacionamento com eles. O padrão de relações sociais da pessoa torna-se, assim, incorporado na estrutura de seu sistema perceptivo, como uma sedimentação de uma histó- ria passada, de envolvimento interativo mútuo e direto. Desse modo, as habilidades ou aptidões para a ação, como caminhar, falar, ouvir e tocar instrumentos musicais emergem dentro do processo de desenvolvimento do organismo/pessoa,^9 processo que – longe de construir o indivíduo particular, inicialmente fechado para o mundo, em um conjunto de relacionamentos baseados nos membros de uma coletividade inclusiva – tem,

(^9) “Rather, the abilities both to speak and to read and write emerge within a continuous process of bodily modification, involving a ‘fine-tuning’ of vocal-auditory and manual-visual skills together with corres- ponding anatomical changes in the brain, and taking place within the contexts of the learner’s engage- ment with other persons and diverse objects in his or her environment. Both capacities, in short, are the properties of developmental systems.” (Ingold, 2002g, p. 377).

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elas são encapsuladas na consciência da pessoa, que é a estrutura do ser. A co- nexão entre as relações sociais e a consciência deve então ser compreendida em termos de abertura e fechamento – mais do que como relações de causa e efeito

  • e em termos de processos – mais do que relações entre entidades separadas. (Ingold, 1991, p. 373, tradução minha).

Esta perspectiva sugere que “é possível que as pessoas se engajem umas com as outras na base da experiência perceptiva formada antes da objetivação da experiência em termos das representações coletivas codificadas pela lin- guagem e validadas pelo acordo verbal” (Ingold, 1991, p. 373, tradução mi- nha). Então, a socialidade é possível na ausência da linguagem e de qualquer tipo de autoconsciência que dependa da linguagem. Mais claramente, ela é uma dimensão crucial da vida social humana, está ligada ao que pode ser cha- mado de “orientação normativa da conduta”, segundo expressão de Hallowell (1960, p. 346 apud Ingold, 1991, p. 373) e sua regulação e julgamento se dão em termos de padrões ideais comumente aceitos. A vida social pode ser comparada a uma atividade artesanal ( craft skill ), pois ambas envolvem enga- jamento ativo – com o material, em um caso, e com pessoas, no outro; ambas dependem de uma sintonia fina com as habilidades perceptuais (Ingold, 1991, p. 373-374). Então, a vida social não é simples processo de transcrever a for- ma ideal de relacionamento na realidade comportamental. As duas coisas vão juntas – a ação intencional e a monitoração intencional da ação. Isso supõe tanto o engajamento direto de pessoas com outros agentes dotados de intenção (em contextos de ação onde relacionamentos sociais são gerados e reprodu- zidos), quanto a representação discursiva e a interpretação da experiência de engajamento para si e para os outros (Ingold, 1991). O conceito-chave dessa proposta analítica que permite a Ingold vislum- brar a superação da dualidade entre organismo e pessoa e a oposição entre indivíduo e sociedade é o de engagement , espécie de princípio operador que dissolve a oposição entre natureza e cultura e seu derivado, a dualidade or- ganismo/pessoa. Isso é possível em função da adoção da teoria da evolução, pensada em termos de potencial transformativo do campo relacional dentro do qual o desenvolvimento ocorre. Assim, ser uma pessoa é um aspecto do ser um organismo. Central para essa concepção é que o organismo/pessoa (como um agente criativo e intencional, “vindo a ser”, e mantendo o desenvol- vimento dentro de um contexto de relações com outros organismos/pessoas

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através de suas ações) contribui para o contexto de desenvolvimento daqueles outros com os quais se relaciona. O comportamento social, então, não será visto como causado por genes, nem pela cultura, mas pelo agenciamento do organismo todo em seu ambiente. Portanto, para Ingold (1991, 1993, 1994), essa nova compreensão da evolução supõe que a causação estaria no processo evolucionário imanente. Sob esse prisma,

a evolução é o processo no qual os organismos se tornam seres com suas formas e capacidades particulares e, mediante suas ações ambientalmente situadas, es- tabelecem condições de desenvolvimento para seus sucessores. Seres humanos são tão aprisionados neste processo quanto os organismos humanos. Crianças, assim como os jovens de muitas outras espécies, crescem em ambientes provi- dos pelas gerações anteriores, e assim como fazem, carregam as formas de seus modos de vida em seus corpos – nas habilidades específicas, sensibilidades e disposições. (Ingold, 2003, p. 20).

Enquanto “seres no mundo”, as atividades de seres humanos fazem parte e são parte da autotransformação do mundo. Desse modo, considerando o organismo/pessoa como ponto de partida, é possível também dissolver a dico- tomia entre evolução e história, pois essa passa a ser vista como um exemplo específico de um processo que está prosseguindo no mundo orgânico.

Representações ocidentais e conceitos antropológicos na teoria da pessoa

Como se pode observar nas seções acima, Ingold retoma, por outra via, uma das inquietações que estiveram na base da escola sociológica francesa que, justamente, demarcou seu campo de saber, afirmando, como Durkheim e Mauss o fizeram, a origem histórica e coletiva das categorias do entendimen- to ou das representações coletivas. Basta apenas lembrar que as proposições analíticas de Durkheim, voltadas para a explicação da sociedade, trouxeram consigo a própria fundação epistemológica da disciplina, explorando a fecun- didade de todo empreendimento antropológico que fosse, também, uma “so- ciologia do conhecimento” ao não separar o sujeito do objeto da investigação. Sob esse prisma, os conceitos explicativos, mesmo universalizáveis, podem, a rigor, ser igualmente representações coletivas (Durkheim, 1970). Daí a im- portância fundamental do pensamento antropológico relativizar a si mesmo.

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concebe o “potencial gerador” que é a própria vida orgânica, vista como ativa, desdobrando-se criativamente em um campo total de relações no interior do qual os seres aparecem e tomam suas formas particulares, uns em relação aos outros. O segundo nível de problematização, que demonstra a vulnerabilidade dessa abordagem de Ingold, é a própria concepção do fazer antropológico, que tem implícita uma concepção geral das ciências e, correlativamente, das ciências sociais. O terceiro nível de problematização refere-se ao que está subentendi- do nessa tentativa de unificar organismo/pessoa elaborada por Ingold, prin- cipalmente o fato de deixar em aberto questões tão nucleares para a nossa cultura contemporânea como a consideração da ideologia individualista e a necessidade de relativizar suas proposições no interior da mesma. Além disso, também deixa em aberto outras possibilidades de singularização, correlatas a configurações de ideias-valores de contextos sociais específicos Não deixa de ser interessante enfatizar que, para Ingold, uma das conse- quências da dicotomia que separa mente e corpo, natureza e cultura, é justa- mente uma posição ortodoxa que coloca a “essência humana” em um pedestal no qual a natureza pode ser apropriada conceitualmente e mesmo transforma- da fisicamente, de acordo com os próprios modelos de significados dos pos- suidores dessa existência humana. Pois foi justamente essa uma das principais razões de a biologia ter sido o último domínio da vida intelectual a incorporar a visão de mundo evolutiva, como apontam Lewontin e Levins (1985) – isto é, por causa da ameaça direta ao princípio da superioridade única do homem. Eles também apontam a visão evolutiva – parte essencial dos sistemas naturais

  • como uma ideologia intrínseca a uma sociedade vista como estando em cons- tante modificação ou marcada por uma estabilidade dinâmica, possibilidade antes inconcebível na sociedade feudal, com suas relações hereditárias fixas e com uma visão de mundo que admitia apenas mudanças ocasionais como resultado de redistribuições irregulares da graça divina. Paradoxalmente, e como que demonstrando as dificuldades de uma proposta analítica que rejeita a preeminência do social, é importante lembrar que, dentre as cosmologias evolutivas, é a ecologia biológica justamente a que mais próxima está da des- crição ideológica da evolução como um modo de organizar o conhecimento do mundo, pela concepção do universo como estando em constante expansão, aumentando sua complexidade intrínseca. Essa concepção é contrária à da

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genética evolutiva, que concebe a mutação e a recombinação de genes se fa- zendo ao acaso, razão pela qual a mudança é vista como oscilante, pois é lenta durante longos períodos e rápida num período muito breve. Como afirmaram Lewontin e Levins (1985, p. 240),

entre todos os processos evolutivos, só a evolução genética das populações e a termodinâmica estatística têm uma estrutura matemática sólida. Outros domí- nios, como por exemplo, a ecologia evolutiva, são fortemente matematizados, mas a dinâmica em que suas estruturas matemáticas assentam é inteiramente hipotética e, por isso, as suas teorias são ficções elaboradas (apesar de poderem contar muitas verdades). Na ausência de uma teoria exata da evolução, as di- reções dos processos evolutivos são definidas a priori e são consequências de orientações ideológicas preexistentes.

Os autores demonstram que as concepções do universo – seja em expan- são oscilante ou em estabilidade dinâmica – são uma espécie de espelho da suposta evolução da sociedade moderna. É bem verdade que essas afirmações de Lewontin e Levins não apenas restituem as premissas do pensamento antropológico, mas ajudam também a esclarecer o que está em jogo nas proposições de Ingold, através de questões diferentes, embora interligadas: a primeira questão é a tentativa de utilizar princípios de uma interpretação biologizante para fundamentar tanto a base biológica do organismo quanto os estados mentais daí derivados, pressupondo um contínuo entre homens e ambiente, e a segunda é a própria dificuldade envolvida, quando se trata da cultura, de definir a “verdade” de um fenôme- no cultural independente das relações históricas e sociais nas quais ele está inserido, mesmo considerando a pretensão do paradigma biológico hegemô- nico, com as conquistas do projeto do genoma humano, o refinamento das técnicas de reprodução assistida e a possibilidade de clonagem de seres hu- manos. Como lembraram Bourdieu, Chamboredon e Passeron (1999), este é um dos maiores equívocos das análises sociológicas, que compromete suas reflexões, pois encontra sua raiz em uma representação falsa da epistemologia das ciências da natureza e da relação que essa epistemologia mantém com a epistemologia das ciências humanas, pois tende a se apropriar de uma ima- gem caricaturada das ciências da natureza. Tanto em um caso quanto noutro, o objeto da ciência é construído como um sistema de relações conceituais que

375 A teoria da pessoa de Tim Ingold

os temas da regulação e da autoridade moral durkheimianas, como instituido- ras da vida social, para dar ênfase à interação, ao engajamento e à experiência como formas de habitar o mundo. Ao invés da “socialização”, conceito da an- tropologia durkheimiana nuclear para a compreensão da relação entre unidade e diversidade da cultura – como a educação, por exemplo, vista por Durkeim (1979) como um processo socializador –, Ingold propõe o conceito de sociali- dade para expressar a qualidade constitutiva de relacionamentos, que está nas e através das relações que as pessoas vêm mantendo em suas atividades e na vida social. São esses relacionamentos, entendidos como um entranhamento profundo da ação no tempo, que circunscrevem as interações sucessivas como momentos simples e que, ao contrário de construir o indivíduo, teriam como pré-condição a imersão desse indivíduo no momento exato do nascimento em um campo social relacional. A criança situada dentro desse campo cresce e de- senvolve suas próprias estruturas de consciência e padrões de respostas, emer- gindo, assim, como um agente autônomo com capacidade de iniciar outros relacionamentos. Transformadas no curso da ação social, essas relações são encapsuladas na consciência da pessoa, tornando-se a estrutura do ser. É necessário sublinhar aqui a experiência perceptiva como um núcleo através do qual as pessoas se engajam e se envolvem umas com as outras, pro- cesso que, segundo Ingold, acontece “antes da objetivação da experiência em termos de representações coletivas codificadas pela linguagem”. Trata-se de um ponto fundamental na análise de Ingold, que vai permitir pensar o organismo/ pessoa como se constituindo antes da representação, pois remete à ideia de que podemos ter contato direto com o mundo através das “percepções”, que tem propriedades de desenvolvimento nos remetendo para o mundo externo. Nesses termos, perceber é estar consciente do mundo como algo que se constitui de uma maneira ou de outra. Essa experiência perceptiva, que é tanto da pessoa quan- to do organismo, advém de fatores biológicos, como o tato, a visão, etc. (ver Ingold, 1991, 1993, 2002d, 2002f). Com tais argumentos, Ingold (2002c) inclui a consciência como parte da vida orgânica, imanente ao processo evolutivo. Esses argumentos, como se pode observar, diluem justamente aquilo que se constituiu como um objeto da escola sociológica francesa, que é precisamen- te o processo de reificação das abstrações da vida social, ou das representações coletivas, nos termos durkheimianos. Não só desconsidera as representações coletivas, mas faz delas um obstáculo epistemológico ao conhecimento quan- do pressupõe que há uma diferença entre o concebido e o real. Nos termos de

376 Regina Coeli Machado e Silva

Ingold, as representações são vistas como um resíduo irredutível, uma conse- quência do próprio pensamento ocidental que supõe a dicotomia entre fatos universais da natureza e fatos percebidos de formas culturalmente distintas. Cabe lembrar aqui, justamente sobre isso, que o próprio Durkheim enfatizava a natureza específica dos fenômenos sociais e advertia que a compreensão dos mesmos deveria ser orientada por uma conduta metodológica que os abordasse como coisas, estabelecendo essa advertência como uma primeira regra do mé- todo sociológico, em 1895, pois implica admitir as reificações das abstrações da vida social como exteriores e anteriores aos indivíduos. Tal problema, das representações coletivas e de sua origem, foi objeto de atenção específico de Durkheim em 1889. Como parte desse esforço des- comunal para construir a ciência social como um domínio de saber diferente da filosofia e da psicologia, ele escreveu um ensaio sobre a relação entre as representações individuais e coletivas no qual afirma:

[…] é inegável que ignoramos a forma como os movimentos podem, combinan- do-se, dar nascimento a uma representação; mas tampouco sabemos como um movimento intermediário pode, quando é detido, transformar-se em calor e vice- versa. No entanto, a realidade dessa transformação não pode ser colocada em dúvida. Já que é assim, o que existe, então, de impossível na primeira? Dentro de um conceito mais geral, poder-se-ia afirmar que, caso a objeção fosse válida, chegaria a negar toda mudança, porque entre um efeito e sua causa, entre uma resultante e seus elementos, há sempre uma distância. É matéria da metafísica achar uma concepção que torne representável esta heterogeneidade; para nós, é suficiente que sua existência não seja posta em dúvida. (Durkheim, 1994, p. 45).

Como evoquei no início deste artigo, esse problema, que, à época, Durkheim deixou à metafísica, passou a constituir o núcleo norteador das ci- ências cognitivas e permanece, até hoje, quase nos mesmos termos discutidos por Durkheim. Em sua polêmica com os pragmatistas, por um lado, e com os partidários da teoria epifenomenista, por outro, ambos reduzindo a consci- ência a um epifenômeno da vida física, Durkheim recusa a conclusão de que o “corpo governa o espírito”.^11 É oportuno lembrar também aqui como ele

(^11) A ideia de pensar com o corpo e a favor dele também está presente em alguns filósofos da mente atu- almente, como, por exemplo, John Searle (1992, 1998), para quem a consciência é uma característica biológica do cérebro humano e animal.