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Este documento discute a sumula vinculante, um instituto jurídico constitucional do supremo tribunal federal (stf) brasileiro que estabelece interpretações constitucionais vinculativas para outras instituições da república. O texto explica a importância da sumula vinculante no contexto do sistema jurídico brasileiro, sua relação com a teoria do poder de violência simbólica e sua natureza jurídica. Além disso, o documento aborda as objeções da doutrina sobre o instituto e sua importância para a segurança jurídica.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
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fernandonotaroberto@msn.com Bacharel em Direito e Pós-graduado em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus Participou do programa de Formação em Direito do Estado, promovido pelo IDAP e das primeiras formações do GEA- FDDJ. Advogado.
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O presente estudo pretende analisar a súmula vinculante como instrumento do poder de violência simbólica do Supremo Tribunal Federal (STF). Para isto, este artigo não tem a pretensão de esgotar todos os temas tratados e aspectos relaciona- dos à súmula vinculante, mas visa especialmente propor a reflexão sob um novo olhar em relação à súmula vinculante fundamentado na teoria de Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Deste modo, asseverar-se-á sobre alguns pontos em relação à súmula vincu- lante, porém, se escusando de adentrar quanto aos seus reais aspectos polêmicos e controversos do supracitado instituto jurídico constitucional, haja vista a enorme quantidade de autores por parte da doutrina que asseveram sobre o campo da sú- mula vinculante. Importante ressaltar que a súmula com efeito vinculante é um instituto jurí- dico constitucional engendrado no Brasil em 2004, pelo poder constituinte derivado reformador que se deu pela Emenda Constitucional no^ 45, a denominada emenda da Reforma do Poder Judiciário. Aliás, ao falar da súmula vinculante não há como deixar de tecer comentários sobre a importância do Supremo Tribunal Federal no ce- nário jurídico brasileiro, pois somente o Supremo Tribunal Federal (STF) poderá criar, ou melhor, editar a súmula vinculante, desde que observados os requisitos do artigo 103-A da Constituição Republicana de 1988, bem como o da lei infraconstitucional (Lei no^ 11.417, de 19 de dezembro de 2006) que a regulamentou. O estudo do tema se faz necessário, pois a súmula vinculante editada pelo Supremo Tribunal Federal vincula toda a estrutura do Poder Judiciário, bem como a Administração Pública, portanto, a súmula vinculante passa a ser caracterizada como uma norma jurídica, por possuir conteúdo normativo, ou seja, por apresentar enunciados prescritivos, repercutindo assim efeitos jurídicos e sociais para o orde- namento jurídico em razão de suas qualidades no plano abstrato de bilaterialidade, disjunção e porque não dizer de sanção, tendo em vista a existência da ação cons- titucional denominada reclamação constitucional que analisará a existência ou não de violação sumular. Ademais, observação a se fazer é que ao editar a Súmula Vinculante, o STF (re) estabelece a coerência com o sistema jurídico preservando o princípio da supre- macia constitucional por meio de seus mandamentos editados, mediante o controle das inúmeras interpretações jurídicas existentes, devidamente combatidas e deba- tidas no momento em que o pleno do Supremo Tribunal Federal se reúne a fim de apreciar as demandas sub judice constitucionalizadas. Ao asseverar acerca da súmula vinculante como um instituto jurídico consti- tucional sob o prisma do Poder de Violência Simbólica do Supremo Tribunal Federal, isto é, por meio da teoria abordada por Tércio Sampaio Ferraz Júnior, consequen- temente, surge a discussão ou mesmo cria-se uma grande celeuma se o STF estaria ferindo o princípio da separação dos poderes ao editar a súmula vinculante? De
A SÚMULA VINCULANTE COMO INSTRUMENTO DE VIOLÊNCIA SIMBÓLICA
fato, ao tentar esclarecer essa digressão, observar-se-á a teoria ou o poder normativo sobre a perspectiva de Paulo de Barros Carvalho, no que tange à norma jurídica, delimitando, desse modo, qual a natureza jurídica da súmula vinculante. Assim, a súmula vinculante como instrumento de violência simbólica é um tema bastante promissor e ainda complexo a se falar (haja vista a existência do projeto de Emenda Constitucional no^ 33/2011 que altera o procedimento de edição, bem como a eficácia da súmula vinculante) e porque não a se refletir no campo zetético da academia, tendo em vista que é o guardião da Constituição, o Supremo Tribunal Federal, que a edita, revisa e cancela, sem falar que é realmente o Poder Judiciário em último caso que garante ou concretiza os postulados constitucionais, efetivando, assim, os direitos e deveres consagrados pela Constituição Republicana, atribuindo, portanto, a promoção e a guarda da Carta Política de 1988.
Criado como Supremo Tribunal de Justiça em 1828, o Supremo Tribunal Fe- deral (STF) é o órgão judicial brasileiro mais antigo, sendo, atualmente, órgão máxi- mo dentro da esfera do Poder Judiciário. Suas atribuições são estabelecidas no artigo 102 da Constituição Republicana de 1988, que define a competência para processar e julgar ações originárias, recursos ordinários e extraordinários. Importante ressaltar que a Constituição Republicana de 1891 introduziu uma nova concepção acerca do Poder Judiciário. Influenciada pela doutrina constitucio- nal norte-americana conferiu-se ao aludido órgão a função de guardião da Consti- tuição e da ordem federativa (MENDES, 2009, p. 981). Cabe a ele, principalmente, zelar pelo cumprimento e eficácia das normas ou postulados constitucionais. Aliás, todo Estado fundamentado na perspectiva de Estado Democrático de Direito tem seu próprio Tribunal Constitucional. Certo é que cada Estado atribui algumas particularidades aos seus Tribunais, como, por exemplo, critério para a es- colha de seus membros, eficácia das decisões, competências que lhe são atribuídas, dentre outras. Destarte, com a Constituição Republicana de 1988 ampliou significativamente a competência originária do Excelso Pretório, especialmente no que tange ao controle de constitucionalidade de leis, atos normativos e ao controle da omissão inconstitucio- nal (MENDES, 2009, p. 990). Posteriormente, a Emenda Constitucional no^ 3, de 1993, estabeleceu a ação declaratória de constitucionalidade, a fim de afastar a insegurança jurídica ou o estado de incerteza sobre a validade de lei ou ato normativo federal, pre- servando, assim, a ordem jurídica constitucional, com eficácia contra todos, e dotada de efeito vinculante em seu julgamento final relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo (SANTOS, 2012, p. 163-164 e 180). Mais tarde, de forma salutar, foi promulgada a Emenda Constitucional n o^ 45, de 2004, que permitiu a extensão dos efeitos da decisão do caso concreto para o
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e cancelar os enunciados de súmula vinculante, autorizando assim a construção de normas “gerais” ou de produção normativa (GOSSON, 2007, p. 160) produzida pelo sistema jurídico com o escopo de assegurar a interpretação dos dispositivos constitucionais, repercutindo, dessa maneira, o caráter de observância obrigatória por parte dos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Direta e Indireta de forma a concretizar uma eficiente prestação da jurisdição constitucional, confor- me o artigo 103-A da Constituição Republicana de 1988^5.
Inicia-se o estudo da história sumular com antecedentes longínquos no Direito português por meio das Ordenações Manuelinas de 1521. Essas ordena- ções foram as primeiras a estabelecer os “assentos”. Importante esclarecer que cabia tão somente à Casa da Suplicação de Lisboa a edição dos referidos assen- tos. Com os assentos procurava-se resolver os conflitos de orientações jurispru- denciais de tribunais superiores que posteriormente adquiriam força obrigatória geral com a doutrina (interpretação) vencedora adotada pelo pleno do tribunal. Ademais, observa-se que a natureza jurídica dos assentos se revestiam de caráter jurisdicional, tendo em vista se tratar de normas jurisprudenciais (MIRANDA, 2011, p. 370-372). O resumo histórico dos assentos até as súmulas vinculantes editadas pelo Supremo Tribunal Federal se dá a partir das Ordenações Manuelinas. Com perfeição, Manoel Justino Bezerra Filho exerce grande influência no estudo do direito sumular brasileiro, pois elucida sobre as origens do direito sumular:
a) 1446 – Ordenações Afonsinas – não conheceram qualquer tipo de súmu- la; b) 1521 – Ordenações Manuelinas – estabeleceram o sistema inicial de “Assentos”; c) 1603 – Ordenações Filipinas – mantiveram e aperfeiçoaram o sistema de “Assentos da Casa de Suplicação”; d) 18.08.1769 – A “Lei da Boa Razão” tirou dos Tribunais de Relação do Rio de Janeiro e da Bahia a possibilidade de “assentos”, o que foi restabelecido por D. João VI em 1808; e) 20.10.1823 – Lei sem número, de D. Pedro I, mantém em vigor as Ordenações Filipinas; f) 18.09.1828 – Lei sem número, de D. Pedro I, cria o Supremo Tribunal de Justiça, com poderes para relacionar julgados a serem uniformizados; g) 23.10.1875 – Dec. 2.684, de D. Pedro II, man-
5 Artigo 103-A da CF. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante de- cisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
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tém os assentos da “Casa da Suplicação”, concedendo ao Supremo Tribunal de Justiça a possibilidade de também efetuar “assentos”; h) 1 o^ .05.1943 – O Dec. 5.452, Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 902, cria “pre- julgados”, posteriormente substituídos pela Lei 7.033, de 05.10.1982, por súmulas e enunciados do TST; i) 28.08.1963 – Criação da “Súmula do Su- premo Tribunal Federal”, por alteração do Regimento Interno do mesmo STF (BEZERRA FILHO, 2003, p. 37). Ademais, esclarecendo a respeito da criação das “Súmulas”, pode se dizer que surgiu no STF, justamente pela iniciativa do Ministro Victor Nunes Leal, com o escopo de facilitar os tramites dos julgamentos nas sessões e ao mesmo tempo trazer a memória a reflexão dos casos já assentados por aquela Corte.
Por falta de técnicas mais sofisticadas, a Súmula nasceu – e colateralmente adquiriu efeitos de natureza processual – da dificuldade, para os Ministros, de identificar as matérias que já não convinham discutir de novo, salvo se sobrevivesse algum motivo relevante. O hábito, então, era reportar-se cada qual à sua memória, testemunhando, para os colegas mais modernos, que era tal ou qual a jurisprudência assente da Corte. Juiz calouro, com agra- vante da falta de memória, tive que tomar, nos primeiros anos, numerosas notas, e bem assim sistematizá-las, para pronta consulta durante as sessões de julgamento. Daí surgiu a ideia da Súmula, que os colegas mais experien- tes – em especial os companheiros da Comissão de Jurisprudência, Ministro Gonçalves de Oliveira e Pedro Chaves – tanto estimularam. E se logrou, rápido, o assentimento da Presidência e dos demais Ministros. Por isso, mais uma vez, em conversas particulares, tenho mencionado que a Súmula é sub- produto da minha falta de memória, pois fui eu, afinal, o relator, não só da respectiva emenda regimental, como dos seus primeiros 370 enunciados (LEAL, 1997, p. 294-295). Aliás, para o Ministro Victor Nunes Leal, a súmula traduzia-se num método de trabalho “destinado a ordenar melhor e facilitar a tarefa judicante (...)” (LEAL, 1981, p. 2). Além disso, em artigo “Passado e Futuro da Súmula do STF”, já dizia o Ministro Victor Nunes Leal que o surgimento da súmula deu-se pela “necessidade de sistematizar os julgamentos do Tribunal, para se localizarem os precedentes com menor dificuldade” (LEAL, 1981, p. 24). Posto isso, deu-se a ideia da criação da súmula possibilitando, assim, a edi- ção de uma emenda que posteriormente alterou o regimento interno do STF no qual acrescentou o Capítulo XX, do Título III do supracitado regimento, cujas súmulas editadas entraram em vigor no início de 1964 (LEAL, 1981, p. 1). Ora, é bom lembrar que na época não existia o Superior Tribunal de Justiça
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Desse modo, súmula significa resumo e esse resumo contém enunciados (conjuntos de palavras), proposições (significações) e verbetes (conjunto de signifi- cações). Assim, a palavra “súmula” nos remete a uma repetição de julgamentos que sedimentam uma interpretação sobre determinada matéria (PELICANI, 2007, p.19). Importante esclarecer é que as súmulas podem ser criadas por todos os Tribu- nais tanto os Tribunais Especiais quanto os Tribunais de Justiça Comum, não perma- necendo ao cabo simplesmente do Supremo Tribunal Federal. Aliás, há também as súmulas institucionais da Advocacia-Geral da União (AGU), cujo escopo é reforçar e padronizar a atuação em caráter nacional, unificando, assim, o entendimento jurídi- co-institucional no âmbito da advocacia pública federal, a fim de garantir segurança jurídica para a coletividade e reduzir a litigiosidade da Fazenda Pública. Por fim, se remontarmos ao tempo da “criação da súmula” ou propriamente da “Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal”, teve por finalidade dar a desejável firmeza à jurisprudência da Corte a partir do imediato conhecimento de seus precedentes pelas partes interessadas e, principalmente, pe- los próprios juízes. As súmulas conformariam, desse modo, um sistema oficial de referência dos precedentes judiciais, estruturadas em verbetes que consolidariam a orientação predominante e segurança jurídica da aludida jurisprudência do Supre- mo Tribunal Federal (PELICANI, 2007, p. 86). Além do mais, a súmula remete-se ou remetia-se à ideia de possuir o escopo de vincular os tribunais estaduais (a respeitarem) à jurisprudência do STF em maté- rias de legislação federal (PELICANI, 2007, p. 61) uniformizando, assim, as decisões dos Tribunais na época.
Como fora dito, a súmula vinculante está prevista no artigo 103-A, da Consti- tuição Federal. O referido artigo foi acrescentado pela Emenda Constitucional no^ 45, de 2004. Aliás, até a publicação desta emenda constitucional, não havia o poder de vinculação ou obrigatoriedade de observação da súmula no ordenamento jurídico. Desse modo, nas palavras de Helano Márcio Vieira Rangel, a súmula vinculante “representa uma aproximação entre a tradição romano-germânica, que concede primazia à lei como fonte do direito, e a tradição anglo-saxônica, que prioriza o precedente judicial” (RANGEL, 2011, p. 44) 7.
7 “A tradição romano-germânica, própria da Europa Continental, foi transmitida ao Brasil pela tradição jurídica lusitana. Nessa tradição, as decisões judiciais devem ser subordinadas à lei, a qual adquire primazia como fonte do direito. A tradição romano-germânica fundamenta-se por uma desconfiança social em face da figura do juiz, cujo papel era legado ao Estado, no âmbito do poder administrativo. Tal desconfiança tornou-se nítida com as revoluções burguesas no século XVIII, pois os juízes eram vistos como representantes do antigo regime absolutista. Desse modo, o Direito pós-revolucionário e exegético, baseado no constitucionalismo liberal, no princípio da legalidade e no da separação dos poderes. Esse Direito cuidou de limitar o poder, de maneira que os juízes deveriam simplesmente
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André Ramos Tavares alude em sua obra que “reconhece-se a súmula vin- culante como a possibilidade de construção de enunciados que sintetizem o en- tendimento (interpretação) anterior do Tribunal Constitucional” (TAVARES, 2012, p. 425). Aduz, ainda, que para melhor compreender a súmula vinculante trata-se de um “processo objetivo típico (embora com certas particularidades), que promo- ve a aproximação entre o controle difuso-concreto de constitucionalidade (reite- radas decisões) e o controle abstrato-concentrado (efeito vinculante)” (TAVARES, 2012, p. 437). Importante mencionar que para o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tri- bunal Federal, a súmula vinculante possui conteúdo pedagógico-institucional de orientação das instâncias e da Administração Pública em geral (MENDES, 2009, p. 1014). Além disso, “a súmula terá por objetivo superar controvérsia atual sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas capazes de gerar inse- gurança jurídica e relevante multiplicação de processos” (MENDES, 2009, p. 1010). A propósito, Rosa Benites Pelicani afirma que a súmula vinculante, por sua vez, “tem por base reiteradas decisões proferidas sobre determinada matéria e não será ela própria uma decisão judicial, mas um resumo da decisão judicial” (PELICA- NI, 2007, p. 126). Desse modo, a súmula vinculante possui como característica fundamental o seu efeito “vinculante”, por isso que há a deferência em relação à outra modalidade de súmula simplesmente, isto é, por vincular toda a estrutura e órgãos do Poder Judiciário e a Administração Pública direta e indireta, em todas as unidades da Fede- ração (União, Estados-membros, Municípios e o Distrito Federal).
Aliás, para a existência da súmula vinculante, requer-se a presença de alguns requisitos constitucionais e legais, que acabam por definir o próprio conteúdo das súmulas vinculantes^8. Convém esclarecer que toda e qualquer matéria expressa na Constituição Republicana de 1988, ainda que não propriamente dita de natureza constitucional e que exista conflito interpretativo poderá ensejar a edição de súmula vinculante (PELICANI, 2007, p. 180).
aplicar a lei sem exercer quaisquer funções criativas. Para países como o Brasil, que seguem a tradição romano-germânica, a principal fonte formal do Direito é a lei em sentido lato, que se manifesta por leis em sentido estrito e códigos. Até o advento da súmula vinculante, a jurisprudência, que se sedimenta pela uniformização de decisões judiciais sobre determinado caso, não se constituía como fonte formal, pois a sua função não era a de estabelecer normas jurídicas, apenas a de interpretar a lei frente a casos concretos. (...) Por seu turno, a tradição anglo-saxônica é aquela cuja característica essencial é a força vinculante dos precedentes judiciais ”^ (RANGEL, 2011, p. 44 – 45). 8 “(...) em regra serão formuladas a partir das questões processuais de massa ou homogêneas, envolvendo matérias previdenciárias, administrativas, tributárias ou até mesmo processuais, suscetíveis de uniformi- zação e padronização” (MENDES, 2009, p. 1011).
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Desse modo, pode-se concluir, conforme ponderações supramencionadas que, apesar da súmula vinculante não advir do Poder Legislativo, apresenta peculia- ridade de “generalidade” e abstração, o que lhe confere dizer para alguns doutrina- dores que a súmula vinculante é uma norma jurídica prescritiva. Insta reiterar que não há violação a tripartição de poderes, por parte do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo, como se verá adiante no quarto capítulo. Sendo assim, Helano Marcio Viera Rangel conclui que até o advento por emenda constitucional da súmula vinculante, a jurisprudência, que se sedimenta pela uniformização de decisões judiciais sobre determinado caso, não se constituía como fonte formal, pois a sua função não era a de estabelecer normas jurídicas, mas apenas a de interpretar a lei frente a casos concretos (RANGEL, 2011, p. 56-57).
Norma jurídica é o elemento do direito positivo, que visa ordenar e transfor- mar o comportamento humano em sociedade, cujo escopo consiste alterar a reali- dade social (CARVALHO, 2012, p. 90). Portanto, é uma estrutura do sistema social que orienta as diversas relações intersubjetivas dos indivíduos e dos indivíduos com o Estado. Primeiramente, pode-se dizer que a norma jurídica é uma construção de lin- guagem dotada de sentido, ou seja, apresenta uma proposição que pode (ou deverá) ser entendida de imediato pelos seus destinatários. Nesse sentido, a norma jurídica se insere no sistema de linguagem de cunho prescritivo. Dessa forma, pode-se dizer que as normas jurídicas são as significações que a leitura do texto desperta no inte- lecto do destinatário (CARVALHO, 2012, p. 298). Insta esclarecer que a norma jurídica possui duas peculiaridades, sendo a primeira de conteúdo descritivo e a segunda de conteúdo prescritivo (indicativo). O conteúdo descritivo consiste em indicar as condições de aplicação da nor- ma jurídica, ou seja, o conteúdo, sentido e alcance das regras jurídicas (sujeito, tem- po, espaço, objeto tutelado), e aquela segunda característica estabelece os modais deônticos do conectivo deve ser (proibido, obrigatório e permitido), que influenciam determinadas condutas a serem observadas pelo destinatário. Dessa forma, a norma jurídica possibilita a descrição de uma conduta. De outro modo, a norma prescritiva (ou imperativa) indica aquilo que deve acontecer em decorrência de uma vontade ou ordem superior. Sendo assim, “a prin- cipal característica das normas imperativas é o fato de descrever determinada con- duta, ordenando que seja seguida” (DIMOULIS, 2007, p. 66). Desse modo, esse enunciado deve ser transformado em uma norma jurídica mediante o trabalho do intérprete, corroborando assim na “construção” da norma jurídica. Importante ressaltar que, para a ciência do direito e sua positivação, a lingua- gem utilizada é decisiva, visto que ela se materializa no mundo exterior. Por conse-
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guinte é essencial lembrar que “o direito positivo se insere no mundo por intermédio de linguagem, que, por sua vez, deve ser produzida a partir de suportes físicos de comunicação, por intermédio de textos” (CASTELLANI, 2009, p. 9). Sendo o Direito linguagem, dessa maneira pode-se dizer que a súmula vin- culante é norma jurídica que introduz no sistema de direito positivo os enunciados prescritivos^9 de linguagem direta que indicam condutas a serem seguidas tanto para Administração Pública quanto para os órgãos do Poder Judiciário de forma obrigató- ria, ou seja, de ordem a ser cumprida e devidamente respeitada. Corrobora, ainda, Grace Christhine de Oliveira Gosson, ao ponderar que: A expressão súmula “vinculante” também é utilizada para indicar o(s) enunciado(s), com conteúdo constitucional, que ingressa(m) no ordenamento jurídico por intermédio do veículo introdutor de normas jurídicas e cuja fun- ção é conceder validade, indicar qual a interpretação constitucional adequa- da e dar eficácia a determinadas normas jurídicas ou enunciados prescritivos já existentes no sistema jurídico (GOSSON, 2007, p. 150). Sendo assim, a súmula vinculante é uma norma jurídica válida de compe- tência (ou de produção) normativa oriunda da norma de estrutura^10 , pois é emanada por um órgão (autoridade) competente para editá-la, conforme estabelece a própria Constituição Republicana de 1988, e consequentemente esta supracitada norma jurídica irradia seus efeitos para o ordenamento jurídico. Portanto, a enunciação aparece, assim, como um processo político-jurídico de produção dos enunciados prescritivos (direito positivo), cuja função é prescrever condutas que se materializam por meio dos instrumentos normativos. Dessa maneira, pode se dizer que as súmulas vinculantes se inserem como enunciados prescritivos, que postos em circulação visam atingir o nível apurado de comportamento social no sistema jurídico, restringindo, assim, o campo de contra- dições e ambiguidades das diversas modalidades de interpretações em conflitos de uma determinada norma jurídica analisada, à custa de ingentes esforços de inter- pretação devidamente debatidos e combatidos no pleno do STF, a fim de não mais repercutir dúvida na transmissão da mensagem, corroborando por fim na compreen- são e eficácia da norma jurídica, nos seus aspectos de conteúdo, sentido e alcance pleno da proposição jurídica. Aliás, o Supremo Tribunal Federal “tem limitado seu campo ao preceito sobre o qual se constrói a súmula. Não pode ir além dele. Por-
9 “Na nova teoria das fontes do direito, a expressão enunciação é utilizada para indicar a atividade huma- na produtora de enunciados , ou seja, o procedimento de certos órgãos (autoridades competentes) que, em conformidade com determinados enunciados prescritivos que disciplinam o ato da enunciação, produz novos enunciados prescritivos” (ASSIS, 2012, p. 162). 10 “Para melhor compreender o sistema, as normas jurídicas (...) de competência ou de estrutura: são aque- las que estabelecem poderes e procedimentos, ou seja, têm por objeto os comportamentos relacionados à produção normativa, determinam os órgãos do sistema e os expedientes formais necessários para que se editem normas jurídicas válidas, bem como o modo pelo qual serão alteradas e desconstituídas (...)” (ASSIS, 2011, p. 1).
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p.2), pois o STF estaria ferindo o Princípio da Separação dos Poderes ao editar a súmula vinculante, tendo em vista que esta regula condutas (comportamentos) no convívio social, mesmo não sendo lei. Desse modo, infere-se que a súmula vinculante não fere o Princípio da Se- paração dos Poderes, vale dizer, não há usurpação de competência por parte do Su- premo Tribunal Federal em relação ao Congresso Nacional, uma vez que ele apenas consolida em súmula o entendimento predominante do tribunal com o escopo de facilitar o trabalho técnico no sistema jurídico e judicial. Importante esclarecer, pelo princípio do “ inclusio unius alterius exclusio ” e pela linha de interpretação adotada pelo Supremo Tribunal Federal, o Poder Legis- lativo não se sujeita ao efeito vinculante, portanto, a súmula vinculante editada e dentre outras decisões proferidas em sede de controle concentrado nas modalidades de ação direta de inconstitucionalidade (ADI), ação declaratória de constituciona- lidade (ADC) e na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) não vincula a função legislativa, consequentemente, não abre-se caminho para o “inconcebível fenômeno da fossilização da Constituição e, por seguinte, da petri- ficação da evolução social” (LENZA, 2012, p. 312-313). Importante consignar que é competência exclusiva do Congresso Nacional o escopo de zelar e preservar sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes da Re- pública (artigo 49, XI, da CF). Aliás, sob tal perspectiva, o Supremo Tribunal Federal (re)afirma que o efei- to vinculante resultante de seu julgamento nos processos de fiscalização abstrata (controle normativo abstrato) não se aplica e muito menos se estende à atividade legislativa. Nessa consonância, a função legislativa não é alcançada pela eficácia ‘ erga omnes ’ das decisões proferidas pelo aludido E. Plenário^13. Desse modo, não há, pois, efeito vinculante para o Poder Legislativo. Portan- to, o efeito vinculante somente alcança, atinge os demais órgãos do Poder Judiciário e toda a Administração Pública no momento em que o Supremo Tribunal Federal edita a súmula vinculante. Além disso, importante ressaltar que a separação dos poderes é relativa^14 , tendo em vista que a própria Constituição traz exceções à regra e confere tarefas de um Poder da República em relação a outro poder (instituição estatal) republicano.
13 Precedentes do Supremo Tribunal Federal: (Rcl 2.617-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 23- 2-2005, Plenário, DJ de 20-5-2005); (Rcl 13.019-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 8-5-2012, DJE de 15-5-2012.); (Rcl 14.156-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 2-4-2013, DJE de 5-4-2013). 14 “Embora a Constituição Federal estabeleça uma tripartição entre os Poderes (art. 2.o) é notório que essa tripartição não mais opera com rigidez de outrora, bastando considerar casos em que o Legislador julga (art. 49, IX; art. 52, I e II) e administra (art. 52, XII e XIII); o Executivo julga (art. 84, XII) e legisla (art. 84, III, IV e XXVI); o Judiciário administra (art. 96 e incisos), e em certa medida legisla (arts. 93 e 125, §1. o). Assim, hoje prevalece o aspecto funcional do Estado Social de Direito (dimensão semântica), sobre o aspecto da soberania ou do Poder (dimensão estática), devendo todos os entes políticos interagir na consecução do bem comum”.^ (MANCUSO, 2013, p. 402).
A SÚMULA VINCULANTE COMO INSTRUMENTO DE VIOLÊNCIA SIMBÓLICA
Afinal, ao editar a súmula vinculante o Supremo Tribunal Federal estaria sim- plesmente exercendo o seu mister constitucional funcional, no qual foi incumbido da aludida competência, conforme o artigo 103-A da Carta Política. Dessa forma, a súmula vinculante se tornou no emblema mais vistoso da chamada “ legislação judicial” (MENDES, 2009, p. 211), ou seja, uma normatividade que esclarece e, ao mesmo tempo, “impõe” o dizer do direito aos destinatários da norma jurídica, ou seja, ao Poder Judiciário e Executivo. Aliás, André Ramos Tavares assevera: (...) Em outras palavras, também o magistrado cria Direito, e não apenas o legislador (nem tão somente por ditar a “lei” para o caso concreto). Toda apli- cação de lei pressupõe um ato interpretativo, e a interpretação constitui um ato de criação do agente. O significado da lei não se extrai dela, mas antes é construído pelo intérprete, dentro, dentre outros, dos limites do texto legal. (...) A criação de “diretivas” gerais, de “súmulas” do pensamento (interpretação) do Tribunal, para serem generalizadamente assumidas pelos demais centros de “poder”, constituem, inegavelmente, uma atuação de ordem normativa. A circunstância, porém, de implicar a redação de um enunciado não deve tur- var a verdadeira atuação interpretativa que representa tal situação. Aliás, toda interpretação é necessariamente consignada em enunciados redigidos pelo Tribunal Constitucional. Não há nenhuma novidade nesse ponto, nem se deve falar em atuação legislativa. Ora, no caso da súmula vinculante, o que se faz é admitir a força do precedente norte-americano para um específico enunciado que se constrói a partir da decisão. Ela não é atividade meramente legislativa, muito menos com patamar de lei (TAVARES, 2012, p. 427-428). Em outra passagem Gilmar Mendes assevera: O precedente vinculativo, que se caracteriza pelo fato de a decisão de um alto tribunal ser obrigatória, como norma, para os tribunais inferiores, tem as nações anglo-americanas, a exemplo da Inglaterra, Canadá e Estados Unidos, como reputado ambiente natural, por serem elas de direito de criação predo- minantemente judicial. Isso, no entanto, não impede de se ver o precedente vinculante também em países de tradição romanista, embora aí mais formali- zado, como referido (MENDES, 2009, p. 1008). Portanto, ao editar a Súmula Vinculante o Supremo Tribunal Federal exerce uma “atividade positiva” a fim de aprimorar o sistema jurídico do país e não con- turbá-lo. Desse modo, não há de se falar em Supremo Tribunal Federal atuar como “legislador positivo”, o que implicaria em flagrante ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes e na usurpação de poderes incompatíveis com a independência e har- monia dos Poderes da República Federativa do Brasil 15. Aliás, “ao Poder Judiciário é assegurada a independência em relação aos demais poderes para o desempenho de suas funções típicas” (ZOCKUN, 2004, p.
15 Precedente: ADPF 144, voto do Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 6-8-2008, Plenário, DJE de 26-2-2010.
A SÚMULA VINCULANTE COMO INSTRUMENTO DE VIOLÊNCIA SIMBÓLICA
fazer com que, embora conservadas como possíveis, certas alternativas não sejam levadas em consideração (ASSIS, 1995, p. 201). Assim, o decano ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, afir- ma a importância da Suprema Corte brasileira ao refletir sobre a Constituição Repu- blicana de 1988:
Em 5 de outubro de 1988 dissiparam-se os tempos sombrios que tanto afli- giam a Nação brasileira. Hoje vivemos sob a égide de um estado impregnado de perfil claramente democrático e a responsabilidade institucional do STF é imensa na preservação da continuidade da ordem democrática e na subsis- tência do ordenamento fundado na lei fundamental da República (REVISTA VIRTUAL CONSULTOR JURÍDICO, 2011, p. 1).
Corrobora a professora Maria Tereza Sadek, ao dispor acerca do Poder Judi- ciário, que “a visão da população brasileira tem mudado em relação ao Judiciário em reconhecimento à sua participação política na sociedade” (REVISTA VIRTUAL CONSULTOR JURÍDICO, 2013, p. 1).
Nos últimos anos, dificilmente se encontrará uma questão marcante que tenha tido impacto no âmbito político e/ou das relações privadas que o Judiciário não tenha participado. Temas de alto impacto na vida do país constam atualmente da agenda do Supremo Tribunal Federal, como a criação de cotas raciais, a interrupção de gestação de fetos com anencefalia, ocupação de terras por quilombolas. Esses exemplos poderiam ser multiplicados. O exame do que tem ocorrido permite afirmar que essa característica do modelo institucional brasileiro imprimiu uma feição política ao Judiciário, propiciando que atue, de fato, como poder (SADEK, 2011, p.1).
Assim, torna-se evidente o Poder de Violência Simbólica nas decisões das Cortes por sua relação de autoridade^17 dentro do sistema jurídico e social, tendo em vista que a interpretação jurídica adotada pelos Tribunais consiste em poder e in- fluência ao mesmo tempo, cujo objetivo é uniformizar o sentido da norma jurídica, pois “o exercício de poder pressupõe, (...), um ato de violência simbólica ” (ASSIS, 1995, p. 202). Desse modo, diante da interpretação jurídica, se dará o poder propriamente dito dos Tribunais, capaz de controlar e influir interpretações como genuínas, cor-
17 Vale mencionar, conforme lição de Olney Queiroz de Assis, que existe relação de autoridade quando a influência se opera através da neutralização do tempo. A passagem do tempo altera o sentido da norma, daí a necessidade de generalizar o sentido apesar do tempo diversificá-lo. Neutraliza-se a possibilidade de outras interpretações pelo estabelecimento de hierarquias em relação às normas e em relação aos intérpretes (autoridades competentes). A interpretação da autoridade é aceita orientada pela ideia de que sempre se procedeu da forma por ela interpretada, portanto, consolidada na tradição. A interpre- tação é considerada autêntica em oposição às interpretações contrárias, consideradas não autênticas, motivo pelo qual a interpretação da autoridade exige adesão convicta. Nesse sentido, a Jurisprudência dos Tribunais, especialmente, a do STF (ASSIS, 2011, p. 24- 25).
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retas, e impedir outras interpretações de conteúdos múltiplos possíveis no momento em que estiver para decidir uma situação jurídica “problemática”. Sendo assim, são três as formas de exercício de poder de violência simbólica: autoridade^18 , reputação e liderança (ASSIS, 1995, p. 184). Anota Olney Queiroz Assis que: No processo interpretativo, a influência implica a generalização de sentido com vistas à neutralização de outras possibilidades. Nesse sentido, o poder assume três relações: a) relação autoridade: a interpretação é generalizada (confirmada) quando o intérprete ocupa uma posição superior dentro de uma determinada hierarquia, por exemplo, do Poder Judiciário; b) relação de lide- rança: a interpretação é generalizada quando todos ou quase todos repetem (imitam) a mesma interpretação; c) relação de reputação: a interpretação é generalizada com base no prestígio do intérprete (ASSIS, 2011, p. 24). Portanto, (...) nestas três formas o direito entra na relação de poder e dá plenas con- dições para que este se estruture e dissimule as relações de força que estão presentes na sua base. Com isso, é possível apontar que a interpretação das normas jurídicas é, no fundo, um ato de poder, isto é, um ato de violência simbólica que se utiliza das relações de autoridade, liderança e reputação. Em outras palavras, é possível o poder penetrar na dogmática jurídica (ASSIS, 1995, p. 186). Dessa forma, “torna-se possível falar violência não como vis física, concreta e atual, mas no sentido simbólico de ameaça. Não se fala da violência como ins- trumento de direito, (...). Trata-se, porém, a violência como manifestação do direito, (...)” (FERRAZ JR., 2003, p. 346), por meio do qual se dá nos Tribunais pela dogmá- tica da decisão, ou seja, o que é decidido pelos órgãos jurisdicionais. Emerge-se, as- sim, o brocardo jurídico “ roma locuta, causa finita ”, portanto, no momento em que se decide o litígio, o Estado se manifesta por ato de império, dando termo a causa e, consequentemente, vinculando as pessoas a respeitar a autoridade da decisão judicial, no caso em tela do Supremo Tribunal Federal. Desse modo, se insere a súmula vinculante não como meio propriamente dito de coerção ou imposição no mundo do direito, mas como um instrumento jurídico constitucional do Supremo Tribunal Federal a fim de exercer sua influência no cenário jurídico e social da sociedade brasileira, combatendo, assim, interpreta- ções conflitantes de decisões judiciais e extrajudiciais (jurídicas) que desencadeiam incertezas e inseguranças no campo jurídico, conforme já reiteradamente afirmado
18 “No direito, é enorme a importância desse argumento. Basta pensar no valor da tradição, no papel dos jurisconsultos, na força da jurisprudência para ter-se uma ideia de sua presença. Por meio deles, a própria doutrina, bastante discutida quanto a seu papel de fonte ou não do direito, pode exercer, como de fato exerce, grande pressão na conformação, compreensão e decisão dos conflitos judiciais e extra- judiciais. Basta ver o papel exercido pelo parecer técnico, cuja força está não apenas na correção dos raciocínios, mas, sobretudo, no nome de quem o assina” (FERRAZ JR., 2003, p. 337 – 338).