






















Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Este documento aborda a questão da repartição de competências e atribuição de poderes no estado federal brasileiro, com foco na competência legislativa da união e dos estados, bem como nas competências concorrentes. Também é discutida a influência da interpretação constitucional na distribuição de poderes e a relação entre as competências materiais e legislativas.
Tipologia: Resumos
1 / 30
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 215
Sumário
O federalismo demanda uma divisão do poder, principalmente entre o ente central (União) e os Estados-membros, mas tam- bém com os Municípios. Na lição de Silva (2002, p. 494), poder significa “a porção de matérias que a Constituição distribui entre as entidades autônomas e que passam a compor seu campo de atuação governa- mental, suas áreas de competência”. Então, a competência determina a “esfera delimi- tada de poder que se outorga a um órgão ou entidade estatal, mediante a especificação de matérias sobre as quais se exerce o poder de governo” (SILVA, 2002, p. 494). Portanto, a divisão de poderes opera-se principalmente pela repartição de compe- tências, que representa “o ponto fulcral a ser considerado em uma Constituição
Paulo Mohn é Mestre em Direito e Políticas Públicas (Uniceub), Especialista em Direito Pú- blico (IDP) e Consultor Legislativo do Senado Federal.
Paulo Mohn
216 Revista de Informação Legislativa
Federal” (BARACHO, 1997, p. 61). Afinal, observa Horta (2002, p. 308) que “a decisão a respeito da repartição de competências condiciona a fisionomia do Estado federal, para determinar os graus de centralização e de descentralização do poder federal”. Este trabalho pretende oferecer uma descrição analítica do sistema de repartição de competências implantado no Brasil pela Constituição Federal de 1988. Para tanto, realiza breve apresentação dos modelos gerais de repartição de competências (dual e cooperativo), para depois analisar especi- ficamente o sistema brasileiro, examinando as competências privativas da União, as remanescentes dos Estados, as privativas dos Municípios, as comuns (materiais) e as concorrentes (legislativas).
Conforme Horta (2002, p. 308), as for- mulações constitucionais de repartição de competências podem ser reduzidas a dois modelos principais, que qualifica como clássico e moderno. Ferreira Filho (1997, p. 150; 2007, p. 56) denomina esses modelos, respectivamente, de federalismo dual e de federalismo cooperativo. Mas tanto em uma denominação, quanto na outra, os modelos correspondem à aplicação de técnicas dis- tintas de repartição de competências: a hori- zontal e a vertical (ALMEIDA, 2005, p. 33).
2.1. A repartição horizontal de competências e o federalismo dual O modelo clássico foi inaugurado pela Constituição dos Estados Unidos da América e praticado em outros países, principalmente nos séculos XVIII e XIX. Nele, atua a repartição horizontal de com- petências, que opera a separação radical de competência entre os entes federativos, por meio da atribuição a cada um deles de uma área própria, denominada competên- cia privativa ou exclusiva, consistente em toda uma matéria (do geral ao particular),
com exclusão da participação dos demais (FERREIRA FILHO, 1997, p. 151; 2007, p. 55). Nesse sentido, pode-se dizer que a repartição horizontal opera uma repartição material das competências. No modelo norte-americano, as com- petências da União estão expressamente relacionadas na Constituição (competên- cias enumeradas ) e aos Estados-membros correspondem todas aquelas que não são atribuídas à autoridade federal nem veda- das às autoridades estaduais (competências remanescentes). Explica Schwartz (1993, p. 9) que a preocupação dominante dos autores da Constituição Federal era assegurar que o governo federal não fosse tão poderoso que tragasse os Estados que comporiam a na- ção. Para tanto, limitaram o governo federal a uma lista específica de poderes essenciais a seu funcionamento efetivo, enumerados na Constituição, ao mesmo tempo em que reservaram todo o resto de autoridade aos Estados. O que era necessário, na visão dos founding fathers , era que cada governo se limitasse a sua própria esfera e, dentro desta esfera, fosse independente do outro. O constituinte norte-americano não viu necessidade de enumerar os poderes dos Estados-membros, pois pressupôs a preexistente organização desses entes (HORTA, 2002, p. 309). Contudo, como surgiram dúvidas sobre a questão, sobre- veio a Décima Emenda, ratificada em 1791, cujo texto expressamente estabelece que “os poderes que não tenham sido delegados aos Estados Unidos pela Constituição e não tenham sido proibidos por ela aos Estados serão reservados, respectivamente, aos Estados ou ao povo” (ALMEIDA, 2005, p. 48; SCHWARTZ, 1993, p. 13). Em vista dessa separação estanque de competências entre as duas esferas federati- vas, de modo que uma não pode participar na outra, é que se denomina esse modelo de federalismo dual. Os Estados e a União são concebidos como rivais iguais e a delimi- tação de competências é estabelecida para
218 Revista de Informação Legislativa
atuação dos governos estaduais, por meio de políticas econômicas e sociais que aspi- ravam a uma atuação conjunta dos distintos níveis federais, utilizando-se de mecanis- mos como as subvenções condicionadas à aceitação de padrões e a submissão de controles federais, com a aquiescência da Suprema Corte (ALMEIDA, 2005, p. 36; SOMMERMANN, 2003, p. 2.284; ZIMMER- MANN, 1999, p. 56). Ocorre que, como demonstra Schwartz (1993, p. 30-31), a teoria do laissez-faire e o fe- deralismo dual mostraram-se inadequados para atender aos problemas apresentados pela Grande Depressão de 1929, pois era re- querida uma maior intervenção do governo federal para recuperar a economia nacional. Se antes o governo deveria ser apenas regu- lamentador e negativo, passou-se a exigir dele uma atuação positiva, de intervenção nos assuntos econômicos e sociais em escala nacional. Isso somente estava ao alcance do governo federal, que, para tanto, deveria atuar de forma coordenada com os Estados. A partir de então, a Suprema Corte passou a interpretar a Décima Emenda como um mero truísmo (de que tudo que não foi cedi- do se conserva) e reconhecer a competência federal em matérias de interesse local que ti- vessem repercussão nacional. Disso resultou uma necessária cooperação entre os níveis federativos, marcada pelo predomínio do poder federal (SCHWARTZ, 1993, p. 36). Contudo, a experiência que mais ca- racteriza o federalismo cooperativo é a da Alemanha, cujo funcionamento não recai sobre as mesmas bases da norte-americana, mas sim na técnica de repartição vertical de competências (distribuição funcional) entre os entes federativos. Esse modelo tem suas origens na Constituição alemã de 1919 (Constituição de Weimar) e na Constituição austríaca de 1920, mas ganhou forma e aplicação nas Constituições desses países posteriores à 2a^ Guerra Mundial. A Constituição de Weimar relacionava as competências legislativas exclusivas da União ( Reich ) e o direito de legislar priorita-
riamente em um longo elenco de matérias. Havia, ainda, a possibilidade de a União estabelecer regras de princípio sobre deter- minadas matérias, ficando o detalhamento delas a cargo das leis estaduais. Vigorava, ainda, a regra de que o direito federal preva- lece sobre o estadual. Essa Constituição não chegou, portanto, a significar uma descen- tralização acentuada de poderes. O avanço veio com a Constituição austríaca, de 1920, que distribuiu as competências da seguinte forma: a Federação recebeu a competência de legislação e de execução sobre matérias predeterminadas; em outras, a Federação ficou com a legislação e os Estados ( Länder ) com a execução; e, em numerosas matérias, reservou-se à Federação a legislação de princípios e aos Estados a legislação de aplicação e de execução. Foi mantida, tam- bém, a regra de competência remanescente para os Estados. Ou seja, rompeu-se com o exclusivismo de legislação na Constituição austríaca e foi estabelecido um sistema de comunicação entre a legislação da Federa- ção e a de execução dos Estados. Não obs- tante, a Constituição austríaca preservou elementos centralizadores, provenientes da tradição monárquica (HORTA, 2002, p. 312; ALMEIDA, 2005, p. 50). Esse modelo foi aperfeiçoado pela Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, de 1949, que introduziu ino- vações significativas na organização do Estado federal. Na síntese de Horta (2002, p. 313), a repartição de competências do novo federalismo alemão compreendeu dois segmentos fundamentais: o da legis- lação exclusiva da Federação (União) e o da legislação concorrente ou comum. Esta se caracterizava como uma competência mista, a ser explorada tanto pela Federação quanto pelos Estados, e era mais numerosa do que a exclusiva da Federação. Ainda conforme Horta (2002, p. 313), no domínio da legislação concorrente, que reú- ne matérias de grande importância, a priori- dade de legislar é dos Estados, admitindo-se o exercício da legislação federal com o fim
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 219
de preencher a necessidade de legislação uniforme, dentro de critérios constitucio- nais (art. 72). Nessas mesmas condições, a Federação tem o direito de estabelecer nor- mas gerais, a serem complementadas pelos Estados para regular as suas especificidades (art. 75). Mantém-se a prevalência da legis- lação federal sobre a estadual (art. 31), mas os Estados detêm a competência remanes- cente (art. 70) e podem legislar em matéria exclusiva da União se houver autorização expressa por lei federal (art. 71). Além disso, a execução das leis federais é atribuída aos Estados como matéria própria, salvo disposição em contrário (art. 83), po- dendo também lhes caber essa execução por delegação da União (art. 85). Nesses casos, os Estados podem regulamentar a organização dos órgãos públicos e procedimentos admi- nistrativos, salvo disposição em contrário de leis federais, admitindo-se, ainda, que o governo federal determine preceitos admi- nistrativos de caráter geral (arts. 84 e 85). Em todo caso, essas disposições ensejam maior participação dos Estados (ALMEIDA, 2005, p. 53), que também podem receber a colaboração da União em tarefas julgadas importantes para a coletividade ou de inte- resse comum para a melhoria das condições de vida, conforme lei federal (art. 91-A). Por tudo isso, Horta (2002, p. 313-314) entende que a Lei Fundamental de Bonn institui um modelo de federalismo de equilíbrio, por meio do qual “o indispensável exercício dos poderes federais não venha inibir o florescimento dos poderes estaduais”.
A história da federação brasileira não é retilínea. Ao contrário, caracteriza-se por períodos cíclicos de breves expansões e de longas restrições à autonomia dos entes federativos, com consequentes retrações ou alargamentos dos poderes e competências da União. Tal percurso autoriza Almeida (2005, p. 44) a concluir que, pelo menos até
antes da Constituição de 1988, se tratava “quase de um Estado unitário redivivo”. A tendência centralizadora, que se identifica em muitas federações, teve gran- de intensidade no Brasil. Proveniente da descentralização de um Estado unitário, a federação brasileira mostrou, desde seu nascedouro, certo artificialismo, que se traduziu em disposições constitucionais que acabavam por se confrontar com a re- alidade. Tanto assim que, em seu primeiro século de existência (1889-1988), a federa- ção brasileira contou com apenas metade desse tempo de efetividade e prática, sendo o restante coberto por períodos de vigência meramente formal nas Constituições. A Constituição de 1988 consolidou a redemocratização brasileira e ensejou, entre outras expectativas, a da restauração de um federalismo mais efetivo. Ocorre que, con- forme registra Silva (2002, p. 475), a reparti- ção regional e local de poderes depende da natureza e do tipo histórico de federação. No Brasil, em face da concentração de po- der no governo central, de origem histórica e dimensão acentuada durante os governos militares, o esperado ressurgimento de um federalismo de equilíbrio passou a ser visto como um processo de descentralização do poder para os entes federados. O imperativo de redistribuição de poder resultou em um intrincado sistema de repar- tição de competências, com “a combinação de praticamente tudo o que já se experimen- tou na prática federativa” (ALMEIDA, 2005, p. 74). O princípio geral que norteia a re- partição de competência entre as entidades do Estado federal, segundo Silva (2002, p. 477), é o da predominância de interesse, pela qual cabe à União as matérias de interesse nacional, enquanto compete aos Estados as matérias de interesse regional e aos Municí- pios as matérias de interesse local. No sistema da Constituição de 1988, con- vivem a repartição horizontal e a repartição vertical de competências. Sob a orientação de repartição horizontal, foram relacionadas as competências da União, no campo material
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 221
largueza que os poderes federais assumi- ram na história, sempre houve nos textos constitucionais um rol que delimitava (ou procurava delimitar) os poderes da União. Tradicionalmente, porém, as constituições brasileiras reuniram, em um só dispositivo, tanto as competências materiais quanto as legislativas. Por exemplo, no regime cons- titucional anterior, elas estavam juntas no art. 8o^ (BRASIL, 1967, art. 8o). A novidade da Constituição de 1988 foi cindir a enume- ração de competências privativas da União em dois artigos: o art. 21 para as competên- cias materiais e o art. 22 para as legislativas (BRASIL, 1988, arts. 21 e 22).
3.1.1. As competências materiais privativas da União O art. 21 reúne as competências ma- teriais da União, isto é, as atividades e encargos que a União está habilitada a desempenhar, sejam elas de cunho político, administrativo, econômico ou social (AL- MEIDA, 2005, p. 84). Ou seja, reúnem-se nesse dispositivo as competências de índole executiva ou não-legislativa da União. Ferreira Filho (1997, p. 151) vê uma tê- nue tendência de reversão da centralização na Constituição de 1988, embora constate que o art. 21, mais do que nenhum outro, re- vela a realidade da federação brasileira, ao mostrar, “insofismavelmente, a vastidão da
competência da União, que não deixa muito para os Estados”. Comparando-o com os preceitos equivalentes nas Constituições de 1891 e 1946, revela-se o acentuado processo de centralização pelo qual passou o Estado federal brasileiro. Em comparação com o regime consti- tucional precedente, Almeida (2005, p. 91) registra que as competências materiais da União foram ampliadas na Constituição de
Agrupamento Incisos do artigo 21 daConstituição Federal
Autoridade do Estado no plano in- ternacional, guerra e paz, e defesa do território
I – manter relações com Estados estrangeiros e participar de orga- nizações internacionais; II – declarar a guerra e celebrar a paz; III – assegurar a defesa nacional; IV – permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente; VI – autorizar e fiscalizar a produção e o comércio de material bélico; XXII – executar os serviços de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras (redação dada pela EC 19/1998); Proteção da ordem constitucional em momentos de crise
V – decretar o estado de sítio, o estado de defesa e a intervenção federal;
Moeda e câmbio
VII – emitir moeda; VIII – administrar as reservas cambiais do País e fiscalizar as opera- ções de natureza financeira, especialmente as de crédito, câmbio e capitalização, bem como as de seguros e de previdência privada;
222 Revista de Informação Legislativa
Também devem ser da União as compe- tências referentes ao Distrito Federal, pelas especificidades que este ente federativo apresenta em termos institucionais e de se-
gurança. Igualmente, são de índole federal os serviços oficiais de estatística, geografia, geologia e cartografia de âmbito nacional. Esses grupos estão representados abaixo:
Agrupamento Incisos do artigo 21 daConstituição Federal
Distrito Federal
XIII – organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios; XIV – organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos, por meio de fundo próprio (redação dada pela EC 19/1998). Serviços oficiais XV – organizar e manter os serviços oficiais de estatística, geografia,geologia e cartografia de âmbito nacional;
O próximo agrupamento, porém, enseja alguma polêmica acerca de sua inserção en-
Agrupamento Incisos do artigo 21 daConstituição Federal
Planos de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social, calamidades públicas, desenvolvimento urbano.
IX – elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social; XVIII – planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações; XX – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habi- tação, saneamento básico e transportes urbanos;
tre as competências privativas da União:
Almeida (2005, p. 91) sugere que al- gumas dessas competências poderiam compor o rol de competências comuns. Uma delas seria a de planejar e promover a defesa permanente contra as calamida- des públicas (inc. XVIII), especialmente as secas e inundações. O socorro aos Estados em caso de calamidade pública foi o pri- meiro (e único, à época) instrumento de cooperação entre eles e a União (BRASIL, 1891, art. 5o) e serviu, muitas vezes, como instrumento de interferência federal nos assuntos de economia interna dos Estados. Para Ferreira Filho (1997, p. 161), o apelo à União para que prestasse socorro às secas do Nordeste “foi um fator importantíssimo que ponderavelmente contribuiu para a centralização no federalismo brasileiro”. Apesar da relevância da atuação da União, especialmente na função de planejamento, não se justifica que essa competência não seja compartilhada com os próprios entes federativos envolvidos nas reiteradas ocorrências.
Outra competência privativa da União que se pode questionar refere-se à área do planejamento nacional e regional. Almeida (2005, p. 92) lembra que o planejamento é informado pelos princípios da “unidade por integração” e da “globalidade”, o que resulta em dificuldade de conciliação com a autonomia das unidades federadas. Con- tudo, argumenta a autora, embora possa utilizar-se de processos de centralização autocráticos, o planejamento pode valer-se de medidas de coordenação com a forma federativa, por meio da concertação dos planos federal e estaduais. Isso depende- ria do desenvolvimento que se desse à lei que “estabelecerá as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compa- tibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento” (BRASIL, 1988, art. 174, § 1o). A competência para “elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econô-
224 Revista de Informação Legislativa
O elenco do art. 21, porém, não esgota as competências materiais privativas da União, que podem ser encontradas também em outros dispositivos da Constituição de
3.1.2. As competências legislativas privativas da União
Há uma correspondência entre as com- petências materiais da União e as suas com- petências legislativas (FERREIRA FILHO, 2007, p. 62), porque, na maior parte das ve- zes, a execução da atividade deve basear-se em uma norma legal emanada do próprio ente. Por isso, existe uma correlação entre o art. 21 (competência material) e o art. 22 (competência legislativa) da Constituição (BRASIL, 1988, arts. 21 e 22). Isso ocorre nos casos seguintes:
Agrupamento Incisos do artigo 21 daConstituição Federal
Rádio e televisão
XII – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou per- missão: a) os serviços de radiodifusão sonora, e de sons e imagens (redação dada pela EC 8/1995); XVI – exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão;
Água e energia elétrica
XII – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou per- missão: b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento ener- gético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos; XIX – instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso;
Transporte, navegação e viação
XII – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou per- missão: c) a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária; d) os serviços de transporte ferroviário e aquaviário entre portos brasi- leiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de Estado ou Território; e) os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros; f) os portos marítimos, fluviais e lacustres; XXI – estabelecer princípios e diretrizes para o sistema nacional de via- ção;
Serviços e instalações nucleares
XXIII – explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições: a) toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional; b) sob regime de permissão, são autorizadas a comercialização e a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos médicos, agrícolas e industriais (redação dada pela EC 49/2006); c) sob regime de permissão, são autorizadas a produção, comercialização e utilização de radioisótopos de meia-vida igual ou inferior a duas horas; (redação dada pela EC 49/2006); d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa (redação dada pela EC 49/2006);
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 225
O mesmo se dá com algumas competên- cias materiais da União que estão previstas, de modo esparso, no texto constitucional.
Nessa hipótese, o quadro a seguir indica os dispositivos correspondentes em colchetes que se seguem à transcrição dos incisos:
Agrupamento Incisos do artigo 22 daConstituição Federal
Competências legislativas com equivalência nas competências materiais do art. 21, ou conexas a elas.
IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; V – serviço postal; VI – sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais; VII – política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores; IX – diretrizes da política nacional de transportes; X – regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial; XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia; XVII – organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa destes; XVIII – sistema estatístico, sistema cartográfico e de geologia nacionais; XXVI – atividades nucleares de qualquer natureza; XXVIII – defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional.
Agrupamento Incisos do artigo 22 daConstituição Federal
Competências legislativas com equivalência nas competências materiais da União esparsas na Constituição, ou conexas a elas.
XIV – populações indígenas [ver art. 231]; XXII – competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais [ver art. 144, §§ 1o^ a 3o]. XXIII – seguridade social [ver art. 194]; XXIV – diretrizes e bases da educação nacional [ver art. 211]; XXV – registros públicos [ver art. 236]; XXIX – propaganda comercial [ver art. 220, §§ 3o, II e 4o]
Outros domínios, embora não tenham correspondência imediata com as compe- tências materiais do art. 21 ou de normas esparsas, são assuntos tipicamente discipli-
nados pela instância federal, porque dizem respeito à nação e sua relação com o exterior e os estrangeiros:
Agrupamento Incisos do artigo 22 daConstituição Federal
Competências legislativas tipica- mente federais
VIII – comércio exterior e interestadual; XIII – nacionalidade, cidadania e naturalização; XV – emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estran- geiros;
Em alguns casos, a competência legis- lativa da União foi determinada porque se entendeu necessário constituir sistemas de
caráter nacional, para fomentar uma ação ordenada e uniforme na área. Esses grupos estão relacionados a seguir:
Agrupamento Incisos do artigo 22 daConstituição Federal
Sistemas de caráter nacional
XI - trânsito e transporte; XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões; XIX - sistemas de poupança, captação e garantia da poupança popular; XX - sistemas de consórcios e sorteios;
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 227
Os incisos IX e XXIV constam nos quadros anteriores, relacionados entre as matérias legislativas que têm conexão com competências materiais da União. A competência da União para dispor sobre normas gerais de organização das polícias militares e corpos de bombeiros, segundo Ferreira Filho (1997, p. 175), tem origem na ameaça que essas forças representam para o nível federal, conforme comprova a história
Sundfeld (1993, p. 277) indica como motivo de inclusão do tema das licitações no art. 22 o fato deste dispositivo conferir a competência legislativa de normas gerais para a União, sem outorgar competência suplementar aos Estados, tal como ocorreria no art. 24. Para o autor, permite-se, com isso, que os Municípios exerçam poderes equiva- lentes aos dos Estados com relação à matéria, o que não poderia ocorrer se o tema fosse contemplado nas competências concorrentes entre União e Estados do art. 24. Uma questão relacionada é saber se a previsão de legislação sobre normas gerais no art. 22 resulta na impossibilidade de os Estados exercerem a competência legislativa plena, se não existir lei federal sobre o tema (art. 24, § 3o). E, nesse caso, se os Municípios poderiam dispor livremente sobre a matéria, no âmbito do interesse local (art. 30, I), ou se somente poderiam suplementar as disposi- ções estaduais (art. 30, II). O que se mostra adequado, no caso, é que cada ente dispo- nha suas normas particulares, sem legislar supletivamente sobre normas gerais, deven- do então recorrer a outros instrumentos de preenchimento de lacuna, como a analogia e os princípios gerais de direito. Por fim, é necessário registrar que as competências legislativas da União não estão integralmente previstas no art. 22. Existem inúmeros outros dispositivos cons- titucionais que prevêem a edição de lei para regular assuntos de competência da União. O exemplo mais marcante disso é o art. 48, que, ao dispor sobre as atribuições do Con- gresso Nacional, relaciona quinze incisos contendo domínios de legislação federal. Não é à toa que existe, reconhecidamente, legislação em profusão na área federal.
3.1.3. Delegação de competências legislativas privativas da União Provavelmente para compensar a con- centração de domínios legislativos na área federal, a Constituição de 1988 admite que lei complementar autorize os Estados a legislar sobre questões específicas das
228 Revista de Informação Legislativa
matérias relacionadas no art. 22 (BRASIL, 1988, art. 22, par. único). É uma tentativa de resguardar algum campo de normatização para os Estados, para disciplinarem sobre suas particularidades. Essa possibilidade não é uma inovação do constituinte de 1987/88. Desde a Consti- tuição de 1937 já se previa faculdade equiva- lente aos Estados, “quando se trate de ques- tão que interesse, de maneira predominante, a um ou alguns Estados” (BRASIL, 1937, art. 17). Mas, na época, a lei estadual dependia da aprovação do governo federal. Essa regra foi modificada nas Constitui- ções seguintes, dando forma à legislação supletiva ou complementar dos Estados, prevista tanto no art. 6o^ da Carta de 1946, quanto no art. 8o, § 2o, da Carta de 1967. Em ambas, essa possibilidade somente incidia para algumas poucas competências legisla- tivas privativas da União, mas serviu como o germe da legislação concorrente no direi- to constitucional brasileiro. A Constituição de 1988 não indicou quais matérias, entre as listadas no art. 22, podem ser objeto da delegação. Algumas delas não a admitem, como no caso das que regulam atividades executadas pela União, ou daquelas que não possam ter desdobramentos específicos nos Estados. Questão interessante diz respeito à pos- sibilidade ou não de a delegação dirigir-se apenas a um ou alguns Estados. Ferreira Filho (1997, p. 178) admite essa hipótese, “caso em que a norma assim editada apenas terá eficácia no território deste”. Almeida (2005, p. 110), entretanto, rejeita que tal de- legação seja feita de forma desigual, em face do princípio da igualdade de tratamento tradicionalmente assegurado às entidades federadas, o que mantém a simetria de nosso federalismo. Lamenta que não tenha sido utilizada a fórmula da Constituição de 1937, que admitia a delegação apenas quando se tratasse de questão de interesse de um ou alguns Estados, porque aí estaria possibilitado o tratamento diferenciado, o que poderia contribuir para reduzir as desi- gualdades regionais e sociais brasileiras.
3.2. As competências remanescentes dos Estados
O art. 25, § 1o, da Constituição Federal traz a norma de atribuição de competências remanescentes, ao dispor que “são reserva- das aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição” (BRASIL, 1988, art. 25). Essa disposição se estende ao Distrito Federal (BRASIL, 1988, art. 32, § 1o). A cláusula de atribuição das compe- tências remanescentes aos Estados está presente, com variações de redação, desde a primeira Constituição Federal brasileira, com inspiração no modelo norte-ameri- cano. Por causa do processo de formação por segregação da federação brasileira, Ferreira Filho (1997, p. 197) defende que era mais adequada a redação de 1967, que dizia serem “conferidos” aos Estados os poderes remanescentes, do que as de 1946 e de 1988, que utilizaram o verbo “reservar”, porque os Estados-membros não detinham poderes que pudessem ser reservados, mas, ao contrário, receberam aqueles que o ente central lhes atribuiu. Tradicionalmente, os Estados permane- ciam com as competências que não eram conferidas à União. Como os Municípios foram erigidos a entes federativos, as com- petências estaduais passaram não só a ser comprimidas por cima, mas também por baixo. Atualmente, cabem aos Estados as competências que não se incluem entre as competências que a Constituição confere, explicita ou implicitamente, à União ou aos Municípios. Assim, Ferreira Filho (1997, p.
230 Revista de Informação Legislativa
Para definir as competências legislativas privativas dos Municípios, a Constituição Federal diz caber-lhes legislar sobre as- suntos de interesse local (BRASIL, 1988, art. 30, I). Em linhas gerais, esse é o critério adotado para a delimitação das competên- cias municipais: o do “peculiar interesse” ou do “interesse local”. Aquela primeira expressão foi adotada desde a primeira Constituição Federal brasileira (BRASIL, 1891, art. 68); esta última foi utilizada ape- nas na mais recente, provavelmente apenas para veicular de modo diferente o mesmo conceito. De todo modo, não se identifica
uma distinção entre elas, devendo preva- lecer o entendimento de que se referem ao interesse predominante do Município, e não do exclusivo, até porque este seria atualmente de difícil possibilidade. Quanto às competências materiais privativas do Município, elas estão exem- plificadas em alguns incisos do art. 30, mas podem ser buscadas no próprio conceito de “interesse local” e, eventualmente, em dispositivos esparsos da Constituição Federal. São as seguintes as competências explicitamente enumeradas dos Municí- pios:
Agrupamento Incisos do artigo 30 daConstituição Federal
Tributária
III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
Distritos e ordenamento territorial
IV – criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação esta- dual; VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, me- diante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
Serviços públicos
V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou per- missão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;
Social (educação e saúde)
VI – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental (redação dada pela EC 53/2006); VII – prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população; Proteção do patrimônio histórico- cultural
IX – promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, obser- vada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.
A menção à competência tributária do Município não tem equivalente na União e no Estado. Ela decorre da descrição que a própria Constituição Federal faz do sistema tributário e, em especial, dos impostos do Município (BRASIL, 1988, art. 156). Tam- bém, não constitui novidade, visto que a Constituição de 1934 já previa a autonomia municipal em especial para “a decretação dos seus impostos e taxas, a arrecadação e aplicação das suas rendas” (BRASIL, 1934, art. 13, II). De qualquer modo, conferiu destaque à transparência na prestação de contas, prevista na parte final do dispo- sitivo.
Como já foi abordado, a elevação do Município a ente federativo ensejou a transferência para ele da competência, ante- riormente pertencente ao Estado-membro, de criar, organizar e suprimir os distritos, que são circunscrições administrativas municipais. Mas como a criação de distritos continua a ter repercussões para o Estado- membro, a Constituição exige que os Muni- cípios atendam à legislação estadual. Cabe ao Município, ainda, promover adequado ordenamento territorial, median- te planejamento e controle do uso, do par- celamento e da ocupação do solo urbano. Embora a matéria seja de evidente interesse
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 231
local, o Município deverá compatibilizar seu plano diretor com os planos nacionais e regionais de ordenação do território, de competência privativa da União (BRASIL, 1988, art. 21, IX), assim como aos ditames do direito urbanístico, cuja competência é con- corrente entre União e Estados (BRASIL, 1988, art. 24, I). O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana, cujo objetivo é ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (BRASIL, 1988, art. 182). Também no que diz respeito aos servi- ços públicos, vale o interesse local como critério de distinção da competência municipal. Cumpre registrar que, desde a Constituição de 1934, atribui-se ao Mu- nicípio “a organização dos serviços de sua competência” (BRASIL, 1934, art. 13, III). O Município poderá organizar e prestar os serviços de interesse local diretamente ou sob regime de concessão. O dispositivo exemplifica, como de competência muni- cipal, o transporte coletivo, inclusive para acentuar seu caráter essencial. Não obs- tante, vale lembrar que à União compete privativamente instituir diretrizes para os transportes urbanos, as quais deverão ser seguidas pelos Municípios. As demais competências, relativas a educação, saúde e patrimônio histórico- cultural são, na verdade, de atuação comum dos entes federativos, tanto assim que constam do art. 23 da Constituição Federal (BRASIL, 1988, art. 23, II, III e V). Contudo, elas vêm relacionadas como competências dos Municípios para reforçar a atuação específica que a esfera municipal desempe- nha nessas áreas. Na área de educação, compete aos Mu- nicípios manter programas de educação infantil e de ensino fundamental, com a co- operação técnica e financeira da União e do Estado. A disposição se compatibiliza com o art. 211, que determina a organização, em regime de colaboração, dos sistemas
de ensino da União, Estados e Municípios, garante assistência técnica e financeira e estabelece uma divisão de atribuições aos entes federados, cabendo aos Municípios atuação prioritária no ensino fundamental e na educação infantil. Situação equivalente existe na área de saúde, em que cabe ao Município prestar os serviços de atendimento à saúde da população, com a cooperação técnica e fi- nanceira da União e do Estado. A atuação do Município segue as diretrizes do sistema único de saúde, do qual participam, de forma integrada, todos os entes federados (BRASIL, 1988, art. 198). Por fim, cabe aos Municípios proteger o patrimônio histórico-cultural local, ob- servada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual. Trata-se de atuar, em seu âmbito, na proteção das obras e bens de valor histórico, artístico e cultural, impedindo-lhes a evasão, a destruição e a descaracterização (BRASIL, 1988, art. 23, III e IV). Como se vê, o rol do art. 30 da Cons- tituição Federal não acrescenta muito, uma vez que apenas procura sistematizar
3.4. As competências comuns (materiais concorrentes) A repartição de competências no Esta- do federal mostrou-se, na realidade, mais complexa do que a classificação em poderes enumerados e poderes remanescentes seria capaz de apreender. Embora boa parte dos poderes se constituísse de competências exclusivas da União ou dos Estados, consta- tou-se a existência de poderes compartilha- dos entre os entes da federação, que levou à noção de competências concorrentes. Tal como procedeu quanto às competên- cias da União, a Constituição de 1988 tratou em dispositivos separados as competências
Brasília a. 47 n. 187 jul./set. 2010 233
Além da competência para legislar sobre águas, energia, jazidas, minas e recursos minerais (BRASIL, 1988, art. 22, IV e XII), à União cabe “instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso” (BRASIL, 1988, art. 21, XIX), assim como explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os “serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos” (BRASIL, 1988, art. 21, XII, b ). A exploração desses recursos hidráu- licos e minerais beneficia, inicialmente, a União. Dispõe o art. 176 da CF que os re- cursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou
aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. Para tanto, essas ativi- dades são realizadas mediante autorização ou concessão da União. Nos termos da lei, é assegurada aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como aos órgãos da administração direta da União, participa- ção no resultado da exploração dos recursos no respectivo território, ou compensação financeira por essa exploração (art. 20, § 1 o). Nesse sentido é que se admite a com- petência concorrente comum de “registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recur- sos hídricos e minerais em seus territórios” (BRASIL, 1988, art. 23, XI). Duas outras competências materiais concorrentes baseiam-se em diretrizes tra- çadas pela União:
Competência material comum Competência legislativa correspondente XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios;
Da União: Art. 22, IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão; Da União: Art. 22, XII – jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia;
Competência material comum Competência legislativa correspondente V – proporcionar os meios de acesso à [...] à edu- cação [...];
Da União: Art. 22, XXIV – diretrizes e bases da educação nacional [ver art. 211]; Comum: Art. 24, IX – educação, [...]; IX – promover programas de construção de mora- dias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico;
Da União: Art. 21, XX – instituir diretrizes para o de- senvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; Comum: Art. 24, I – direito [...] urbanístico;
No inciso V do art. 23 figura a importan- te área da educação, na qual a União legisla sobre as diretrizes e bases da educação na- cional (art. 22, XXIV). Nesse setor, a própria Constituição Federal traçou uma divisão vertical de competências, ao dispor que os Estados atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio e os Municípios, no ensino fundamental e na educação infantil (art. 211, §§ 2o^ e 3o). Outra área em que deverão ser seguidas as diretrizes da União é a de desenvolvi- mento urbano, inclusive habitação e sane-
amento básico (art. 21, XX). Desse modo, os “programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básicos” (BRASIL, 1988, art. 23, IX), a serem promovidos por todos os entes federativos, deverão estar coerentes com aquelas diretrizes, além de seguir as normas gerais estabelecidas pela União na legislação sobre direito urbanístico (BRA- SIL, 1988, art. 24, I). As demais competências materiais co- muns do art. 23 estão todas vinculadas a competências legislativas concorrentes:
234 Revista de Informação Legislativa
Nesses domínios, cabe à União estabe- lecer as normas gerais e aos Estados e Mu- nicípios editar as normas suplementares, relacionadas às suas respectivas peculiari- dades (arts. 24, §§ 1o^ e 2o; e 30, II).
3.4.2. Formas de cooperação Ainda no terreno das competências materiais comuns, cabe analisar a possibi- lidade que abre o parágrafo único de art. 23, segundo o qual leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. De início, a redação original do dispositivo previa apenas uma lei com- plementar. A Emenda Constitucional no 53, de 19 de dezembro de 2006, substituiu a expressão “lei complementar” por “leis complementares”, para que as normas de cooperação possam ser fixadas para cada
domínio, em virtude da dificuldade de se estabelecer uma regra única para todos eles. Como era antes, Ferreira Filho (1997, p.
Competência material comum Competência legislativa correspondente
II – cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
Comum: Art. 24, XII – previdência social, proteção e defesa da saúde; Comum: Art. 24, XIV – proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência; III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monu- mentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracte- rização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
Comum: Art. 24, VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; Comum: Art. 24, VIII – responsabilidade por dano [...] a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
V – proporcionar os meios de acesso à cultura, [...] e à ciência;
Comum: Art. 24, IX – educação, cultura, ensino e desporto;
VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora;
Comum: Art. 24, VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recur- sos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; Comum: Art. 24, VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente [...];
VIII – fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar;
Comum: Art. 24, V – produção e consumo; Da União: Art. 187. A política agrícola será planeja- da e executada na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção [...] § 1o^ – Incluem-se no planejamento agrícola as atividades agro-industriais, agropecuárias, [...]. XII – estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito
Comum: Art. 24, IX – educação, cultura, ensino e desporto; Da União: Art. 22, XI – trânsito e transporte;