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Este artigo explora a teoria elisiana para entender a lógica estrutural da prática do vale tudo, uma atividade física violenta que tem ganho popularidade recente, apesar de ser considerada uma das modalidades esportivas mais violentas. O artigo aborda a tensão entre o controle e o uso da violência pelos praticantes e/ou consumidores desta atividade, e questiona como reduzir a violência para conter sua expressão sem descaracterizar a prática esportiva. Além disso, o texto discute a legitimação da violência presente no vale tudo e sua influência na torcida.
Tipologia: Esquemas
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A PRÁTICA DO VALE TUDO: alguns apontamentos a partir da teoria elisiana
Miguel A. de Freitas Jr Centro Universitário Positivo – UnicenP Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG GRUPO DE PESQUISA ESPORTE, LAZER E SOCIEDADE
Em uma sociedade rotinizada como é a que vivemos, na qual a urgência e o controle rigoroso do tempo são elementos fundamentais. As atividades recreativas e esportivas sob suas múltiplas formas de manifestações, tornaram-se uma grande oportunidade para que as pessoas vivenciem experiências emocionais que normal- mente não são permitidas no seu cotidiano. É comum utilizarmos palavras para expressarmos nossos senti- mentos, porém não podemos extrapolar os limites do que é determinado socialmente como sendo correto. Entretanto, em determinados ambientes nossas palavras e atitudes tornam-se normais; isto nos leva a acreditar que possuímos diferentes níveis de tolerância, que sofrem influência direta do local e do tipo de atividade que estamos envolvidos. Partindo deste contexto, este artigo busca suporte teórico na teoria elisiana, que nos per- mita entender a lógica estrutural da prática do “Vale Tudo”. Atividade física que passa por um período de desportivização, mas que vem despertando grande interesse dos meios de comunicação e do público, algo inquetante em um momento onde somos bastante sensíveis à violência. Para realizar esta análise partimos de dois critérios propostos por Elias: 1) Se a violência é legítima, no sentido que concorde com um código de regras, normas e valores socialmente prescritos, ou que seja não normativa ou ilegítima, no sentido de infligir as normas sociais aceitas; 2) A violência adote uma forma racional e afetiva, quer dizer, racionalmente prefe- rida como meio para assegurar o ganho de um fim determinado, ou tomada como um fim em si mesmo, emocionalmente satisfatória e agradável. Optou-se por estes critérios porque a partir deles a análise do Vale Tudo torna-se algo contraditório, ou seja, a violência pode ser ilegítima e irracional ao mesmo tempo que pode ser vista como legítima e racional.
TERMOS CHAVES: VIOLÊNCIA, VALE TUDO, ESPORTE, COMPORTAMENTOS SOCIAIS.
O objetivo central deste artigo é levantar algumas questões que permitam fomentar o debate em torno da violência que ocorre a partir da prática do Vale do Tudo. Tendo como eixo central de análise uma questão paradoxal, que é a tensão entre o controle e o uso da violência pelos praticantes e/ou consumidores desta atividade. Mesmo tendo Norbert Elias como referência central^1 para o desenvolvimento deste trabalho, gostaria de neste intróito partir do pensamento de George Duby^2 , estudioso francês que chama atenção por estar preo- cupado com as questões do seu tempo, pois sempre acreditou ser dever do pesquisador erudito não se fechar em seus objetos de investigação, sendo importante refletir os problemas da atualidade e para isto sendo neces- sário trabalhar com o empírico, levantando questões que possam ajudar o devir. Partindo deste pressuposto e do fato de estarmos vivendo o início de um novo século, sendo este um momento de transição sócio – econômica, proporcionando oportunidades impares para a reflexão, pois alguns dos padrões mais antigos passam a ser contestados, entretanto os mais novos ainda não conquistaram o seu espaço. Ou seja, os padrões de comportamentos de nossa sociedade, que ficam gravados no indivíduo desde a mais tenra idade, como uma espécie de segunda natureza (habitus) e que são mantidos por um forte controle social, necessitam ser repensados. Muitas vezes ao tratarmos das condutas dos indivíduos, estabelecemos juízos de valores entre atitu- des civilizadas (não violentas) X incivilizadas (violentas). Estes comparativos são perigosos se não tivermos um medidor claro e preciso. Ao tratarmos da prática do Vale Tudo, percebemos que esta questão é algo bas- tante complexo, pois:
(^1) As principais obras utilizadas para a construção deste trabalho foram: DUNNING, Eric & ELIAS, Norbert.
A busca da excitação. Lisboa: Difel, 1992. GARRIGOU, Alain & LACWIE, Bernard. Norbert Elias: a política e a história. São Paulo Perspectiva, 2001. (^2) DUBY, Georges. Ano 1000 ano 2000. São Paulo: Fundação da UNESP, 1998.
Hélio Gracie e Waldemar Santana lutaram durante três horas e 40 minutos, naquela noite de Maio de
(^3) PRIDE: competição de Vale Tudo realizada no Japão no mês de dezembro e que reúne os melhores lutado-
res de Vale Tudo do mundo, oferece premiação em dinheiro onde o campeão ganha cerca de 500 mil dólares. (^4) REVISTA 100% LUTA: nocaute. A evolução do Vale Tudo. São Paulo: Dezembro de 2002, ano 1. (^5) Propaganda realizada pelo Sport Tv em 23 de abril de 2002, para promover a final do Ultimate Fight daque-
le ano. (^6) Cf. Revista Tatame. R egras de Vale Tudo. São Paulo, julho de 2002, número 77.
a locais em que as práticas físicas são violentas. Não obstante, vemos que o público presente no local de lutas é pequeno quando comparado com a audiência televisiva, ou seja, optamos em viver a violência num mundo fictício, que não tocamos materialmente e isto faz bem para a nossa consciência, pois a violência é escondida ou ainda, é mantida à distância, pois ocorre longe, na ficção, ou com grupos que não fazem parte da nossa rede de pertencimento.Em última instância podemos dizer que esta é uma violência sofisticada, própria para pessoas que se julgam civilizadas. A busca do controle da violência através da rigidez das regras, proporciona o aumento de competiti- vidade limitando determinadas atitudes consideradas perigosas. Entretanto, um dos problemas centrais está no fato de que os lutadores utilizam a violência como um fim em si mesmo, passando a sentir prazer em realizá- la além do necessário para alcançar o seu objetivo, pois desta forma o indivíduo consegue demonstrar as suas virtudes atléticas, que o faz merecedor de melhores cotações na bolsa, além de receber elogios e honras entre os membros do seu próprio grupo, da sua comunidade ou academia que representa. Mesmo durante todo o século XX ter ocorrido um processo de intensificação do controle da violência e das normas de quietude ( aversão a castigos corporais e execuções públicas), vivemos a violência de forma sofisticada, onde ela se apresenta compartimentada, pois nos episódios que envolvem lutadores de Vale Tudo as brigas ocorridas na rua, são entre os grupos e neste caso ninguém se considera culpado pelos danos físicos proporcionados ao oponente, o que reforça a idéia entre uma possível cisão entre o lutador de Vale Tudo e o indivíduo que pratica Vale Tudo, aumentando a contradição e a dificuldade de perceber o auto-controle deste indivíduo. Diante desta aporia^10 , podemos dizer que esta contradição tem alcance geral, podendo provocar uma cisão da consciência e um desdobramento da moralidade, afetando as relações de interdependência constituída pela sociedade. A dupla orientação marca, tanto os lutadores quanto os torcedores, pois mesmo que eles não recebam o mesmo papel no uso da violência acabam sendo estimulados, utilizando-a como algo que se torna normal em suas vidas, pois em uma situação de divergência de opiniões e de confronto VALE TUDO!
10 Aporia: conflito entre opiniões contrárias e igualmente concludentes, em resposta a uma mesma questão.