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Uma análise breve da política de diplomacia cultural da espanha em relação ao brasil, com ênfase no trabalho do instituto cervantes durante a década de 1990. O autor examina como a transformação da diplomacia cultural espanhola, inspirada em modelos europeus, é crucial para entender sua ação atual no campo cultural. O documento também discute a importância da participação de outros atores sociais na produção e promoção de valores nacionais, e a expansão da política cultural espanhola além da américa latina e da europa ocidental.
Tipologia: Notas de estudo
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A política externa cultural espanhola para o Brasil
JÚLIA ERMINIA RISCADO
Este trabalho tem como objeto analisar brevemente a política de diplomacia cultural da Espanha para o Brasil, dando enfoque ao trabalho do Instituto Cervantes ao longo da década de 1990. Tal recorte temporal foi escolhido por estar situado no período em que se buscou eliminar qualquer vestígio da política externa anterior promovida durante o governo de Franco. A transformação da diplomacia cultural espanhola, inspirada nos demais modelos europeus, é crucial para a melhor compreensão de sua ação atual no campo cultural. Se, atualmente, a Espanha é reconhecida por ter uma diplomacia cultural de grande relevância no cenário internacional, deve-se perceber que o aprimoramento de suas políticas culturais ocorreu em paralelo com a valorização do aspecto cultural ao longo do século XX. Observar este processo auxilia o entendimento das características que definem a diplomacia cultural espanhola. Inicialmente, o desenvolvimento no campo foi tímido, se comparado aos demais países europeus, em especial Alemanha e França. Autores como L. Bonet (BONET, 1999; 89-99) trabalham com a idéia de que as constantes rupturas na estrutura política nacional priorizariam a restauração da ordem no interior do país, deixando a política externa, centralizada nos interesses comerciais, em segundo plano até um momento mais recente. Lorenzo Delgado e Maria Figueroa (GÓMEZ-ESCALONILLA & FIGUEROA,2008), contudo, anunciam uma maior complexidade nos compromissos internacionais culturais. Além das dificuldades encontradas com a documentação que tiveram contato, os autores perceberam que, de início, o próprio Ministério de Assuntos Exteriores Espanhol não entendia tais ações como parte relevante de sua política. Ainda segundo Lorenzo Delgado e Marisa Figueroa, as primeiras ações no campo cultural promovidas pela Espanha foram datadas nas três primeiras décadas do século XX, direcionadas apenas a América e tendo como referência o modelo francês. Seu intuito era primordialmente usar da via cultural como propaganda internacional.
(^) Mestranda em História Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).
Nos anos da Segunda Guerra Mundial a atuação na área da cultura foi pouco significativa, sofrendo uma transformação já no Franquismo. Neste momento a política cultural poderia amenizar a imagem do regime. Obviamente, a atuação Franquista no campo cultural foi profundamente distinta àquela do período democrático. Nos anos oitenta predominou a transformação e expansão da atuação das políticas exteriores culturais. A Constituição de 1978 já indicava uma postura distinta do Estado a questões culturais internas, irradiando ao discurso internacional. Pretendia-se assegurar o respeito às diversidades culturais existentes dentro do território espanhol, dando certa autonomia às Comunidades Autônomas e atribuindo ao Estado apenas parte desta responsabilidade. De acordo com Tanja Börzel, a Espanha passou por uma grande transformação além da democratização, ao desenvolver uma política interna de “parceria” com as 17 Comunidades Autônomas causada pelo processo que a autora define como “Europeização”:
“The shift from competitive regionalism to cooperative federalism is the result of the progressive Europeization of the Spanish state and its autonomous communities, which has encouraged consultation and cooperation between the national government and regions. As traditional forms of intergovernmental relations proved ineffective for necessary coordination and cooperation, the Spanish government and the autonomous communities established a new procedure for cooperating in European affairs – the first institutional framework to provide for the joint participation of all 17 autonomous communities in central-state decisionmaking” (BÖRZEL,2000;18).
Apenas em 1994 foi firmado o acordo entre Estado espanhol e as demais Comunidades Autônomas para enfatizar a cooperação multilateral, deixando de lado as negociações bilaterais e as competições regionais que caracterizavam a dinâmica interior da Espanha até aquele momento. Trazer outros atores sociais à condição de produtores e promotores dos valores nacionais foi importante não só para o desenvolvimento da política cultural do país como também para a formação de uma postura internacional nos padrões soft power. Em paralelo, vale destacar a década de 80 como um período marcante na história da diplomacia cultural espanhola, uma vez que sua política internacional cultural passa a não se limitar mais a países da América Latina e Europa Ocidental. Nesse momento,
passaria a ter uma atitude mais pró–ativa quanto à política cultural. Edgar Telles Ribeiro explica perfeitamente essa condição na seguinte passagem:
“Se o bem cultural é, por definição, visível, palpável, audível ou perceptível de diversas maneiras (o filme exibido, o livro discutido, o balé dançado, a bolsa de estudos usufruída, a escultura vista ou tocada, a música ouvida, a comida saboreada, a assistência técnica recebida, etc.), as conseqüências de sua utilização, sobretudo no contexto de programas da política externa, são, no entanto, essencialmente invisíveis.” (RIBEIRO, 1989; 26)
E complementa ao afirmar que “dois Estados podem, em períodos de grande tensão, manter – e até estimular – relações culturais. Esse tipo de comunicação permite deixar as portas entreabertas para facilitar e encorajar futuros mecanismos de aproximação” (RIBEIRO, 1989; 27). Com relação ao Brasil, observa-se que a cooperação bilateral cresceria gradativamente entre os anos de 1975-1995, principalmente nos campos econômico e político. Nessa primeira fase, de acordo com Bruno Ayllón (AYLLÓN, 2007), a cooperação econômica abriu espaço para um contato promissor entre Brasil e Espanha, antes pouco valorizado pelos dois países. Contudo, a escolha pela opção cultural viria como uma maneira estratégica de atenuar os conflitos comerciais entre Brasil e Espanha surgidos desde a adoção de tarifas protecionistas sobre o café brasileiro em 1979 (CERVO & BUENO, 1992). Vale destacar que para autores como Bruno Ayllón (AYLLÓN, 2007) e Susana Kakuta (KAKUTA, 1993; 213-228) as relações culturais ainda não seriam reconhecidas com o terceiro pilar na política externa da Espanha, ao contrário de autores como Mônica Lessa, Telles Ribeiro e Maria Susana Arrosa Soares. As ações de promoção cultural dos países, neste caso por parte da Espanha, não ganharam o devido destaque no processo de integração e cooperação bilateral. Após 1995 esses relacionamentos tornar-se-iam mais dinâmicos e funcionais, resultado da política cultural no período. Entendido como resultado de trocas culturais entre os países, este processo de aproximação e identificação mútua viria através de importantes iniciativas como a instauração do Instituto Cervantes no Brasil. Pensar a atuação desta instituição leva a aproximação do pensamento foucaultiano quanto à análise das relações de poder. Segundo Foucault,
“as relações de poder enraízam-se no conjunto da rede social. Isto não significa, contudo, que haja um princípio de poder, primeiro e fundamental que domina até o menor elemento da sociedade (...) É certo que o Estado nas sociedades contemporâneas não é simplesmente uma das formas ou um dos lugares – ainda que seja o mais importante – do exercício do poder, mas que, de certo modo, todos os outros tipos de relação de poder a ele se referem. Porém, não porque cada um dele derive. Mas, antes, porque se produziu uma estatização contínua das relações de poder”(FOUCAULT, 1995;247).
Explorar as diversidades presentes neste longo processo de transformação torna- se uma importante via de compreensão da política externa espanhola contemporânea. Ressaltar o recorte temporal tão recente possibilita explora não apenas a mudança de atitude por parte de Espanha com relação a importância aos assuntos culturais em sua política externa como também indica uma postura mais pró-ativa do governo brasileiro nesse aspecto, valorizando os esforços daquele país. Considerando esse contexto recente, o presente trabalho se encontra numa fortuita interseção entre história política com história cultural, analisando o papel de uma instituição de caráter cultural e seus desdobramentos para o cenário internacional, além dos contextos internos dos países em questão. Embora a pesquisa verse primeiramente sobre o entendimento da diplomacia cultural espanhola, é também possível explorar sua relação com os demais âmbitos da política externa da Espanha. A construção da idéia de proximidade com o Brasil serviria não somente para legitimar sua influência na região latino-americana, mas, sobretudo, para manter um vínculo entre os países acima de questões econômicas. A Espanha se baseou no modelo de atuação de diplomacia cultural francês, o tendo adaptado a sua realidade fragmentada pelas comunidades autônomas. Ao consolidá-lo institui no cenário internacional, em especial para América Latina e Europa Ocidental. Em especial no caso latino-americano, podem ser traçados relevantes paralelos ao pontuar comparativamente as formas de atuação espanhola aos demais países da região além do Brasil. Estas diferenciações expõem ainda mais a condição de destaque do país frente aos interesses espanhóis.
Para os autores, o conflito seria decorrente o conflito seria decorrente de diferentes interesses nacionais específicos. O discurso estatal seria entendido como resultado das realidades presentes em cada uma dessas sociedades, por isso suas discordâncias. É no interior das sociedades que os discursos nacionais viriam a ser proferidos e aceitos. Nogueira e Messari, contudo, rejeitam a possibilidade de existência de uma anarquia no interior dessas estruturas sociais. As identidades nacionais seriam ser vistas como fator preponderante na formação da identidade cultural. Para a construção de identidades nacionais é “preciso definir interesse nacional e, para defini-lo, é preciso definir as identidades que estão em sua origem” (NOGUEIRA & MESSARI, 2005). De acordo com Pierre Milza (In RÉMOND,2008), é fundamental a criação uma produção simbólica capaz de criar o sentimento de pertencimento social dos indivíduos referentes à sua nação. Os discursos nacionais seriam construções sociais que precisariam do respaldo da opinião pública para serem fixados em âmbito internacional. Embora seja difícil estabelecer um consenso quanto à definição de cultura política, Eliana Dutra conclui ser, em referência à Geertz, a formação de um sistema simbólico, a configuração de um esquema de circulação de sentidos que dariam autoridade às ações políticas. Com isso, cultura política viria a ser um universo político formado por “valores, regras e crenças compartilhadas em função de uma leitura comum do passado, de aspirações e projeções de um futuro a ser vivido em conjunto; e da comunicação de uma mesma visão de mundo” (DUTRA,2002;24). O sentido histórico compartilhado por uma coletividade possibilitaria a formação de uma base ideológica que daria organização ao discurso político estatal. E este seria aplicado tanto dentro como fora de seu território, alçando o ambiente das relações internacionais. De acordo com Jean François Sirinelli (RIOUX & SIRINELLI, 1998), a história teria o papel determinante na formação das culturas políticas. Isso porque, o enfoque dado a momentos históricos específicos legitimaria as ações políticas do presente. Cada cultura política apresentaria uma herança tradicional específica e única. É interessante construir uma análise comparativa da política externa cultural espanhola para o Brasil em diferentes momentos. Dar notoriedade a documentação
existente no Instituto Cervantes e consulares, que podem contribuir ainda mais com a compreensão de sua dinâmica. A fim de obter maiores informações sobre o Instituto Cervantes foi possível explorar brevemente o acervo documental e bibliográfico em sua sede no Rio de Janeiro. Observar as publicações internas, atas de seus congressos, catálogos, entre outros, facilita ainda mais o entendimento da difusão cultural da língua e cultura espanhola, além de perceber como essas ações são recebidas no Brasil. Criado em 1991, o Instituto Cervantes surge com o intuito de ensinar e promover a língua e cultura hispânica. Além disso, realiza atividades conjuntas com outras organizações espanholas e hispano-americanas e é integrado por representantes do Ministério de Assuntos Exteriores, da Educação e Ciência, da Cultura, entre outros. Com sede em Madri, o Instituto conta também com 74 sedes ao redor todo o mundo. Na América do Sul são 9 sedes, das quais todas se localizam no Brasil. A primeira sede no país foi inaugurada no ano de 1998 em São Paulo, seguido pelo Rio de Janeiro em 2001 e Brasília, Curitiba e Porto Alegre em 2007. Segundo dados do próprio Instituto Cervantes, de 2008-2009 foram realizadas 5.227 atividades culturais, sendo 50% destas relacionadas a mostras de cinema e 25% correspondem a atividades como ciclos monográficos, colóquios, feiras, festivais, congressos, oficinas, etc. Durante o mesmo período foram oferecidos 13.239 cursos de espanhol e 656 cursos de formação de professores, totalizando 13.895 cursos. Já o número de matrículas chegou a 126.799. Além disso, seu acervo bibliográfico é formado por um total de 1.027.351 volumes, distribuídos entre as bibliotecas que compõem a rede. Os dados acima mostram a expressiva atuação do órgão pelo mundo e seu investimento contínuo na difusão da cultura espanhola. No Brasil, seu crescimento esteve intimamente ligado a Lei do Espanhol, promulgada em 4 de agosto de 2005, em que tornava obrigatória, dentro do prazo de cinco anos, a inclusão do espanhol como disciplina optativa no Ensino Médio das escolas brasileiras. Esses dados apontam para inúmeros caminhos a serem seguidos e estudados tanto no campo da História Contemporânea como das Relações Internacionais. Pode-se, com isso, afirmar que as possibilidades de discussão em torno dos reflexos da tentativa de identificação e aproximação cultural entre estes países são infinitas.
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