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Este artigo discute a democratização da gestão da política de assistência social em londrina, paraná, entre 2001 e 2004, enfatizando o acesso à informação e a participação dos sujeitos envolvidos. O texto revela que a democratização é entendida como viabilização do acesso aos direitos sociais e a participação, baseada na descentralização política-administrativa e na participação da comunidade.
Tipologia: Notas de estudo
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Márcia Pastor Universidade Estadual de Londrina (UEL)
A democratização da gestão da política de assistência social: fragmentos de um estudo Resumo : Este artigo discute o acesso à informação como um dos aspectos constituintes da gestão democrática a partir da experiência da política de assistência social em Londrina, Paraná, no período compreendido entre 2001 e 2004. Traz apontamentos sobre democratização e gestão e examina as visões dos sujeitos envolvidos na efetivação desta política pública. Os dados coletados através de pesquisa documental e de entrevistas semi-estruturadas com gestores, conselheiros municipais, dirigentes de entidades sociais, assistentes sociais e usuários, que compuseram a tese de doutorado da autora, revelaram o entendimento da democratização como viabilização do acesso aos direitos sociais e à participação. O acesso às informações evidenciou-se como elemento qualificador da gestão democrática e como princípio incorporado na prática dos gestores e profissionais. Palavras-chave : assistência social, democratização, gestão, acesso à informação.
The Democratization of Social Assistance Policy Administration: Fragments of a Study Abstract : This article discusses access to information as one of the essential elements of democratic administration based on the experience of the social assistance policy in Londrina, Paraná, from 2001 - 2004. It discusses democratization and management and examines the views of the actors involved in the enactment of this public policy. The data collected in the study of documents and semi- structured interviews with administrators, municipal council members, directors of social entities, social workers and users, was used for the author’s doctoral thesis. They reveal the understanding of democratization as making viable access to social rights and participation. The access to information proved to be a qualifying element in democratic management and a principle incorporated in the practice of managers and professionals. Key words : social work, democratization, administration, access to information.
Recebido em 16.04.2007. Aprovado em 03.07.2007.
RELATO DE EXPERIÊNCIA
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Introdução
A implementação da gestão democrática da as- sistência social revela que é no cotidiano que se cons- trói, com avanços e com limites, uma política pública afiançadora de direitos, especialmente numa conjun- tura que assiste à destruição dos padrões de prote- ção embasados no trabalho e da tentativa de destitui- ção dos direitos sociais. Por isso, falar em gestão democrática é falar tam- bém da busca pela efetivação dos direitos sociais, particularmente para os setores sociais excluídos e que se encontram em condições mais vulneráveis.
A democratização e a gestão: apontamentos iniciais
Ao olharmos as últimas três décadas, podemos testemunhar o quanto a sociedade brasileira avan- çou em termos de resgate dos direitos políticos e de consagração dos direitos sociais: do regime de exce- ção ao pluripartidarismo; do Colégio Eleitoral às elei- ções diretas para presidente; das reivindicações e emendas populares à garantia dos direitos sociais assegurados pela Constituição Federal de 1988. Analisando esse período, Chauí (2004, p. 1) as- sim se refere:
A Constituinte que tivemos nos anos oitenta foi essencial para o processo democrático, fez parte dessas lutas políticas, sociais e democráticas, mas, no caso, significa também a ampliação da noção de democracia, na qual a democracia não é confundi- da apenas como um tipo de governo, mas é pensa- da como a presença de direitos sociais, econômi- cos e culturais.
Ao reconhecer que os direitos sociais são legiti- mados e que devem ser garantidos primordialmente através da ação do Estado, diversos segmentos soci- ais investiram tanto na cobrança como na proposi- ção de ações a serem implementadas pelo poder pú- blico, reivindicando também a ampliação da partici- pação em suas várias instâncias. A década de 1990 foi marcada pela elaboração das leis complementares à Constituição, dentre as quais podemos destacar o Estatuto da Criança e do Adoles- cente (ECA-Lei 8.069/1990), a Lei Orgânica da Saú- de (Leis 8.080/1990 e 8.142/1990) e a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS-Lei 8.742/1993). Den- tre outros atributos, tais leis indicaram a descentralização político-administrativa e a participa- ção da população como diretrizes a serem adotadas para a execução das políticas sociais (BRASIL, 2007). Há que se considerar que a luta pela efetivação dos direitos inscritos na Constituição continuou sen-
do protagonizada pelas classes dominadas e por se- tores progressistas. Foi num período marcado pela imposição das diretrizes neoliberais que, dentre ou- tras ações, procurou desqualificar movimentos sindi- cais e sociais rotulando-os como representantes do atraso e prejudiciais à democracia; promoveu a des- tituição dos direitos trabalhistas; impôs medidas pro- visórias, restringindo direitos sociais e previdenciários e reduzindo o já precário sistema de proteção social. Sob a égide de um regime político democrático, di- versas experiências provocaram a revisão e a re-sig- nificação de conceitos e de estratégias que, no limiar do século 21, dessem conta de explicar as mutações de uma sociedade cuja riqueza crescia velozmente, mas que, simultaneamente, alijava deste progresso um contingente crescente da população brasileira. Autor do célebre artigo A democracia como va- lor universal , publicado em plena vigência da dita- dura militar (1979), Coutinho polemizava, dentro do campo da esquerda, o reducionismo do entendimen- to da democracia como uma etapa de transição do capitalismo para o socialismo. Transcorridos mais de vinte anos da publicação de tal artigo, o autor propôs a rediscussão do tema, res- saltando a democracia como um processo histórico:
Talvez hoje eu mudasse o título do meu artigo para ‘A democratização como valor universal’, porque a democracia é necessariamente alguma coisa que se aprofunda e que combina indissoluvelmente refor- mas políticas com reformas econômicas e sociais. A democracia é soberania popular, é construção de uma comunidade participativa, é igualdade (COUTINHO, 2000, p. 129).
Já Oliveira (2000) relembra que nos anos 1980 a democracia foi saudada como uma importante con- quista social e trouxe consigo uma grande expectati- va de governabilidade. Logo em seguida, porém, o que se assistiu foi uma série de ações concretas, pau- tadas nos ditames neoliberais, visando a destruição dos direitos coletivos. Embora a democracia estivesse constantemente presente nos discursos oficiais, processou-se um movimento de ‘desqualificação da política’, de su- pressão dos dissensos, de ‘destituição da fala’ e de desmoralização das demandas sociais e das alterna- tivas apresentadas ao modelo imposto, rotuladas como ‘arcaicas’. Tentou-se criar uma falsa consciência sobre a ‘desnecessidade do público’, repertório obvi- amente necessário para os processos de privatização que marcaram a década de 1990.
O que a destruição do público opera em relação às classes dominadas [...] é a destruição de sua políti- ca, o roubo da fala, sua exclusão do discurso reivindicativo e, no limite, sua destruição como clas-
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se a despolitização da própria questão social e a ame- aça de ver frustrada a universalização e a efetivação de direitos sociais legalmente adquiridos, que podem vir a ser substituídos “pelo dever moral de atender à pobreza.” A interpretação neoliberal sobre o papel do Esta- do estimulou diversos debates, dentre os quais se si- tua a proposta de reforma do Estado, que partia do pressuposto da necessidade da administração públi- ca incorporar procedimentos gerenciais visando a eficiência de suas ações. De acordo com Bento (2003, p. 152),
[...] o plano de reconstrução do Estado vai além de um imperativo de eficiência. Trata-se também de reconstruir a esfera pública, de fortalecer a socie- dade civil, sua capacidade de autogestão; ao mes- mo tempo, de superar o insulamento burocrático, de combater a falta de responsabilidade política e administrativa pela má formulação ou implementação de estratégias, e de prevenir a captura dos gover- nos por interesses corporativos e a privatização do espaço público.
As discussões a respeito da gestão emergem na segunda metade da década de 1990. Dentre as especificidades da gestão pública, Nogueira (1998, p. 202) situa que
[...] a gerência pública não se separa da questão da democracia e do aperfeiçoamento dos mecanismos democráticos, devendo-se dedicar a estimular a participação dos cidadãos e a fazer com que os atos do poder sejam transparentes e estejam sub- metidos a um efetivo controle social.
A perspectiva que norteia este estudo pauta-se na compreensão da gestão exercida no terreno dos direitos e desenvolvida de forma a contar com a par- ticipação de profissionais, conselheiros e usuários, dentre outros, não apenas na discussão como tam- bém na deliberação sobre ações a serem adotadas. É necessário considerar a democratização da ges- tão como o espaço onde se negocia o consenso entre os diversos atores sociais, geralmente motivados por seus interesses específicos. Compreende-se, pois, que o exercício da gestão democrática seja eivado de conflitos e contradições, mas também abre uma pos- sibilidade de publicizar os interesses em disputa.
Uma expressão da democratização da gestão da assistência social no município de Londrina: o acesso à informação
Ao discutir a gestão da política de assistência so- cial implementada a partir da década de 1990 do sé- culo 20, faz-se necessário pontuar, ainda que breve-
mente, o contexto histórico no qual se desenvolve esta política pública no país. As contradições imanentes às políticas sociais no capitalismo assumem contornos mais nítidos quando se referem à assistência social, visto que esta se ca- racteriza pela tensão permanente entre responder às demandas mais agudas decorrentes da questão soci- al, ao mesmo tempo em que questiona as condições que geram estas mesmas demandas. Ao atender as carências das camadas empobrecidas, contribui para a reprodução do próprio modelo capitalista que cria essa pobreza, estruturado na apropriação privada da riqueza socialmente produzida. As diretrizes e os princípios estabelecidos pela LOAS, entretanto, surgem na contramão da conjun- tura dos anos 1990, onde se observou a adoção das medidas neoliberais que ditavam ao Estado a redu- ção dos gastos nas áreas sociais. Nas palavras de Raichelis (1998), tal situação demonstrava um dos grandes desafios para a política de assistência social: estruturar-se como ‘política’ e consolidar-se como ‘pública’. De fato, a implantação da assistência social não só como uma política pública, mas também com a perspectiva democrática em sua gestão, mereceu atenção em diversas administrações municipais, como no estudo de caso do município de Londrina, no esta- do do Paraná, referente ao período compreendido entre os anos 2001 a 2004 (PASTOR, 2006). A preocupação com a construção dessa política fez-se notar desde a criação do órgão gestor munici- pal, em 1993. Porém, a estruturação de programas e serviços com orçamento e equipe próprios, obtidos neste mandato (1993-1996), não teve continuidade na administração seguinte. As experiências da segunda gestão (1997-2000) demonstraram, mais uma vez, o quanto a área da assistência é vulnerável às determinações políticas no âmbito local, além de susceptível às macrodeterminações políticas e econômicas, especi- almente na conjuntura em que vivíamos na transição do século 20 para o 21. Por sua vez, o período refe- rente aos anos 2001 a 2004 – abordado no estudo citado – trouxe avanços consideráveis quanto à de- mocratização da gestão. Mais uma vez, cabe ressaltar que o processo de construção da gestão da assistência social no âmbito municipal insere-se num contexto maior no qual se constata “a existência de uma cultura política que se mantém ao longo do autoritarismo, sugerindo um en- tendimento da democratização como um processo mais longo de transformação da cultura política e das relações Estado-sociedade” (AVRITZER, 1995, p.109-110). Ter esta compreensão sobre o movimento histórico é essencial para balizar as melhorias con- cretizadas, ainda que limitadas pelos marcos estrutu- rais da ordem capitalista.
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Na pesquisa desenvolvida, levantou-se com um con- junto de atores (uma gestora municipal, duas assesso- ras, duas assistentes sociais, dois conselheiros munici- pais, três dirigentes de entidades assistenciais e três usu- ários) suas visões sobre a gestão da política municipal de assistência social. Os dados coletados revelaram o entendimento da democratização como viabilização do acesso aos direitos sociais e à participação. Devido aos limites deste artigo, optou-se por abor- dar um dos elementos indicados como expressão da democratização: o acesso à informação como requi- sito para uma gestão democrática. Frações de alguns depoimentos dos entrevista- dos serão apresentadas a seguir, visando ilustrar e socializar parte das reflexões por eles proporciona- das. O acesso dos usuários às informações – e ao conhecimento, de forma mais abrangente – foi en- tendido como condição para que estes consigam acessar os próprios direitos sociais:
A gente vê que tem muitas pessoas que estão caren- tes de informação, que não vão atrás, não porque não querem: é porque nem têm informação de como buscar essa informação (Dirigente de Entidade 1).
A falta de informação é mais um mecanismo de opressão porque pode desviar as pessoas dos cami- nhos de acesso a seus direitos.
Se o usuário não tem informação, às vezes ele se vê precisando de recurso para pagar um advogado para lutar, para conseguir o seu direito. E devido à sua situação financeira, ele às vezes deixa de con- quistar direitos, porque não tem conhecimentos e não tem recursos para pagar um advogado; então ele deixa o direito de lado (Dirigente de Entidade 1).
Este depoimento de- monstra claramente a com- preensão e a necessidade de se democratizar as informa- ções. Por isso, corrobora-se a afirmação de Dowbor (2001) que postula que a in- formação é um ‘pré-direito’, porque é uma forma de acessar outros direitos, constituindo um elemento central da cidadania e da qualidade da gestão. A socialização do conhe- cimento é indicada como um pressuposto para o exercício do poder decisório:
Para mim, não tem democratização se não tiver partilha do poder decisório – esse é o espaço da democratização. O Conselho é um espaço de par-
tilha. Ocorre que a partilha não acontece se você não tiver divisão de saberes, partilha de conheci- mento (Gestora).
Nota-se que esta gestora demonstra ter muita cla- reza sobre a dualidade do conhecimento, sobre o ris- co de manipulação, mas também sobre seu caráter emancipatório:
Por outro lado, o conhecimento sempre foi uma arma importante, a favor e contra. Você pode informar as pessoas pela sua cartilha, se quiser. Quer dizer, você pode formar sem garantir autonomia de pensamen- to, sem criticidade suficiente para opinar (Gestora).
Seguindo esta perspectiva, a gestora afirma que a democratização da gestão “é uma ação mais políti- ca que técnica, porque você pode criar espaços téc- nicos de fala (sic), porém pode não conseguir espa- ços políticos de decisão.” Verifica-se que os instru- mentais administrativos não são descartados; pelo contrário, o que se enaltece é a dimensão política da gestão, como já discutia Nogueira (2004, p. 11-12):
Por se dispor a dirigir, coordenar e impulsionar a formação ampliada de decisões, a gestão democrá- tica opera em um terreno que não se esgota no administrativo, no manuseio de sistemas e recur- sos, mas se abre para o universo organizacional como um todo. Ela é essencialmente dialógica, e transcorre em ambientes éticos e políticos povoa- dos de pessoas, desejos e interesses que não po- dem ser simplesmente ‘gerenciados’.
Tendo em vista a importância atribuída à partici- pação no processo de gestão, outro eixo selecionado para avaliar a implantação da gestão democrática em Lon- drina foi a ampliação dos es- paços participativos. É preciso deixar explícito que a democratização alme- jada não se limita e nem se aplica exclusivamente aos organismos estatais incumbi- dos da execução da política de assistência social. A de- mocratização vem sendo delineada aqui como uma mo- dalidade de operar a política pública de assistência social, tendo por base o sistema des centralizado e participativo preconizado pela LOAS. Outra característica apontada pelo Conselheiro 2 (que ocupou o cargo de vice-presidente no período analisado) sobre o caráter democrático da gestão foi a autonomia: