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Álvares de Azevedo: A Revolução Romântica na Literatura Brasileira, Notas de estudo de Construção

Este texto analisa a obra de álvares de azevedo, um escritor romântico brasileiro, e sua contribuição para a revolução na concepção e realização de todas as artes, incluindo literatura. O autor discute a importância da discordância e contraste na obra de azevedo, bem como sua organização meticulosa e sua popularidade entre a juventude da época.

O que você vai aprender

  • Como a discordância e o contraste foram empregados na obra de Álvares de Azevedo?
  • Qual foi a visão de Azevedo sobre a literatura?
  • Qual foi a organização interna de sua produção literária?
  • Qual foi a contribuição de Álvares de Azevedo para a revolução na concepção e realização de todas as artes?
  • Como Azevedo foi lido e imitado pela juventude da época?

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Raimundo
Raimundo 🇧🇷

4.6

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GERSIANE FRANCIERE FREITAS RIBEIRO
A CONSTRUÇÃO DAS PERSONAGENS FEMININAS EM
NOITE NA TAVERNA
Montes Claros
Universidade Estadual de Montes Claros
Setembro/2015
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GERSIANE FRANCIERE FREITAS RIBEIRO

A CONSTRUÇÃO DAS PERSONAGENS FEMININAS EM NOITE NA TAVERNA

Montes Claros

Universidade Estadual de Montes Claros

Setembro/

GERSIANE FRANCIERE FREITAS RIBEIRO

A CONSTRUÇÃO DAS PERSONAGENS FEMININAS EM NOITE NA TAVERNA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Letras: Estudos Literários, da Universidade Estadual de Montes Claros, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Letras – Estudos Literários. Área de concentração: Literatura Brasileira Linha de Pesquisa: Tradição e Modernidade Orientadora: Professora Doutora Telma Borges Silva

Montes Claros

Universidade Estadual de Montes Claros

Setembro/

Aos meus pais, José Wilson e Vanete, por todo amor, carinho e dedicação.

RESUMO

O trabalho se propôs, a partir do livro Noite na taverna , uma análise da imagem da mulher construída por Álvares de Azevedo, do arsenal simbólico utilizado nessa construção e a maneira como os personagens, tanto masculinos quanto femininos, neste livro, subvertem a moral da época, século XIX. Para tanto, traçamos um perfil das mulheres que aparecem em Noite na Taverna , a fim de compreender como o autor construiu essas personagens e qual o papel desempenhado por elas nos contos, além de pesquisar se essas personagens femininas fugiram ou não ao ideal romântico vigente na época, assim como os temas e a escrita de Azevedo diferiam dos outros autores de seu tempo. Do mesmo modo, buscamos apreender de que forma essa obra, que nunca gozou do mesmo prestígio acadêmico de Lira dos vinte anos ou de Macário , relaciona a mulher à temática do mal. Como resultado, mostramos que o paradigma de feminilidade construído por Azevedo em Noite na taverna reflete a busca por um progressismo, tanto no âmbito literário quanto no social, colocando em xeque os valores básicos da moral e da família burguesa brasileira na segunda metade do século XIX.

Palavras-chave : Tradição e Modernidade, Álvares de Azevedo, Noite na taverna ,

Personagens femininas, Mal.

ABSTRACT

The present paper propose to analyze the figure of the womam in Noite na Taverna’s book according to Álvares de Azevedo’s perspective. It will consider the symbolic arsenal used in this construction and the way of the characters presented in this book, both male, and female, subvert the moral aspects in the nineteenth century. For that, we constructed a profile of the women who appear in Noite na Taverna in order to understand how the author create these characters and the role played by them in the tales. It also intend to investigate whether these female characters ran away or not in the ideal current romantic period. Likewise, we try to understand how this book, relate the woman to the theme of evil. Such intention has never enjoyed the same academic prestige as it occurs in Lira dos vinte anos or Macário books. As a result, we will show that the femininity paradigm developed by Azevedo reflects the investigation for a progressivism in both, literary and social aspect, questioning the basic values of moral and bourgeoisie family in the second half of the XIX century.

Key Words: Tradition and Modernity, Álvares de Azevedo, Noite na Taverna , Female characters, Badness.

INTRODUÇÃO

Manuel Antônio Álvares de Azevedo, ou simplesmente “Maneco”, como era chamado pela família e amigos, nasceu em 12 de setembro de 1831, na casa de seu avô em São Paulo. Vinte anos depois sofreu um acidente, queda de cavalo, cuja consequência foi um tumor na fossa ilíaca. O agravamento da doença o levou ao falecimento em 25 de abril de 1852, no Rio de Janeiro. É considerado o maior expoente do Ultrarromantismo brasileiro e, de acordo com alguns biógrafos e pesquisadores, como Manoel Cerqueira Leite, era homem de pequena estatura e delicada compleição: de testa ampla e morena, mas muito pálido – palidez assinalada não só por Paulo Eiró, como também por Bernardo Guimarães – a voz, fina e de pouco volume, emprestava-lhe à palavra uma certa suavidade, uma certa maciez. Era um bom amigo; às vezes, um pouco altivo. Uma alma caridosa e afável, um admirável conversador, uma vigorosa imaginação, atraída pelo fantástico, pelo terrível, comprazendo-se no fúnebre, no sinistro. Em vida, Álvares de Azevedo publicou apenas alguns discursos acadêmicos e fúnebres. Postumamente foram publicados alguns estudos literários e cartas, além das obras Lira dos vinte anos , O poema do Frade , O conde Lopo , O livro de Fra Gondicário , Macário e Noite na taverna , que será nosso objeto de estudo. Nesse sentido, o trabalho se propôs a uma análise da imagem da mulher construída por Álvares de Azevedo em Noite na Taverna e tem por questão central: As personagens femininas nos contos de Noite na taverna fogem ou não ao ideal romântico vigente na época? Tal questão nos levou à hipótese de que Álvares de Azevedo, no processo de elaboração dessas personagens , segue o mesmo padrão vigente do Romantismo: enquanto castas, são anjos do bem, se são sedutoras, anjos do mal. Contudo, utiliza esse modelo para depois subvertê-lo. Para o desenvolvimento da pesquisa, traçamos um perfil das mulheres que aparecem na obra a fim de compreender como o autor construiu essas personagens e qual o papel desempenhado por elas nos contos, além de pesquisar se essas personagens femininas fugiram ou não ao ideal romântico vigente na época, assim como os temas e a escrita de Azevedo diferiam dos outros autores de seu tempo. Do mesmo modo, buscamos apreender de que forma essa obra, que nunca gozou do mesmo prestígio acadêmico de Lira dos vinte anos ou de Macário , relaciona a mulher à temática do mal. É necessário deixar claro, antes de tudo, que o trabalho aqui apresentado, ao propor uma

análise da representação da mulher em Noite na taverna , não pretende oferecer um estudo sobre a vida das mulheres da época. Tem, antes, como objetivos, compreender a imagem da mulher construída pelo autor, o arsenal simbólico utilizado nessa construção, e a maneira como a representação do feminino em Azevedo reflete ou não a moral da época e da escola literária em vigor. Para tanto, esta análise se norteou pelas literaturas de textos teóricos e críticos que enfocam o autor e a obra estudada, bem como a representação da mulher no universo literário romântico e na sociedade brasileira do século XIX. Assim sendo, foi realizada uma pesquisa bibliográfica numa travessia pelas fundamentações de Antonio Candido, Cilaine Alves, Andréa Sirihal Werkema, Karin Volobuef, Mário Praz, Hildon Rocha, João Adolfo Hansen, Vera Pacheco Jordão, Angélica Soares, José Veríssimo, Sílvio Romero, Jacó Guinsburg, Giovanni Papini, Carlos Roberto F. Nogueira, Georges Bataille, Octavio Paz, Ruth Silviano Brandão, Judith Butler, Affonso Romano de Sant’Anna, Décio de Almeida Prado, dentre outros estudiosos. A dissertação foi divida em três capítulos. No primeiro capítulo, fizemos uma explanação sobre o Romantismo, não só como estilo de época, mas como berço para o escritor, até percorrermos um caminho que nos levou ao contexto da obra de Azevedo, a segunda geração romântica, dita Ultrarromântica, quando pudemos discorrer sobre o estilo romântico de Azevedo. Perpassamos, também, pelas exposições de alguns críticos acerca da obra azevediana, em especial Noite na taverna que, de acordo com Candido, junto com o drama Macário , formam uma modulação ficcional, uma mistura de gêneros, que faria parte do projeto literário do escritor. No segundo capítulo, realizamos uma discussão acerca do perfil das personagens femininas que predominavam na literatura romântica, caminho que nos levou ao nosso objetivo principal: analisar as personagens femininas de Noite na taverna , além de discutir se Álvares de Azevedo também assumiu uma postura diferente dos seus contemporâneos na formulação dessas personagens. No terceiro e último capítulo, tratamos da questão do mal como forma de libertação. Para tanto, fizemos um percurso histórico sobre o mal na literatura, sobretudo no período romântico, desde as obras mais aclamadas até Noite na taverna. Nesse sentido, também fizemos uma explanação acerca da relação entre a mulher e o mal que, como veremos, de acordo com os preceitos religiosos, estiveram ligados desde o princípio. E, finalmente,

Capítulo 1

O ROMANTISMO DE ÁLVARES DE AZEVEDO: UM

ESCRITOR DE TENDÊNCIA UNIVERSAL

Seria inútil, portanto, tentar enfeixar numa definição formal, num conjunto de normas bem delimitadas, o que foi sobretudo necessidade de expansão, quebra de barreiras morais e estéticas, questionamento da arte, da sociedade e do homem. (...) Ao passarmos das certezas clássicas às incertezas românticas não podemos evitar a impressão de que é a nossa própria história que começa. Décio de Almeida Prado

Neste primeiro capítulo, discorremos sobre o Romantismo, tanto no Brasil quanto na Europa, assim como sobre o romantismo de Álvares de Azevedo, de tendências universais. Também fizemos uma análise da fortuna crítica do autor, principalmente das críticas referentes à Noite na Taverna , que é nosso objeto de estudo.

1.1 Romantismo: um movimento de transformação

O Romantismo inicia uma nova e importante etapa na literatura, voltada aos assuntos de seu tempo como efervescência social e política, esperança e paixão, luta e revolução etc. Para Jacó Guinsburg, “o Romantismo é um fato histórico e, mais que isso, é o fato que assinala, na história da consciência humana, a relevância da consciência histórica. É, pois a forma de pensar que pensou e pensou historicamente” (GUINSBURG, 2005, p. 14). De acordo com Angélica Soares,

um dos modos de reação do homem romântico ao aburguesamento dos valores que caracterizou a sua época, (fato decorrente da Revolução Industrial e da revolução social inaugurada com a Revolução Francesa de 1789), foi a busca de uma realidade transcendente, que satisfizesse os ideais de realização de sua humanidade, restaurando-lhe a poetização da vida, a experiência religiosa e o espírito de aventura, esvaziados gradativamente pela racionalização e pela burocratização burguesa. E diferentes foram os caminhos abertos pela estética romântica para simbolizar o descontentamento com a situação vigente, do qual resultou, em grande parte, o fenômeno conhecido como “mal Du siècle” (SOARES, 1989, p. 21).

O Romantismo foi um movimento artístico do século XIX, mas suas origens encontram-se no início do século XVIII, momento histórico que consolidou a Idade Moderna. Ainda segundo Guinsburg,

Como foi explicitado por Volobuef, o romantismo brasileiro apresentou três fases distintas; no entanto, a fim de marcar os limites desta dissertação, concentrar-nos-emos no

eixo relativo a Álvares de Azevedo.

1.1.1 O Romantismo de Azevedo

Aqui dissipa-se o mundo visionário e platônico. Vamos entrar num mundo novo, terra fantástica, verdadeira Ilha Baratária de D. Quixote, onde Sancho é rei, e vivem Panúrgio, Sir John Falstaff, Bardolph, Fígaro e o Sganarello de D. João Tenório: – a pátria dos sonhos de Cervantes e Shakespeare. Álvares de Azevedo

Manuel Antônio Álvares de Azevedo dedicou a maior parte de sua vida aos estudos. Segundo Candido, foi um “estudante excepcionalmente aplicado. A febre de escrever atirou-o atabalhoadamente sobre o papel, como se as palavras viessem por demais imperiosas” (CANDIDO, 1975, p. 167). Figura controvertida na literatura brasileira, o autor teria sido romântico? Ultrarromântico? Anjo ou demônio? Álvares de Azevedo teria sido o “poeta excepcional, agudo e fino cantor de teatro, narrador prodigioso de contos fantásticos e terríveis, prosador numeroso, cheio de arranques magníficos, estofo de um crítico de rara agudeza em tão jovem idade”? (PIRES, 1942, p. 13). Para Antonio Candido,

dentre os poetas românticos, Álvares de Azevedo é o que não podemos apreciar moderadamente: ou nos apegamos à sua obra passando por sobre defeitos e limitações que a deformam, ou a rejeitamos com veemência, rejeitando a magia que dela emana. Talvez por ter sido um caso de notável possibilidade artística sem a correspondente oportunidade ou capacidade de realização, temos de nos identificar ao seu espírito para aceitar o que escreveu. […] Sentiu e concebeu demais, escreveu em tumulto, […] o que resta, porém, basta não só para lhe dar categoria, revelar a personalidade mais rica da geração (CANDIDO, 1975, p. 56).

Sua obra foi escrita entre 1848 e 1852, mas só foi publicada um ano após sua morte, época em que o nacionalismo, o indianismo e o sentimentalismo romântico estavam em voga no Brasil. Azevedo seguiu uma vertente diferente: foi extremamente influenciado pelo

movimento Sturm Und Drang^1 (Tempestade e Ímpeto) do Romantismo alemão. Sob a influência inglesa, Azevedo cultivou em alguns de seus textos, principalmente em Noite na taverna , o culto à noite, o gosto pelas orgias e o satanismo, provocando o afastamento da imagem de Deus e transformando Lúcifer em um ser atraente. Acompanhou a geração que pregava o desencanto pela vida que se converteu no mal do século. É nesse momento do movimento romântico que situamos Álvares de Azevedo. Como já dissemos, o romantismo brasileiro apresentou três fases distintas. A chamada “primeira geração romântica” tinha como principais lemas a defesa do nacionalismo e do sentimentalismo na literatura, além de apresentar também forte apego à natureza. De acordo como o pesquisador Nachman Fabel, “o nacionalismo nesse tempo irrompe impetuosamente em cena, arrastando consigo boa parte dos povos europeus em direção às suas aspirações políticas e sociais” (FABEL, 2005, p. 24). A “segunda geração romântica” 2 , denominada Ultrarromantismo, segundo Carlos Reis e Maria da Natividade Pires, “enquanto resultado de certa evolução do Romantismo, possui, apesar de tudo, uma autonomia relativa, que se traduz numa produção literária própria, desenrolada entre os anos 40 e os anos 60 do século XIX” (PIRES; REIS, 1999, p. 246). Massaud Moisés descreve o romântico dessa fase:

(^1) “O Romantismo na Alemanha foi precedido pela corrente literária pré-romântica denominada Sturn und Drang (1767-1785), um movimento de protesto realizado por jovens intelectuais que herdaram do Iluminismo a valorização da liberdade e a autodeterminação do indivíduo, mas que nutriam forte descrédito em relação à possibilidade de realização desse ideal pela educação ou pelo ensino. Eles protestaram contra a arbitrariedade do poder dos príncipes e contra imperativos de razão e virtude determinados pelo Iluminismo, preferindo cultivar as emoções e sentimentos – herdados do pietismo – e revesti-los de conotação antiautoritária. É a emancipação do indivíduo por meio do irracionalismo e do sentimento religioso. Subjetivismo extremo e intenso sentimentalismo constituem, assim, dois traços fundamentais do movimento. A eles juntam-se a propensão à melancolia e ao isolamento, a valorização da originalidade e a oposição a regras e convenções preestabelecidas pela poética classicista, o interesse pelas características nacionais e um anseio pelo retorno à Natureza. Com o Stürmer impõe-se ainda a ideia de gênio, termo que qualifica não o indivíduo com dotes excepcionais, mas aquele que abandona os impulsos de sua imaginação e produz uma obra livre e independente de toda injunção externa: a obra brota do íntimo do criador, impulsionada somente pela mola de inspiração e da criatividade do indivíduo” (VOLOBUEF, 1999, p. 29-30). (^2) De acordo com Karin Volobuef, “a segunda fase [romântica] apresentou em relação à primeira, maior liberdade espiritual, e consequentemente mais largo conceito estético. Se para aqueles a influência europeia quase exclusivamente da França, agora acrescia-se o modelo anglo-saxão. É a hora do ultrarromantismo: na poesia predomina o “satanismo” e o “mal do século”, inspirados por Byron, Musset, Espronceda, Shelley, Leopardi e De Maistre. Nesse período, no Brasil, o centro cultural transladou-se do Rio de Janeiro para São Paulo, tendo por núcleo a Faculdade de Direito, transformada no foco do byronismo no país. Subjetividade extrema, melancolia, tédio em relação à vida, pessimismo são os acentos que marcaram a postura e a poesia desses jovens estudantes. Sua fantasia apela para as orgias, necrofilia, bebedeiras, vícios e excessos de todo o tipo – numa franca oposição aos preceitos sociais e morais da burguesia. O ceticismo vinha substituir a religiosidade da geração anterior. O fascínio pela morte como motivo poético marcou não apenas a produção lírica, como também a vida desses poetas, cuja biografia acusa amiúde o falecimento prematuro” (VOLOBUEF, 1999, p. 163).

a ideologia nacionalista da época, definindo-a como discurso dos “oradores de lugares comuns que não sabem o que dizem” (AZEVEDO, 2000, p. 509). Segundo Candido, essa tendência nacionalista era reputada de tal modo para a expressão do Brasil,

que os jovens da segunda geração manifestaram verdadeiro remorso ao sobrepor- lhe os problemas estritamente pessoais, ou ao deixá-la pelos temas universais e o cenário de outras terras. Ninguém mais eloquente a esse respeito que Álvares de Azevedo, o menos pitoresco de todos, o mais obcecado pelo seu drama íntimo e os modelos europeus. Há um trecho importante do Macário em que se desdobra nos personagens e faz um deles acusar enquanto o outro defende, um poeta céptico, pouco nacional, que é certamente ele próprio. Penseroso fala por toda a geração e pela consciência patriótica do autor, quando brada: “Esse americano não sente que é filho de uma nação nova, não a sente o maldito cheia de sangue, de mocidade e verdor? Não se lembra que seus arvoredos gigantescos, seus oceanos escumosos, os seus rios, suas cataratas, que tudo lá é grande e sublime? Nas ventanias do sertão, nas trovoadas do sul, no sussurro das florestas à noite não escutou nunca os prelúdios daquela música gigante da terra que entoa a manhã a epopeia do homem de Deus? Não sentiu ele que aquela nação infante que se embala nos hinos da indústria europeia como Júpiter nas cavernas do Ida no alarido dos Coribantes – tem futuro imenso?” Mas Macário censura a artificialidade do indianismo e da poesia americana , numa revolta de bom senso realista: “Falam nos gemidos da noite no sertão, nas tradições das raças perdidas das florestas, nas torrentes das serranias, como se lá tivessem dormido ao menos uma noite, como se acordassem procurando túmulos, e perguntando como Hamleto no cemitério a cada caveira do deserto o seu passado. Mentidos! Tudo isso lhes veio à mente lendo as páginas de algum viajante que esqueceu-se talvez de contar que nos mangues e nas águas do Amazonas e do Orenoco há mais mosquitos e sezões do que inspiração: que na floresta há insetos repulsivos, répteis imundos, que a pele furta-cor do tigre não tem o perfume das flores – que tudo isto é sublime nos livros mas é soberanamente desagradável na realidade?” Trechos capitais, exprimindo a ambivalência do nosso Romantismo, transfigurador de uma realidade mal conhecida e atraído irresistivelmente pelos modelos europeus, que acenavam com a magia dos países onde radica a nossa cultura intelectual (CANDIDO, 1975, p. 16).

Assim, na contracorrente do nacionalismo literário tão apregoado na época, destacaram- se alguns estudantes da Academia de Direito de São Paulo que, na capital paulista do século XIX, adotaram autores como Byron, Musset, Shelley, Hoffmann, entre outros, como influência de vida e de arte; nas palavras de José Alencar: “todo estudante de alguma imaginação queria ser um Byron; e tinha por destino inexorável copiar ou traduzir o bardo inglês” (ALENCAR, 1998, p. 46). Fruto das influências do poeta inglês, essa geração exaltou o satanismo e o ceticismo, e tem Álvares de Azevedo como seu maior representante, como a “mais sonora e autêntica voz do byronismo no Brasil” (ROCHA, 1956, p. 39). A crítica aproveitou esse momento, construído em torno dos estudantes, para sustentar

uma aura múltipla na figura de Álvares de Azevedo. Percebemos que a produção literária do poeta é explicada, via de regra, a partir de uma personalidade complexa, ou de um sujeito influenciado negativamente por leituras. No entanto, apesar de tudo que se fala sobre a vida do autor, dos mitos que foram construídos, alguns aspectos de sua vida ainda são nebulosos, como afirma Magalhães Júnior:

Há um capítulo na vida de Álvares de Azevedo, em que tudo é vago, confuso, nebuloso. É o capítulo sentimental, a história de seu coração, a biografia de seus amores. Os únicos documentos a tal respeito são os versos, que falam muito, e as cartas, que revelam pouco. O pior de tudo é que as cartas, em geral, contradizem os versos (MAGALHÃES JR., 1962, p. 88).

A vida pessoal do autor foi muitas vezes explicada ou espelhada em suas obras. No entanto, acredita-se que, devido a sua morte precoce, Azevedo não tenha conhecido o amor, mas essa é uma afirmação que não podemos fazer com certeza, apesar da afirmação de Mário de Andrade de que o escritor teria “não apenas temor, mas uma verdadeira fobia do amor sexual” (ANDRADE, 2000, p. 35). Para o crítico José Veríssimo,

o seu amor, esse amor que canta em cada estrofe, e que me inclino a crer também era um amor de cabeça, um amor de poeta, o amor do amor, sem realidade objetiva, não tem gritos de angústia ou de desespero, que acreditemos. É mais um desejo de amar, a aspiração por uma mulher idealmente amada, que uma paixão verdadeira e pessoal (VERÍSSIMO, 2000, p. 42).

Veríssimo fala do amor presente nos versos de Azevedo e não nos amores do autor ou na falta dele, como faz Mário. Essa descrição do amor encaixa-se na descrição arquetípica do amor romântico de outros autores do mesmo período, que idealizavam mais o sentimento do que a pessoa amada, pois “ao longo da obra de Álvares de Azevedo pode-se notar que o sentimento amoroso não realizado contribui para o prolongamento da duração do ideal” (ALVES, 1998, p. 82). Na obra de Álvares de Azevedo, como já mencionamos, não encontramos exaltações à pátria, mas encontramos, como explicita Andrea Sirihal Werkema, várias das convenções românticas, pois

Álvares de Azevedo as visita e discute incessantemente. Escreveu poesia amorosa de matriz idealizante, assim como poesia de alta voltagem erótica,