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Poema de Castro Alves: 'Despertar para Morrer' - A Cachoeira de Paulo Afonso, Notas de aula de Poesia

Neste poema, castro alves descreve a beleza e o poder da cachoeira de paulo afonso, uma famosa queda-d'água no estado de bahia, no brasil. O poema é composto por versos que evocam a natureza, a morte e o amor, criando uma atmosfera misteriosa e romântica. Além da descrição da queda-d'água, o poema também contém referências aos mitos e lendas que envolvem esta bela e impressionante paisagem.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Pipoqueiro
Pipoqueiro 🇧🇷

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A Cachoeira de Paulo Afonso
Castro Alves
Poesia:
1. A tarde
2. Maria
3. O baile na flor
4. Na margem
5. A queimada
6. Lucas
7. Tirana
8. A senzala
9. Diálogo dos ecos
10.O nadador
11.No barco
12.Adeus
13.Mudo e quedo
14.No fonte
15.Nos campos
16.No monte
17.Sangue de africano
18.Amante
19.Anjo
20.Desespero
21.História de um crime
22.Último abraço
23.Mãe penitente
24.O segredo
25.Crepúsculo sertanejo
26.O bandolim da desgraça
27.A canoa fantástica
28.O São Francisco
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A Cachoeira de Paulo Afonso

Castro Alves

Poesia:

1. A tarde

2. Maria

3. O baile na flor

4. Na margem

5. A queimada

6. Lucas

7. Tirana

8. A senzala

9. Diálogo dos ecos

10.O nadador

11.No barco

12.Adeus

13.Mudo e quedo

14.No fonte

15.Nos campos

16.No monte

17.Sangue de africano

18.Amante

19.Anjo

20.Desespero

21.História de um crime

22.Último abraço

23.Mãe penitente

24.O segredo

25.Crepúsculo sertanejo

26.O bandolim da desgraça

27.A canoa fantástica

28.O São Francisco

29.A cachoeira

30.Um raio de luar

31.Desperta para morrer

32.Loucura divina

33.A beira do abismo e do infinito

34.A cachoeira de Paulo Afonso

A tarde Era a hora em que a tarde se debruça Lá da crista das serras mais remotas... E d'araponga o canto, que soluça, Acorda os ecos nas sombrias grotas; Quando sobre a lagoa, que s'embuça, Passa o bando selvagem das gaivotas ... E a onça sobre as lapas salta urrando, Da cordilheira os visos abalando. Era a hora em que os cardos rumorejam Como um abrir de bocas inspiradas, E os angicos as comas espanejam Pelos dedos das auras perfumadas ... A hora em que as gardênias, que se beijam, São tímidas, medrosas desposadas; E a pedra... a flor... as selvas ... os condores Gaguejam... falam... cantam seus amores! Hora meiga da Tarde! Como és bela Quando surges do azul da zona ardente! ... Tu és do céu a pálida donzela, Que se banha nas termas do oriente... Quando é gota do banho cada estrela. Que te rola da espádua refulgente... E, — prendendo-te a trança a meia lua, Te enrolas em neblinas seminua!... Eu amo-te, ó mimosa do infinito! Tu me lembras o tempo em que era infante. Inda adora-te o peito do precito No meio do martírio excruciante; E, se não te dá mais da infância o grito Que menino elevava-te arrogante, É que agora os martírios foram tantos, Que mesmo para o riso só tem prantos! ... Mas não m'esqueço nunca dos fraguedos Onde infante selvagem me guiavas, E os ninhos do sofrer que entre os silvedos Da embaíba nos ramos me apontavas; Nem, mais tarde, dos lânguidos segredos

O baile na flor QUE BELAS as margens do rio possante, Que ao largo espumante campeia sem par!... Ali das bromélias nas flores doiradas Há silfos e fadas, que fazem seu lar... E, em lindos cardumes, Sutis vaga-lumes Acendem os lumes P'ra o baile na flor. E então — nas arcadas Das pét’las doiradas, Os grilos em festa Começam na orquestra Febris a tocar... E as breves Falenas Vão leves, Serenas, Em bando Girando, Valsando, Voando No ar! ...


Na margem "VAMOS! VAMOS! Aqui por entre os juncos Ei-la a canoa em que eu pequena outrora Voava nas maretas... Quando o vento, Abrindo o peito à camisinha úmida, Pela testa enrolava-me os cabelos, Ela voava qual marreca brava No dorso crespo da feral enchente! Voga, minha canoa! Voga ao largo! Deixa a praia, onde a vaga morde os juncos Como na mata os caititus bravios... Filha das ondas! andorinha arisca! Tu, que outrora levavas minha infância — Pulando alegre no espumante dorso Dos cães-marinhos a morder-te a proa, — Leva-me agora a mocidade triste Pelos ermos do rio ao longe... ao longe..." Assim dizia a Escrava... Iam caindo Dos dedos do crepúsc'lo os véus de sombra, Com que a terra se vela como noiva Para o doce himeneu das noites límpidas ... Lá no meio do rio, que cintila, Como o dorso de enorme crocodilo,

Já manso e manso escoa-se a canoa. Parecia, assim vista ao sol poente, Esses ninhos, que tombam sobre o rio, E onde em meio das flores vão chilrando — Alegres sobre o abismo — os passarinhos!...


A queimada MEU NOBRE perdigueiro! vem comigo. Vamos a sós, meu corajoso amigo, Pelos ermos vagar! Vamos Já dos gerais, que o vento açoita, Dos verdes capinais n'agreste moita A perdiz levantar!... Mas não!... Pousa a cabeça em meus joelhos... Aqui, meu cão! ... Já de listrões vermelhos O céu se iluminou. Eis súbito da barra do ocidente, Doudo, rubro, veloz, incandescente, O incêndio que acordou! A floresta rugindo as comas curva... As asas foscas o gavião recurva, Espantado a gritar. O estampido estupendo das queimadas Se enrola de quebradas em quebradas, Galopando no ar. E a chama lavra qual jibóia informe, Que, no espaço vibrando a cauda enorme, Ferra os dentes no chão... Nas rubras roscas estortega as matas.... Que espadanam o sangue das cascatas Do roto coração!... O incêndio — leão ruivo, ensangüentado, A juba, a crina atira desgrenhado Aos pampeiros dos céus!... Travou-se o pugilato e o cedro tomba... Queimado..., retorcendo na hecatomba Os braços para Deus. A queimada! A queimada é uma fornalha! A irara — pula; c cascavel — chocalha... Raiva, espuma o tapir! ... E às vezes sobre o cume de um rochedo A corça e o tigre — náufragos do medo — Vão trêmulos se unir! Então passa-se ali um drama augusto... N'último ramo do pau-d'arco adusto O jaguar se abrigou... Mas rubro é o céu... Recresce o fogo em mares... E após... tombam as selvas seculares... E tudo se acabou!...

Tirana "MINHA MARIA é bonita, Tão bonita assim não há; O beija-flor quando passa Julga ver o manacá. "Minha Maria é morena, Corno as tardes de verão; Tem as tranças da palmeira Quando sopra a viração. "Companheiros! o meu peito Era um ninho sem senhor; Hoje tem um passarinho P'ra cantar o seu amor. "Trovadores da floresta! Não digam a ninguém, não!... Que Maria é a baunilha Que me prende o coração. "Quando eu morrer só me enterrem Junto às palmeiras do val, Para eu pensar que é Maria Que geme no taquaral.. ."


A senzala Qual o veado, que buscou o aprisco, Balindo arisco, para a cerva corre... Ou como o pombo, que os arrulos solta, Se ao ninho volta, quando a tarde morre..., Assim, cantando a pastoril balada, Já na esplanada o lenhador chegou. Para a cabana da gentil Maria Com que alegria a suspirar marchou! Ei-la a casinha... tão pequena e bela! Como é singela com seus brancos muros! Que liso teto de sapé doirado! Que ar engraçado! que perfumes puros! Abre a janela para o campo verde, Que além se perde pelos cerros nus... A testa enfeita da infantil choupana Verde liana de festões azuis. É este o galho da rolinha brava, Aonde a escrava seu viver abriga... Canta a jandaia sobre a curva rama E alegre chama sua dona amiga.

Aqui n'aurora, abandonando os ninhos, Os passarinhos vêm pedir-lhe pão; Pousam-lhe alegres nos cabelos bastos, Nos seios castos, na pequena mão. Eis o painel encantado, Que eu quis pintar, mas não pude... Lucas melhor o traçara Na canção suave e rude... Vede que olhar, que sorriso S'expande no brônzeo rosto, Vendo o lar do seu amor... Ai! Da luz do Paraíso Bate-lhe em cheio o fulgor.


Diálogo dos ecos E CHEGOU-SE p'ra a vivenda Risonho, calmo, feliz... Escutou... mas só ao longe Cantavam as juritis... Murmurou: "Vou surpr’endê-la!" E a porta ao toque cedeu... "Talvez agora sonhando Diz meu nome o lábio seu, Que a dormir nada prevê..." E o eco responde: — Vê! ... "Como a casa está tão triste! Que aperto no coração! ... Maria!... Ninguém responde! Maria, não ouves, não?... Aqui vejo uma saudade Nos braços de sua cruz... Que querem dizer tais prantos, Que rolam tantos, tantos, Sobre as faces da saudade Sobre os braços de Jesus?... Oh! quem me empresta uma luz?... Quem me arranca a ansiedade, Que no meu peito nasceu? Quem deste negro mistério Me rasga o sombrio véu?... E o eco responde: — Eu! ... E chegou-se para o leito Da casta flor do sertão... Apertou co'a mão convulsa O punhal e o coração! ... 'Stava inda tépido o ninho Cheio de aromas suaves... E — como a pena, que as aves Deixam no musgo ao voar, —

O nadador E-Lo que ao rio arroja-se. As vagas bipartiram-se; Mas rijas contraíram-se Por sobre o nadador... Depois s'entreabre lúgubre Um círculo simbólico... É o riso diabólico Do pego zombador! Mas não! Do abismo — indômito Surge-me um rosto pálido, Como o Netuno esquálido, Que amaina a crina ao mar; Fita o batel longínquo Na sombra do crepúsculo... Rasga com férreo músculo O rio par a par, Vagas! Dalilas pérfidas! Moças, que abris um túmulo, Quando do amor no cúmulo Fingis nos abraçar! O nadador intrépido Vos toca as tetas cérulas... E após — zombando — as pérolas Vos quebra do colar. Vagas! Curvai-vos tímidas! Abri fileiras pávidas Às mãos possantes, ávidas Do nadador audaz!... Belo, de força olímpica — Soltos cabelos úmidos — Braços hercúleos, túmidos... o rei dos vendavais! Mas ai! Lá ruge próxima A correnteza hórrida, Como da zona tórrida A boicininga a urrar...

É lá que o rio indômito, Como o corcel da Ucrânia, Rincha a saltar de insânia, Freme e se atira ao mar. Tremeste? Não! Qu'importa-te Da correnteza o estríduío? Se ao longe vês teu ídolo, Ao longe irás também... Salta à garupa úmida Deste corcel titânico... — Novo Mazeppa oceânico — Além! Além! Além!...


No barco — Lucas — Maria! murmuraram juntos... E a moça em pranto lhe caiu nos braços. Jamais a parasita em flóreos laços Assim ligou-se ao piquiá robusto... Eram-lhe as tranças a cair no busto Os esparsos festões da granadilha... Tépido aljôfar o seu pranto brilha, Depois resvala no moreno seio... Oh! doces horas de suave enleio! Quando o peito da virgem mais arqueja, Como o casal da rola sertaneja, Se a ventania lhe sacode o ninho. Cantai, ó brisas, mas cantai baixinho! Passai, ó vagas..., mais passai de manso! Não perturbeis-lhe o plácido remanso, Vozes do ar! emanações do rio! "Maria, fala!" — "Que acordar sombrio", Murmura a triste com um sorriso louco, "No Paraíso eu descansava um pouco... Tu me fizeste despertar na vida ... "Por que não me deixaste assim pendida Morrer co'a fronte oculta no teu peito? Lembrei-me os sonhos do materno leito

Mudo e quedo E CALADO ficou... De pranto as bagas Pelo moreno rosto deslizaram, Qual da braúna, que o machado fere, Lágrimas saltam de um sabor amargo Mudos, quedos os dois neste momento Mergulhavam no dédalo d'angústia, No labirinto escuro que desgraça... Labirinto sem luz, sem ar, sem fio ... Que dor, que drama torvo de agonias Não vai naquelas almas! ... Dor sombria De ver quebrado aquele amor tão santo, De lembrar que o passado está passando... Que a esperança morreu, que surge a morte!... Tanta ilusão!... tanta carícia meiga!... Tanto castelo de ventura feito À beira do riacho, ou na campanha!... Tanto êxtase inocente de amorosos!... Tanto beijo na porta da choupana, Quando a lua invejosa no infinito Com uma bênção de luz sagrava os noivos!... Não mais! não mais! O raio, quando esgalha O ipê secular, atira ao longe Flores, que há pouco se beijavam n'hástea, Que unidas nascem, juntas viver pensam, E que jamais na terra hão de encontrar-se! Passou-se muito tempo... Rio abaixo A canoa corria ao tom das vagas. De repente ele ergueu-se hirto, severo, — O olhar em fogo, o riso convulsivo — Em golfadas lançando a voz do peito!... "Maria! — diz-me tudo... Fala! fala Enquanto eu posso ouvir... Criança, escuta! Não vês o rio?... é negro!... é um leito fundo... A correnteza, estrepitando, arrasta Uma palmeira, quanto mais um homem!... Pois bem! Do seio túrgido do abismo Há de romper a maldição do morto;

Depois o meu cadáver negro, lívido, Irá seguindo a esteira da canoa Pedir-te inda que fales, desgraçada, Que ao morto digas o que ao vivo ocultas!..." Era tremenda aquela dor selvagem, Que rebentava enfim, partindo os diques Na fúria desmedida!... Em meio às ondas Ia Lucas rolar Um grito fraco, Uma trêmula mão susteve o escravo... E a pálida criança, desvairada. Aos pés caiu-lhe a desfazer-se em pranto. Ela encostou-se ao peito do selvagem — Como a violeta, as faces escondendo Sob a chuva noturna dos cabelos —! Lenta e sombria após contou destarte A treda história desse tredo crime!...


No fonte I "ERA HOJE ao meio-dia. Nem uma brisa macia Pela savana bravia Arrufava os ervaçais... Um sol de fogo abrasava; Tudo a sombra procurava; Só a cigarra cantava No tronco dos coqueirais. II "Eu cobri-me da mantilha, Na cabeça pus a bilha, Tomei do deserto a trilha, Que lá na fonte vai dar. Cansada cheguei na mata: Ali, na sombra, a cascata As alvas tranças desata Como ua moça a brincar.

VII

"Quando o sol queima as estradas, E nas várzeas abrasadas Do vento as quentes lufadas Erguem novelos de pó, Como é doce em meio às canas, Sob um teto de lianas, Das ondas nas espadanas Banhar-se despida e só! ... VIII "Rugitavam os palmares... Em torno dos nenufares Zumbiam pejando os ares Mil insetos de rubim... Eu naquele leito brando Rolava alegre cantando... Súbito... um ramo estalando Salta um homem junto a mim!"


Nos campos "FUGI desvairada! Na moita intrincada, Rasgando uma estrada, Fugaz me embrenhei. Apenas vestindo Meus negros cabelos, E os seios cobrindo Com os trêmulos dedos, Ligeira voei! "Saltei as torrentes. Trepei dos rochedos Aos cimos ardentes, Nos ínvios caminhos, Cobertos de espinhos, Meus passos mesquinhos Com sangue marquei! .......................... "Avante! corramos! Corramos ainda!...

Da selva nos ramos A sombra é infinda. A mata possante Ao filho arquejante Não nega um abrigo... Corramos ainda! Corramos! avante! "Debalde! A floresta — Madrasta impiedosa — A pobre chorosa Não quis abrigar! "Pois bem! Ao deserto! "De novo, é loucura! Seguindo meus traços Escuto seus passos Mais perto! mais perto! Já queima-me os ombros Seu hálito ardente. Já vejo-lhe a sombra Na úmida alfombra... Qual negra serpente, Que vai de repente Na presa saltar!... ...................................... Na douda Corrida, Vencida, Perdida, Quem me há de salvar?"


No monte "PAREI... Volvi em torno os olhos assombrados... Ninguém! A solidão pejava os descampados... Restava inda um segundo... um só p'ra me salvar; Então reuni as forças, ao céu ergui o olhar... E do peito arranquei um pavoroso grito, Que foi bater em cheio às portas do infinito! Ninguém! Ninguém me acode... Ai! só de monte em monte Meu grito ouvi morrer na extrema do horizonte!... Depois a solidão ainda mais calada Na mortalha envolveu a serra descampada!... "Ai! que pode fazer a rola triste Se o gavião nas garras a espedaça? Ai! que faz o cabrito do deserto, Quando a jibóia no potente aperto Em roscas férreas o seu corpo enlaça? "Fazem como eu?... Resistem, batem, lutam, E finalmente expiram de tortura. Ou, se escapam trementes, arquejantes,

Se a justiça do céu de ti se esquece, A justiça do escravo está na força... E quem tem um punhal nada carece! ... "Vamos! Acaba a história ... Lança a presa... Não vês meu coração, que sente fome? Amanhã chorarás; mas de alegria! Hoje é preciso me dizer — seu nome!"


Anjo "AI! QUE VALE a vingança, pobre amigo, Se na vingança a honra não se lava?... O sangue é rubro, a virgindade é branca — O sangue aumenta da vergonha a bava. "Se nós fomos somente desgraçados, Para que miseráveis nos fazermos? Deportados da terra assim perdemos De além da campa as regiões sem termos... "Ai! não manches no crime a tua vida, Meu irmão, meu amigo, meu esposo!... Seria negro o amor de uma perdida Nos braços a sorrir de um criminoso!..."


Desespero "CRIME! Pois será crime se a jibóia Morde silvando a planta, que a esmagara? Pois será crime se o jaguar nos dentes Quebra do índio a pérfida taquara? "E nós que somos, pois? Homens? — Loucura! Família, leis e Deus lhes coube em sorte. A família no lar, a lei no mundo... E os anjos do Senhor depois da morte. "Três leitos, que sucedem-se macios, Onde rolam na santa ociosidade... O pai o embala... a lei o acaricia... O padre lhe abre a porta à eternidade. "Sim! Nós somos répteis... Qu'importa a espécie? — A lesma é vil, — o cascavel é bravo. E vens falar de crimes ao cativo? Então não sabes o que é ser escravo!... "Ser escravo — é nascer no alcoice escuro

Dos seios infamados da vendida... — Filho da perdição no berço impuro Sem leite para a boca ressequida... "É mais tarde, nas sombras do futuro, Não descobrir estrela foragida... É ver — viajante morto de cansaço — A terra — sem amor!... sem Deus - o espaço! "Ser escravo — é, dos homens repelido, Ser também repelido pela fera; Sendo dos dois irmãos pasto querido, Que o tigre come e o homem dilacera... — É do lodo no lodo sacudido Ver que aqui ou além nada o espera, Que em cada leito novo há mancha nova... No berço... após no toro... após na cova!... "Crime! Quem falou, pobre Maria, Desta palavra estúpida?... Descansa! Foram eles talvez?!... É zombaria... Escarnecem de ti, pobre criança! Pois não vês que morremos todo dia, Debaixo do chicote, que não cansa? Enquanto do assassino a fronte calma Não revela um remorso de sua alma? "Não! Tudo isto é mentira! O que é verdade É que os infames tudo me roubaram ... Esperança, trabalho, liberdade Entreguei-lhes em vão... não se fartaram. Quiseram mais... Fatal voracidade! Nos dentes meu amor espedaçaram... Maria! Última estrela de minh'alma! O que é feito de ti, virgem sem palma? "Pomba — em teu ninho as serpes te morderam. Folha — rolaste no paul sombrio. Palmeira — as ventanias te romperam. Corça — afogaram-te as caudais do rio. Pobre flor — no teu cálice beberam, Deixando-o depois triste e vazio... — E tu, irmã! e mãe! e amante minha! Queres que eu guarde a faca na bainha! "Ó minha mãe! Ó mártir africana, Que morreste de dor no cativeiro! Ai! sem quebrar aquela jura insana, Que jurei no teu leito derradeiro, No sangue desta raça ímpia, tirana Teu filho vai vingar um povo inteiro!... Vamos, Maria! Cumpra-se o destino... Dize! dize-me o nome do assassino!..." "Virgem das Dores, Vem dar-me alento, Neste momento De agro sofrer! Para ocultar-lhe Busquei a morte...