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Guias e Dicas
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Aristóteles e a Lógica: Entimema, Silogismo Dialético e Retórico, Notas de aula de Lógica

Este texto discute o conceito de entimema no contexto do silogismo dialético e retórico de aristóteles. Ele explica a importância da lógica formal na argumentação dialética e o papel do termo médio e dos extremos em um silogismo. Além disso, o texto distingue entre silogismo autêntico e aparente, e entre entimema autêntico e aparente. Finalmente, ele discute a importância da demonstração retórica como uma forma especial de entimema.

O que você vai aprender

  • Qual é a definição de entimema no contexto do silogismo dialético?
  • Qual é a importância da demonstração retórica na retórica?
  • Quais são as configurações das formas silogísticas na primeira e segunda figura?
  • Como Aristóteles distingue entre silogismo autêntico e aparente?
  • Como as premissas intersubjetivas garantem os requisitos básicos de logicidade na retórica?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Boto92
Boto92 🇧🇷

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE APOIO À PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
A analogia estrutural entre os argumentos lógico-retórico e lógico-dialético,
na Retórica e nos Tópicos de Aristóteles
Bolsista: Isofran Gonçalves de Souza, CNPq
MANAUS
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Baixe Aristóteles e a Lógica: Entimema, Silogismo Dialético e Retórico e outras Notas de aula em PDF para Lógica, somente na Docsity!

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO DEPARTAMENTO DE APOIO À PESQUISA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

A analogia estrutural entre os argumentos lógico-retórico e lógico-dialético,

na Retórica e nos Tópicos de Aristóteles

Bolsista: Isofran Gonçalves de Souza, CNPq

MANAUS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO DEPARTAMENTO DE APOIO À PESQUISA PROGRAMA INSTITUCIONAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

RELATÓRIO FINAL

A analogia estrutural entre os argumentos lógico-retórico e lógico-dialético,

na Retórica e nos Tópicos de Aristóteles

Bolsista: Isofran Gonçalves de Souza, CNPq PIB-H/0023/

Orientadora: Profª Drª Valcicléia Pereira da Costa

MANAUS

Sumário

  • Resumo
  • Abstract ...................................................,......................................................................
  • Apresentação...................................................................................................................
  • Introdução
  • Aristóteles: da dialética à lógica
  • Órganon : o instrumento forjado na lógica
  • Introdução aos termos da lógica aristotélica
  • Da semântica à simbologia
  • Do Semêion ao Tekmérion : em busca do silogismo retórico irrefutável
  • Considerações finais
  • Referências

Apresentação

O campo da retórica, como o da dialética, não é o das proposições evidentes, mas aquele da verossimilhança e da probabilidade que brotam da opinião comum, aceitas pela maioria como válidas, mesmo que não o sejam. Ambas (retórica e dialética) não se aplicam a um objeto determinado, mas se aplicam a todas as matérias, diferindo da racionalidade apodítica que possui matéria própria. São métodos propriamente ditos, não sendo determinados por nenhuma matéria ou fim específicos. Se a ferramenta lógica do discurso dialético é o silogismo, fundado sobre premissas ou proposições cuja credibilidade baseia-se na opinião provável, na discussão pode ocorrer o uso inadequado, falacioso das proposições e comprometer o escopo do método dialético. Assim, Aristóteles define a forma de argumentação dialética (o silogismo), explicita o conteúdo das premissas e indica as falácias das formas tendenciosas. Cumpre-nos, em primeiro lugar, definir o que é um silogismo e quais as suas variedades, a fim de entendermos o que é o silogismo dialético, uma vez que ele será o objeto de investigação. O silogismo é um argumento em que, dadas certas proposições, algo distinto delas resulta necessariamente pela simples presença das proposições aduzidas. O silogismo é uma demonstração quando parte de premissas evidentes e primeiras, ou de premissas tais que, o conhecimento que temos, radica nas premissas primeiras e evidentes. É dialético o silogismo que conclui a partir de premissas prováveis. Prováveis são as opiniões recebidas, por todos, ou pela maioria, ou pelos sábios, e, entre estes últimos, pelos mais notáveis e pelos mais ilustres.

A analogia estrutural entre os argumentos lógico-retórico e lógico-dialético constitui fundamentalmente, à luz das obras Retórica e Tópicos , de Aristóteles, o objeto de análise da presente pesquisa. Para Aristóteles, o raciocínio lógico é uma operação do pensamento realizada por meio de juízos e enunciada por meio de proposições encadeadas, formando um silogismo. O silogismo é um raciocínio em que, uma vez formuladas certas suposições (isto é, premissas), alguma coisa distinta das primeiras se deduz necessariamente (isto é, a conclusão), devido à simples presença das suposições como tais. Por isso, quem conhecer melhor os silogismos dialéticos, conhecerá bem os entimemas , isto é, conhecerá bem a retórica.

Nesse sentido, para fundamentar uma explicação coerente que sistematize a relação de afinidade estrutural dos silogismos dialéticos e retóricos será imprescindível a investigação da possível implicação entre os conceitos de silogismo dialético e silogismo retórico ou entimema como correlativos equivalentes. Além deste passo, investigaremos nos Tópicos as características gerais da dialética aristotélica e seus possíveis desdobramentos no campo da retórica; bem como, na Retórica , buscaremos conhecer estruturas do pensar e do raciocinar que procedem de elementos fundados sobre as diretrizes da dialética. E por fim explicaremos o instrumento lógico do discurso: entimema , como uma demonstração retórica e sua relação com o silogismo dialético.

Introdução

Antes mesmo do surgimento da democracia na Grécia, local onde a retórica terá seus contornos delineados por diversos autores, vemos surgir o embrião dessa arte através dos poemas de Homero. Tanto a Ilíada quanto a Odisseia estão repletas de exemplos onde a eloquência discursiva, além da coragem e da estratégia bélica, faz parte da areté de um indivíduo. Mas é com as instituições democráticas que a oratória passa a ser concebida como retórica, ou seja: uma “ciência do discurso oratório”. Como afirma Jaeger:

Os discursos e diálogos das tragédias revelam-nos, além na formação da eloquência jurídica, a nova aptidão para a sutil argumentação lógica. Nisso Eurípedes revela-se, muito mais que na simples arte da palavra e nas figuras, discípulo da retórica. Por todo lado, descortinamos a tragédia em competição com as justas oratórias dos tribunais, que tanto entusiasmavam os atenienses. A disputa retórica tornava-se cada vez mais um dos principais atrativos do teatro. (JAEGER, 1989, p. 277).

Esse entusiasmo pela oratória dos tribunais foi criticado por Aristófanes em sua comédia As Vespas : nesta, o personagem Bdeliclêon, pai de Filoclêon, sofre de uma terrível doença: a paixão pelos tribunais: “ A paixão dele é julgar; ele fica desesperado se não consegue ocupar o primeiro banco dos juízes ”. (ARISTÓFANES, 2004, p. 17).

A preferência dos atenienses pela retórica forense não destoa de sua origem como arte. Na Sicília, em 485 a.C., Gélon e Hierão, tiranos de Siracusa, forneceram terras àqueles que, sob suas ordens, expropriassem e deportassem os cidadãos. Após o afastamento dos tiranos, a população da cidade tentou recuperar suas terras, mas para isso era preciso ir aos tribunais. Entretanto, muitos não tinham capacidade oratória necessária para realizar a tarefa. Contratavam, então, pessoas com habilidades oratórias para tal função. Esse foi o passo inicial para o surgimento de professores e escolas com o intuito de habilitar pessoas a falar em ambiente judicial, sendo os primeiros manuais publicados por Córax, discípulo do filósofo Empédocles, e Tísias de Siracusa.

Os sicilianos, antes despojados de suas propriedades, agora podiam recorrer aos tribunais para reconquistar os seus direitos, e foi nesse ínterim que os retores, com seu agudo senso de publicidade, ofereceram aos litigantes um instrumento de persuasão que afirmavam ser invencível, por ser capaz de convencer qualquer pessoa em qualquer assunto ou circunstância.

Foi da necessidade de argumentar a partir do verossímil ( eikós) que a retórica adquiriu notoriedade, pois se a verdade já fosse conhecida no âmbito judiciário, não seriam necessário oradores de defesa e acusação e nem leis para respaldar um e outro, e

os tribunais seriam apenas câmaras de registros dos fatos. E é nesse ponto que a técnica sobressai como forma de racionalidade e não apenas como demonstração, o que é verossímil está relacionado às opiniões normalmente aceitas e que circulam pelo meio social. O novo espaço aberto na sociedade grega, naquele momento, é público, uma vez que se trata da organização de uma nova ordem democrática, permitindo que os enunciadores possam levar suas reivindicações para julgamento; porém, o conteúdo dos enunciados se fecha para a noção jurídica, pois eles se vinculam, quase sempre, às reivindicações para legitimação ou reivindicação do direito das terras que foram tomadas pelos tiranos, fato relacionado ao Direito Civil, que cuida das relações civis, inclusive a propriedade, que é o bem reivindicado pelos enunciadores (os próprios cidadãos) daquela época. Assim, a restauração agrária é da ordem jurídica inserida na organização social. Na verdade, o discurso jurídico e o discurso político, na Antiguidade grega, são como dois lados de uma mesma moeda.

Górgias (483-375 a.C.), natural da Sicilia, foi quem criou uma forma mais estética e literária da retórica, sendo um dos fundadores do discurso epidítico (elogio público), que se aprimorou em uma arte retórica. Posteriormente Platão (427-347 a.C), recusou vivamente a concepção gorgiana de retórica, no diálogo intitulado Górgias. Nele, nega até mesmo que a retórica seja uma arte, isto é, um discurso fundado num conhecimento racional, e apresenta-a como simples prática empírica, que tem em vista exclusivamente a persuasão dos outros, fora de qualquer conhecimento. O objetivo dessa retórica, segundo Platão, não é o bem, mas somente o prazer; por isso ele a define como uma forma de adulação e a compara com as práticas como a culinária e a cosmética, que se preocupam somente em obter o prazer do corpo, e que são imitações ruins da medicina e da ginástica, preocupadas, ao contrário, com seu verdadeiro bem. (BERTI, 2002).

Apesar de a sofística ganhar espaço em Atenas, o seu elo com a retórica só aparece plenamente com Protágoras (490-420 a.C.). A origem da erística (controvérsia) também foi atribuída a Protágoras e posteriormente se transforma na dialética, cuja técnica é a arte de vencer uma discussão contraditória. Inicialmente, qualquer sofisma poderá ser utilizado na discussão dialética, inclusive, os considerados piores. (REBOUL, 2000).

É importante frisar que os sofistas somente tinham em comum o fato de serem mestres profissionais e de ensinarem a retórica, pois, além disso, não existia nenhum campo comum nos assuntos que ensinavam, ou na mentalidade que estes produziam. No contexto da concepção educativa sofistica, ensinar a argumentar com o mesmo êxito de ambos os lados, demonstra que sobre cada assunto há sempre dois argumentos contrários entre si, e, ainda que um deles seja mais fraco, pode-se escorá-lo para que pareça mais forte; técnica sofista, bem desenvolvida entre aqueles que se tornavam seus discípulos, é a arte do logos.

Isócrates (436-338 a.C.), ao propor uma retórica mais plausível e mais moral que a dos sofistas, de certa forma separa a retórica do domínio da sofística. Ao se proclamar

é classificada por Aristóteles como arte ( techné ). A retórica, porém, é um tipo de arte diferenciada das outras, pois as demais possuem um objeto que lhes é próprio, como a medicina no que diz respeito à saúde, enquanto a retórica não possui um tema ou objeto particular. A partir disso, Aristóteles define a retórica como o estudo do método da persuasão aplicado a casos distintos, ou seja: a capacidade de descobrir o que é adequado a cada caso com o fim de persuadir. (ARISTÓTELES, Retórica, I, 1355b).

A Retórica é uma obra de Aristóteles composta por três livros (I: 1354a-1377b; II: 1377b- 1403a; III: 1403a-1420a). O livro I da Retórica principia com a definição da retórica, mostrando sua semelhança com a dialética (I 1, 1354a). Segundo Aristóteles, raciocinar dedutivamente é discursar tendo como elementos premissas a partir das quais é gerada uma conclusão diferente delas mesmas. Ora, uma demonstração é aquela que parte de premissas verdadeiras, mas para uma proposição ser considerada verdadeira, ela deve ser crível por si mesma e não por outras proposições. As premissas do silogismo dialético, porém, têm tão somente caráter verossimilhante, isto é, são aceitas ou por todos ou pela maioria ou pelos mais sábios. (ARISTÓTELES, Tópicos , II, 100b).

Nos Tópicos de Aristóteles estão presentes oito livros, sendo que a maior parte deles, os livros II-VII, lidam com os tópicos, enquanto que os dois restantes, os livros I e VIII, expõem os fundamentos de uma disputa dialética. A obra tem como objetivo principal proporcionar uma arte de argumentação, de modo que qualquer indivíduo que a possui esteja perfeitamente capacitado para uma disputa dialética de estilo socrático. No âmago desta arte está, por sua vez, um método para formular argumentos baseado nos Tópicos.

A palavra dialética deriva do verbo grego dialeghestai, que significa discutir. Em Aristóteles, a dialética perderá o caráter de ciência suprema e passa a ser parte da lógica. Constituirá o discurso amplo das probabilidades. Ainda não é o discurso científico propriamente dito, baseado em princípios necessários e evidentes. Aristóteles enquadrará a dialética no esquema silogístico. Mas enquanto o silogismo demonstrativo se move a partir de premissas cuja veracidade é previamente definida cientificamente, o silogismo dialético parte de premissas cuja veracidade não é definida previamente, mas que é somente provável, isto é, de teses não manifestamente fundadas, admitidas mais ou menos em geral. O seu uso típico é aquele que ocorre no debate político e jurídico; onde se assume provisoriamente a tese sustentada pelo adversário, na intenção de colocar às claras a invalidade, fazendo derivar dela consequências que resultam inaceitáveis.

A função do discurso dialético ultrapassa o lado puramente prático e se torna o método por excelência da exposição. Mesmo não se identificando com a ciência, é útil para expô-la e fazer avançar a razão na aplicação dos próprios princípios científicos. Por três formas é útil: como exercício, nos encontros cotidianos casuais e nas ciências filosóficas. Que ele seja útil como exercício é por si mesmo óbvio, pois que o domínio deste método nos capacitará mais para argumentar acerca do tema proposto.

Portanto, o silogismo dialético serve para tornar-nos capazes de discutir e, em particular, individualizar, quando discutimos com as pessoas comuns ou com as pessoas cultas, quais são os seus pontos de partida e o que, nas suas conclusões, concorda ou não com eles, não a partir de pontos de vista estranhos a eles, mas no seu próprio ponto de vista: ensina-nos a discutir com os outros, fornecendo-nos os instrumentos para sintonizar com eles. Serve à ciência, não só para debater corretamente os prós e os contras das várias questões, mas para acertar os primeiros princípios que, sendo silogisticamente irredutíveis, só podem ser captados indutiva ou intuitivamente; mas tanto a indução como a justificação de uma intuição supõem uma discussão com as opiniões da maioria ou dos sábios.

Se a ferramenta lógica do discurso dialético é o silogismo, fundado sobre premissas ou proposições cuja credibilidade baseia-se na opinião provável, na discussão pode ocorrer o uso inadequado, falacioso das proposições e comprometer o escopo do método dialético. Assim, Aristóteles define a forma de argumentação dialética (o silogismo), explicita o conteúdo das premissas e indica as falácias das formas tendenciosas. Cumpre-nos, em primeiro lugar, definir o que é um silogismo e quais as suas variedades, a fim de entendermos o que é o silogismo dialético, uma vez que ele será o objeto de investigação. O silogismo é um argumento em que, dadas certas proposições, algo distinto delas resulta necessariamente pela simples presença das proposições aduzidas. O silogismo é uma demonstração quando parte de premissas evidentes e primeiras, ou de premissas tais que, o conhecimento que temos, radica nas premissas primeiras e evidentes. É dialético o silogismo que conclui a partir de premissas prováveis. Prováveis são as opiniões recebidas, por todos, ou pela maioria, ou pelos sábios, e, entre estes últimos, pelos mais notáveis e pelos mais ilustres. (ARISTÓTELES, Tópicos , I, 100 a-b).

O discurso é sempre um tipo de movimento, isto é, passagem de proposição(ões) a outra proposição com o intuito de convencer, mesmo se não visa em todas as suas formas à verdade, a ela se tende, e o discurso dialético procura convencer por meios racionais independentemente da vontade do ouvinte e ou mesmo contra ela. Para que isto se torne possível, não é necessária outra condição preliminar, sendo que o ouvinte admita a arbitragem da razão e aceita algumas premissas em comum com o orador, geralmente tiradas das crenças correntes do seu meio social ou cultural, do senso comum ou do consenso científico. No discurso dialético, o ouvinte tem apenas de confiar no seu próprio poder de raciocínio e nas premissas geralmente admitidas; o rumo do discurso será controlado pelo próprio ouvinte, sempre pronto a rejeitar as conclusões que lhe pareçam escapar da sequencia lógica. A credibilidade do discurso dialético depende, portanto, exclusivamente de dois fatores:

1º o ouvinte tem de se comprometer a seguir a lógica do argumento e a aceitar como verdadeiras as conclusões que não possa refutar logicamente;

O entimema constitui tanto a “ferramenta” da dialética quanto da retórica, considerada como um ramo daquela. Quando tratarmos do discurso dialético, tornar-se- á claro a diversidade entre as duas modalidades.

O discurso retórico é constituído por dois tipos de argumentos persuasivos, os técnicos e os não técnicos, isto é, sem arte. Estes são aqueles que já se encontram à disposição do orador; são dados de antemão, sem a pesquisa intelectual. São as testemunhas, as confissões obtidas sob tortura, documentos e convenções. Os argumentos técnicos são aqueles adquiridos mediante método e podem ser dispostos por nós, isto é, inventados antes ou durante a discussão.

Existem três espécies de argumentos técnicos à disposição do orador, conforme o objetivo proposto: os que residem no próprio orador, os que se dirigem aos ouvintes, e os que se concentram no próprio discurso, através do que demonstra ou do que aparenta demonstrar. Para o nosso objetivo, é suficiente o terceiro, pois se trata das argumentações lógicas que levam à persuasão, os entimemas.

As argumentações abreviadas (os entimemas ) baseiam-se em premissas cujo conteúdo são as convicções comumente aceitas e não em princípios científicos. Tal forma abreviada de argumentação exclui tanto a apoditicidade do discurso analítico, assim como as exigências críticas do discurso dialético, em que cada passo (premissas maior + premissa menor e discurso) deve-se mostrar os prós e os contra. O público, em geral, não acompanha os raciocínios cientificamente montados. Nem todos os homens estão preparados para tanto e o discurso se tornaria extremamente cansativo. As opiniões comuns possuem um caráter de verossimilhança que consideradas sob o aspecto da credibilidade são prováveis. O uso desse tipo comum de argumentação se dá de forma que ora se omite a premissa maior, ora a menor, ficando um delas subentendida; ou mesmo pode ocorrer que a conclusão fique a cargo do ouvinte.

Para atingir seu objetivo, que é a persuasão, a retórica, além do entimema , utilizará o exemplo que corresponde à indução lógica e que não implica mediação lógica de qualquer gênero, mas torna imediatamente evidente o que se quer provar.

Dado que é evidente que o método conforme a técnica se refere aos argumentos retóricos, e os argumentos retóricos são uma espécie de demonstração (pois acreditamos, sobretudo quando consideramos que algo foi demonstrado), a demonstração retórica é um entimema , e este por assim dizer, o mais importante dos argumentos, e como o entimema é um silogismo e o estudo do silogismo é tarefa da dialética, de toda ela ou de parte dela, é evidente que aquele que melhor conhecer as premissas e como se origina o silogismo, este será o mais hábil nos entimemas , pois compreenderá a que se aplica o entimema e que diferenças ele possui em relação aos silogismos lógicos.

Chama-se entimema ao silogismo retórico e exemplo à indução retórica. Os discursos dialéticos e retóricos são aqueles mais familiares para Aristóteles. Platão identificou a dialética com a própria filosofia e a opôs às demais formas de

conhecimento, apontando-a como o caminho para atingir e relacionar as Ideias, portanto sendo a ciência por excelência (epistéme). Aristóteles tratará do discurso dialético nos Tópicos e nas Refutações Sofísticas , duas obras que compõem o Órganon.

A cerca da persuasão mediante demonstração ou demonstração aparente , assim como na dialética existe a indução, silogismo e silogismo aparente ; a retórica se dá de modo semelhante, pois o exemplo é uma indução, o entimema um silogismo e o entimema aparente um silogismo aparente.

Retórica e dialética apresentam a mesma estrutura lógica, isto é, a mesma forma, o mesmo modo de argumentar, aplicados a situações e a conteúdos diversos. Isso resulta do fato de que ambas se ocupam de procedimentos praticáveis por todos, e, além disso, pelo fato de que os procedimentos dos quais se servem são análogos: examinar, sustentar uma tese, no caso da dialética; e enfim acusar e defender-se, no caso da retórica. (ARISTÓTELES, Retórica , I 1, 1354a 5-6).

A retórica constitui-se por saber usar bem as pístis (meios de persuasão, modos de causar crença), no caso da dialética, por saber usar bem as argumentações. Contudo, a pístis , diz Aristóteles, não passa de uma espécie de demonstração, mais precisamente uma demonstração retórica, da qual a forma principal é o entimema , por sua vez uma espécie de silogismo, ainda que haja diferença entre o entimema e os silogismos lógicos, isto é, dialéticos. Por isso, quem conhecer melhor os silogismos, vale dizer, conhecer melhor a dialética, conhecerá bem os entimemas , isto é, conhecerá bem a retórica. (ARISTÓTELES, Retorica , I 1, 1355a 3-14).

Aristóteles: da dialética à lógica

Enquanto frequentava a Academia de Platão, Aristóteles esteve frente a frente com a arte dos diálogos, essa maneira própria do discurso manifestar o modo do pensar dialético. Platão ensinava nos seus Dialógos que o entendimento acerca dos fenômenos que se apresentam no mundo físico necessita de uma hipótese:

[...] a existência de um plano superior da realidade, atingido apenas pelo intelecto, e constituído de formas ou ideias , arquétipos eternos dos quais a realidade concreta seria a cópia imperfeita e perecível. (PESSANHA, 1987, p. XIV).

Elevar-se do mundo apreendido pelos sentidos e objeto apenas de opiniões mutáveis só seria possível através da dialética que consistia num exercício direto do

A lógica de Aristóteles surge num meio de oradores e hábeis argumentadores denominados retóricos e sofistas. Nada mais sensato que, portanto, ela tenha início numa análise da linguagem, a fim de detectar seus diferentes usos e elencar os diversos sentidos imputados às palavras usadas nas discussões. Donde resulta posteriormente a designação de Órganon , para o conjunto de seus livros de lógica, do qual as Categorias o abrem, partindo de pesquisas sobre as palavras, procurando inclusive evitar os equívocos que resultam da designação de coisas diferentes através do mesmo nome (homônimo) ou da mesma coisa por meio de diversas palavras (sinônimos). (PESSANHA, 1987).

Aristóteles é de fato o criador da lógica, principalmente por ter dado uma forma precisa e definitiva às leis da prova, e examinado exaustivamente a técnica da dedução silogisticamente. É ele de fato o precursor do silogismo que uniu e sistematizou as formas do pensamento e da expressão.

Assim, com o intuito meramente didático, a organização das obras preservada de Aristóteles é organizada da seguinte maneira conforme (MONTEIRO, 2002, p. 14):

A) Diálogos ou obras do período da Academia: O Grilo, o Eudemo, o Protréptico ou Exortação à Filosofia, Sobre as Idéias, Sobre o Bem e Sobre a Filosofia.

B) Ciências teoréticas

I. Lógica: Categorias, Acerca da Interpretação, Primeiros Analíticos, Segundos Analíticos, Tópicos, Refutações Sofísticas. (O conjunto dessas obras de lógica é conhecido como Órganon ).

II. Metafísica: Metafísica.

III. Filosofia da natureza: Física, Do Céu, Sobre a Alma, Da Geração e da Corrupção, Os Meteorológicos, A História dos Animais, A Geração dos Animais, As Partes dos Animais, Sobre o Movimento dos Animais, e todo um conjunto e tratados breves de história natural.

C) Ciências práticas

IV. Ética e Política: Ética a Nicômaco, Magna Moral, Ética a Eudemo, Política, A Constituição de Atenas.

D) Ciências da criação

V. Estudos sobre a arte: A Retórica, A Poética.

Órganon : o instrumento forjado na lógica

O Ó rganon , obra monumental onde Aristóteles estabelece as bases da lógica formal, está entre as mais importantes e complexas que nos foram legadas pelo Estagirita. (BINI, 2005, p. 7).

O Órganon corresponde à designação dada por Andrônico de Rodes à reunião e estruturação dos tratados lógicos de Aristóteles que atualmente é constituído por seis livros, a saber, as Categorias , Da Interpretação , os Primeiros e Segundos Analíticos , os Tópicos ou Lugares Comuns , e as Refutações Sofísticas (BITTAR, 2003). Trata-se do mais antigo e mais perfeito tratado de lógica que o Helenismo legou à humanidade.

A estrutura e os fins do Órganon estão intimamente ligados aos próprios fins da Lógica. Sendo o fim da lógica o estudo da razão necessária, ou seja, da demonstração, e sendo a demonstração própria do silogismo, aquele que tencione sobre a lógica escrever deverá necessariamente tratar do silogismo.

O silogismo, porém, não existe independentemente das proposições que o constituem; e por isso se impõe necessariamente o estudo das relações dumas com as outras, dos seus elementos, isto é, os nomes e os verbos, «cujas propriedades, significações e gêneros se contêm em dez classes ou ordens, que Aristóteles chamou categorias» , como introdução ao estudo da constituição e formas do raciocínio. Começando, pois, pelos elementos, o lógico estudará sucessivamente «a força das palavras simples, a forma das proposições, a constituição do silogismo e a estrutura da prova necessária e evidente; em segundo lugar inculcará, por assim dizer, certos lugares de argumentação provável donde se podem tirar todos os materiais para a discussão em ambos os sentidos e, finalmente, procurará prevenir contra as ilusões dos sofistas» [...]. (CARVALHO, 1992, p. 51).

Os tratados do Órganon não foram casualmente agrupados na perspectiva de um todo contínuo. Embora não correspondam a um todo planejado, um texto é o desencadeamento de seu precedente. Os textos relacionam-se de tal maneira que os conceitos contidos em um tornam-se elementos aprioristicamente determinantes do conteúdo dos outros que o seguem.

Aristóteles estabelece claramente que a lógica tem um objetivo dúplice: a probabilidade e a verdade. Para cada uma destas ele utilizou duas faculdades: a dialética e a retórica para a probabilidade, e a análise e a filosofia para a verdade, sem nada descurar do que leva à descoberta, ao juízo ou ao uso. À descoberta ele dedicou os Tópicos, os Metódicos e numerosas proposições, por meio das quais é possível dispor de argumentos prováveis para resolver problemas. Para os juízos Aristóteles compôs os Primeiros Analíticos e os Analíticos Posteriores; por meio dos Primeiros julgam-se as premissas e por meio dos Posteriores provam-se as conclusões. (Diogênes Laêrtios, 2008, p. 136).

B) Da Interpretação (1 livro)

O assunto fundamental de Aristóteles no Da Interpretação é exatamente a linguagem na sua relação com o pensamento, como tradutora ou interprete deste. Aristóteles apresenta a teoria das proposições baseada numa tese de grande alcance, pois produz uma extraordinária síntese no universo da linguagem.

Principiemos por definir o nome e o verbo e, em seguida, explicar o que se entende por negação, afirmação, sentença e proposição. (ARISTÓTELES, Da Interpretação , I, 16a 1, 2005, p. 81).

Segundo Aristóteles, a proposição é o objeto da lógica, ela exprime, por meio da linguagem, os juízos formulados pelo pensamento. A proposição seria o enunciado de um juízo por meio do qual um predicado é atribuído a certo sujeito.

É o estudo da proposição lógica que constitui o objeto do tratado Da Interpretação. Aristóteles definia a palavra como o símbolo do pensamento; mas havendo, porém, duas espécies de operações no pensamento, devem distinguir-se duas espécies de sinais na palavra. Às ideias ou simples apreensões, que não são nem verdadeiras nem falsas, correspondem termos isolados, enquanto que a verdade e o erro são sempre expressos por uma afirmação ou negação, isto é, por uma proposição. (CARVALHO, 1992, p. 69).

Dessa maneira as proposições podem ser classificadas em universais e particulares : é universal quando o atributo é afirmado ou negado do sujeito como um todo; é particular , quando o atributo é afirmado ou negado de apenas parte do sujeito. Veja os exemplos:

  1. Proposição universal : “Todos os filósofos são sábios”;
  2. Proposição particular : “Alguns homens não são maus”

A proposição é a atribuição de um predicado a um sujeito. Esse encadeamento de juízos é a essência do raciocínio que se expressa logicamente por intermédio da junção de proposições; essa conexão denomina-se silogismo. Na proposição, a categoria da substância corresponde ao sujeito e as demais categorias são os predicados de forma que a predicação se faz por meio do verbo de ligação ser.

C) Primeiros (2 livros) e Segundos Analíticos (2 livros)

O objeto de investigação dos Analíticos é o encadeamento rigoroso de proposições, de modo a exprimir um raciocínio que pretenda concluir por uma afirmativa necessária. A proposição é um discurso declarativo que enuncia ou declara

verbalmente aquilo que foi pensado e relacionado pelo juízo, ou seja, a proposição separa ou reúne verbalmente o que o juízo separou ou reuniu mentalmente.

Nossa primeira tarefa consiste em indicar o objeto de estudo de nossa investigação e a que ciência ele pertence: que concerne à demonstração que pertence a uma ciência demonstrativa. Em seguida teremos que definir o significado de premissa , termo e silogismo , e distinguir entre um silogismo perfeito e um imperfeito; depois disso, necessitaremos explicar em que sentido diz-se estar ou não estar um termo inteiramente contido num outro e o que entendemos por ser predicado de todo ou de nenhum. (ARISTÓTELES, Primeiros Analíticos , I, 24a 10, 2005, p. 111).

Aristóteles, com sua ideia de silogismo, procura resolver os impasses criados pelas dicotomias, apresentando uma conexão que segue um rumo à conclusão. Nesse sentido, é papel da lógica investigar os elementos que constituem uma proposição, os tipos de proposições e de silogismos e os princípios necessários a que toda proposição e todo silogismo devem obedecer para serem verdadeiros.

Platão, através do método da divisão , procurava chegar a definições: como exemplifica no diálogo Sofista , poder-se-ia obter a definição de uma espécie por sucessivas divisões do gênero em que ela estiver contida. Mas Aristóteles considera insuficiente esse procedimento platônico, pois as dicotomias sucessivas colocam opções sem determinar necessariamente qual dos dois rumos deve ser tomado. (PESSANHA, 1987, p. XV).

A teoria aristotélica do silogismo repousava na concepção de raciocínio como inferência. Para o filósofo, inferir é obter uma proposição como conclusão de outra ou de várias outras proposições que a antecedem e são a sua causa.

O silogismo é uma locução em que, uma vez que certas suposições sejam feitas, alguma coisa distinta delas se segue necessariamente devido à mera presença das suposições como tais. Por “devido à mera presença das suposições como tais” entendo que é por causa delas que resulta a conclusão, e por isso não há necessidade de qualquer termo adicional para tornar a conclusão necessária. (ARISTÓTELES, Primeiros Analíticos , I, 24b 20, 2005, p. 112).

Um silogismo é constituído por três proposições. A primeira é denominada de premissa maior ; a segunda de premissa menor e a terceira, de conclusão. A conclusão é obtida das premissas pela conexão de um termo chamado termo médio. As premissas possuem termos denominados extremos ; há um extremo maior e um extremo menor , e a