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Guias e Dicas
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1 A linguagem das figuras: o caso da ilustração, Exercícios de Desenho

domínio do desenho. A relação da ilustração com a pintura é um aspecto marcante no seu texto, destacando diferenças e pontos em comum. Cor,.

Tipologia: Exercícios

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Amazonas
Amazonas 🇧🇷

4.4

(80)

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A linguagem das figuras:
o caso da ilustração
Alice começava a enfadar-se de estar sentada no
barranco junto à sua irmã e não ter nada que
fazer: uma ou duas vezes espiara furtivamente o
livro que ela estava lendo, mas não tinha figuras
nem diálogos, “e de que serve um livro” — pensou
Alice — “sem figuras nem diálogos?”1
1.1. Palavras iniciais
A ilustração é entendida, em geral, como uma
arte visual que produz imagens para comunicar uma
informação concreta a partir de um conteúdo descritivo
ou analítico. A presente pesquisa visa a desenvolver
uma reflexão sobre essa atividade essencialmente
prática e mapear questões específicas para esboçar
um pensamento teórico sobre a ilustração à luz do
design. As artes visuais são entendidas sob um âmbito
amplo e múltiplo e a ilustração é vista como
comunicação visual, embora possua especificidades
que ultrapassam as fronteiras da área. A ideia para a
construção de uma teorização da ilustração baseia-se
no diálogo entre as artes visuais e a comunicação
visual, desconsiderando-se hierarquias e juízos de
valor. Para a presente pesquisa não existem diferenças
estabelecidas apenas pelo fato de um trabalho ser da
área das artes visuais, do design gráfico ou da
1 Entrando na toca do Coelho, in CARROLL, Lewis, Aventuras
de Alice no País das Maravilhas. Atráves do espelho e o que
Alice encontrou lá, 3a ed., São Paulo, Summus, 1980, p. 41.
Tradução e organização de Sebastião Uchôa Leite.
Figura 1: Ilustração de Lewis
Carroll para personagem Alice.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0610655/CA
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A linguagem das figuras:

o caso da ilustração

Alice começava a enfadar-se de estar sentada no barranco junto à sua irmã e não ter nada que fazer: uma ou duas vezes espiara furtivamente o livro que ela estava lendo, mas não tinha figuras nem diálogos, “e de que serve um livro” — pensou Alice — “sem figuras nem diálogos?”^1

1.1. Palavras iniciais

A ilustração é entendida, em geral, como uma arte visual que produz imagens para comunicar uma informação concreta a partir de um conteúdo descritivo ou analítico. A presente pesquisa visa a desenvolver uma reflexão sobre essa atividade essencialmente prática e mapear questões específicas para esboçar um pensamento teórico sobre a ilustração à luz do design. As artes visuais são entendidas sob um âmbito amplo e múltiplo e a ilustração é vista como comunicação visual, embora possua especificidades que ultrapassam as fronteiras da área. A ideia para a construção de uma teorização da ilustração baseia-se no diálogo entre as artes visuais e a comunicação visual, desconsiderando-se hierarquias e juízos de valor. Para a presente pesquisa não existem diferenças estabelecidas apenas pelo fato de um trabalho ser da área das artes visuais, do design gráfico ou da

(^1) Entrando na toca do Coelho, in CARROLL, Lewis, Aventuras de Alice no País das Maravilhas. Atráves do espelho e o que Alice encontrou lá , 3 a^ ed., São Paulo, Summus, 1980, p. 41. Tradução e organização de Sebastião Uchôa Leite.

Figura 1: Carroll para personagem Alice. Ilustração de Lewis

ilustração. As possibilidades despertadas pela obra constituem aquilo que a faz resistir ao tempo e repercutir nas transformações visuais existentes ao longo dos anos. Enfrentando uma tradicional tendência de separação das áreas, a pesquisa apresenta a intenção de se aproximar e trocar informações e reflexões com diferentes campos de atuação. Parte-se de uma visão integrada entre a ilustração, o design (gráfico) e as artes visuais. A noção de ilustração afasta-se da ideia de técnica, de estilo e de enfeite e aproxima-se da noção de uma prática que comunica visualmente um conteúdo que a acompanha, seja, de forma complementar ou, suplementar. Logo, não se limita a um “produto” em si mas a um processo de trabalho. Nesse sentido, encontra-se com a definição de design como um processo que tem no projeto um caminho para se alcançar o objeto^2. No caso da ilustração há uma relação direta com a sua vertente gráfica mas em termos conceituais pode-se comunicar com definições próprias ao design. A pesquisa adotou o termo artes visuais para englobar não só as artes plásticas mas as artes ligadas a visualidade em geral. Busca-se uma flexibilização da fronteiras que separam as artes plásticas das artes visuais. Considera-se assim, que ilustração e design fazem parte das artes visuais. Juízos de valor e hierarquizações não são considerados no presente estudo. Optou-se pela utilização do termo artes visuais em função de sua abordagem ampla, a fim de

(^2) MÜLLER, William R. The Definition of Design (1988). Traduzido do original por João de Souza Leite (1997).

de imagens. A sequência de imagens muitas vezes ajuda na construção espaço-tempo que determina a narrativa, apresentando-se de forma aberta a interpretações flexíveis e facilitadoras de cada leitura pessoal. Contar histórias não é a função pertinente apenas ao texto oral ou escrito, mas também às ilustrações. As ilustrações sugerem um entendimento de espaço e de tempo. Enquanto a leitura do texto ocorre de forma linear, as imagens sugerem uma narrativa própria, onde imagem e palavra se potencializam mutuamente em função das suas diferenças. Cada qual pode sobressair-se em relação ao outro, mas o objetivo de contar uma história ou de passar um conteúdo comunicativo prevalece. A ilustração, de maneira geral, caracteriza-se como uma prática que acompanha a longa história da comunicação humana. Da origem dos primeiros sistemas de representação, que se transformaram na estrutura da escrita, ao universo imagético das expressões visuais nos muros dos grandes centros urbanos contemporâneos, assim como nos livros ilustrados, uma vasta produção visual vem marcando a história da comunicação. O Livro dos Mortos egípcio (Fig.5), as iluminuras medievais (Fig.6), as xilogravuras que acompanharam textos impressos na prensa de Gutenberg, as ilustrações em cartazes que configuraram o design gráfico do século XX (Fig.7), são exemplos pontuais que revelam a amplitude e a complexidade do assunto. Atualmente, o tema da ilustração vem despertando o interesse de alunos e profissionais da

Figura 5: dos Mortos”. Página do “Livro

Figura 6: Exemplo de Iluminur0000000000a.

Figura 7: Christoph Niemann, 2001 Ilustração de.

área do design gráfico. A aproximação entre arte e design gráfico, a valorização do design vernacular, a explosão do grafite (Fig.8) e uma releitura dos cadernos de desenhos ( sketchbooks ) representam alguns reflexos da revitalização da ilustração. Entretanto, a expansão da ilustração em contraponto com o seu descredenciamento, ocorrido a partir da fotografia, ao longo das últimas décadas do século XX, sugere um paradoxo em relação ao futuro da atividade. O que significa ilustrar um texto? O que é ilustração e como se dá a sua relação com o design gráfico? Como se configurou a formação da área nas suas origens? Qual a importância de questões como estilo, técnica e autoria para o entedimento da ilustração? Como se dá a relação entre conteúdo textual e imagético? Quais os pontos de contato entre ilustração e artes visuais? O que determina o que seja considerado ou não ilustração? Quais são os gêneros que compõe o universo dessa prática? Quais os parâmetros e as premissas para a construção de uma possível teorização sobre a ilustração? Essas são algumas das muitas perguntas pertinentes ao estudo da ilustração, aqui proposto. Parte-se da ideia da ilustração como uma imagem funcional – narrativa ou descritiva – desencadeadora de uma relação de diálogo entre a representação visual e o texto. A ilustração apresenta um amplo universo de estudo em função da existências da variedade de gêneros que a compõe. Assim, a prática que acompanha o caminho de representações visuais que vem sendo construído pela humanidade, precisa estar acompanhada de uma

Figura 8: Grafite na rua.

— do que decorativas. 5 Para o autor, a história da ilustração começa com o surgimento do Códex, na medida em que esse formato impôs um planejamento relativo à aplicação do texto e da ilustração. John P. Harthan (1916-2000) — bibliotecário da Biblioteca do Victoria and Albert Museum , em Londres — afirma que a ilustração surge como tal nas iluminuras na Idade Média, feitas à mão livre junto com o texto. Entretanto, a ilustração narrativa representada no Livro dos Mortos (século XIII a.C.) dos egípcios já configura um registro elaborado e complexo, relacionando imagem e texto. (Fig.9) A questão narrativa esboçava-se muitos anos antes, desde os primeiros desenhos primitivos, como representação visual. A ilustração, de forma mais genérica, existia em objetos e em registros anteriores à escrita. Os desenhos que deram origem à escrita visavam também o controle da produção agrícola e dos animais, ou seja, enfocavam um objetivo funcional, e não uma imagem decorativa. A partir dessa afirmação, questiona-se o fato de as definições consideradas clássicas sobre ilustração, bem como o próprio entendimento do senso comum, enfatizarem o seu lado de adorno superficial. Muitas vezes, em textos sobre diferentes assuntos, o termo “ilustrar” aparece como algo que vai acrescentar uma curiosidade ou um bônus, e não uma força informativa. O desenho é, antes de tudo, uma ferramenta, um instrumento tanto para a comunicação de um pensamento visual como para a representação de uma ideia ou uma situação. O domínio técnico constitui um

(^5) Id., p. 8.

Figura 9: Mortos”. Página de “Livro dos

passo para a realização da tarefa de produzir uma imagem-função. A imagem-função, ou arte visual funcional, é a característica intrínseca da ilustração. O que confere qualidade a um trabalho não se encontra na sua característica imagem-arte, ou imagem-função, mas na sua força qualitativa e na compreensão de seu objetivo. Assim, técnica e estilo são ferramentas circunstanciais que estão a serviço de um objetivo ligado à construção da comunicação e do desenvolvimento de uma linguagem visual. A porosidade existente no limite do que determina o que é ou não é uma ilustração — a funcionalidade — estabelece uma ligação com a história das artes visuais. O estudo da ilustração muitas vezes limita-se a um compêndio de trabalhos de profissionais validados pelo domínio de diferentes técnicas. O culto ao estilo e à técnica fortalece a imagem de alguns ilustradores, mas não é suficiente para uma reflexão sobre a área. Percebe-se o esquecimento da ilustração na história da arte. Dan Fergus, no seu artigo “ Illustration and Art History ”,^6 propõe a seguinte questão: por que a ilustração vem sendo excluída da história da arte? Para o designer, educador e escritor americano, essa separação acirrou-se no final do século XIX com a distinção entre artes plásticas e arte popular. Fergus defende uma reavaliação da ilustração na história da arte, e lembra o pensamento de Jorge Frascara sobre a valorização de inovações de cunho fantástico em ideias de design; inovações que, muitas vezes, não possuem uma conexão com a sociedade. Enquanto

(^6) Acesso em 2 jan. 2010. Em: http://www.danfergusdesign.com/academic/writings/fairUse.html

1957 e 1985, apenas doze abordam o tema da ilustração. A seguir apresenta-se uma síntese desses doze livros, seguindo os comentários de Godfrey. The Language of Graphics , de 1980, é um dos raros livros de referência da área da comunicação visual que trata a ilustração junto ao design gráfico. No seu primeiro capítulo, dedica-se às origens dos sinais e símbolos, e os capítulos posteriores exploram o papel da imagem gráfica na sociologia, na estratégia e na psicologia. O capítulo final mostra-nos uma história cronológica das artes gráficas: da Revolução Industrial aos meados dos anos 70.^8 Os autores afirmam que

Frequentemente negligenciada das histórias do design, a ilustração tem capítulo próprio, assim como embalagens e design ambiental. O então emergente campo da imagem gerada por computador também recebe aqui uma de suas primeiras menções.^9

Visual Presentation of Invisible Process , - how to illustrate invisible process in graphic design de Anton Stamkowski de (Telifen c.1967), é um álbum de experimentos visuais. Images of an Era: The American Posters 1945-75 , de John Garrigan, Margaret Cogswell, Milton Glaser, Dore Ashton e Alan Gowans (Washigton, 1975), apresenta uma relação de artistas- ilustradores-designers influentes e de seus trabalhos que relacionam as áreas. The Language of Graphics , de Edward Booth-Clibborn e Daniele Baroni (Nova

(^8) GODFREY, Jason, Bibliográfico: 100 livros clássicos sobre design gráfico , São Paulo, Cosac & Naify, 2009, p. 113. (^9) BOOTH-CLIBBORN, Edward & BARONI, Daniele, The Language of Graphics , Nova York, 1980, apud GODFREY, Jason, Bibliográfico , op. cit., p. 113.

York, 1980), explicita a lacuna existente na inclusão da ilustração nos livros de design gráfico. Graphic Styles: From Victorian to Post-Modern , de Steven Heller e Seymour Chwast (Nova York, 1988), utiliza uma abordagem baseada na história da arte e tenta usa-la aplicada ao design gráfico, distante de qualquer reflexão sobre a ilustração do ponto de vista teórico. Love and Joy about Letters , de Ben Shahn (Londres, 1974), é um livro que mostra ilustrações de letterings em pinturas, cartazes, artes gráficas, ilustrações e trabalhos de referência sobre o artista. Ou seja, trata- se de uma espécie de compêndio de trabalhos sem análises e reflexões sobre os próprios trabalhos e sobre o tema. Graphic Design: A Concise History , de Richard Hollis (Thames & Hudson, Londres, 1994), é um livro de referência que mostra trabalhos de design gráfico. A ilustração é apresentada a partir de um olhar focado principalmente em especificidades do design gráfico, influenciado por um viés do pensamento modernista. Outros livros citados abordam trabalhos de artistas que tornaram a separação entre ilustração e design gráfico algo difícil de realizar do ponto de vista prático. Os trabalhos falam por si só da relevância e da integração entre design gráfico e ilustração mas, em geral, sem a presença de textos que acompanhe os trabalhos e fomentem uma análise critica do tema. 10 Tomando por base o material levantado, identifica-se, mais uma vez, o silêncio sobre a atividade

(^10) Polski Plakat Filmowy , de Tadeusz Kolaswi (Org.), Varsóvia, 1957; Milton Glaser: Graphic Design , de Milton Glaser (Woodstock, 1973); The Complete Tandori Yokoo , de Tandori Yokoo (Tóquio, 1971); The Left-handed Designer , de Seymour Chwast (Londres e Paris, 1985); Top Graphic Design , de F. H. K. Henrion (Zurique, 1983).

como ilustração-escritura , ou seja, uma outra voz , uma outra maneira de dizer.^11 A presente pesquisa considera a ilustração parte das artes visuais. A ilustração frequentemente está associada às referências das artes — composição, luz, cor, forma, estilo, técnica etc. — que constituem as bases do desenvolvimento da sua prática. A força da comunicabilidade da imagem, de fato, é o que determina o seu alcance. O próprio termo “ilustração” pode, em algumas circunstâncias, sugerir um sentido pejorativo. Trata-se de uma espécie de cacoete introjetado existente em relação à reprodução seriada. O valor da obra única e original ainda perpassa atitudes e pensamentos relativos à valorização da imagem. Entretanto, do ponto de vista da reflexão sobre as artes visuais, esta distinção hierárquica não encontra amparo nos próprios fatos que marcaram a história da arte. As diferenças existentes estão atreladas às características das áreas, e não são suficientes para determinar a exclusão da ilustração. Enquanto a obra de arte se afirmou no mercado a partir de sua condição única e original, a ilustração reproduzida em série projetou-se no alcance popular. A ilustração tem as suas características formais influenciadas pelos movimentos estéticos, mas está comprometida com uma informação. A ilustração tem como ponto de partida um texto ou um conteúdo, e, por isso, está atrelada a uma função. Não tem como foco principal despertar a fruição estética, embora isso

(^11) RIBEIRO, Marcelo In: OLIVEIRA, Leda (Org.), O que é qualidade em ilustração no livro infantil e juvenil: com a palavra o ilustrador , São Paulo, DCL, 2008, p. 124.

possa ocorrer sempre que for estabelecida uma interconexão entre obra e observador. A imagem funcional parte da sua função para ser o que é. Assim, com as suas especificidades, a ilustração construiu a sua história, ainda que em paralelo. O esquecimento da ilustração nos registros da história das artes visuais, em contrapartida, apresenta uma oportunidade para que esta atue mais livremente. Em essência, arte, ilustração e design estão intimamente interligados. No entanto, os mercados protegem os seus próprios interesses e buscam diferenciar-se para a sua consolidação. Os processos de distinção ocorreram em função da busca da delimitação dos campos. Para Marshall Arisman (1938- ), ilustrador e professor americano (Fig.10), o pintor que ilustra é considerado suspeito, enquanto o ilustrador que procura uma galeria para expor não é bem aceito. O ilustrador, para Arisman, não é bem-vindo no meio artístico, pois a palavra “ilustração”, neste meio, é considerada uma espécie de beijo da morte ”, ou seja, não é reconhecida enquanto “arte” e, muitas vezes, vista segundo um sentido pejorativo. O meio artístico refere-se a um trabalho como “ilustrativo” quando o considera sem qualidade. Arisman cita as palavras do escultor David Smith, que define a arte comercial como “arte que encontra a mente e precisa de outras pessoas”, e a arte plástica como “arte que encontra a mente e precisa do artista”. 12 O autor acredita que é

(^12) HELLER, Steve & ARISMAN, Marshall, The Education of an Illustrator , Nova York, Alworth Press New York and School of Visual Arts, 2000, p. 3.

Figura 10: “The United States of the Atomic Bomb” para TimeMagazine, 1986. Ilustração de Marshall Arisman

muitos dos textos produzidos sobre o assunto. Trata-se de uma proposta para a desmitificação da ilustração, ou seja, ver o assunto de uma maneira distanciada. Enquanto, do ponto de vista prático, a quantidade e a qualidade das ilustrações crescem de forma exemplar, a produção de textos críticos sobre o tema ainda se mostra limitada. A investigação sobre a defasagem existente entre a qualidade prática crescente e os textos de reflexão sobre o tema, ainda sem plena densidade, motiva a realização do presente estudo. Sendo assim, em contraponto à prática da ilustração, percebe-se uma oportunidade para a realização de um estudo teórico da ilustração no campo do design gráfico brasileiro. Em grande parte dos textos sobre design gráfico, a ilustração é pouco mencionada. Uma possível teorização acerca da ilustração pode estabelecer e promover diálogos com as teorias do design. Um dos objetivos da presente pesquisa visa tecer uma teorização da ilustração a fim de contribuir no ensino de ilustração a partir do diálogo com as teorias do design. A ilustração tem sua origem atrelada às artes plásticas, e cada vez mais se mostra uma importante parceira do design gráfico. Ou seja, atualmente, na prática, a ilustração se reconhece, interage e se expressa muito mais junto ao design. A ação dos ilustradores direciona-se nesse sentido, embora os discursos ainda se fixem no vocabulário próprio às artes visuais. Observa-se, assim, um movimento contínuo de aproximação e diálogo existente entre design gráfico e ilustração. Entendendo-se design a partir da visão da interdisciplinaridade:

Mais do que ter vocação interdisciplinar, o Design tem natureza de interdisciplinaridade tecnológica. É uma disciplina que tem em sua base elementos disponibilizados pelo conhecimento científico, empírico e intuitivo. É uma tecnologia, que utiliza, na sua prática, conhecimento de outros campos de saber, o que explica sua vocação interdisciplinar.^14

A convivência do design com a ilustração possibilita o surgimento de uma ilustração mutante, reunindo elementos próprios do ambiente do desenho e da gráfica. A ilustração mutante reúne elementos próprios da ilustração associados a elementos específicos do design gráfico. A tipografia ilustrada pode ser um exemplo dos muitos caminhos que essa característica da ilustração pode ser explorada. Essa ilustração revela um processo de trabalho conjugado que revela flexibilidade diante de desafios visuais próprios da era contemporânea. Nos últimos anos, novos conceitos estéticos e a utilização de recursos computacionais abriram espaço para a mistura de técnicas, suportes e linguagens nas artes gráficas. Ilustrar é um ato de aproximação entre a expressão e a observação do cotidiano, entre o banal, o corriqueiro e a informação. Outro aspecto que envolve a ilustração é o estilo. O estilo definido ajuda o profissional ilustrador a ser reconhecido. Entretanto, o estilo pode revelar-se uma espécie de armadilha:

(^14) COUTO, Rita Maria & OLIVEIRA, Alfredo Jefferson (Org.), Formas do Design , Rio de Janeiro, 2AB, 1999, p. 66.

A foco central desta pesquisa consiste em investigar o estatuto da ilustração. Busca-se identificar a problemática que a envolve a partir do ponto de vista do design. A ilustração é uma linguagem que dialoga com as artes visuais e com o design gráfico, transitando entre as duas áreas. A ilustração não se constitui na condição de campo autônomo em função da sua própria razão de ser, ou seja, descrever ou narrar uma ideia, mesmo quando a narrativa é construída apenas de imagens e a imagem-função fundamenta o sentido da obra. A ilustração é parte fundamental da história das artes visuais; história que abrange o design gráfico. A ilustração pode comportar-se de forma mais autônoma ou de forma equilibrada, na complementação do conteúdo textual. Os livros didáticos, por exemplo, são concebidos com o objetivo da troca entre os conteúdos textuais e imagéticos. Já os livros de imagens revelam um potencial independente da ilustração, e destacam a força imagética como transmissora de mensagens e como linguagem visual. A ilustração, de uma maneira ou de outra, estará contando alguma história. É interessante refletir sobre o termo “ornamento”. Sob o ponto de vista modernista, representado no livro Ornamento e crime (1931), do arquiteto vienense Adolf Loos (1870-1933), o ornamento é algo desprezível e que precisa ser combatido. Loos acredita que a evolução humana está diretamente ligada ao desapego do ornamento. Esse pensamento está refletido em obras de arquitetura e de design ao longo do século XX e, durante muitos anos,

serviu de base para manifestações modernistas. Na medida em que, em linhas gerais, a ilustração era entendida como um ornamento que acompanha um determinado texto, pode-se entender a razão pela qual se estabeleceu um certo afastamento entre a imagem funcional e o design gráfico. A ilustração foi banida do contexto gráfico que visava atender ao lema do “menos é mais”. Esses preceitos, a partir de então, impactaram significativamente a história da ilustração. Para Arisman, embora a ilustração seja muitas vezes definida como “arte aplicada”, esta expressão é inadequada para explicar a área ou a forma de trabalho. Para ele, muitas escolas e universidades americanas aceitam a ideia de que a ilustração é uma arte aplicada, assim como o design gráfico. Mas a definição de ilustração com a qual este autor mais se identifica é “arte figurativa baseada na contação de história”. 18 A ilustração apresentada segundo a sua particularidade — a narratividade —, não se encontra autônoma. Paralelamente, as artes visuais buscam desassociar-se de vestígios narrativos para encontrar a sua autonomia. A narrativa inviabiliza a construção de uma expressão plena, segundo o ponto de vista desse campo. As palavras de Francis Bacon (1909-1992) artista plástico irlandês 19 , revelam tal postura, ao

(^18) Introdução, in HELLER, Steve & ARISMAN, Marshall, Teaching Illustration , Nova York, Alworth Press New York and School of Visual Arts, 2006, p. xix. (Tradução livre.) (^19) Francis Bacon iniciou sua carreira em Paris como decorador, designer de móveis e de tapeçarias. O artista afirma que seus guaches para projetos decorativos o levaram à pintura. In SYLVESTER, David, Entrevista com Francis Bacon , São Paulo, Cosac & Naify, 2007, p. 206.